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Estimativa da idade média ao nascimento do primeiro filho no contexto de declínio da fecundidade: os casos de Brasil e Bolívia *

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Estimativa da idade média ao nascimento do primeiro filho no contexto de

declínio da fecundidade: os casos de Brasil e Bolívia

*

Gabriela M. O. Bonifácio† Juliana V. S. Barros‡

O processo de transição da fecundidade na América Latina, iniciada no final do século XX, culminou em transformações na distribuição dos nascimentos por idade das mães, os quais passaram a se concentrar nos grupos mais jovens, notadamente abaixo dos 25 anos, na contramão dos países europeus, por exemplo. Os contextos brasileiro e boliviano recentes servem de exemplo, pois se caracterizam tanto pelo declínio da fecundidade quanto pelas mudanças na entrada à maternidade, fenômeno este que merece uma atenção especial devido ao impacto que causa no comportamento reprodutivo futuro. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é estimar a proporção de mulheres tendo o primeiro filho e a idade média ao nascimento desse filho, para Brasil e Bolívia, a fim de analisar aspectos ligados à entrada à maternidade. Essas estimativas são importantes porque refletem o adiamento ou o início mais precoce da vida reprodutiva, fator que tem grande impacto sobre a dinâmica populacional. A análise será feita através da aplicação dos modelos de nupcialidade de Hernes (1972) e Hajnal (1953), técnicas indiretas simples que se utilizam de poucas informações facilmente obtidas em pesquisas amostrais ou censos demográficos. Serão empregados dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS), para o Brasil em 2006, e da Encuesta Nacional de Demografía y Salud (ENDSA), para a Bolívia em 2008, segundo escolaridade e tipo de união, uma vez que essas características relacionam-se estreitamente com o início da vida reprodutiva das mulheres, fato importante em países como Brasil e Bolívia, marcados por grandes desigualdades. Os resultados apontam importantes diferenciais na entrada à maternidade segundo a escolaridade e o tipo de união, em ambos os países, com uma tendência das mulheres de alta escolaridade a adiar sua fecundidade. Além disso, as mulheres brasileiras começam mais tardiamente sua vida reprodutiva, em comparação às bolivianas. A conclusão é de que tanto Brasil como Bolívia possuíam uma fecundidade de perfil jovem, porém, esse último país apresenta um padrão reprodutivo mais rejuvenescido. Há indícios de que estaria ocorrendo uma mudança no padrão brasileiro, na direção de um envelhecimento da estrutura de fecundidade e uma elevação da idade média ao ter o primeiro filho.

Palavras-chave: primeiro filho, idade, métodos indiretos, fecundidade

* Trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Águas de

Lindóia/SP – Brasil, de 19 a 23 de novembro de 2012.

Aluna de doutorado em Demografia, no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), gabriela@cedeplar.ufmg.br

Aluna de doutorado em Demografia, no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), julianav@cedeplar.ufmg.br

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1. INTRODUÇÃO

A mudança do comportamento da fecundidade na América Latina, iniciada no final do século XX, dialoga com o processo de modernização do continente, o qual abarca uma série de fatores globais que condicionam o tamanho final da prole – tais como a maior participação da mulher no mercado de trabalho, a difusão do conhecimento dos métodos contraceptivos e de idéias de planejamento familiar e a transformação do padrão de casamento. Junto com essa mudança, que culminou na diminuição do número de filhos tidos, verifica-se o rejuvenescimento da estrutura etária da fecundidade, haja vista que os nascimentos passaram a se concentrar nas idades mais jovens, notadamente abaixo dos 25 anos, na contramão dos países europeus, por exemplo. Os contextos brasileiro e boliviano recentes servem de exemplo para esse cenário, pois são marcados tanto pelo declínio da fecundidade quanto pelas mudanças na entrada à maternidade, fenômeno este que merece uma atenção especial devido ao impacto que causa na dinâmica populacional.

O objetivo deste estudo é, dado o cenário acima, estimar a distribuição de mulheres tendo o primeiro filho e a idade média relativa à entrada à maternidade, no Brasil e na Bolívia, a partir de uma informação simples que pode ser obtida nas pesquisas amostrais ou mesmo no censo demográfico: a proporção observada de mulheres, por idade, que teve filho alguma vez na vida, para um determinado ano. A idéia é mostrar que é possível fazer uso de pouca informação, simples de ser captada, para gerar dados valiosos no estudo da fecundidade. As análises da proporção de mulheres tendo o primeiro filho e da estimativa da idade média ao nascimento do primeiro filho são extremamente valiosas para o estudo da fecundidade, já que indicam o início da maternidade e oferecem insumos para o estudo dos nascimentos subseqüentes. Ademais, um exame dessas informações, principalmente num contexto de queda da fecundidade, é uma ferramenta indispensável para entender a realidade do comportamento reprodutivo das mulheres e seu impacto no crescimento e desenvolvimento de uma dada população. Nesse sentido, a entrada precoce na maternidade pode implicar um número maior de filhos ao final do período reprodutivo, devido à exposição ao risco de ter outros filhos durante um período de tempo mais longo comparativamente à entrada tardia à maternidade (Hobcraft e McDonald, 1984). Concomitantemente, proporções maiores de mulheres tendo filho a uma idade mais jovem têm um impacto na taxa de crescimento populacional, já que podem encurtar o tempo que se leva para uma geração substituir a anterior (Pebley et al., 1982).

