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ECLI:PT:TRE:2007: E

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ECLI:PT:TRE:2007:398.07.3.3E

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRE:2007:398.07.3.3E

Relator Nº do Documento

Acácio Neves

Apenso Data do Acordão

31/05/2007

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Apelação Cível revogada parcialmente a sentença

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais Jurisprudência Nacional Legislação Comunitária Legislação Estrangeira Descritores

modificabilidade da decisão de facto; direito de propriedade; ocupação de prédio; prédio encravado; servidão de passagem;

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Sumário:

I – A Relação só pode alterar a matéria de facto dada como provada na 1ª Instância se estiver na posse de todos os elementos que ali foram presentes.

II – Tendo o réu construído uma estrada com assento no prédio do autor, estrada essa que passou a ser utilizada pela população em geral, o réu não pode ser condenado a “desocupar” a área “ocupada”, mas sim a desmanchar a estrada que construiu, nos termos do artigo 562º, do Código Civil.

III – O proprietário dum prédio encravado não tem, sem mais, servidão de passagem. Apenas tem o direito de exigir a constituição de uma servidão.

Decisão Integral:

*

PROCESSO Nº 398/07 - 3

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

*“A” intentou, em 23.01.2003. acção declarativa ordinária contra “B” e “C”, pedindo:

- que ambos os réus sejam condenados a reconhecer que o prédio descrito rústico, com a área de 0,7500 hectares, sito na freguesia de …, concelho do …, denominado "…", inscrito na matriz predial rústica sob artigo 013.0333.0000 e descrito na Conservatória do Registo Predial do … sob o n° 4141, a fls. 51 do Livro B-13, é propriedade do autor e dos seus filhos;

- e sejam condenados, solidariamente, a restituírem as parcelas que ocupam ao autor, este, na qualidade de cabeça de casal;

- que o réu “B” seja condenado a desmanchar à sua custa a estrada que construiu, ou a pagar ao autor, logo à herança que representa, a quantia de € 20.000,00, para que possa por si efectuar a obra;

- sendo o mesmo ainda condenando a pagar uma indemnização, fixada equitativamente, pela diminuição do valor patrimonial do prédio do autor e dos seus filhos, durante todo o período de ocupação do mesmo pela estrada e que antes da obra era de € 25.000,00;

- que o réu “C” seja condenado a desmanchar à sua custa o portão e a soleira que edificou no prédio do autor e dos seus filhos;

- e que ambos os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar ao autor uma indemnização por danos morais, no montante de € 5.000,00;

- indemnizações essas acrescidas de juros de mora a contar da citação.

Alegou para tanto e em resumo que é dono, juntamente com os seus filhos (herança por partilhar, aberta na sequência da morte de sua esposa) de determinado prédio e que, sem autorização, o réu “B”, abriu um novo caminho nesse prédio, onde, com a utilização de máquinas, retirando terra arável, colocando brita e cascalho e abrindo valetas, fez com que cerca de 1.000 m2 deixassem de poder ser usados para fins agrícolas, construindo uma estrada com 6,5 metros de largura e cerca de 140 metros de comprimento, estrada essa agora utilizada por toda a gente e que fez com que o prédio do autor deixasse de ter valor comercial, sendo que tais factos têm trazido o autor

preocupado e angustiado.

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4,80 metros que deita directamente para o prédio do autor, portão esse em parte implantado no terreno do autor, de forma a aproveitar a estrada feita pelo co-réu, apesar de ter acessos próprios ao seu prédio.

Citados, contestaram ambos os réus, defendendo-se por impugnação, defendendo o réu “C” a existência de uma servidão de passagem constituída por usucapião e o réu “B” a natureza pública do caminho em causa, tendo ainda sido invocada, pelo réu “C”, a ilegitimidade do autor, pela preterição do litisconsórcio necessário activo.

Replicou o autor, impugnando a existência da invocada servidão e da invocada natureza pública do caminho e, perante a invocação da sua ilegitimidade, veio requerer a intervenção principal de seus filhos, “D” e “E”, a qual foi admitida, não tendo os chamados intervido nos autos, apesar de

citados.

Foi proferido despacho saneador, no qual se reconheceu a legitimidade das partes, e foram elaborados os factos assentes e a base instrutória, após o que, instruído o processo, teve lugar a audiência de julgamento.

Seguidamente, foi proferida sentença, nos termos da qual a acção foi julgada procedente, condenando-se:

- os réus a reconhecerem que o prédio em causa (acima identificado) é propriedade do autor e seus filhos e a restituírem as parcelas que ocupam ao autor, este na qualidade de cabeça de casal; - o réu “B” a desmanchar à sua custa a estrada que construiu ou a pagar ao autor (à herança que representa) a quantia - a liquidar em execução de sentença - para que possa por si efectuar a obra; - e ainda a pagar uma indemnização fixada equitativamente, pela diminuição do valor patrimonial do prédio durante todo o período de ocupação do mesmo pela estrada, a liquidar em execução de sentença;

- o réu “C” a desmanchar à sua conta o portão e soleira que edificou no prédio; - verbas essas com juros de mora desde a citação;

- e ainda ambos os réus, solidariamente, a pagarem ao autor uma indemnização, por danos morais no valor de € 5.000,00, com juros de mora desde a data da sentença.

Inconformados, interpuseram recurso de apelação ambos os réus.

