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Os limites de atuação do poder judiciário e os reflexos do ativismo judicial: um estudo sobre o princípio da separação de poderes e a atual crise de representatividade democrática no país

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE LUÍS OTÁVIO VIEIRA FELTRIN

OS LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO E OS REFLEXOS DO ATIVISMO JUDICIAL: UM ESTUDO SOBRE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES E A ATUAL CRISE DE REPRESENTATIVIDADE DEMOCRÁTICA NO

PAÍS.

CRICIÚMA 2017

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OS LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO E OS REFLEXOS DO ATIVISMO JUDICIAL: UM ESTUDO SOBRE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES E A ATUAL CRISE DE REPRESENTATIVIDADE DEMOCRÁTICA NO

PAÍS

Trabalho de Conclusão do Curso, apresentado para obtenção do grau de bacharel no Curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC.

Sob orientação do professor Me. Michel Alisson da Silva.

CRICIÚMA 2017

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OS LIMITES DE ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO E OS REFLEXOS DO ATIVISMO JUDICIAL: UM ESTUDO SOBRE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES E A ATUAL CRISE DE REPRESENTATIVIDADE DEMOCRÁTICA NO

PAÍS

Trabalho de Conclusão do Curso, apresentado para obtenção do grau de bacharel no Curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC.

Criciúma - SC, 06 de dezembro de 2017

BANCA EXAMINADORA

Prof. Michel Alisson da Silva – Mestre – UNESC – Orientador

Prof. Daniel Ribeiro Preve – Mestre – UNESC

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Dedico este trabalho aos meus pais, Otávio Aparecido Feltrin, Elsi Vieira Feltrin, minha irmã Mariana Vieira Feltrin, minha Avó Neuza Vitória Dante Feltrin, e minha companheira de todos os momentos Rafaela Ferrari.

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AGRADECIMENTOS

Inicio o trabalho agradecendo primeiramente a Deus, por estar presente nos momentos mais difíceis ao meu lado, inclusive na elaboração da presente monografia. Somado a este apoio, agradeço também à minha família, meu pai Otávio Aparecido Feltrin, minha mãe Elsi Vieira Feltrin, minha irmã Mariana Vieira Feltrin e minha Avó Neuza Vitória Dante Feltrin, que me deram todo o suporte e apoio necessário, não me deixando faltar absolutamente nada para conseguir realizar meus trabalhos com calma e tranquilidade, sem eles, com certeza eu não conseguiria.

Necessário é agradecer a minha companheira de todos os momentos Rafaela Ferrari, que esteve comigo nos desabafos, nas tristezas e nas aflições, assim como também esteve nas alegrias, nas vitórias e nas comemorações. Sua importância para a realização deste trabalho é de tamanho imensurável, ao qual devo meus mais sinceros agradecimentos.

Agradeço à minha segunda família, que são meus amigos, que me apoiam desde que cheguei na cidade de Criciúma em 2006, até os dias atuais, servindo também como suporte e como fortaleza para os momentos difíceis na vida. Faço questão de destacar os amigos Sandro Soratto Ortolan, João Maurício Mattos, Estevão Giordani, Francisco Henrique Pinheiro Marques, Luís Fernando De Bem, Catarina Dessuy Messer, Arthur De Bem, Thales Tavares Fontoura, Rodrigo Gomes Marcelo e Gustavo Tcatch, que me acompanham e me servem como família desde minha mudança até o presente momento, sem eles, também não seria possível a calma e a tranquilidade necessária para completar minha tão sonhada graduação.

Aos professores do curso de Direito da UNESC, especificamente ao meu orientador Michel Alisson da Silva, que com toda sua sabedoria e sua calma, me tranquilizou nos momentos de aflição, e me orientou de maneira brilhante a

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conseguir desenvolver o conteúdo apresentado. Também acredito ser justo destacar os cumprimentos aos professores Matheus Back, Frederico Ribeiro de Freitas Mendes, João Carlos Rodrigues e à Magnífica Reitora Luciane Ceretta, que para além da minha construção acadêmica, ajudaram a moldar meu caráter.

Aos companheiros de movimento estudantil, que me ensinaram a importância da universidade comunitária na sociedade, me colocaram à prova em situações difíceis, nas quais conseguimos lograr êxito juntos. Destaco os companheiros Franciel Tupan, Lucene Magnus, Marcos André Meller, Carla Martins, Táira Oliveira, Rafael Amaral, Alexandre Bristot Rocha, Marcos Soares Machado, Giovana Vitto Mondardo e Paola Soccas. Todos tiveram papel fundamental na minha construção política e no meu plano de carreira.

Por último, não posso deixar de agradecer meus colegas de trabalho da 2ª Delegacia de Polícia de Criciúma, que diariamente me proporcionam saber e me dão aulas de responsabilidade, com destaque aos colegas Daniela Naspolini, Laís Steiner, Adroaldo Girardi, Ana Paula Tomasi, Gílson Bassedone de Castro, e aos mais que colegas, mas mestres de sabedoria e conhecimento, Delegados Ari José Soto Riva e Antônio Márcio Campos Neves.

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“Nós vimos brilho quando o mundo estava adormecido.”

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RESUMO

O presente trabalho tem o objetivo de associar o estudo do princípio da separação de poderes, através de sua concepção histórica e seus conceitos clássicos, através dos pensadores da revolução francesa, aos conceitos modernos de ativismo judicial, através dos doutrinadores modernos. Para além dos estudos conceituais, fora feita uma pesquisa de método indutivo, com questionário direcionado às representantes do Poder Judiciário e Poder Legislativo, para associar os estudos da separação de poderes e do ativismo judicial a atual crise política instaurada no Brasil.

Palavras chave: Separação de Poderes. Ativismo Judicial. Política. Democracia.

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ABSTRACT

The present work has the objective of associating the study of the principle of the separation of powers, through its historical conception and its classic concepts, to the modern concepts of judicial activism. In addition to the conceptual studies, an inductive method research was conducted, with a questionnaire directed to representatives of the Judiciary and Legislative Branch, to associate the studies of separation of powers and judicial activism with the current political crisis established in Brazil.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

STF – Supremo Tribunal Federal

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 12

2. O ESTADO MODERNO E A SEPARAÇÃO DE PODERES ... 14

2. O Estado Moderno ... 14

2.2 Separações De Poderes ... 16

2.3 Separações De Poderes No Estado Brasileiro ... 22

3. ATIVISMO JUDICIAL... 26

3.1 A Distinção De Ativismo Judicial E Judicialização Da Política ... 27

3.2 Origem E Desenvolvimento Do Ativismo Judicial ... 29

3.3 Posicionamentos Na Doutrina Sobre O Ativismo Judicial ... 32

4. LEITURAS CONTEMPORÂNEAS DO ATIVISMO NO PODER LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO ... 38

4.1 O Reconhecimento Do Judiciário Como Garantidor De Direitos Fundamentais . 39 4.2 Relação Entre As Decisões Do Judiciário E Do Legislativo ... 41

4.3 As Decisões Judiciais Que Vão Além Do Texto Da Lei ... 42

4.4 Judicialização Em Busca De Cumprimento De Direitos Fundamentais ... 44

4.5 Percepção Pessoal Sobre Eventuais Problemas Decorrentes Do Ativismo ... 45

4.6 Ativismo Como Reação À Inércia Do Legislativo ... 47

4.7 Razões Para A Anomia ... 48

4.8 Politização Do Judiciário ... 49

4.9 Juízes Políticos ... 50

5 – CONCLUSÃO ... 52

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1. INTRODUÇÃO

O ativismo judicial se conceitua em uma participação com amplitude e intensidade do Poder Judiciário, com uma maior interferência na atuação dos outros dois poderes, Legislativo e Executivo, algumas vezes ditando condutas ou abstenções que estes deveriam cumprir, estas em sua maior parte que dizem respeito a políticas públicas.