Além disso, a entrada à maternidade está condicionada às características socioeconômicas do contexto em que a mulher se insere, fato importante em países como Brasil e Bolívia, marcados por fortes desigualdades. A educação, por exemplo, é uma dessas características que interferem no início da reprodução, já que as mulheres mais educadas tendem a adiar mais o nascimento do primeiro filho, comparativamente às menos educadas (Ford, 1984). O tipo de união é também um fator a ser considerado, devido à relação entre a nupcialidade e a formação das famílias, embora tal relação tenha se enfraquecido por causa da elevação no número de nascimentos ocorridos fora do casamento. Ademais, a nupcialidade sofreu

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modificações ao longo do tempo com o aparecimento de novos padrões, como a coabitação (diferente da união consensual), a qual começa a surgir nesses países na atualidade (Quilodrán, 1999, Castro Martín, 2001). Esses padrões se associam com a ascensão de novos valores e atitudes referentes ao papel dos indivíduos na família e na sociedade (Arriagada, 2002; Sunkel, 2006), o que acaba interferindo no comportamento reprodutivo. Assim, a existência de diferentes tipos de união guarda um vínculo com as transformações no início da maternidade, e essa relação contribui para o entendimento das realidades reprodutivas em contextos variados (Sunkel, 2006).

Tem-se, assim, uma breve ilustração da importância do estudo sobre o padrão etário de mulheres tendo o primeiro filho, complementado pela estimativa da idade média em que se inicia a reprodução, não apenas para a fecundidade, mas também para toda a dinâmica econômica, social e demográfica envolvida, dentro da população. Vale ressaltar, contudo, que apesar de toda influência que exerce, trabalhos detalhados sobre esse tema são bastante escassos tanto para o Brasil e Bolívia, como para a América Latina de modo geral, indicando que não se tem dado uma atenção devida aos aspectos que cerceiam à transição da fecundidade na região.

As estimativas serão realizadas baseando-se nos modelos de Hernes (1972) e Hajnal (1973) desenvolvidos para o exame da nupcialidade, mas que serão adaptados ao estudo da maternidade por meio da alteração dos pressupostos e dados de input. Trata-se de técnicas indiretas simples, as quais possuem duas vantagens que possibilitaram a sua aplicação nessa temática: a primeira é que eles requerem apenas um dado observado, que são as proporções por idade; e a segunda vantagem é que permitem que se utilizem dados de período para fazer estimativas para coorte, sob certos pressupostos. Ademais, problemas que afetam outros modelos, como filhos fora do casamento e omissão do nascimento do primeiro filho pelas mulheres mais velhas, não interferem nesses modelos e, por isso, os resultados obtidos são mais robustos.

Desse modo, partindo da hipótese de que o comportamento reprodutivo é diferenciado conforme a escolaridade e o tipo de união, o presente trabalho analisa os aspectos mencionados referentes à entrada à maternidade para as diferentes coortes de mulheres que compreendem o período reprodutivo (15 a 49 anos) no Brasil em 2006 e na Bolívia em 2008. Para tanto, serão utilizados dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) e da Encuesta Nacional de Demografía y Salud (ENDSA), segmentando a análise entre as duas características supracitadas - escolaridade e tipo de união (casamento formal e união consensual, neste último caso, tentando identificar a coabitação).

A escolha dos países se deve ao fato de representarem realidades distintas, conquanto vivenciem o mesmo processo de transição da fecundidade: o Brasil possui uma TFT (taxa de fecundidade total) abaixo do nível de reposição, ao passo que a TFT da Bolívia ainda se encontra acima desse nível, ao redor de 3,5 filhos por mulher. Assim, um estudo comparativo permitirá captar a tendência de comportamento reprodutivo em cenários antagônicos.

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Nesse sentido, as estimativas obtidas, por escolaridade e tipo de união, contribuem para uma melhor análise do início da reprodução no Brasil e na Bolívia. Ademais, essas estimativas podem ser bons indicadores do efeito das características das mulheres sobre a entrada à maternidade, demonstrando que cenários socioeconômicos e demográficos mais ou menos propícios implicarão entradas à reprodução mais ou menos precoces, acarretando consequências para a dinâmica populacional e para a elaboração de políticas públicas. Espera-se, com este trabalho, fornecer dados e ferramentas que possam incrementar a discussão já existente, a fim de que, futuramente, as instituições governamentais voltadas para o comportamento reprodutivo analisem com mais cuidado esses tipos de informação e os considerem na implantação de políticas públicas. Além disso, espera-se mostrar que técnicas indiretas podem ser aplicadas para produção de estimativas robustas e relevantes para a análise demográfica – técnicas essas de grande importância em contextos em que não se tem dados de boa qualidade ou eles são incompletos.

2. BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE A TRANSIÇÃO DA FECUNDIDADE NO BRASIL E NA BOLÍVIA

Até o início da década de 60, a fecundidade nesses países se manteve aproximadamente constante a uma taxa bastante elevada, acima de 6 filhos (CEALDE, 2008). A partir dessa década, inicia-se a transição da fecundidade para Brasil, enquanto que na Bolívia essa variável permanece inalterada. Chama-se a atenção para a diferença no ritmo de queda entre eles. No Brasil, verifica-se uma velocidade acentuada com que verifica-se deu o descenso da fecundidade, mesmo verifica-se tratando de um contexto de fortes desigualdades socioeconômicas e com indicadores de desenvolvimento desfavoráveis. Assim, a TFT desse país declina de modo suave até meados da década de 60, quando, então, o ritmo de queda é acentuado de maneira imprevista para países com as características que ele possuía (CELADE, 2008). Esse ritmo se mantém acelerado, e o Brasil chega ao nível de fecundidade abaixo da reposição na primeira década de 2000. Assim, pelo comportamento da sua fecundidade, o Brasil sinaliza ter entrado no ciclo definitivo de mudança do seu padrão de reprodução (Carvalho et al., 1981; Carvalho e Wong, 1990).