Nas respectivas alegações, apresentou o réu apelante “B” as seguintes conclusões:

1ª - As respostas dadas pelo Mº Juiz "a quo" à matéria da base instrutória redundaram em flagrante erro na apreciação da prova efectivamente produzida nos autos em sede de audiência de

discussão e julgamento;

2a - O Mº Juiz "a quo" respondeu positivamente à matéria quesitada nos arts. 1° a 10° e 13° a 15° da base instrutória. Contudo, na apreciação crítica de todos os depoimentos prestados deveriam ter sido dadas respostas negativas à referida matéria;

3a - A prudente convicção do julgador ao fixar a matéria que considera provada deve ser

sustentada pelo conjunto da prova efectivamente produzida, analisada de forma crítica e à luz das regras da experiência comum;

4a - As testemunhas dos réus depuseram de forma segura, isenta e espontânea acerca dos factos perguntados, revelando ter conhecimento directo e pessoal dos mesmos;

5a - Não se justifica assim que os seus depoimentos sejam desacreditados conforme fez o Mº Juiz "a quo", que, em contrapartida, aceitou sem reservas os três depoimentos prestados pelas

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testemunhas do autor, duas das quais eram suas irmãs e depuseram sem isenção;

6a - Da análise crítica do depoimento de todas as testemunhas, resulta apurado que o apelante não abriu um novo caminho no prédio do autor, mas antes que reparou o caminho que já existia;

7a - Resulta ainda que esse caminho existia pelo menos há vinte ou trinta anos, inicialmente mais estreito mas tendo sido alargado com a continuidade da passagem das pessoas;

8a - E ainda que o mesmo era utilizado regularmente pelo público em geral como forma de acesso e ligação entre as propriedades agrícolas e a Aldeia da …;

9a - Os depoimentos prestados pelas testemunhas “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L” e “M”, todos unânimes em afirmar que o caminho já existia antes da actuação do apelante, permitem que se conclua, com certeza e razoabilidade, que o réu não construiu um novo caminho mas sim que reparou o existente, devendo alterar-se a resposta dada ao quesito 1° da base instrutória, dando-se como não provado;

10a - Deverá proceder-se igualmente quanto à matéria perguntada nos quesitos 2° e 3° da base instrutória no que respeita à existência de trabalhos de escavações, terraplanagens e retiro de terra arável e abertura de valetas no prédio do autor, face à inexistência de prova positiva quanto a tal matéria e, ao invés, à existência de prova segura e credível da sua inexistência;

11ª - Também não se fez qualquer prova quanto á desvalorização comercial do prédio do autor; 12a - Por isso, a resposta positiva dada a essa matéria não se apresenta sustentada por qualquer prova documental ou testemunhal, devendo ser alterada a resposta dada ao respectivo quesito e a mesma considerada como não provada face à ausência de provas;

13a - A matéria perguntada nos quesitos 6° a 9° da base instrutória deverá considerar-se prejudicada na sequência daquilo que se vem expondo nas conclusões anteriores;

14a - De igual forma, atentas as considerações que antecedem, não deverá igualmente ser dada como provada a matéria que se encontra quesitada nos arts. 13° a 15° devendo ser alterada a sua resposta e a mesma dada como não provada;

5ª - Assim, deverão V. Exas proceder à reapreciação da referida matéria de facto, a qual deverá ser analisada e ponderada face aos depoimentos efectivamente prestados, alterando-se as respectivas respostas, devendo a mesma ser dada como não provada;

16ª - Não se apurou que o apelante ocupa qualquer parcela de terreno do autor;

17a - Assim sendo, deve considerar-se descabida a sua condenação na restituição das parcelas de terreno do autor ocupadas pelo apelante;

18a - Mesmo que assim não entendessem V. Exas, sempre deveria considerar-se que a condenação do apelante em indemnização a favor do autor ou da Herança, quer por prejuízos materiais quer por danos morais é injusta e indevida;

19a - Com efeito, não resultou provado no decorrer do julgamento a existência de danos; 20a - Finalmente, apurou-se que o apelante reparou o caminho já existente no prédio do autor, conjuntamente com outros habitantes da aldeia e proprietários de prédios vizinhos, não sendo o mesmo responsável pelo pagamento de prejuízos que, a existirem, teriam sido causados por todos e não apenas pelo réu;

21ª - A douta decisão recorrida não fixou os factos quesitados de acordo com a prova que foi efectivamente produzida, gravada em audiência de julgamento, havendo erro grave na sua fixação e apreciação;

22a - A douta decisão quanto á matéria de facto deverá ser alterada, dando-se como não provada nos pontos acima indicados, alterando-se, consequentemente proferida;

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Por sua vez, nas respectivas alegações, o réu apelante “C” apresentou as seguintes conclusões: 1ª - O presente recurso de apelação vem interposto da, aliás, mui douta sentença de fls ... e sgs. dos autos;

2a - Com o devido respeito - que é muito - afigura-se-nos que aquela douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 265°, n° 3, 515°, 653°, n° 2, 655°, 659°, nº 2, todos do CPC; bem como o preceituado nos arts. 483° e segs, 1550°, 1553° e 1548° e segs, todos do C. Civil;

padecendo, outrossim, a sentença recorrida do vício de nulidade a que se referem as als. b), c), do n° 1 do art. 668° do CPC. Com efeito,

3a - O Tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 515° e 653°, n° 2, ambos do CPC, quando deu como não provados os factos quesitados sob os arts. 20°, 22° a 27°, cuja prova impendia sobre o aqui apelante, quando as testemunhas que se indicam a fls .... da transcrição e indicadas pelo aqui apelante, depuseram, de modo isento, imparcial, credível, de forma diametralmente oposta;

efectivamente:

4a - As testemunhas “I”, “J”, “N” e “H”, cfr. fls ... da transcrição, provaram que: o réu “C” se

limitou a substituir um portão de arame e tábuas, que naquele local existia há mais de 50 anos, por um novo mais seguro de forma a que os animais que tem não saíssem da sua propriedade; desde há, pelo menos, 50 anos a esta parte que o prédio do 2° réu, denominado "…" e que é contíguo ao do autor e filhos, está vedado; a passagem pela "…" é feita ininterruptamente desde há 50 anos a esta parte; já era para tal usada pelos antepossuidores da "…"; tal situação está à vista e é do conhecimento de toda a gente; sempre ocorreu sem oposição de quem nisso pudesse mostrar interesse e que sempre foi usada com a convicção de que se podia usar dela, por ser a única forma de aceder ao prédio;

5a - Ainda assim, o Tribunal recorrido, escudando-se no princípio da livre apreciação da prova, violou os arts. supra descritos e bem assim o art. 655° do CPC, por excesso, porquanto: "O

princípio da livre apreciação das provas, adoptado no n° 1 do art. 635° do CPC, significa apenas a libertação do juiz das regras severas e inexoráveis da prova legal, sem que, entretanto, se queira atribuir-lhe o poder arbitrário de julgar os factos sem prova ou contra as provas" - Alberto dos Reis, CPC Anot., 3° - 245° e CPC Anot., 4° - 570° - o sublinhado é nosso.