Indo de encontro às condutas ativistas, encontra-se o Princípio da Separação de Poderes, que desde os pensadores Aristóteles, John Locke e Montesquieu já era visto como um princípio ideal para a organização de uma República, sendo que tal princípio assegura que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário devem ser harmônicos e independentes entre si, teoria esta que o ativismo judicial acaba desbancando, mesmo que em nome do bem estar social.

Devido à lentidão do aparelho estatal, o ativismo certas vezes acaba se tornando necessário para que demandas urgentes e sem previsão normativa sejam resolvidas. Porém, acredita-se que há um limite a essa atuação para que o Judiciário não comece a legislar ao invés daqueles que para isso foram eleitos, uma vez em que há uma divisão de poderes que faz com que um poder não se aproprie das demandas do outro.

A relevância da pesquisa sobre o ativismo judicial é justamente questionar se o Poder Judiciário pode ou não assumir determinadas demandas que deveriam ser do Poder Legislativo, e se tal conduta acaba criando uma crise de representatividade da população em respeito a seus representantes eleitos, uma vez que a justificativa buscada para motivar o ativismo, é a lentidão do Legislativo para solucionar suas demandas. Tal pesquisa é importante para que se busque uma reflexão a respeito da atuação do judiciário brasileiro nos dias atuais, e que perigo causaria uma conduta cada vez mais ativista para a democracia brasileira.

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Para alcançar esse objetivo, tratar-se-á no primeiro capítulo sobre o princípio da separação de poderes através dos pensadores clássicos que estudaram sobre o assunto, trazendo todo seu aspecto histórico, conceito e aplicação à época em que fora escrito, Além dos conceitos e concepções históricas, também fora trazido o referido princípio para os dias atuais, através das doutrinas jurídicas brasileiras contemporâneas que escreveram sobre sua aplicação na Constituição Federal de 1988.

No segundo capítulo, por sua vez, a abordagem é sobre o ativismo judicial, onde se fez necessário uma distinção de conceitos de ativismo judicial e judicialização da política. Em seguida fora estudado seus conceitos e concepções históricas, e ademais os posicionamentos críticos favoráveis e contrários ao ativismo judicial nas doutrinas.

E, para encerrar o presente trabalho de pesquisa, no terceiro capítulo se fez necessário questionar os representantes do poder Legislativo e do Poder Judiciário, para comparar suas afirmações a respeito do ativismo judicial, tentando extrair de suas convicções, posicionamentos sobre a necessidade do ativismo judicial, a motivação do judiciário para que atue da maneira ativista, buscar respostas sobre o que autoriza tal conduta e qual seria o limite dessa atuação.

Para tal pesquisa, fora realizada uma entrevista com uma representante do Poder Legislativo e uma representante do Poder Judiciário, com nove perguntas idênticas para cada, todas direcionadas para a atuação dos respectivos poderes no dia a dia, relacionando tal atuação com os princípios e conceitos estudados no trabalho.

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2 – O ESTADO MODERNO E A SEPARAÇÃO DE PODERES

A sociedade em que vivemos atualmente se sustenta em um modelo de Estado que fora pensado e criado em meio às revoluções burguesas do século XVIII. Na época, fora concebido um novo modelo jurídico de Estado, diferente do modelo absolutista que tinha em seu representante todo o poder concentrado, originando assim uma nova concepção de divisão dos poderes.

Esse novo modelo de Estado, buscando sempre tirar das mãos de apenas um indivíduo toda a concentração de Poder, trouxe a ideia de subdividir esses Poderes, criando entre eles freios e contrapesos que permitam sua livre independência e harmonia entre si, justamente para que um não se sobreponha ao outro.

O estudo do princípio da separação de poderes se sustenta, e só é possível ser aplicado, em um Estado soberano, onde se tenha uma organização estatal pública que possa conferir a tais poderes a legitimidade e atribuir suas demandas. Portanto, antes de se estudar a separação de poderes e suas origens, se faz necessário iniciar um breve estudo acerca da origem do conceito de Estado, para melhor entender em que contexto se aplica a separação de poderes.

2.1 – O Estado Moderno

O Estado moderno em que se vive os dias atuais é classificado como um fenômeno sócio-político construído através de uma concepção histórica que chegou a seu último conceito como sendo não apenas um Poder Executivo, que tem em suas atribuições as atividades governamentais administrativas, como também as atribuições de legislar e de julgar. (CADEMARTORI, 2001, p. 27)

Para se chegar a tais conceitos e classificar suas atribuições, fora necessário um amplo debate filosófico que se passou por pensadores clássicos e revoluções, debatendo amplamente sobre qual seria o papel do Estado para com a sociedade.

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O Estado nos moldes de hoje fora pensado em meio às revoluções burguesas, que tinham como principal objetivo tirar o Poder das mãos dos reis autoritários e absolutistas. Portanto é necessário ter a ciência de que antes de se começar a traçar esse novo modelo de Estado democrático e republicano, a sociedade passava por um regime absolutista que tinha toda a concentração de poder para administrar, criar normas e julgar, concentrada em uma única pessoa, o rei.

Na obra Discursos, de Nicolau Maquiavel, autor que inaugurou o pressuposto filosófico político do regime absolutista, pode-se encontrar entendimento que compreende o Estado, como o responsável por garantir a paz entre os cidadãos:

“De fato, que é um governo senão o meio de conter os cidadãos de modo que eles não se injuriem mutuamente? Meio que consiste em dar completa segurança a população ou em reduzi-la a impossibilidade de praticar o mal; ou ainda em fazer tantos benefícios ao povo que este não tenha razão para procurar mudar seu destino (MAQUIAVEL, 1994, c. 23)”

Após as revoluções burguesas, que contaram com inúmeras obras que deram o início aos novos moldes de Estado, compreende-se que não se alterou o objetivo central das atribuições estatais, que seria a garantia da paz entre a sociedade, porém, a maneira que se confere o Poder à autoridade, que será o responsável por essa garantia, fora revolucionária no sentido de atribuir sua escolha ao povo.

Thomas Hobbes (2009, p. 126/127), em sua obra O Leviatã, discorreu sobre o conceito de estado como sendo uma pessoa fictícia instituída por uma grande multidão, que se compreende como população, com diálogos ou pactos recíprocos, para concessão do poder, o que lhe garante o uso da força e violência legalizada, bem como outros meios que achar conveniente, porém, sempre em nome da paz e da defesa comum, essa seria a essência do Estado.

Em uma teoria considerada liberal, onde se acredita que as decisões sobre os rumos da sociedade devem partir do povo, John Locke (1978, p.35)

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acredita que o estado perfeito de liberdade será alcançado quando as pessoas possam regular suas posses e ações conforme as leis da natureza, sem pedir permissão para alguém, ou seja, uma ideia completamente antagônica aos pensamentos absolutistas da época.

Pensando da mesma maneira, querendo conceder ao povo o direito de exercer soberania, Montesquieu (1748, p. 18) crê em um Estado Republicano onde o povo exerce a total soberania através de uma democracia,

Compreende-se então que o Estado deve ser soberano, garantidor da paz, bem como deve ter em seu representante, um representante do povo, que está ali para defender seus interesses e solucionar suas demandas.

Com essa premissa, pode-se iniciar então a discussão de como o Estado irá solucionar as demandas de criar normas para que a sociedade cumpra, normas que devem se relacionar com o bem estar social e a paz, deve também ter o poder de julgar aqueles que desrespeitarem tais normas, estabelecendo punições caso necessário, bem como deve gerir tais normas, assim sendo, deve cuidar de sua organização, existindo então uma necessidade de dividir essas atribuições entre setores do Estado. Chega-se assim ao conceito da separação de poderes, que passa-se a trabalhar à seguir.