Quanto à Bolívia, uma peculiaridade da transição da fecundidade desse país se caracteriza por ele ter entrado relativamente tarde nesse processo, quando confrontado com o resto da América Latina (Aguirre, 1998, Tórrez Pinto, 1996). Entre 1955 e 1975, seus níveis de fecundidade mantiveram-se elevados, com uma média ao redor de 7 filhos por mulher, ao

passo que o Brasil, por exemplo, já experimentava quedas em suas taxas (CELADE, 2008).

Mas, a partir de meados da década de 70, já é possível observar um descenso no nível da

fecundidade na Bolívia, sendo mais acentuado entre as décadas de 1980 e 1990 (CELADE,

2008). Esse país, porém, apresenta um ritmo lento e constante de declínio das suas taxas

(embora nos últimos anos a velocidade de queda tenha aumentado, segundo dados do CELADE, 2008). Isso faz com que a Bolívia exiba, nos últimos anos, uma elevada taxa de fecundidade, indicando que o país se encontra em uma fase diferenciada do processo de transição da fecundidade em relação ao Brasil.

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Um aspecto comum a esses países, no entanto, diz respeito à distribuição etária da fecundidade, que é marcada por um rejuvenescimento durante a transição, dado que a limitação do número de filhos tidos ocorre, a princípio, nos grupos de idade mais envelhecidos do ciclo reprodutivo, enquanto que as mais jovens têm sua fecundidade em ascensão ou estável. Por conseguinte, há uma diminuição da idade média com que as mulheres se tornam mães e um rejuvenescimento da estrutura etária reprodutiva. Isso está em concordância com a assertiva de Ryder (1980), de que a América Latina seria marcada por reduções desproporcionais na fecundidade, ocorrendo com mais intensidade nas ordens de nascimento mais elevadas, e, portanto, nas idades mais velhas (p. 41).

A descrição da transformação do padrão etário reprodutivo colombiano, realizado por Vargas (2006), pode ser aplicada igualmente para o exame da Bolívia e do Brasil:

“En la etapa pretransicional (antes de 1965) el patrón tenía uma cúspide dilatada a los 25-29 años, y una edad media a la maternidad de 30 años. Hacia finales del siglo, en la etapa avanzada de la transición hay una cúspide temprana a los 20-24 años con una edad media a los 27 años, esto implica que há aumentado la contribución de las mujeres más jóvenes a la fecundidad” (Vargas, 2006, p. 91).

Cabe salientar, todavia, que tal configuração jovem do padrão etário da fecundidade nesses países tende a se alterar no futuro próximo, conforme asseveram Rosero-Bixby et al. (2009). Para os autores, isso se deve ao aumento da proporção de mulheres latino-americanas com vinte ou trinta anos de idade que ainda não fizeram a transição para a maternidade entre a década de 70 e primeiro quinquênio de 2000, o que sugere um adiamento da maternidade, e também à redução da proporção de latino-americanas que tem o primeiro filho nas idades abaixo de 30 anos. Esse fenômeno é salientado por Wong (2009), que apresenta evidências recentes de queda da taxa de fecundidade do grupo etário 15-19 anos na América Latina e indica uma provável tendência de envelhecimento da composição etária da fecundidade entre os países da região.

3. DADOS E MÉTODO 3.1. Dados

Esse estudo foi baseado em informações do survey de fecundidade realizado no Brasil entre 2006 e 2007, e na Bolívia em 2008, como parte do programa DHS (Demographic and Health Surveys) implementado pela Macro International Inc. As pesquisas do programa DHS são do tipo domiciliar, realizadas por meio de uma amostragem probabilística complexa e estratificada (Brasil, 2009). Tais pesquisas têm representatividade nacional e as unidades amostrais são selecionadas em dois estágios dentro de cada estrato: unidade primária, que são os setores censitários, e as unidades secundárias, que são as unidades domiciliares.

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Na pesquisa brasileira, foram entrevistadas 15.575 mulheres, de 15 a 49 anos, residentes em 14.617 municípios, obtendo uma taxa de resposta de 89%. Na Bolívia, foram entrevistadas 16.939 mulheres da mesma faixa de idade, para os 19.564 domicílios visitados, apresentando uma taxa de resposta de 96%. As mulheres responderam a perguntas retrospectivas ligadas à maternidade, gravidez e parturição, o que permite construir a história de nascimentos das entrevistadas.

A análise proposta foi realizada segundo a escolaridade das mulheres. O nível de escolaridade foi obtido através da variável anos de estudo, a qual foi agregada em duas categorias: baixa escolaridade e alta escolaridade. No primeiro grupo, estão inseridas aquelas que têm até 7 anos de estudo, ao passo que a segunda categoria abrange as mulheres com 8 ou mais anos de estudo.

Também se segmentou a análise segundo o tipo de união, selecionando-se as mulheres que estavam em um casamento formal ou em união consensual. O estudo por tipo de união é importante devido ao padrão nupcial presente na América Latina, o qual é caracterizado pela presença marcante de uniões consensuais como um tipo de união reconhecida e amplamente adotada na formação da família (Quilodrán, 1999). O perfil diferenciado de mulheres que adota cada tipo de união – as mulheres em união consensual, em geral, pertencem às camadas menos favorecidas da população e estão condições econômicas e sociais desfavoráveis (Quilodrán, 1999, Castro Martín, 2001) –, nesse sentido, torna necessária uma análise que leve em consideração esses diferenciais.