6a - A sentença recorrida viola, igualmente, o disposto no art. 659°, n° 2 do CPC quando não efectuou,. In casu, a aplicação das normas jurídicas correspondentes e, bem assim, a sua

fundamentação é, não só, contraditória entre si, como a posteriori está em oposição com a decisão. Contudo, a este respeito o Tribunal recorrido alega, para decidir pela não verificação daquela

servidão, que: " ... apenas o artigo matricial 127 confina com o prédio dos autores (o artigo matricial n° 333) e não confina com o dito caminho público. No entanto, tais artigos matriciais não mostram ter autonomia física, pois que os dois primeiros - os artigos matriciais 126 e 127 - encontram-se murados em conjunto, sendo uma mesma realidade física e confinam, portanto, com o caminho situado no lado oposto ao prédio dos autores".

7ª - Ao decidir assim o Tribunal a quo violou, no nosso modesto entender, o disposto nos arts. 1548° e 1550°, ambos do C. Civil, pois que:

8ª - Se o Tribunal dá como provada a abertura do portão -sendo que nos reportamos àquele que deita para a propriedade do autor - ao não dar como provado que o aqui recorrente não faz uso desse mesmo portão (até porque não quesitado) e, como tal, se o mesmo não é utilizado (sendo que configure uma mera decoração), não tem porquê proceder, contra este réu, o primeiro pedido do autor.

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como entre estes e a decisão, o que implica a nulidade da sentença proferida, nos termos do disposto no art. 668°, n° 1, al. c) do CPC.

10ª - Mas mais, a sentença recorrida, se por um lado admite que o prédio do aqui recorrente, inscrito sob o art. 127°, é um prédio encravado, por outro consigna que, como o aqui recorrente também é, desde data que o Tribunal não apurou ou, pelo menos, não deu como provada, proprietário de um prédio confinante com o art. 127°, não tem qualquer direito a servidão de passagem pelo prédio do autor.

11ª - Ora, "É encravado o prédio, rústico ou urbano, que, por todos os seus lados confina com outros prédios" - vide Henrique Mesquita, RLJ, 129° - 191 e sgs. - cfr. art. 1550°, n° 1 do CC, pelo que a circunstância de, após a aquisição do art. 127°, o recorrente ter adquirido o 126°, não obsta - no nosso modesto entender - a que, anteriormente e por usucapião se tenha constituído a

servidão de passagem por usucapião sobredita.

12ª - Mais a mais quando a sentença recorrida sequer deu como provadas as datas em que esses prédios - art. 126° e 127° - foram adquiridos - elementos esses assaz importantes, no nosso ver, para a boa decisão da causa e que importa a violação, pela sua ausência, pelo Tribunal a quo do disposto no art. 265°, n° 3; bem como do disposto no art. 653°, n° 2, ambos do CPC, porquanto existem nos autos elementos documentais suficientes para comprovar o ora alegado, mas que não mereceram do Tribunal qualquer exame.

13ª - Além do mais, a sentença recorrida condena os réus “B” e “C” a reconhecerem que o prédio ... é propriedade do autor e seus filhos e condenados solidariamente a restituírem parcelas que ocupam ao autor ... "

14ª - Salvo o devido respeito por melhor opinião, inexistem, quer na p.i., quer na matéria dada como provada, factos que consubstanciem que o aqui apelante ocupe ou ocupasse seja que terreno for do autor e filhos.

15ª - Pelo que é evidente que a decisão não encontra, também nesta parte, qualquer apoio nos factos provados e sequer alegados, consubstanciando, mais uma nulidade da sentença recorrida, nos termos daquele art. 668°, n° 1, al. b), pois sequer são explicados quaisquer fundamentos que justifiquem esta decisão.

16ª - Não se bastando, a sentença recorrida condena, ainda, o aqui apelante no pagamento, solidário do montante de € 5.000,00, por danos alegadamente sofridos pelo autor, mas o curioso é que não são alegados nem dados como provados, consequentemente, quaisquer danos

provocados pelo aqui recorrente com a colocação do portão e a reparação do muro e, ainda assim, este é condenado no pagamento solidário de € 5.000,00.

17ª - E, para tal, basta sopesarmos todos os pontos dados como provados de 1) a 42) da sentença recorrida, onde inexiste qualquer prova de danos provocados pelo aqui recorrente ao autor - cfr. fls ... dos autos.

18ª - Mais, o Tribunal a quo nem sequer faz referência à norma jurídica aplicável neste caso; com violação do art. 659°, n° 2 do CPC e padecendo do vício da nulidade a que se refere o nº 1, al. b) do art. 668° do CPC.

19ª - Meritíssimos Juízes, cremos ainda ter presente que o art. 483° do CC, para constituir alguém na obrigação de indemnizar outrem, exige: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano (Almeida Costa, Obrigações, 4°, 364). Quais os pressupostos preenchidos pelos factos dados como provados que permitam constituir o aqui recorrente nessa obrigação: NENHUNS!

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recorrente sem o preenchimento dos requisitos legais para tal, em clamorosa violação do art. 483° e sgs., além dos supra referidos.

21ª - Pelo exposto supra, deve a sentença recorrida ser declarada nula, com as demais

consequência legais. Sendo que, caso não seja este o douto entendimento de V. Exas, a sentença recorrida, porque viola os preceitos legais atrás referidos, deve ser revogada e substituída por outra que julgue totalmente improcedente por não provados os pedidos do autor e intervenientes, com a consequente absolvição do réu do pedido. Caso não seja este ainda o entendimento de V. Exas, deverá o pedido indemnizatório ser declarado totalmente improcedente por não provado,

absolvendo-se o réu do pedido.