2.2 – Separações De Poderes

A separação de poderes é um dos pressupostos fundamentais no qual se consolidou o Estado Republicano atual, este conceito fora pensado desde a Grécia Clássica, onde Aristóteles já ensaiava a necessidade de uma separação das atividades do Estado entre setores da sociedade.

A origem deste conceito, em modelo tripartite, onde três grandes poderes são os responsáveis pelo funcionamento e pela soberania do Estado, surgiu na obra de Aristóteles “A Política”, onde divaga e expõe de maneira inovadora sobre a existência de tais poderes:

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17 “Em todo governo, existem três poderes essenciais, cada um dos quais o legislador prudente deve acomodar da maneira mais conveniente. Quando estas três partes estão bem acomodadas, necessariamente o governo vai bem, e é das diferenças entre estas partes que provêm as suas. O primeiro destes três poderes é o que delibera sobre os negócios do Estado. O segundo compreende todas as magistraturas ou poderes constituídos, isto é, aqueles de que o Estado precisa para agir, suas atribuições e a maneia de satisfazê-las. O terceiro abrange os cargos de jurisdição.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 87)

Aristóteles traz então a necessidade de tais poderes estarem bem acomodados, ou seja, harmônicos entre si, para que o governo progrida em seus objetivos. É possível identificar que o pensador define como as três principais atribuições do estado a função de legislar, de administrar e de julgar.

Ainda na obra de Aristóteles, os conceitos e as funções de cada poder são explanadas de maneira separada. Começando pelo Poder Legislativo, que na obra ainda era chamado de Deliberativo, Aristóteles afirma que a Assembleia decide se haverá paz ou guerra, deverá fazer leis e suprimi-las, decretar pena de morte, de banimento e de confisco, e também prestar contas aos magistrados. (ARISTOTELES, 2009, p. 88)

É possível encontrar na referida obra a aproximação do Poder Legislativo ao povo, onde Aristóteles afirma que todo cidadão que quiser participar das Assembleias Gerais, vindo da tribo que for, poderá participar para realizar a criação de leis:

“[...] quem delibera é a Assembléia dos magistrados, mas todos chegam por seu turno a magistraturas, venham da tribo que vierem e tenham a condição que tiverem, sem excetuar os últimos, até que todos as tenham ocupado. A Assembléia geral do povo só ocorre quando da feitura das leis, para retocar a Constituição ou para ouvir as proclamações dos magistrados.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 88)

Magistrados, para Aristóteles, são aqueles designados para função previamente estabelecida, sendo responsáveis pelas atribuições dos cargos que ocupam.

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Diferente do poder Legislativo, Aristóteles trata do Poder Executivo como um cargo que deve ser conferido a alguém, e este, teria a responsabilidade de administrar os negócios:

“O primeiro cuidado do governo é fazer com que se encontrem nos mercados os víveres necessários. Para tanto, deve haver um magistrado que cuide de que tudo seja feito de boa fé e que a decência seja observada.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 91)

Na mesma linha, Aristóteles também explana sobre a administração das coisas públicas das cidades:

“O outro cuidado que deriva do precedente, ou que o segue de bem perto, é a administração dos edifícios públicos e privados, a fim de submetê-los a formas convenientes; das casas em ruínas, ruas em mau estado, para consertá-las e reconstruí-Ias; dos limites que separam as propriedades, a fim de que cada um goze tranqüilamente do que lhe pertence, assim como dos outros objetos do mesmo gênero. Chama-se este ofício polícia urbana; ele abarca um grande número de partes que nas grandes cidades é preciso confiar a funcionários diferentes, tais como o inspetor de construções, o reparador de fontes e o intendente dos portos.” (2009, p. 91)

Já no poder Judiciário, este também teria seu cargo conferido pelo povo, por meio de eleições ou sorteio, cabendo ao representante julgar a apresentação das contas dos demais poderes, as malversações financeiras, os crimes de Estado ou atentados à Constituição, multas para pessoas públicas ou privadas, contratos, os crimes de homicídio e os negócios do estrangeiro, bem como seriam criados os cargos de juízes para os casos mínimos, para julgar casos que não seriam necessários a remessa aos grandes tribunais. (Aristóteles, 2009, p. 98)

Posteriormente, nas supramencionadas revoluções burguesas, o assunto fora discutido como sendo uma das principais demandas a serem resolvidas, visto que o Estado estava na mão de um único soberano que se atribuía de todas as funções que o governo deve exercer, sendo assim, os pensadores da época trataram do assunto da separação de poderes com mais afinco e mais relevância, trazendo tal princípio como fundamental para o bom funcionamento de um governo Republicano.

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John Locke, em sua obra “Segundo Tratado sobre o Governo Civil”, divide as funções do Estado entre os poderes Legislativo, Executivo e Federativo, estes dois últimos sendo subordinados ao primeiro:

“Em uma sociedade política organizada, que se apresenta como um conjunto independente e que age segundo sua própria natureza, ou seja, que age para a preservação da comunidade, só pode existir um poder supremo, que é o legislativo, ao qual todos os outros estão e devem estar subordinados; não obstante, como o legislativo é apenas um poder fiduciário e se limita a certos fins determinados, permanece ainda no povo um poder supremo para destituir ou alterar o legislativo quando considerar o ato legislativo contrário à confiança que nele depositou; pois todo poder confiado como um instrumento para se atingir um fim é limitado a esse fim, e sempre que esse fim for manifestamente negligenciado ou contrariado, isto implica necessariamente na retirada da confiança, voltando assim o poder para as mãos daqueles que o confiaram, que podem depositá-lo de novo onde considerarem melhor para sua proteção e segurança.”(LOCKE, 1994, p. 76)

É possível notar que John Locke confere ao Poder Legislativos sua maior investidura, e o poder supremo com maior importância e relevância, justamente por associar este poder ao povo, este retratado como soberano, dando à população a possibilidade de destitui-lo e escolher novamente os representantes que irão tomar as frentes das legislaturas do Estado.

John Locke (1994, p. 77) afirma que a participação do povo na escolha dos representantes do legislativo é expressamente fundamental, sendo o executivo apenas um auxiliar para ajudar nas eleições, dando suas diretrizes, bem como requisitando que o Legislativo se reúna para legislar em intervalos determinados.

Somadas às contribuições de Aristóteles e John Locke, chega-se à obra que é considerada pela doutrina como clássica ao se falar do princípio da separação de poderes, que são os ensinamentos de Montesquieu na obra “O Espírito das Leis”.

Em seu livro, O Espírito das Leis, Montesquieu chega ao conceito dos três poderes que é aplicado até hoje, Legislativo, Executivo e Judiciário, pela ideia de que não é possível que um só representante ou um só poder consiga se atribuir das demandas que um Estado Republicano exige:

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20 “Estaria tudo perdido se um mesmo homem, ou um mesmo corpo de principais ou nobres, ou do Povo, exercesse esses três poderes: o de fazer as leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar as os crimes ou as demandas dos particulares”. (MONTESQUIEU, 2000, p. 165)

Na obra de Bobbio (1997, p. 132), “A teoria das formas de governo”, explica-se sobre a importância da estrutura de um governo, inclusive, para caracterizar a sua própria natureza. Bobbio, parafraseando Montesquieu, chega a concluir que a natureza de um governo deriva de sua própria estrutura, de quem governa e de como governa.

Bobbio (1997, 136) ainda explana sobre a importância da existência de três poderes independentes que se atribuam das demandas do Estado, de maneira que o jogo equilibrado entre esses poderes garante que o poder supremo não fique nas mãos de uma pessoa só, evitando assim o abuso de poder.