3.2. O modelo de Hernes

O modelo de Hernes (1972) para o estudo da nupcialidade é baseado na teoria de difusão, em que as redes sociais exercem papel relevante na determinação da entrada ao primeiro casamento. Desse modo, segundo Hernes, a passagem do estado de solteiro para o estado de casado de um indivíduo seria fruto de duas forças: por um lado, a pressão social para o casamento aumentaria com a idade, consequência da elevação da porcentagem de casados entre os membros da coorte a que esse indivíduo pertence. Por outro lado, a passagem do tempo, levando ao aumento da idade desse indivíduo, diminuiria a sua potencialidade para o casamento, derivada do efeito de seleção, do declínio do número de potenciais parceiros ao casamento na mesma coorte, ou mesmo por uma decisão individual de permanecer solteiro. Partindo da primeira hipótese, Hernes argumenta, então, que o risco de se casar no tempo t é

uma função da proporção de alguma vez casados no tempo t (Pt ), da proporção de

não-casados (1 - Pt ) e do parâmetro de conversão para a entrada no primeiro casamento (Hernes,

1972, p. 174-175). Com isso, se teria o que ele chamou de equação diferencial para a curva logística. No entanto, esse modelo não estaria completo. Para incorporar a segunda hipótese, ele estende o modelo incluindo um elemento de variação no tempo, refletindo o declínio na potencialidade para o casamento ao longo do tempo (Goldstein & Kenney, 2001, p. 511). Conforme Hernes, o parâmetro de conversão é ele mesmo uma função do tempo declinante, já que cada pessoa inicia com um certo potencial ao casamento – Ai - mas esse potencial

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declina por uma proporção constante b para cada unidade de tempo, onde b é a mesma para todos os indivíduos (1972, p. 175). Assim, o potencial ao casamento é uma progressão geométrica que declina por uma proporção constante para cada unidade de tempo (Hernes, 1972, p. 175), dado por:

q = f(t), sendo f(t) = Abt

Em que q é o parâmetro de conversão para a entrada no primeiro casamento.

Com isso, o modelo final de difusão não-homogêneo de Hernes, para o estudo da nupcialidade, é dado por:

1

1

1

t t b

P

ka

=

+

(Em que Pt é proporção acumulada estimada de primeiro casamento por idade, e k, a e b são

os parâmetros do modelo). Sendo, a = exp(A/log b) k = P0 /[a(1 – P0)] 1 2 3 2 log log log log t t t t t g g b g g − − ∑ = ∑

A (média do potencial inicial ao casamento) = log.a * log(b)

Porque b, na maioria das vezes, assume valor menor que 1, a proporção estimada de entrada no casamento alcança um limite V na medida em que t se torna elevado, em que V = 1/(1 + 1/k) (Goldstein & Kenney, 2001, p. 518).

É importante mencionar que Hernes derivou uma expressão para estimar seu modelo baseando-se somente na proporção acumulada observada de pessoas “alguma vez casadas” por idade. Isso porque, nesse modelo, uma vez que o indivíduo se casou, ele nunca deixará o estado de “alguma vez casado” (ou seja, não voltará a ser solteiro) mesmo que no momento da entrevista, por exemplo, ele não esteja casado. Assim, a proporção acumulada de pessoas “alguma vez casadas” é a proporção acumulada de primeiros casamentos.

A fim de verificar se o modelo de Hernes corresponde aos dados observados, basta comparar as proporções de primeiro casamento estimadas pelo modelo, utilizando os parâmetros calculados, com as proporções observadas. O modelo será tanto melhor quanto mais próximo será o ajuste entre as porcentagens observadas e as porcentagens acumuladas estimadas (Hernes, 1972, p. 176).

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3.2.1. O modelo de Hernes aplicado à maternidade

O modelo de Hernes aplicado ao estudo da entrada à maternidade segue a mesma metodologia do modelo original, mudando, apenas, o sentido dos pressupostos e dos dados de input. Assim, nesse caso específico, se trabalhará apenas com mulheres, enquanto que no modelo descrito anteriormente se poderia trabalhar com população total (homens e mulheres). Sabe-se que a interação social exerceu importante influência para o declínio generalizado da fecundidade observado em vários países, inclusive no Brasil e na Bolívia. A difusão de informações sobre contracepção e planejamento familiar, bem como conversas entre membros da mesma rede social sobre aspectos associados à adoção de uma família menor, acabaram modificando as decisões dos casais em direção a uma baixa fecundidade (Kohler, 1997). Concomitantemente, a entrada da mulher no mercado de trabalho acabou gerando um trade off entre maternidade e profissão que contribuiu para a queda da fecundidade (Becker, 1991).

No entanto, mesmo com o declínio da fecundidade, o desejo pela maternidade é universal, e muitas mulheres apenas adiam, intencionalmente, a entrada nessa fase, devido a fatores econômicos, profissionais e sociais (Rosero-Bixby et al, 2009). No caso da América Latina, a baixa fecundidade coexiste com uma entrada precoce na maternidade como consequência provável da valorização dos laços familiares presentes na cultura latino-americana e repassada a cada geração pelas redes familiares (Fussell & Palloni, 2004, apud Rosero-Bixby et al, 2009, p. 04).

Nesse sentido, as redes sociais influenciam bastante o comportamento reprodutivo das mulheres no contexto atual, havendo uma ampla pressão social para o controle da fecundidade, já que cada vez mais mulheres estão adotando famílias pequenas. E como a experiência de amigas e vizinhas acaba afetando as decisões das mulheres, a limitação da fecundidade por meio de contracepção tem sido a realidade de muitas delas (Kohler et al, 2000; Behrman et al, 2002). Ao mesmo tempo, há uma mesma pressão social para as mulheres se tornarem mães, já que, em alguns casos, é a única maneira delas obterem seu status dentro da família e da comunidade (Boonmongkon, 2001), além de ter um significado social e individual valioso para muitas sociedades (Ngalinda, 2005). Há evidências de que mulheres que não são mães acabam excluídas de eventos sociais e cerimônias, e desrespeitadas por seus companheiros (Boonmongkon, 2001). E essa pressão aumenta com a idade para uma coorte, já que aumenta a proporção de membros que são mães.