Contra-alegou o autor, pugnando pela improcedência de ambas as apelações. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Perante as conclusões das alegações de ambos os réus apelantes, enquanto delimitadoras do objecto do recurso (arts. 684°, n° 3 e 690°, nº 1 do CPC), são as seguintes as questões de que cumpre conhecer:

Apelação do réu “B”:

- alteração da matéria de facto; - restituição de parcelas ocupadas; - obrigação de indemnizar;

Apelação do réu “C”:

- alteração da matéria de facto; - nulidade da sentença;

- servidão de passagem; - restituição de parcelas; - obrigação de indemnizar.

Factualidade dada como provada na 1ª instância:

1) Encontra-se registada a favor do autor “A”, casado com “O” no regime de comunhão geral de bens, o prédio rústico, com a área de 0,7500 hectares, sito na freguesia de …, concelho de …, designado "…", inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 013.0333.0000 e descrito na Conservatória do Registo Predial do … sob o n° 4141, a fls. 51 do Livro B-13, por doação sucessória por morte de “P” e “Q”, definida em partilha extrajudicial.

2) Na sequência de escritura pública, celebrada em 26 de Dezembro de 1991, no Cartório Notarial do …, pelo falecimento de “O”, ocorrido em 4 de Setembro de 1991, foram habilitados o seu marido “A” e filhos “D” e “E”.

3) O prédio referido em 1) confina a nascente com o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 334, secção N, que pertence ao réu “B”.

4) Confronta ainda, a nascente com o prédio inscrito na matriz sob o artigo 419 da Secção N, que pertence a “R”.

5) E a sul com o prédio inscrito sob o artigo 415 da Secção N, pertencente a “S”.

6) Todos estes prédios formavam um prédio único, que pertencia a “T”, mas, mercê de sucessivas partilhas, foi fraccionado em vários prédios mais pequenos que couberam aos diversos herdeiros. 7) O prédio antigo ligava com a Aldeia … através de um caminho particular que ladeava a

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propriedade a norte, seguindo ao longo da extrema do prédio e, sensivelmente a meio, flectia para nascente em direcção ao Monte onde vivia a família do autor o qual, ainda hoje, existe e fica dentro do prédio inscrito na matriz sob os artigos 416 e 417, pertença de duas irmãs do autor.

8) Este caminho é o único acesso que as proprietárias do prédio 416 e 417 têm para sair da sua propriedade para a Aldeia, indo desembocar numa Estrada Nacional.

9) Deste prédio partia outro caminho que, dirigindo-se a nascente, atravessava novamente o prédio do autor, em oblíquo, passando junto de uma construção ali existente, seguindo novamente à extrema do prédio do autor e do inscrito sob o artigo 419.

10) Todos estes caminhos permitiam que se pudesse deslocar dentro do prédio mãe e sair dele, facilitando a execução das tarefas agrícolas.

11) Estando tal prédio vedado com um portão existente junto à povoação.

12) O prédio referido em 1) confronta ainda a sul com o prédio rústico denominado "…", inscrito na matriz predial rústica sob os artigos 126°, 127° e 128°, o qual pertence ao réu “C”.

13) Em meados de Fevereiro de 2002, o réu “B” abriu um novo caminho na propriedade do autor, ligando os dois extremos dos caminhos que a atravessam.

14) Para tanto, sem autorização, entrou com máquinas no prédio do autor e procedeu a obras de escavação e terraplanagem.

15) Retirou terra arável, colocou brita e cascalho e abriu valetas.

16) Deixando cerca de 1.000 m2 do prédio de poder ser usados para fins agrícolas. 17) Por vezes, esse prédio era usado para pastagens.

18) E construiu uma estrada com 6,5 metros de largura e cerca de 140 metros de comprimento. 19) Que permite fazer a ligação entre a Aldeia … e o caminho que liga à Estrada Nacional. 20) A qual foi construída toda dentro da propriedade do autor e de seus filhos.

21) Sendo agora usada por todos quantos nela querem passar.

22) Fazendo com que o prédio do autor deixasse de ter valor comercial. 23) Desde que teve conhecimento destes factos, o autor tem andado muito preocupado e atormentado.

24) Não dorme e come sossegado.

25) Vivendo angustiado com toda esta situação.

26) Em Maio de 2002, o réu “C” vedou a propriedade que possui e abriu um portão com 4,80 metros que deita sobre o terreno do autor.

27) Implantando o portão numa soleira de betão construída em parte sobre o terreno do autor. 28) De forma a aproveitar a estrada construída pelo réu “B” que passa junto à extrema entre os prédios do autor e do réu “C”.

29) Após a construção do muro e portão referidos, ficaram abandonados no terreno do autor brita e outros materiais.

30) O réu tem um acesso directo ao seu terreno pelo lado norte, onde passa um caminho público, e por onde tem uma entrada e esse acesso à via pública faz-se - e a entrada situa-se - num outro prédio do réu, murado em conjunto com o prédio do réu imediatamente confinante com o do autor. APELAÇÃO DO RÉU “B”:

Quanto à alteração da matéria de facto:

Este apelante questiona, em termos genéricos, as respostas (positivas) dadas aos quesitos 1° a 10° e 13° a 15° da base instrutória (conclusão 2a), pretendendo que tais respostas sejam

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flagrante erro na apreciação da prova produzida nos autos. Perguntava-se em tais quesitos o seguinte:

1° (dado como provado): "Em meados de Fevereiro do ano de 2002, o réu “B” abriu um novo caminho na propriedade do autor, ligando os dois estremos dos caminhos que o atravessam?" 2° (dado como provado): "Para tanto, sem autorização, entrou com máquinas no prédio do autor e procedeu a obras de escavação e terraplanagem? "

3° (dado como provado): "Retirou terra arável, colocou brita e cascalho e abriu valetas? " 4° (dado como provado): "Deixando cerca de 1.000 m2 do prédio de poder ser usados para fins agrícolas? "

5° (Em relação ao qual se deu como "provado apenas que, por vezes, esse prédio era usado para pastagens”): "Terreno esse que o autor cedia anualmente a terceiros para pastagens?"