Montesquieu também afirma em seu livro que é da natureza do ser humano ir até o limite de seu poder para usufruir do máximo de suas virtudes:

“Mas é uma experiência eterna que todo homem que tem poder é levado a abusar dele. Vai até onde encontrar os limites. Quem diria! A própria virtude precisa de limites. Para que não possam abusar do poder, precisa que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder. Uma constituição pode ser tal que ninguém seja forçado a fazer as coisas que a lei não obrigue, e a não fazer as coisas que a lei permita”. (MONTESQUIEU, 2000, p. 163).

Para Montesquieu o homem era visto com certa desconfiança quando associado à política, por isso seria necessário que criasse modelos institucionais que freassem suas ambições com o poder.

Percebe-se então que Montesquieu coloca os poderes separados justamente para que um poder freie o outro, já que em caso contrário, o homem se deixaria levar pelas virtudes do poder e não conseguiria colocar limites às suas vontades pessoais. Porém, com três poderes independentes entre si, cada um possui o dever de fiscalizar o próximo, e com os poderes repartidos, o homem não terá a sensação de que detém o poder unificado:

“Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de Magistratura, o Poder Legislativo é reunido ao Executivo, não há liberdade. Porque pode temer-se

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21 que o mesmo Monarca ou mesmo o Senado faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não haverá liberdade se o Poder de Julgar não estiver separado do Legislativo e do Executivo. Se estivesse junto com o Legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário: pois o Juiz seria o Legislador. Se estivesse junto com o Executivo, o Juiz poderia ter a força de um opressor. (MONTESQUIEU, 2000, p.167-168.)

John Locke (1994, p. 75), além de conceituar os poderes da mesma maneira que Aristóteles, explanou sobre a importância de manter os poderes Legislativo e Executivo separados, afirmando que aquele que for investido pelo poder de crias as leis, devera fazê-lo, porém não deverá manter seu cargo em vigor, já que não havia trabalho suficiente para um mandato definitivo. Em seguida, afirmou que em nome da fragilidade humana pelo poder, não se poderá admitir que quem crie as leis, as execute em seguida, pois poderiam adequa-las à sua vontade, bem como tentar fugir de seus cumprimentos.

Mesmo não atribuindo a função de julgar a um poder específico, Locke não deixou de tratar sobre o assunto quando atribui tal demanda ao poder Legislativo e Executivo, ou seja, ainda não chegou ao modelo tripartite conhecido nos dias de hoje, porém não se esqueceu das funções necessárias e inerentes a um Estado Republicano:

“E por essa maneira a comunidade consegue, por meio de um poder julgador, estabelecer que castigo cabe às várias transgressões quando cometidas entre os membros dessa sociedade – que é o poder de fazer leis –, bem como possui o poder de castigar qualquer dano praticado contra qualquer dos membros por alguém que não pertence a ela – que é o poder de guerra e de paz –, e tudo isso para preservação da propriedade de todos os membros dessa sociedade, tanto quanto possível. [...] E aqui deparamos com a origem dos poderes legislativo e executivo da sociedade, que deve julgar por meio de leis estabelecidas até que ponto se devem castigar as ofensas quando cometidas dentro dos limites da comunidade, bem como determinar, mediante julgamentos ocasionais baseados nas circunstâncias atuais do fato, até onde as agressões externas devem ser retaliadas; e em um outro caso utilizar toda a força de todos os membros, quando houver necessidade.[...]” (LOCKE, 1994, p.117-241)

Percebe-se que John Locke traz o conceito de poder Legislativo e Executivo como sendo os responsáveis de criar e executar as leis, feitas de maneiras separadas e independentes, porém, confere à estes também o poder de

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julgar as normas já criadas, não existindo ainda a concecpção de um poder apenas para julgamento, mas identifica tal demanda e a atribui aos poderes referidos.

Montesquieu, por seu turno, em busca de um conceito acerca dos poderes e de sua forma de atuação, classificando-os da seguinte forma:

“Com o primeiro, o príncipe ou o magistrado cria leis por um tempo ou para sempre e corrige ou anula aquelas que foram feitas. Com o segundo, ele faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, instaura a segurança, previne invasões. Com o terceiro, ele castiga os crimes, ou julga as querelas entre os particulares. Chamaremos a este último poder de julgar e ao outro simplesmente poder executivo do Estado” (MONTESQUIEU, 2000, p. 167 – 168)

Mesmo tendo criado tais poderes, Montesquieu (2000, p. 173) ainda não os colocava de maneira igualitária perante o outro, pois atribuía ao poder Judiciário importância menor do que aos outros dois poderes, considerando inclusive o poder Judiciário como “nulo”. Por acreditar na importância dos poderes Executivo e Legislativo, acreditava na necessidade de um poder regulador para freá-los, porém este contrapeso não existe para o Poder Judiciário desde então.

Chega-se então, ao modelo de separação de poderes tripartite que é ainda é usado, definindo o Poder Legislativo como aquele que cria as leis, o Poder Executivo que executa as leis e organiza a forma de atuação do Estado, e o Poder Judiciário que julga os crimes e os dissídios particulares.

Considerando tal princípio como indispensável para o bom funcionamento do Estado, este conceito serve de base para a aplicação dos modelos de organizações de governos jurídicos, inclusive o modelo brasileiro de República Federativa, que passa a se discorrer no próximo item.

2.3 – Separações De Poderes No Estado Brasileiro

O estado nacional brasileiro, regido pela constituição federal de 1988, se assenta em princípios essenciais para a seguridade e livre atuação das instituições, entre eles, está justamente o princípio da separação de poderes.

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Na doutrina esta nomenclatura não é unânime, uma vez que, em sua obra de Direito Constitucional, Barruffini classifica como certo o uso de tripartição de funções, e não de Poderes, pois acredita que o Poder emana da União, e é um só, esta que dividiria suas funções em Legislativa, Executiva e Judiciária:

“Constitui erronia falar em tripartição de poderes estatais, uma vez que eles são fruto de um mesmo poder. O poder é um só, quaisquer que sejam as manifestações de vontade emanadas em nome do Estado. “(BARRUFFINI, 2008, p. 39)

Apesar do posicionamento divergente, adotar-se-á no presente trabalho a nomenclatura da expressão “poderes”, uma vez que este é empregado não só majoritariamente pela doutrina, mas pela própria Constituição Federal de 1988, já em seu segundo artigo afirma:

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. (BRASIL, 1988)

Este princípio se tornou clausula pétrea no Brasil na Constituição de 1988. A separação dos poderes é um assunto levado tão a sério, considerado tão importante para a funcionalidade do Estado, que fora colocado da seguinte maneira em nossa carta magna:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

III - a separação dos Poderes; (BRASIL, 1988)

No Brasil, o poder Legislativo é atribuído à União através de seu Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, como dispõe o artigo 44 da Constituição Federal:

Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. (BRASIL, 1988)

O regime a qual o legislativo brasileiro é submetido, traz um conceito bicameral, onde a Câmara dos Deputados é responsável por se atribuir da competência de projetos que sejam ligados as demandas que são discutidas na

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sociedade, assim como o Senado Federal é responsável pelos projetos que envolvem os interesses econômicos e jurídicos dos Estados Membros frente à União, como preceituam os artigos 45 e 46 da mesma carta magna:

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário. (BRASIL, 1988)

Esse modelo de representação também fora previsto por Montesquieu, este que acreditava que os interesses da elite não devem se confundir com os interesses do povo, sendo assim, é necessário que o Poder Legislativo de a devida atenção para as respectivas demandas que tais agrupamentos da sociedade exigem:

“Existem sempre num Estado pessoas eminentes pelo nascimento, pelas riquezas ou pelas honras. Se elas ficassem confundidas entre o Povo, e não tivessem senão um voto como os outros, a liberdade comum seria a sua escravidão, e elas não teriam interesse em defender a liberdade, porquanto a maioria seria contra elas. A participação dessas pessoas na Legislação deve pois estar proporcionada às demais vantagens que têm no Estado. Ora, isto se dará se elas formarem um corpo com direito de frear as iniciativas do Povo, assim como o Povo terá o direito de frear as delas.” (MONTESQUIEU, 2000, p. 173)

José Afonso da Silva acredita que o sistema de freios e contrapesos é essencial para que se evite o arbítrio dos poderes, porém, para que tal prática se efetive, é necessário admitir que os poderes deverão ser mais harmônicos do que independentes, ou seja, deverá ter uma certa interferência para conseguir manter o controle institucional:

“A ampliação das atividades do Estado contemporâneo impôs nova visão da teoria da separação de poderes e novas formas de relacionamento entre os órgãos legislativo e executivo e destes com o judiciário, tanto que atualmente se prefere falar em 'colaboração de poderes' [...]. A 'harmonia entre os poderes' verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de

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25 um em detrimento do outro e especialmente dos governados’’ (SILVA, 2009, p. 110)

O artigo 48 da Constituição Federal enumera todas as atribuições do Congresso Nacional, ou seja, o poder máximo Legislativo no Brasil, através de dezessete incisos elencados para taxar e clarear aos representantes do Congresso sobre suas obrigações. (BRASIL, 1988)

Na obra de Michel Temer (2010, p. 133) acerca de direito constitucional, este afirma que além do poder de legislar que é atribuído ao Poder Legislativo, conforme o artigo 59 da Constituição Federal, o mesmo poder também possui caráter fiscalizatório, concedendo à ambas funções o mesmo grau de importância.

A independência dos poderes deve ser encarada como a não delegação de funções de um poder a outro, uma vez que se feito dessa maneira irá revogar norma constitucional que conferiu ao poder correspondente a sua atribuição, como ensina Roman em sua obra acerca de exigências de legalidade:

“O que talvez falte esclarecer é que a proibição da delegação de funções não inviabiliza, por completo, a atividade normativa da Administração Pública. Não obstante, as considerações antes referidas quanto à proibição de delegação de poderes, não se deve crer que a proibição implique a completa vedação de qualquer atividade normativa da Administração Pública. Tal conclusão, ademais, afrontaria a própria letra da Constituição que estipula a competência privativa do Presidente da República para expedir regulamentos para a fiel execução das leis. A vedação da delegação, contudo, é capaz de restringir as normas da Administração apenas ao que for necessário à execução das leis editadas pelo Parlamento.”( ROMAN, 2007 p. 35.)

Com tais estudos explanados, é possível identificar que a separação de poderes é um princípio que rege o bom funcionamento de um Estado sobre suas atribuições e demandas. Devendo elas serem independentes e harmônicas entre si para que se estabeleça um sistema de freios e contrapesos que irá garantir a não sobreposição de um poder a outro.

Este sistema de freios e contrapesos, porém, possibilita que um poder de pareceres ou de fato regule uma atividade de outro poder, o que em certos

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momentos pode ser encarado como um abuso ou um conflito em nome da legalidade e do bem estar social.

É justamente esse conflito que é causado pela forte regulamentação do Poder Judiciário, através do fenômeno denominado ativismo judicial, que será estudado no próximo capítulo.

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3. ATIVISMO JUDICIAL

Analisando a atuação do Poder Judiciário brasileiro, desde a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 até os dias atuais, pode-se notar que a prepode-sença dos controles jurisdicionais em decisões nos tribunais aumentou de maneira gradativa desde então, tornando-se matéria de discussão da doutrina brasileira desde que fora criado seu conceito e aplicado nos tribunais brasileiros.

O fenômeno chamado de ativismo judicial é derivado de um comportamento próprio do Poder Judiciário, que interpreta a lei de maneira expansiva, o que nesse caso acaba extrapolando suas funções e muitas vezes se atribuindo de demandas dos demais poderes da República. (BARROSO, 2009, p. 21)

O conceito de ativismo é pacificado entre as doutrinas, a discussão que se faz em torno deste fenômeno gira em torno dos limites de atuação do Poder Judiciário, e se mesmo extrapolado tais limites, chega ser prejudicial para o bem estar social e para a saúde da democracia.

Antes de aprofundar a discussão acerca do ativismo judicial e seu conceito, é necessário explanar acerca da diferença do referido fenômeno e da judicialização da política, estes que possuem natureza intervencionista, porém, não se confundem pela motivação de sua atuação.

3.1 – A Distinção de Ativismo Judicial e Judicialização da Política

O ativismo pode ser facilmente confundido com a judicialização da política pela maneira com que atua em relação aos outro poderes, entretanto, pode-se dizer que a comparação se restringe apenas a maneira de atuação, pois o ativismo e a judicialização possuem origens diferentes. (BARROSO, 2009, p. 22)

Ao contrário da judicialização, o ativismo judicial não está previsto na constituição federal ou em alguma ação que pode ser proposta por representantes da população, mas pode-se dizer que é uma conduta única e exclusiva do julgador, que atuando de maneira expansiva, decide julgar tal matéria de acordo com suas convicções do que acredita que seria justo e benéfico para a sociedade. Pode-se observar tal argumentação na doutrina de Luís Roberto Barroso, onde encontra-se importante esclarecimento acerca das diferenças entre o ativismo judicial e a judicialização da política:

A judicialização e o ativismo judicial são primos. Vêm, portanto, da mesma família, frequentam os mesmos lugares, mas não têm as mesmas origens.

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28 Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas. A judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. Em todos os casos referidos acima, o Judiciário decidiu porque era o que lhe cabia fazer, sem alternativa. Se uma norma constitucional permite que dela se deduza uma pretensão, subjetiva ou objetiva, ao juiz cabe dela conhecer, decidindo a matéria. Já o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva. (BARROSO, 2009, p. 22)

Encontra-se na obra de Barroso o termo “judicialização”, que deve ser encarado como um fenômeno atual que tende a crescer cada vez mais, que é a necessidade da sociedade de resolver seus anseios e dissídios através de ações judiciais.

Na obra de Débora Alves Maciel e Andrei Koerner, é possível encontrar a origem do termo “judicialização”, vejamos:

Os juristas usam o termo judicialização para se referirem à obrigação legal de que um determinado tema seja apreciado judicialmente. Próximo a esse sentido, mas já com caráter normativo, afirma-se que judicialização é o ingresso em juízo de determinada causa, que indicaria certa preferência do autor por esse tipo de via. Refere-se a decisões particulares de tribunais, cujo conteúdo o analista consideraria político, ou referente a decisões privadas dos cidadãos (como questões de família). Decisões judiciais particulares poderiam ser sujeitas a escrutínio e seu conteúdo poderia ser avaliado como “grau de judicialização”. A expressão é usada neste sentido mesmo para decisões que não são propriamente judiciais como no caso da verticalização das coligações políticas decidida pelo TSE. Ou refere-se à situação excepcional de maior número de conflitos políticos no Judiciário, própria aos períodos de eleições (MACIEL, KOERNER, 2002, p.3).

Identifica-se que o fenômeno da judicialização não decorre de uma atuação arbitrária do Poder Judiciário, mas sim, de uma atuação que já é prevista no texto constitucional, e não resta outra alternativa ao juiz que não seja o de se posicionar a respeito da matéria levada ao Poder Judiciário. A Constituição Federal prevê tal atuação através das ações diretas de constitucionalidade e de inconstitucionalidade.