A passagem do tempo é, contudo, um contrapeso ao incentivo à maternidade. O aumento da idade das mulheres diminuiria o seu potencial para ter filhos simplesmente por uma questão biológica: o ciclo reprodutivo é curto e as mulheres se tornam inférteis. Ademais, pode-se acrescentar o declínio do potencial para encontrar um parceiro (da mesma coorte) que queira ter filho a uma idade elevada, ou mesmo por uma decisão pessoal de não ter filhos mantida mesmo diante da pressão social. Esse último aspecto pode ser considerado relevante devido ao crescente número de mulheres sem filhos em diversas populações (Rosero-Bixby et al, 2009).

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Assim, verifica-se a presença dos mesmos pressupostos estabelecidos por Hernes para estimar o seu modelo, só que agora voltados para a maternidade. E como eles se aplicam no

caso em questão4

Todos os parâmetros e outras suposições feitas no modelo original podem ser calculados e aplicados da mesma forma no modelo de entrada à maternidade, só que onde se teria casamento, passa-se a ter maternidade.

, é possível aplicar o modelo a partir das proporções acumuladas observadas de mulheres que tiveram filho alguma vez, por idade simples. Como este estado é permanente, como no casamento, a proporção de “alguma vez teve filho” é igual à proporção de “primeiro filho”.

3.3. O modelo de Hajnal

O modelo de Hajnal (1953) para o cálculo da idade média ao primeiro casamento (Singulate Mean Age at First Marriage, SMAFM) foi desenvolvido para obter estimativas de coorte com base em dados de período, similar a uma tabela de vida (Lundh, 1997, p.18). Ele utiliza, assim, dados de período para calcular quando os indivíduos se casarão pela primeira vez. A inferência para a coorte pode ser feita porque o modelo pressupõe que as proporções de nunca casados são constates ao longo do tempo, de forma que as proporções encontradas em pesquisas sucessivas podem ser tomadas como sendo a experiência da coorte ao longo da vida. Por ser uma medida de coorte, a SMAFM não é afetada pela estrutura etária da população (Hajnal, 1953; Lundh, 1997).

Alguns outros pressupostos, além daquele referente à estabilidade das proporções, são necessários ao modelo. Em primeiro lugar, o risco de morrer deve ser independente do estado civil dos indivíduos. Além disso, as pessoas nunca perdem o estado de alguma vez casadas, nunca retornando à condição de solteiras (portanto, viúvos e divorciados são considerados alguma vez casados), e somente essas entram no cálculo da SMAFM (Tomás, 2007, p.72). Embora alguns pressupostos sejam bastante frágeis, em especial a constância das proporções de solteiros no tempo, trata-se de um método robusto e eficaz o qual fornece uma boa aproximação da idade média ao primeiro casamento.

Por calcular de forma simples a idade média ao primeiro casamento, é possível adaptar esse modelo para outros eventos, bastando manter os mesmos pressupostos do método original. Nesse sentido, foi aplicada tal técnica para se obter a idade média ao nascimento do primeiro filho. Os dados de entrada do modelo, portanto, são as proporções de mulheres que tiveram algum filho, por idade. Assim como adotado no modelo de Hernes (1972), ter algum filho é o mesmo que dizer que teve um primeiro filho. É preciso, no entanto, ressaltar a dificuldade em se assumir alguns pressupostos, principalmente aquele relacionado à estabilidade das

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É imprescindível que os pressupostos assumidos por Hernes sejam aplicáveis para o caso da maternidade, já que eles são o cerne do modelo. Se não fossem passíveis de serem assumidos no caso em questão, o exercício não poderia ser feito.

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proporções no tempo. Como se sabe, tanto o Brasil quanto a Bolívia vem sofrendo transformações na sua estrutura de fecundidade, o que pode comprometer a estimativa alcançada.

A partir das proporções observadas e daquelas estimadas pelo modelo de Hernes, obteve-se todos os parâmetros necessários para o cálculo da SMAFM adaptada ao nascimento do primeiro filho: F(x), G(x) e nG(x). F(x) será, assim, a proporção de mulheres que tiveram filhos, G(x) representa as mulheres que ainda não tiveram filhos, mas ainda os terão em algum momento da vida e nG(x) é o valor de G(x) multiplicado pelo tamanho do intervalo.

4. RESULTADOS

4.1. As estimativas a partir do modelo de Hernes

As proporções observadas que serviram como dados de input para estimar o modelo se referem ao ano de 2006 para o Brasil e ao ano de 2008 para a Bolívia. Portanto, ao contrário do modelo original, no qual se empregaram dados para uma coorte, aqui as informações são de período.

Com as proporções por idade de mulheres que “tiveram filho alguma vez na vida”, foi possível calcular os parâmetros do modelo, imprescindíveis para se obter as estimativas de primeiro nascimento. O comportamento dessas proporções, por idade, bem como suas divergências, pode ser visualizado mais claramente pela FIG. 1:

Figura 1

Distribuição, por idade, da proporção observada e da proporção acumulada estimada de mulheres tendo os primeiros nascimentos.

a) Brasil, 2006. 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P ro p or çã o Idade Observada Estimada Fonte: PNDS, 2006.

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11 b) Bolívia, 2008. 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P ro p or çã o Idade Observada Estimada Fonte: ENDSA, 2008.

Verifica-se que as proporções estimadas pelo modelo de Hernes seguem a mesma tendência das proporções observadas, indicando um comportamento semelhante com o aumento da idade para ambos os países (FIG. 1, letras a e b). No entanto, as curvas não se sobrepõem, dado as constantes oscilações nas proporções observadas, principalmente a partir dos 19 anos para o Brasil e a partir dos 22 anos para a Bolívia.