6° (dado como provado): "E construiu uma estrada com 6,5 metros de largura e cerca de 140 metros de comprimento?"

7° (dado como provado): "Que permite fazer a ligação entre a Aldeia … e o caminho que liga à Estrada Nacional? "

8° (dado como provado): "A qual foi construída toda dentro da propriedade do autor e de seus filhos? "

9° (dado como provado): "Sendo agora usada por todos quantos nela querem passar?

10° (dado como provado): "Fazendo com que o prédio do autor deixasse de ter valor comercial?” 13° (dado como provado): "Desde que teve conhecimento destes factos, o autor tem andado muito preocupado e atormentado?”

14° (dado como provado): "Não dorme e come sossegado?”

15° (dado como provado): "Vivendo angustiado com toda esta situação?”

Segundo o apelante, não se justifica que o tribunal "a quo", para responder dessa forma, tenha aceitado sem reservas os 3 depoimentos prestados pelas testemunhas do autor, tendo

desacreditado os depoimentos das testemunhas dos réus, que depuseram de forma segura, isenta e espontânea, revelando ter conhecimento directo e pessoal dos factos.

Ainda segundo o apelante da análise crítica dos depoimentos de todas as testemunhas resulta apurado que o apelante se limitou a reparar o caminho já existente, caminho esse que já existia há 20 ou 30 anos, alargado com a sucessiva passagem de pessoas, e utilizado regularmente pelo público em geral como forma de acesso entre as propriedades agrícolas e a Aldeia da …

Todavia, o certo é que reanalisados os depoimentos das testemunhas ouvidas em julgamento (cuja transcrição integral foi junta aos autos), somos levados a concluir no sentido da inexistência do apontado erro de julgamento.

Está em causa nos autos a abertura de determinado caminho, por parte do réu “B”, que, ligando os extremos de outros dois caminhos já existentes na propriedade do autor (n° 333 - vide planta de fls. 131 e 316) atravessou esta propriedade, junto ao muro construído pelo réu “C” no limite da sua propriedade (nº 127) e onde este construiu um portão que deita directamente para o tal novo caminho.

Segundo o réu apelante ora em causa (“B”), no que é secundado pelo co-réu (que defende mesmo a existência de uma servidão de passagem), nesse local já existia anteriormente um caminho, desde há muitos anos, utilizado pela generalidade das pessoas, que dele necessitavam, tendo-se limitado a arranjar o mesmo.

Ora, conforme se alcança da fundamentação das respostas aos quesitos da base instrutória, o Senhor Juiz "a quo", baseando-se essencialmente nos depoimentos das três testemunhas

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arroladas pelo autor, ao responder aos quesitos ora em causa, acabou por aceitar a tese defendida pelo autor, ou seja, no sentido de que o que foi construído foi um caminho novo.

Com efeito, segundo tal fundamentação, das testemunhas "ganhou relevo o depoimento da testemunha “F”, cabo da GNR, que depôs de forma coerente e isenta ... esclareceu que este caminho, anteriormente, voltava à direita no interior do prédio do autor e era um caminho pequeno, estreito ... que o caminho feito pelo réu “B” era um caminho largo feito em brita ... confirmou, no resto a matéria dada como provada ...

As testemunhas “U” e “S”, irmãs do Autor… confirmaram ... historiando o surgimento do caminho inicial e que, naquele lado, nunca o prédio do réu “C” ali teve um portão ...

Mas também teve por base, para além da planta de fls. 131, das fotografias de fls. 220 a 226 e da cópia do processo camarário de fls. 306 e sgs, a inspecção efectuada, em relação à qual se fez consignar (vide fls. 421) que "para além de um caminho antigo, estreito e em mau estado de conservação com a configuração constante da planta de fls. 3331 (prédio 333 a vermelho) ou seja obliqua à direita de depois novamente à esquerda, foi construído um caminho mais recente

atravessando todo o prédio 333 (o do autor) e contíguo ao prédio 127 (do réu “C”) .... "

Dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo autor (“F”, “U” e “P” resulta efectivamente que o que está em causa é a construção de um caminho novo).

E, de facto, conforme bem se salienta na fundamentação as testemunhas arroladas pelos réus (as demais), enquanto interessados (porque familiares e interessados em diminuir incómodos,

revelaram diversas contradições e insegurança nos depoimentos prestados.

O que resulta inequívoco é que (por maior comodidade) e conforme refere a própria irmã do autor “S”, as pessoas passavam por vezes por uma vereda ai existente, no tempo do Verão, quando não havia nada semeado.

Aliás, são as próprias testemunhas dos réus a referir a existência de outros acessos às

propriedades (inclusivamente, no que se refere à propriedade 127 do réu “C”, no seu extremo direito - conforme aliás bem se alcança da planta de fls. 131 e das próprias fotografias e sem prejuízo do acesso pelo seu outro prédio, n° 126, do lado norte) e que aquele caminho apenas tem o condão de tornar mais fácil e directo o acesso a diversas propriedades.

Ademais, havendo já uma bifurcação de caminhos dentro da propriedade do autor (conforme bem se alcança da planta), não faria sentido que tal propriedade ainda fosse onerada com mais um outro, a juntar os vértices daqueles outros, conforme se verifica com o caminho em causa. Aliás, a justificar-se a existência deste caminho (ao lado do muro limitador do prédio 127, do réu “C”) então o que seria lógico é que em vez dos outros dois houvesse um só, na perpendicular, que fosse desembocar naquele (por forma a permitir uma menor devassa e limitação da propriedade do autor).

Acresce que a menor consideração dos depoimentos das testemunhas arroladas pelos réus, em detrimento das testemunhas arroladas pelo autor, tem a ver com o princípio da livre apreciação das provas e com a própria imediação da prova.