Entre as discussões mais acaloradas a respeito da nova Constituição, se incluía as reformas que foram feitas no Judiciário brasileiro, acreditando-se que a nova carta estaria dando à referida instituição um controle de constitucionalidade muito mais amplo e de fácil acesso sobre o Poder Legislativo através das ações diretas de inconstitucionalidade, e das ações diretas de inconstitucionalidade por omissão (BARROSO, 2009, p. 20).

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A ação direta de inconstitucionalidade tem um caráter de regular as políticas adotadas pelo poder Legislativo de acordo com as leis propostas por tal poder, tendo legitimidade para propor tal açãopresidente da República, o procurador geral da república, os governadores dos estados e o governador do distrito federal, as mesas da câmara dos deputados, do senado federal, da câmara legislativa do distrito federal, a mesa de assembleia legislativa, partidos políticos com representação no congresso nacional, conselho federal da ordem dos advogados do Brasil (OAB), entidades de classe de âmbito nacional e confederações sindicais, encontrada devida previsão legal no artigo 103 da CRFB/88. (BRASIL, 1988)

Porém, o motivo real que causou certa estranheza no novo texto da Constituição foi a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, que seria o Poder Judiciário interferindo no Poder Legislativo pedindo para que esse legislasse a respeito de tal assunto, contrariando o entendimento da doutrina clássica. (BARROSO, 2009, p. 27)

Começa-se a configurar então novos conceitos de judicialização da política, estes que dão margem ao poder Judiciário para que em nome da lei e da razoabilidade, interfira de maneira direta no poder Legislativo, sendo para não autorizar criação de novas leis, ou para exigir que este tome posição em relação à matéria ainda não legislada.

Isso só acontece por que a Constituição assim quis, não se torna possível por uma vontade ou um comportamento pessoal do julgador, mas o texto constitucional ao prever tais ferramentas permitem que o judiciário seja provocado para manifestar-se sobre a matéria e não lhe deixe outra escolha senão a da interferência nas atividades do Legislativo (BARROSO, 2009, p. 30).

Explanadas as ponderações sobre a judicialização da política, onde o ente julgador não expressa uma vontade própria de realizar o julgamento interferindo em outro poder, mas sim a constituição que lhe obriga a agir de tal maneira quando provocado por uma ação de controle de constitucionalidade, a discussão migra para um outro tema também muito debatido nas doutrinas brasileiras, o do ativismo judicial, que será aprofundado no próximo ítem.

3.2 – Origem E Desenvolvimento Do Ativismo Judicial

O ativismo judicial tem sua origem histórica em um período muito recente, uma vez que tal fenômeno começou a ser citado nas doutrinas do século XX em diante, tendo sua origem nas cortes norte-americanas e então servindo de exemplo para as demais cortes jurídicas ao redor do mundo.

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Sua primeira menção fora abordada na obra de Luiz Flávio Gomes:

O ativismo judicial foi mencionado pela primeira vez em 1947, pelo jornalista norte-americano Arthur Schlesinger, numa interessante reportagem sobre a Suprema Corte dos Estados Unidos. Para o jornalista, caracteriza-se ativismo judicial quando o juiz se considera no dever de interpretar a Constituição no sentido de garantir direitos que ela já prevê, como, por exemplo, direitos sociais ou econômicos. (GOMES, 2009, p. 2)

Tal reportagem criada por Arthur Schlesinger tinha a missão de descrever os julgamentos da corte norte-americana bem como também descrever o perfil de seus juízes, sendo que à época da reportagem os Estados Unidos viviam um período de fragilidade na politica no mandato de Franklin Rossevelt, ao tentar implantar o ousado plano conhecido como New Deal, este que não era bem visto pela então corte de juízes norte-americanos.

Nota-se então que as praticas ativistas nasceram, ou pelo menos foram diagnosticadas, em um período de instabilidade política, momento este que se voltaram as atenções para os juízes com um fundo de esperança para trazer estabilidade democrática, estes que então atuaram de maneira diferente da acostumada.

O professor Luís Roberto Barroso também deu como origem histórica para o ativismo judicial as cortes norte-americanas:

Ativismo judicial é uma expressão cunhada nos Estados Unidos e que foi empregada, sobretudo, como rótulo para qualificara atuação da Suprema Corte durante os anos em que foi presidida por Earl Warren, entre 1954 e 1969. Ao longo desse período, ocorreu uma revolução profunda e silenciosa em relação a inúmeras práticas políticas nos Estados Unidos, conduzida por uma jurisprudência progressista em matéria de direitos fundamentais (...)Todavia, depurada dessa crítica ideológica – até porque pode ser progressista ou conservadora – a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. (BARROSO, 2009, p. 7)

A discussão a despeito do ativismo judicial e da judicialização da política já acontece no Brasil. Na brilhante lição de Manoel Gonçalves de Ferreira Filho pode-se observar que em 1994 o tema já possuía grande repercussão nas doutrinas jurídicas brasileiras:

Seguramente em nenhum momento anterior da história brasileira esteve o Poder Judiciário focado pelas luzes da ribalta como nestes últimos anos, e particularmente nos dois derradeiros - 1993-1994. Isto não ocorreu por motivos circunstanciais, pela mera coincidência de questões políticas que, em razão de seus aspectos constitucionais, chegaram tumultuosamente aos tribunais, sobretudo ao Supremo Tribunal Federal. Reflete, na verdade, um

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31 fenômeno que é mundial, agravado entre nós pela Carta de 1988 - a judicialização da política que tende a trazer a politização da justiça (FERREIRA FILHO, 1994, p. 01).

O fenômeno da judicialização da vida, que da poder a qualquer pessoa física ou jurídica de judicializar uma demanda que lhe acha conveniente, desde matérias torpes e banais, como matérias que podem ditar como o poder executivo irá atuar diante de determinada circunstância, atua como uma das principais causas das atuações ativistas. A Constituição Federal de 1988 chamada de Constituição cidadã, foi a primeira carta constitucional brasileira a implementar o modelo do estado de bem estar social, trazendo uma série de novos direitos até então nunca presentes com esse grau de relevância. Luís Roberto Barroso compreende tal fenômeno como decorrente da nova constituição garantista:

A constitucionalização abrangente, que trouxe para a Constituição inúmeras matérias que antes eram deixadas para o processo político majoritário e para a legislação ordinária. Essa foi, igualmente, uma tendência mundial, iniciada com as Constituições de Portugal (1976) e Espanha (1978), que foi potencializada entre nós com a Constituição de 1988. A Carta brasileira é analítica, ambiciosa, desconfiada do legislador. Como intuitivo, constitucionalizar uma matéria significa transformar Política em Direito. Na medida em que uma questão – seja um direito individual, uma prestação estatal ou um fim público – é disciplinada em uma norma constitucional, ela se transforma, potencialmente, em uma pretensão jurídica, que pode ser formulada sob a forma de ação judicial. (BARROSO, 2009, p. 4)

Pode-se constatar então que a constituição da abrangência suficiente para que seja judicializada inúmeras matérias que deveriam ser resolvidas pelo poder político.

O ativismo também pode ser visto de maneira a agilizar as demandas do judiciário, trazendo fácil acesso da Justiça à população e resolvendo conflitos que não possuem os olhares do poder Legislativo, como explana a lição de José Rodrigo Rodriguez:

O debate sobre a reforma do Poder Judiciário no Brasil, por exemplo, tem se concentrado principalmente nas questões da celeridade da prestação jurisdicional e na garantia de acesso à justiça à população brasileira. De acordo com essa agenda, é preciso modernizar nossos códigos de processo, aumentar o número de juízes e melhorar a gestão interna do Poder Judiciário para garantir sentenças mais rápidas. Além disso, o país, segundo o raciocínio dominante, precisaria ampliar a oferta de mecanismos de solução de conflitos (juizados especiais, mediação, conciliação) e o acesso a advogados e defensores públicos para permitir que os mais pobres utilizem o Judiciário para resolver seus problemas. (RODRIGUEZ, 2013, p.174)”.