Uma possível explicação é que as divergências entre as proporções demonstradas na FIG. 1, letras a e b, seriam decorrentes dos dados de entrada, ou seja, das proporções observadas. Como fora mencionado anteriormente, esses dados se referem a um único período do tempo e abarcam várias idades, que representam várias coortes distintas. Essas coortes estiveram expostas a situações econômicas, sociais, políticas e culturais variadas e que podem ter influenciado a sua entrada à maternidade. Além disso, essas coortes vivenciaram experiências demográficas de migração, mortalidade e fecundidade particulares que igualmente interferem nos dados obtidos. Portanto, as oscilações observadas seriam fruto do contexto de cada coorte.

No entanto, o modelo de Hernes fornece estimativas das proporções acumuladas de primeiros nascimentos, que seriam representativas do comportamento de uma coorte (por isso as proporções são cumulativas). Nesse sentido, a curva do modelo é mais homogênea, ou seja, não há oscilações. Ao se comparar as proporções, se está confrontado proporções observadas de período com as proporções de uma coorte hipotética. Daí as diferenças serem notórias. Dessa forma, acredita-se que se os dados de entrada fossem de uma coorte, as curvas seriam muito próximas, ou até mesmo sobrepostas. É o que ocorre nas primeiras idades, em que as informações de período são parecidas com a de coorte. Nota-se que nas idades de 15 a 18 anos, no Brasil, as proporções estimadas são próximas das proporções observadas, com as

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curvas do gráfico muito perto uma da outra. Com isso, nessas idades, o ajuste do modelo de Hernes é melhor.

No caso da Bolívia, no entanto, as oscilações na curva das proporções observadas são menos frequentes e mais suaves em comparação com o Brasil, além de ocorrerem a partir de uma idade mais velha. Assim, a distribuição da proporção de primeiro nascimento por idade da mãe é mais uniforme na Bolívia, o que faz com que a curva da proporção estimada pelo modelo de Hernes seja bem próxima da curva observada, indicando um melhor ajuste.

No que diz respeito às distribuições das proporções de mulheres tendo o primeiro filho, por idade, segundo escolaridade e tipo de união, os gráficos das FIG. 2 e 3 oferecem informações interessantes.

Figura 2

Distribuição, por idade, da proporção observada e da proporção acumulada estimada de mulheres tendo os primeiros nascimentos, segundo escolaridade das mulheres

casadas formalmente.

a) Baixa escolaridade. Brasil, 2006 b) Baixa escolaridade. Bolívia, 2008

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada Fonte: PNDS, 2006; ENDSA, 2008.

c) Alta escolaridade. Brasil, 2006 d) Alta escolaridade. Bolívia, 2008

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada Fonte: PNDS, 2006; ENDSA, 2008.

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As curvas dos gráficos das mulheres casadas formalmente e de baixa escolaridade do Brasil e da Bolívia apresentam um comportamento diferenciado nas primeiras idades: no Brasil, a proporção de mulheres tendo o primeiro filho na primeira idade considerada é muito elevada (quase a totalidade), reduzindo-se na mesma proporção na idade seguinte, para depois aumentar e se manter elevada para todas as idades, principalmente depois dos 22 anos, cujas proporções ficam acima de 90% (FIG. 2, letra a). Na Bolívia, por outro lado, a proporção de mulheres tendo o primeiro filho é muito baixa para a primeira idade (FIG. 2, letra b). No entanto, na idade seguinte essa proporção aumenta e, a partir dos 18 anos, praticamente se estabiliza em 100% das mulheres, com pequenas variações (FIG. 2, letra b).

Quanto às mulheres casadas formalmente e com elevada escolaridade, o padrão de comportamento das curvas (obervada e estimada) é bem semelhante para os dois países. Nas primeiras idades, as proporções são baixas, principalmente pelo fato de que as mulheres dificilmente tenham alcançado uma escolaridade elevada (FIG. 2, letras c e d). Mas aumentam continuamente com a idade, sendo que na Bolívia essas proporções de mulheres tendo o primeiro filho parecem se estabilizar a partir dos 28 anos, enquanto que no Brasil os sinais de estabilização aparecem mais à frente, por volta dos 36 anos (FIG. 2, letra c).

É interessante notar que entre as menos escolarizadas, para ambos os países, a estabilização das proporções estimadas de mulheres tendo o primeiro filho se dá a uma idade mais jovem em relação às mais escolarizadas, ou seja, entre as primeiras, aos 19 anos, praticamente todas as mulheres já haviam entrado na maternidade, enquanto que isso só ocorre para as mais escolarizadas por volta dos 30 anos na Bolívia e próximo dos 40 anos no Brasil (FIG. 2, letra c e d). Com esses dados, é possível compreender um adiamento da maternidade entre as mulheres de maior educação formal, e uma precocidade do início da reprodução entre as mulheres menos educadas.

Figura 3

Distribuição, por idade, da proporção observada e da proporção acumulada estimada de mulheres tendo os primeiros nascimentos, segundo escolaridade das mulheres em

união consensual.

a) Baixa escolaridade. Brasil, 2006 b) Baixa escolaridade. Bolívia, 2008

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada Fonte: PNDS, 2006; ENDSA, 2008.

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c) Alta escolaridade. Brasil, 2006 d) Alta escolaridade. Bolívia, 2008

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P r o p o r ç ã o Idade Observada Estimada 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 P ro p o ã o Idade Observada Estimada Fonte: PNDS, 2006; ENDSA, 2008.