A Relação, atento o disposto no art. 712° do CPC, tem o poder de alterar a decisão proferida na 1ª instância ao nível da fixação da matéria de facto, desde que possa dispor de todos os elementos de prova que serviram de base a tal decisão, designadamente no que se refere aos depoimentos prestados em julgamento.

Todavia, conforme se salienta no preâmbulo do DL 39/95, de 15.12, "a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência, visando apenas a

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detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso".

Nos termos do disposto no art. 655°, nºs 1 e 2 do CPC, o tribunal aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, excepção feita aos casos em que a lei exija determinadas formalidades especiais, sendo ainda que, nos termos do disposto nos arts. 396º e 389º do C. Civil, a força probatória dos depoimentos das testemunhas e da prova pericial é criticamente analisada e livremente apreciada pelo tribunal - daí que a garantia do duplo grau de jurisdição não possa subverter tal princípio da livre apreciação da prova.

Aliás, na formação dessa convicção sempre acabam por entrar determinados elementos,

resultantes da imediação da prova, aos quais a Relação, acedendo à gravação da prova, jamais terá acesso, elementos esses essencialmente relevantes ao nível da credibilidade dos depoimentos prestados.

Refere ainda o apelante que não foi feita prova alguma acerca da desvalorização comercial do prédio do autor (respostas aos quesitos 4° e 5° da base instrutória).

No que se refere à área ocupada pelo caminho (que, necessariamente deixou de ser usada para fins agrícolas) trata-se de matéria que foi comprovada por várias testemunhas, designadamente a testemunha “F” (ao referir-se às medidas) e várias das testemunhas dos réus (designadamente ao referirem a possibilidade de transitarem veículos nos dois sentidos) para além de resultar, em certa medida, das próprias fotografias e plantas juntas aos autos (e até da própria inspecção ao local que foi referida na fundamentação).

Desta forma, e conforme já acima referimos, haveremos de concluir no sentido da inexistência de erro de julgamento que imponha a alteração das respostas dadas aos quesitos da base instrutória, ora em análise.

Improcedem assim, nesta parte, as conclusões do recurso em análise. Quanto à restituição das parcelas ocupadas:

Segundo o apelante “B” não se apurou que ocupasse qualquer parcela de terreno do autor, sendo assim descabida a sua condenação na restituição das parcelas de terreno ocupadas.

Conforme se alcança da sentença recorrida, os réus foram condenados a reconhecer que o prédio em causa é propriedade do autor e seus filhos e a restituir as parcelas que ocupam.

E, para além disso, o réu “B”, ora apelante, foi ainda condenado a desmanchar à sua custa a estrada que construiu (ou a pagar ao autor a quantia a tal necessária).

Ora, em relação ao réu ora apelante, afigura-se-nos que, efectivamente, não está propriamente em causa qualquer tipo de ocupação de uma qualquer parcela.

O que está em causa é tão só a construção ilícita de uma estrada, no prédio do autor, estrada essa utilizada não só pelo autor como por várias outras pessoas.

Assim, aquilo que de alguma forma se poderia entender por ocupação, apenas teria a ver com a utilização da estrada enquanto tal.

Desta forma, na perspectiva da reconstituição da situação anterior ao dano, a que alude o art. 562° do C. Civil (situada no âmbito da obrigação de indemnizar, decorrente da verificação do disposto no art. 483° do C. Civil), afigura-se-nos que apenas faz sentido a condenação do réu ora apelante a desmanchar a estrada que construiu.

Impõe-se assim, efectivamente, a revogação da sentença na parte em que condenou o réu “B”, ora apelante, a restituir ao autor as parcelas ocupadas.

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Procedem assim, nesta parte, as conclusões do recurso em análise. Quanto à obrigação de indemnizar:

Segundo o apelante “B” a sua condenação em indemnização a favor do autor ou da Herança por prejuízos materiais ou danos morais é injusta e indevida por não ter resultado provada a existência de danos.

Todavia, sem razão.

Quanto aos danos materiais (patrimoniais), face à factualidade dada como provada, é evidente a sua verificação.

Com efeito, se se provou que, com a construção do novo caminho, cerca de 1.000 m2 deixaram de ser usados para fins agrícolas e que por vezes o prédio era usado para pastagens - tal só pode significar que com a transformação parcial do prédio em caminho (o qual, pela sua natureza, construído com brita e cascalho, não é passível de utilização para fins agrícolas ou de pastagens) resultaram para o autor prejuízos relacionados com a falta dessa utilização.

O que se constata é o valor de tais danos não foi especificamente dado como provado.

Ora, foi por tal razão que a correspondente indemnização foi fixada (em € 2.500,00) com recurso à equidade (conforme o impõe o art. 566°, n° 3 do C. Civil).

Assim, a nosso ver, a única coisa que o réu ora apelante poderia questionar era o valor da indemnização, valor esse que, não tendo sido questionado se deve ter por intocável.

Quanto aos danos morais (não patrimoniais), resulta igualmente evidente a sua verificação.

Com efeito, resultou provado que, em consequência da construção do caminho, e desde que disso teve conhecimento, o autor tem andado preocupado e atormentado e não dorme nem come

sossegado, vivendo angustiado com toda esta situação.

Ora o certo é que tais consequências (ademais, perfeitamente normais, face à conduta em causa) reflectem só por si, de forma clara, evidente e inquestionável, a existência de danos de natureza não patrimonial.

Assim, também neste âmbito, a única coisa que, a nosso ver, o réu “B” podia questionar era o valor da indemnização fixada (€ 5.000,00), o que também não fez.

Diz ainda este apelante que tendo-se apurado que o caminho foi reparado conjuntamente com outros habitantes da aldeia, a existirem os prejuízos teriam sido causados por todos e não apenas pelo réu.

Trata-se, todavia de uma questão que se situa fora do âmbito do processo.

Se apenas o réu foi demandado (e não também os outros habitantes) apenas ele poderia ser condenado, enquanto sujeito processual.