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Uma das maneiras de identificar uma conduta ativista é analisar as atuações do julgador fora dos tribunais, pois a partir do momento que sinaliza uma opinião sobre determinado assunto, acredita-se que o julgador está atuando também de maneira expansiva, não limitando-se apenas aos autos do processo como presume-se sua atuação, como mostra a seguinte doutrina:

Outro conceito igualmente importante para a compreensão do protagonismo institucional do STF na atualidade é o de ativismo judicial. Assim como o fenômeno da judicialização, o ativismo judicial é igualmente complexo por conter uma pluralidade de dimensões. O ativismo judicial pode ser praticado tanto no exercício da prestação jurisdicional (por meio dos autos do processo) quanto de forma extra-jurisdicional pelos magistrados como, por exemplo, em entrevistas, discursos de posse e pronunciamentos exteriores aos processos. (VIEIRA; CAMARGO; SILVAO p. 4)

Desta maneira, pode-se então concluir que a conduta ativista dar-se-á por atuações jurídicas em decisões em que não há previsão legal para tal demanda, desta maneira o Judiciário teria em suas mãos o poder de agir sem que haja previsão legal que o ampare, bem como também se configura em pronunciamentos independentes dos magistrados fora dos autos.

3.3 – Posicionamentos Na Doutrina Sobre O Ativismo Judicial

Na doutrina de Manoel Gonçalves de Ferreira Filho, encontra-se reflexão acerca da ação direta de inconstitucionalidade por omissão:

[...]o art. 103, § 2º da Constituição dá ao Supremo Tribunal Federal o poder de declarar "a inconstitucionalidade por omissão de medida para tomar efetiva norma constitucional". A consequência lógica disto seria dar ao Tribunal o poder de regular a matéria a respeito da qual o Congresso Nacional se omitiu. Entretanto, embora houvesse na Constituinte quem o desejasse, o texto adotado não foi tão longe - apenas determinou que, reconhecida a omissão, será dada ciência ao Congresso Nacional. De qualquer modo, esta "ciência" importa numa censura, ainda que com as famosas luvas de pelica, ao Congresso” (1994, p. 10).

Contrariando o pensamento de Manoel Gonçalves de Ferreira Filho acerca dos malefícios da judicialização da política, é possível encontrar argumentação que sustente seus benefícios como algo necessário a moldar a regulação jurídica, como na ilustre obra de José Rodrigo Rodriguez:

Uma concepção tradicional do direito como a que sustenta as ideias de ―judicialização da política e de ―ativismo judicial veda o acesso a esses processos simultâneos de tradução e de exclusão próprios da juridificação. Mais que isso, essa concepção congela o direito e seu código de tal maneira que a própria possibilidade de pensar a regulação jurídica de conflitos sob novas formas sociais, legais e institucionais desaparece do horizonte dos atores. Um entendimento não tradicional do direito e de seu papel social permite recolocar o problema de fundo presente nas ideias

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33 gêmeas de ―judicialização da política‖ e de ―ativismo judicial em termos mais frutíferos” (RODRIGUEZ, 2013, p. 179).

Analisando os conceitos de ativismo judicial e as discussões abordadas sobre o tema, paira uma discussão sobre qual seria o limite do poder judiciário, a que ele se limita e qual sua função. Lenio Luiz Streck, Vicente de Paulo Barretto e Rafael Tomaz de Oliveira refletiram sobre qual seria os limites do Judiciário:

Afinal, qual é o limite da jursdição constitucional? Se nem uma mínima entificação (semanticidade) funciona como limite, o que impede de o STF alterar “qualquer preceito constitucional”? Em outras palavras, a (in)segurança jurídica mostra-se ofendida, não por deixar sem regulamentação legal a convivência entre pessoas do mesmo sexo, mas, sim, no momento em que a Corte altera, a pretexto de um “esquecimento do constituinte” (sic) ou de uma “descoberta valorativa” (sic), ou, ainda, do saneamento (incorreto) de uma “inconstitucionalidade da própria Constituição” (sic), o texto da Constituição como se Poder constituinte fosse, gerando um tipo de mal-estar institucional gravíssimo” (STRECK; BARRETTO; OLIVEIRA; p.9).

Em artigo do destacado juiz Sergio Moro (MORO, 2001,p .104), encontra-se entendimento favorável a atuação do juiz como legislador, uma vez que o Juiz Federal entende que a vedação à atuação judicial sendo interpretada como legislativa, não possui base que se sustente, pois tal atuação decorre da Constituição Federal, ou seja, a jurisprudência que entenda de maneira diversa confronta o princípio da Supremacia da Constituição bem como o princípio que garante sua efetividade. Tal fato representaria a abdicação indevida do Poder Judiciário de suas atribuições necessárias, entre elas, a de controle da Constituição Federal.

Seguindo o mesmo raciocínio, Sérgio Moro (2004, p.238) afirma que a constituição prevê políticas públicas que não seriam alcançadas sem a atuação ativista do poder Judiciário:

Como as constituições não mais apenas garantem direitos já assegurados, mas também realizam promessas constitucionais de direitos – como a universalização da saúde e da educação, cuja implementação demanda atuação do poder publico -, resta evidente que a eficácia da jurisdição constitucional será comprometida caso seja atribuído ao juiz função meramente negativa (2004, p.238)

Nas pesquisas realizadas, fora encontrado posicionamentos favoráveis aos controles jurisdicionais, posicionamentos absolutamente contrários aos controles, como também fora encontrada na lição de Mauro Cappelletti posições meridianas, vejamos:

“Quando se afirma, como fizemos, que não existe clara oposição entre interpretação e criação do direito, torna-se contudo necessário fazer uma

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34 distinção, como dissemos acima, para evitar sérios equívocos. De fato, o reconhecimento de que é instrínseco em todo ato de interpretação certo grau de criatividade – ou, o que vem a dar no mesmo, de um elemento de discricionariedade e assim de escolha –, não deve ser confundido com a afirmação de total liberdade do intérprete. Discricionariedade não quer dizer necessariamente arbitrariedade, e o juiz, embora inevitavelmente criador do direito, não é necessariamente um criador completamente livre de vínculos. Na verdade, todo sistema jurídico civilizado procurou estabelecer e aplicar certos limites à liberdade judicial, tanto processuais quanto substanciais.” (CAPPELLETTI, 1993, pp. 23-24).

Explanadas tais posições acerca das atuações ativistas, resta o questionamento se de fato o ativismo judicial e a judicialização da política causariam um certo desconforto na relação com o poder legislativo, bem como se tal conduta pode ser tida como benéfica para a sociedade.

Sendo assim, como o legislativo não produz o consenso e não da a devida atenção ao tema, este acaba ficando sem previsão legal, sem amparo legislativo, porém, a demanda no poder judiciário surge da mesma forma, tendo o julgador que decidir sobre temas que não lhe foi dada a devida previsão.

Em sua obra sobre o ativismo judicial, Lênio Streck entendeu que:

“No Estado Democrático de Direito, o foco de tensão se volta para o Judiciário. Inércias do Executivo e falta de atuação do Legislativo passam a poder ser supridas pelo Judiciário, justamente mediante a utilização dos mecanismos jurídicos previstos na Constituição que estabeleceu o Estado Democrático de Direito. A Constituição não está sendo cumprida. As normas-programa da Lei Maior não estão sendo implementadas. Por isso, na falta de políticas públicas cumpridoras dos ditames do Estado Democrático de Direito, surge o Judiciário como instrumento para o resgate dos direitos não realizados” (STRECK, 2007, p.54-55).