Entre as mulheres em união consensual, observa-se que o comportamento das curvas para aquelas de baixa escolaridade é semelhante nos dois países. A proporção estimada de primeiros nascimentos é elevada já nas primeiras idades e praticamente a mesma entre Brasil e Bolívia (FIG. 3, letras a e b), o que não ocorria entre as casadas formalmente, cujas proporções de primeiros nascimentos apresentavam comportamento distinto nas primeiras idades, para as menos escolarizadas. No entanto, a estabilização das proporções estimadas não ocorre na mesma idade nos dois países: no Brasil ela se dá por volta dos 30 anos, e na Bolívia, ao redor de 25 anos (FIG. 3, letras a e b). Assim, no Brasil, a quase totalidade das mulheres estudadas que entraram na maternidade com uma idade mais velha que na Bolívia. Em outras palavras, nesse último país, as mulheres têm filhos mais cedo em relação ao primeiro. Todavia, se se compara com as casadas formalmente e de baixa escolaridade, a totalidade das mulheres em união consensual que têm o primeiro filho se dá a uma idade bem maior, para ambos os países.

O padrão de comportamento da proporção estimada para as mulheres em união consensual e de elevada escolaridade é parecido com o padrão das mulheres casadas formalmente, tanto para Brasil quanto para Bolívia. Chama a atenção, contudo, o fato de que, na Bolívia, a estabilização da proporção estimada de mulheres tendo o primeiro filho é verificada no gráfico (FIG. 3, letra d), ao passo que para o Brasil isso não está explicitado; existem apenas sinais de estabilização a partir das idades mais avançadas (FIG. 3, letra c), tal como entre as casadas formalmente.

Outro fator curioso, que ocorre entre as casadas formalmente e entre aquelas em união consensual, é a grande oscilação nas proporções observadas no Brasil, principalmente entre as de elevada escolaridade. Na Bolívia, elas são menos frequentes e mais suaves. No caso das mulheres em união consensual, por exemplo, embora a curva das proporções estimadas indique a tendência de comportamento das proporções observadas, as curvas não são se sobrepõem, devido às inúmeras variações por idade (FIG. 3, letra c).

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As curvas das proporções estimadas mostraram, assim, que as mais escolarizadas tendem a adiar a maternidade e as menos escolarizadas a antecipar, além de existirem diferenças segundo o tipo de união e que a totalidade de mulheres que tem primeiro filho no Brasil se dá a uma idade mais velha que na Bolívia. Dados esses resultados, fez-se necessário estimar a idade média ao ter o primeiro filho, considerando as características analisadas, empregando essas proporções obtidas pelo modelo de Hernes, e compará-la com a estimativa da idade média utilizando as proporções observadas retiradas diretamente dos dados amostrais.

4.2. Estimativa da idade média ao ter o primeiro filho pelo modelo de Hajnal

A fim de estimar a idade com que, em média, as brasileiras e bolivianas têm seu primeiro filho, empregou-se as mesmas informações analisadas na seção anterior para se realizar o cálculo da INPF. Para tanto, se recorreu ao método de Hajnal (1953) para o estudo da nupcialidade.

A tabela abaixo apresenta os valores da idade média obtidos tanto através da proporção do modelo de Hernes, ajustado anteriormente, como da proporção observada de mulheres que tiveram filho, retirada da PNDS de 2006 e da ENDSA de 2008, com vistas a comparar ambas as estimativas, segundo escolaridade e tipo de união.

Tabela 1

Idade média ao nascimento do primeiro filho, por tipo de união e escolaridade da mãe, segundo a utilização do tipo de proporção de mulheres tendo o primeiro filho. Brasil,

2006 e Bolívia, 2008. Baixa Ecolaridade Alta Escoalridade Baixa Escolaridade Alta Escolaridade Brasil 18,59 21,59 17,03 23,74 Bolívia 15,19 18,6 16,6 19,74 Brasil 19,13 22,5 18,23 22,95 Bolívia 16,78 19,1 17,13 18,29

Proporção observada Proporção Estimada

Casamento Formal

União Consensual

Fonte: PNDS, 2006 e ENDSA, 2008

As estimativas da idade média ao ter o primeiro filho corroboram os resultados apresentados nos gráficos das distribuições das proporções de mulheres tendo o primeiro filho, por idade. Segundo os dados da TAB. 1, existem diferenças segundo a escolaridade e o tipo de união, para ambos os países. Tanto a idade média calculada com as proporções observadas, quanto aquela obtida pelas proporções estimadas pelo modelo de Hernes, demonstra que as mulheres casadas formalmente e de alta escolaridade iniciam a maternidade a uma idade superior às mulheres no mesmo tipo de união, porém de baixa escolaridade. A diferença na idade média

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entre as de alta e baixa escolaridade gira em torno de 3 anos (com exceção do Brasil que, pelas proporções estimadas, obteve uma diferença ao redor de 6 anos).

Entre as mulheres em união consensual, ocorre a mesma situação: as mais escolarizadas iniciam a maternidade mais velhas, em média, do que as menos escolarizadas, independente da proporção empregada, tanto para Brasil quanto para Bolívia (TAB. 1). Contudo, um aspecto merece ser considerado: empregando as proporções observadas, nota-se que as mulheres em união consensual, para ambos os países, apresentam sempre uma idade média superior às mulheres casadas formalmente, tanto entre as menos quanto entre as mais escolarizadas (TAB. 1). No entanto, ao empregar as proporções obtidas pelo modelo de Hernes, essa relação se modifica para as mais escolarizadas: enquanto as mulheres em união consensual continuam tendo uma idade média maior que as mulheres casadas formalmente, para as menos escolarizadas, essa situação se inverte para o grupo mais escolarizado, passando as casadas formalmente a apresentarem uma idade média maior (TAB. 1). Isso indica que a aplicação de dados de natureza diferente pode gerar resultados distintos.