Por outro lado, nem sequer se trata de matéria dada como provada, nem alegada, cuja omissão, a ser relevante, deveria ter sido objecto de impugnação - o que não foi.

Improcedem assim igualmente nesta parte as conclusões do recurso do réu “B”. APELAÇÃO DO RÉU “C”:

Quanto à alteracão da matéria de facto:

Questiona este apelante as respostas dadas aos quesitos 20 e 22° a 27º - aos quais o tribunal respondeu "não provado", quesitos esses nos quais se perguntava:

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mais de 50 anos, por um novo mais seguro de forma a que os animais que tem não saíssem da sua propriedade? "

22°: "Desde há, pelo menos, 50 anos a esta parte que o prédio do 2° réu, denominado "…" e que é contíguo ao do autor e filhos, está vedado?"

23°: "A passagem pela "…" (feita ininterruptamente desde há 50 anos a esta parte? " 24°: "Já era para tal usada pelos antepossuidores da "…"?

25°: "Tal situação está à vista e é do conhecimento de toda a gente?"

26°: "Sempre ocorreu sem oposição de quem nisso pudesse mostrar interesse?"

27°: "Sempre foi usada com a convicção de que se podia usar dela, por ser a única forma de aceder ao prédio?"

Segundo o apelante "as testemunhas “I”, “J”, “N” e “H”, provaram que: o réu “C” se limitou a

substituir um portão de arame e tábuas, que naquele local existia há mais de 50 anos, por um novo mais seguro de forma a que os animais que tem não saíssem da sua propriedade; desde há, pelo menos, 50 anos a esta parte que o prédio do 2° réu, denominado "…" e que é contíguo ao do autor e filhos, está vedado; a passagem pela "…" é feita ininterruptamente desde há 50 anos a esta parte; já era para tal usada pelos antepossuidores da "…"; tal situação está à vista e é do conhecimento de toda a gente; sempre ocorreu sem oposição de quem nisso pudesse mostrar interesse e que

sempre foi usada com a convicção de que se podia usar dela, por ser a única forma de aceder ao prédio ".

Também em relação a esta matéria (alegada por este réu, na perspectiva de justificar a existência de servidão de passagem) o tribunal se baseou essencialmente nas 3 testemunhas indicadas pelo autor.

Segundo a fundamentação a testemunha “F” confirmou que "os prédios do réu “C” (126 e 127 ... vide fls, 131) foram murados em conjunto e que, antes do muro, esses prédios eram delimitados por uma cerca antiga sem portão ... " e as testemunhas “U” e “S” "confirmaram o essencial do depoimento da testemunha “F”, historiando, além do mais, o surgimento do caminho inicial e que, naquele lado, nunca o prédio do réu “C” ali teve um portão ".

Efectivamente tais testemunhas, que merecerem ao tribunal mais credibilidade, conforme já acima referido (no âmbito da impugnação da matéria de facto por parte do réu “B”) apresentam

depoimentos nesse sentido.

Ora, se o facto de as testemunhas “U” e “S” serem irmãs do autor poderia de alguma forma por em causa a sua credibilidade, o certo é que a testemunha “F” se apresenta de uma forma

objectivamente isenta, sem ser familiar das partes e sem ter qualquer interesse no caminho (como acontece com as testemunhas indicadas pelos réus) para além de ser agente da autoridade e de até ter sido chamado a intervir no local nessa qualidade (por causa da construção do portão ... ). Quanto à existência do caminho, já acima nos pronunciámos, valendo aqui as considerações ali feitas.

Quanto à existência de um portão antigo, as testemunhas dos réus (familiares dos réus ou pessoas interessadas na utilização do caminho - cuja credibilidade foi posta em causa) acabam por também nessa parte, apresentar depoimentos imprecisos e de alguma forma contraditórios ... sobre o tipo de vedação ou parede existente (na estrema com o prédio do autor) e sobre a existência do portão. A testemunha “I” (que é filho do réu “C”!!!) refere que havia lá uma passagem (leia-se portão) igual ao que estava, mas não em alvenaria mas também refere que havia uma vedação em paus e arame e uma parede em taipa que ia caindo.

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A testemunha “J”, para além de referir que aquilo era um "sesmo", ou seja, terra de ninguém,

referiu que "aquilo sempre teve uma parede, umas pedras, umas albardas em lenha, com feixas .. " e quando lhe foi perguntado se entrava e saía por um portãozinho que lá havia, disse "não aquilo estava a tapar um, aquilo eram feixas e volta uma albardazita e então punha ali umas feixas a tapar a passagem para não entrarem, os animais não entrarem lá dentro".

A testemunha “N” fala também da existência de umas "feixas" e diz que não havia nenhuma parede e que o portão se fez onde estava o sítio das "feixas".

Por sua vez, a testemunha “H” refere que a passagem para aquela propriedade, "que era

propriedade do meu tio … era sempre pelo meio, à ponta da parede, que era um parede de taipa ... ".

Para além de tudo isto, haverá que ter em consideração o que já cima se consignou acerca da possibilidade de alteração da matéria de facto, por parte da Relação, apenas em situações de manifesto erro, e bem assim acerca da livre apreciação da prova e da relevância, nessa perspectiva, da imediação da prova.

Haveremos assim de concluir no sentido de, também em relação aos quesitos da base instrutória objecto da impugnação de que ora nos ocupamos, não se verificar a existência do invocado erro de julgamento.

Improcedem assim, nesta parte, as conclusões do recurso - e daí que a matéria de facto dada como provada na 1ª instância de deva ter por definitivamente fixada.

Quanto à nulidade da sentença:

Segundo o apelante “C” verifica-se a nulidade da sentença, a que alude o art. 668°, n° 1, al. c) do CPC, nulidade essa decorrente da oposição não só entre os fundamentos entre si como entre estes e a decisão.