A grande realidade, é que o custo político de legislar sobre demandas de grande repercussão é muito alto, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo, interrupção de gravidez ou legalização de drogas, onde a política majoritária acaba não produzindo consenso ao discutir tais assuntos, ou às vezes nem leva tais demandas à discussão, pois teme que seu eleitorado não apoie tal decisão.

Assim aconteceu com o caso da união homoafetiva na ADPF 132/RJ e ADI 4277/DF, onde o STF teve de produzir julgamento sobre a interpretação do artigo 1723 do Código Civil, onde se estendeu a intepretação da referida lei, que agora iria incluir uma categoria de pessoas que até então não estavam sendo alcançadas pela interpretação do dispositivo infraconstitucional, sendo assim, o ministro relator do caso decidiu da seguinte maneira:

“ao art. 1.723 do Código Civil interpretação conforme à Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união

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35 contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, entendida esta como sinônimo perfeito de “família”. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável heteroafetiva.” (BRASIL, 2012)

O julgamento referido foi feito por meio de um controle de constitucionalidade, e o STF não declarou a lei inconstitucional, mas estabeleceu qual seria a interpretação correta para o referido caso, eliminando qualquer interpretação diferente que havia sido tomada anteriormente, como demonstra a lição de Gilvan Nogueira Carvalho sobre o assunto:

“a decisão na ADPF 132/RJ e ADI 4277/DF, o que se verificou foi que o Supremo Tribunal Federal utilizou-se de uma técnica de controle de constitucionalidade denominado interpretação conforme a constituição. No controle concentrado de constitucionalidade, o STF tanto pode declarar a inconstitucionalidade total da norma impugnada, expurgando a mesma do ordenamento jurídico, pode declarar a nulidade parcial sem redução de texto, como pode fixar a interpretação da norma conforme a vontade do texto constitucional. Nesse caso, o Supremo não declara a inconstitucionalidade da norma impugnada, mas elimina determinadas interpretações a ela conferidas, que, segundo o entendimento da Corte, estariam em desacordo com o comando constitucional.” (CARVALHO, 2012, p. 01)

Em obra que analisa o assunto supramencionado das uniões homoafetivas, Lenio Luiz Streck, Vicente de Paulo Barretto e Rafael Tomaz de Oliveira deram parecer afirmando que falta de respostas por parte do legislador, pode-se concluir como uma escolha política:

“De todo modo, há uma perigosa tendência no interior da comunidade jurídica de recorrer aos tribunais para sanar eventuais omissões do legislador, pugnando por um verdadeiro exercício de uma tardia jurisprudência dos valores pelo STF (ou pelos demais tribunais da República). Não se pode esquecer que, por vezes, o fato de o constituinte não tratar do assunto não possa significar “omissão”; pode ser, na verdade, uma escolha política” (STRECK, 2011, p. 06).

A afirmação do descrédito dos entes políticos para legislar sobre determinado assunto, também é afirmado na obra de Marco Aurélio Romagnoli Tavares:

“Dentro das relações de poder, intrínsecas ao Estado, surge a figura proeminente do Judiciário, hoje o poder em voga no Brasil, já que está em curso uma gradativa execução de uma forma de ativismo judicial, capitaneado pelo STF, ou seja, diante da clara impossibilidade da existência de vácuo de poder, decorrente diretamente de um legislativo inoperante, dominado por escândalos de corrupção, bem como de um executivo anabolizado, que busca dominar politicamente todas as esferas de poder. Surge a figura protagonista dos tribunais e de magistrados que aos poucos buscam limitar os excessos praticados pelas administrações, assim como

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36 suprir a ausência de definições legislativas que deveriam acompanhar os avanços econômicos, sociais e científicos” (TAVARES, 2010, p. 92)

Há de se falar que no referido caso o judiciário de fato acabou tomando a função que o legislativo havia de fazer, e se não o fizesse, o caso estaria com a demanda estabelecida, porém com a inércia da resposta, sem resolução alguma, já que não há uma resposta pré-pronta para cada demanda que é levada ao judiciário.

Assim, quando o judiciário toma uma decisão que não há resposta pronta, essa decisão torna-se uma decisão política, não no sentido pejorativo de tomar um lado ideológico, mas sim no sentido de criação. O juiz criou nova norma ou nova interpretação para tal decisão que não havia resposta, portanto, agiu como o legislador, político, deveria agir.

Corroborando com tal afirmação, surge a doutrina de Oscar Valente Cardoso, entendendo que:

“O ativismo judicial (ou judicialização da política) pode ser resumido na atitude dos juízes de interpretar as normas jurídicas sem se limitar às restrições formais e objetivas, e levando em conta que a aplicação das leis é variável, no tempo e em cada caso concreto. Isso pode causar a extensão de direitos não expressamente previstos em lei ou na Constituição, motivo pelo qual se afirma que essa postura judicial importa na “criação” de direitos, a partir de uma interpretação ampliativa de normas escritas, ou com fundamento em princípios jurídicos genéricos (igualdade, razoabilidade, dignidade da pessoa humana, etc.)” (CARDOSO, 2011).

Na obra de Luís Roberto Barroso, encontra-se inúmeros casos listados como exemplos para caracterizar a intensa participação do STF em matérias de grande repercussão que deveriam ser abordadas pelo legislativo ou executivo:

“Ao se lançar o olhar para trás, pode-se constatar que a tendência não é nova e é crescente. Nos últimos anos, o STF pronunciou-se ou iniciou a discussão em temas como: (i) Políticas governamentais, envolvendo a constitucionalidade de aspectos centrais da Reforma da Previdência (contribuição de inativos) e da Reforma do Judiciário (criação do Conselho Nacional de Justiça); (ii) Relações entre Poderes, com a determinação dos limites legítimos de atuação das Comissões Parlamentares de Inquérito (como quebras de sigilos e decretação de prisão) e do papel do Ministério Público na investigação criminal; (iii) Direitos fundamentais, incluindo limites à liberdade de expressão no caso de racismo (Caso Elwanger) e a possibilidade de progressão de regime para os condenados pela prática de crimes hediondos” (Barroso, 2009, pg. 5)

Somados aos casos supra exemplificados pelo ministro Barroso, também está o julgamento do STF da possibilidade ou não de haver nepotismo nas nomeações políticas para cargos da administração pública, onde foi editada a seguinte súmula vinculante de número 13:

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37 “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.” (BRASIL, 2005)

A decisão em questão fora proferida após uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros, onde não havia nenhuma previsão em lei para decidir sobre tal tema, porém, o STF decidiu por proibir tal prática, fundamentando-se no princípio da moralidade e do princípio da impessoalidade, ambos inscritos na constituição, ou seja, uma decisão expansiva e extensiva da constituição federal.

Desta maneira, fica o questionamento sobre qual legitimidade teria o poder judiciário para poder discutir sobre os supramencionados temas, e até anula-los, já que quem tem competência para isso são justamente aqueles que possuíram o batismo do voto popular, ou seja, o batismo das maiorias.

O ativismo judicial então ficou caracterizado como a conduta que certas vezes extrapola os limites de atuação do poder judiciário, porém, certas vezes pode ser vista como necessária e benéfica para atender aos anseios da sociedade, e certas vezes pode ser vista como maléfica, uma vez que não da legitimidade para a decisão tomada, pois esta não fora capitaneada por quem tem o batismo do voto, ou seja, o batismo popular.

Considerando tal fato, foram feitas duas entrevistas com um membro representante do Poder Judiciário, e um membro representante do poder Legislativo, no intuito de questiona-los sobre a atuação dos respectivos poderes e quais seriam suas opiniões sobre a atuação ativista perante o princípio da separação de poderes, na qual será visto no próximo capítulo.

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