Os dados da TAB. 1, adicionalmente às distribuições da proporção de mulheres tendo o primeiro filho mostradas nos gráficos analisados, sinalizam, ainda, que as bolivianas iniciam a reprodução mais cedo do que as brasileiras, independente do tipo de união, sendo a diferença entre elas importante, principalmente entre as mais escolarizadas. Talvez, por isso, é que a estabilização das proporções de mulheres tendo o primeiro filho se dá mais precocemente na Bolívia que no Brasil. E isso ajuda a entender o fato de que na Bolívia, em 2008, o peso das jovens na distribuição da fecundidade permanecesse elevado, maior que o peso das jovens na distribuição do Brasil em 2006, indicando uma estrutura etária da fecundidade mais rejuvenescida no primeiro país. Ao se considerar que um início à maternidade precoce pode levar a um nível de fecundidade mais elevado que um início tardio, os dados aqui obtidos ajudam a explicar a TFT da Bolívia ser maior que a do Brasil, para os anos examinados. Portanto, à medida que se verifica um adiamento na idade ao ter o primeiro filho no primeiro país, é de se esperar que ele diminua o seu nível de fecundidade para próximo do segundo.

O mesmo é esperado para as mulheres de baixa escolaridade: na medida em que elas comecem a adiar a entrada à maternidade, o perfil da distribuição das proporções, bem como a idade média ao nascimento do primeiro filho, tenderá a se assemelhar ao que é notado para as mulheres de elevada escolaridade, podendo levar a uma queda do nível de fecundidade do país. No caso do tipo de união, a maior incidência de um ou outro tipo poderá indicar o perfil de comportamento reprodutivo predominante e, com isso, antever uma maior ou menor fecundidade.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho estimou a proporção de mulheres tendo o primeiro filho e a idade média das mulheres ao ter o primeiro filho, para o Brasil, em 2006, e a Bolívia, em 2008, segundo o nível de escolaridade e o tipo de união, com o objetivo de acrescentar novos dados e

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ferramentas que possam colaborar para uma melhor discussão acerca da fecundidade e do comportamento reprodutiva nesses dois países. Ele foi motivado pelas mudanças observadas no comportamento da fecundidade observadas em todo mundo, em especial no contexto latino-americano, em que a diminuição do número de filhos por mulher se deu de forma acelerada e causou sérias transformações na dinâmica populacional.

Para tal, utilizou-se técnicas indiretas simples, as quais possibilitaram calcular as proporções de mulheres tendo o primeiro filho e a idade média com base em poucas informações. Esse tipo de técnica é importante em contextos em que não se tem dados de boa qualidade ou em que as informações são incompletas. A adaptação desses modelos para estimar relações diferentes daquelas para os quais eles foram propostos originalmente mostrou-se frutífera, não obstante algumas inconsistências oriundas, possivelmente, do ajuste no modelo para os fins deste trabalho. Por se tratar de técnicas pouco utilizadas, este trabalho chama atenção para o fato de que esses são métodos valiosos por sua flexibilidade e de grande simplicidade no que concerne aos dados exigidos, o que os tornam importantes para estimação de medidas de forma concisa.

As estimativas obtidas neste trabalho são de extrema importância por se tratar de informações a partir das quais se pode inferir outros processos relacionados, como a entrada à maternidade, a precocidade da fecundidade, a exposição das mulheres ao risco de ter mais filhos, etc. Além dos aspectos demográficos, as estimativas obtidas relacionam-se ainda a um contexto social e econômico, bem como servem para orientar a formulação de políticas voltadas para uma atenção à mulher, à saúde e à educação.

Observou-se importantes diferenciais quanto à escolaridade e ao tipo de união, em ambos os países e entre eles. As curvas das proporções estimadas mostraram que as mulheres com maior escolaridade tendem a entrar mais tardiamente à maternidade, enquanto há uma precocidade no início da reprodução entre as mulheres menos escolarizadas, nos dois tipos de união. A idade média ao nascimento do primeiro filho também indica que as mulheres mais escolarizadas iniciam sua vida reprodutiva mais tarde do que aquelas de baixa escolaridade. Entretanto, aparentemente as mulheres unidas tendem a iniciar um pouco mais tarde do que as casadas, as quais apresentaram uma idade média um pouco inferior às demais. Além disso, as mulheres no Brasil têm o primeiro filho em uma idade mais velha em comparação à Bolívia.

Por fim, destaca-se o fato de que tanto Brasil como Bolívia possuíam, em 2006 e 2008, respectivamente, uma fecundidade de perfil jovem, uma vez que a idade média ao nascimento do primeiro filho foi baixa. Outro fato que corrobora essa conclusão é a estabilização da proporção de mulheres tendo o primeiro filho entre idades jovens. Nesse sentido, os resultados encontrados vão de encontro com os apontamentos sobre um padrão jovem de fecundidade na América Latina, ocasionado pela transição da fecundidade. Entretanto, deve-se destacar que a estabilização da proporção no Brasil ocorreu em idades mais tardias em comparação à Bolívia. Assim, nesse último país as mulheres têm filhos mais cedo em relação às brasileiras, o que indica um padrão etário mais jovem entre as bolivianas. Esse fato sugere

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que, no Brasil, já poderia estar ocorrendo uma mudança no padrão etário da fecundidade, de forma que país estaria caminhando para uma nova mudança em estrutura de fecundidade, dessa vez para o envelhecimento. Por outro lado, a Bolívia ainda estaria em um estágio pouco avançado do processo de transição, de modo que as elevadas proporções de mulheres tendo o primeiro filho em idades mais jovens levam a um nível de fecundidade mais elevado nesse país.

A entrada à maternidade e a idade média ao ter o primeiro filho refletem o adiamento ou o início mais precoce da vida reprodutiva e tem consequências importantes sobre o nível da fecundidade, o tamanho populacional e os nascimentos posteriores. Nesse sentido, compreender os padrões de fecundidade existentes atualmente, tal qual este estudo intentou para Brasil e Bolívia, é de grande relevância para vislumbrar um cenário futuro acerca deste componente demográfico e seu impacto no crescimento e desenvolvimento da população.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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