Com efeito, segundo o mesmo se o Tribunal dá como provada a abertura do portão que deita para a propriedade do autor, ao não dar como provado que o recorrente não faz uso desse mesmo portão e, como tal, se o mesmo não é utilizado (sendo que configure uma mera decoração), não tem porquê proceder, contra este réu, o primeiro pedido do autor.

Todavia, sem razão.

A condenação deste réu a desmanchar à sua conta o portão e soleira que edificou no prédio, em face do pedido contra o mesmo formulado pelo autor, assentou não na utilização ou não utilização do portão mas sim na ilicitude da sua própria existência, pelo facto de se considerar que este deita directamente para a propriedade do autor (tendo-se inclusivamente provado que a soleira de betão foi construída em parte sobre o terreno do autor).

E isto, na pressuposição, alicerçada na factualidade dada como provada, de que o caminho em causa nos autos, para o qual o portão deita, foi construído ilicitamente em terreno do autor pelo réu “B”, inexistindo anteriormente nesse local qualquer caminho ou servidão de passagem.

O que se perguntava nos quesitos cujas respostas foram objecto de impugnação pelo ora apelante (acima referidos) era se já existia ou não anteriormente no mesmo local, um outro portão, inserido na invocada servidão de passagem.

Ora essa foi a tese que o tribunal considerou como não provada, sendo inequívoca a existência do actual portão, portão este que, conforme já referido, independentemente da sua utilização ou não (sendo aliás de presumir a sua utilização juntamente com o novo caminho construído pelo réu “B”), pelo facto de deitar directamente para o prédio do autor, viola o disposto no n° 1 do art. 1360° do C. Civil, nos termos do qual "o proprietário que no seu prédio levantar edifício ou outra construção

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não pode abrir nela janelas ou portas que deitem directamente sobre o prédio vizinho sem deixar entre este e cada uma das obras o intervalo de metro e meio.

E daí que a condenação do réu ora apelante a desmanchar o portão e a soleira, se mostre inteiramente fundada.

Inexiste assim a apontada contradição e, consequentemente, a invocada nulidade. Quanto à existência da servidão de passagem:

Conforme referido no relatório supra, o réu ora apelante (de que ora nos ocupamos) invocou a existência de uma servidão de passagem, constituída por usucapião (com referência ao caminho e portão em causa nos autos), de que beneficiaria o seu prédio rústico com o artigo matricial n° 127. Diz agora que a sentença se, por um lado, admite que se trata de um prédio encravado, por outro considera que o mesmo não tem qualquer direito a servidão de passagem e que a circunstância de o apelante ter adquirido posteriormente o prédio 126°, contíguo àquele e que tem ligação directa à via pública pelo lado oposto (sendo quem, apesar de tal não ter sido dado como provado existem nos autos elementos documentais suficientes sobre as respectivas datas de aquisição) não obsta a que se tenha constituído a servidão de passagem por usucapião.

Todavia o certo é que o facto de um prédio se encontrar encravado não implica só por si que tenha sido constituída uma qualquer servidão de passagem.

O facto de o prédio estar encravado apenas dá ao respectivo proprietário o direito de exigir a constituição de servidão de passagem.

E até pode acontecer que este não precise sequer da sua constituição - podendo muito bem

acontecer (designadamente pelo tipo de fruição ou exploração ou não do prédio) que o proprietário do prédio encravado não precise de qualquer passagem em concreto (podendo não precisar mais do que o mero acesso a pé) podendo até ter acesso através de várias propriedades confinantes e de forma aleatória, sem constituição de uma passagem propriamente dita.

Aliás, o réu, que se limitou a invocar a existência da servidão de passagem (mera defesa por excepção), não só não pediu expressamente o reconhecimento da mesma como não pediu a sua constituição.

Por outro lado, o facto de a aquisição do prédio com o artigo matricial n° 126 ser posterior (o que efectivamente não se mostra provado) nada tem de relevante para os efeitos pretendidos (isto sendo certo que, tendo o réu acesso à via pública através de um outro seu prédio, sempre lhes estaria vedado exigir passagem a qualquer outro confinante).

Com efeito, podia muito bem acontecer que, precisando o réu de acesso e não tendo ainda

adquirido o prédio n° 126, até fosse este o prédio em melhores condições para ceder a passagem, da mesma forma que tal sempre poderia acontecer em relação a um qualquer outro confinante (aspectos estes que não foram sequer trazidos aos autos).

Assim, face à prova feita sobre a anterior inexistência do caminho em causa e face à falta de prova relativa à factualidade alegada na perspectiva da existência da invocada servidão de passagem, a outra conclusão se não poderia chegar na sentença que não fosse a de considerar tal servidão como não provada e, assim sendo, como inexistente.

Improcedem assim, igualmente nesta parte, as conclusões do recurso de que ora nos ocupamos. Quanto à restituição de parcelas:

A exemplo do outro réu (vide questão acima tratada) também o réu “C”, ora apelante, veio

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(na parte decisória) não especifica quais as parcelas concretamente ocupadas cuja restituição se impunha fazer.

E desde já se diga que, na perspectiva da utilização do caminho propriamente dita, valem aqui inteiramente as considerações acima feitas, a propósito, da mesma questão já apreciada no âmbito da apelação do co-réu.

É certo que, independentemente da estrada propriamente dita, resultou concretamente provado que o réu “C” implantou o portão numa soleira de betão, a qual foi construída em parte sobre o terreno do autor.

Assim, em relação a esta parte (em que a soleira foi construída dentro do prédio do autor) sempre e poderia falar, em certo sentido, em ocupação.

Todavia, o certo é que o mesmo réu (em conformidade com o peticionado) foi ainda condenado a desmanchar à sua custa, para além do portão, a soleira que edificou no prédio (entenda-se ... prédio do autor).

Desta forma afigura-se-nos que esta condenação se afigura de todo suficiente para efeitos da reconstituição da situação anterior ao dano, não fazendo sentido manter-se, em simultâneo, a condenação do réu na restituição da parcelas.

Impõe-se assim nesta parte (condenação na restituição de parcelas), também quanto a este réu, a revogação da sentença (sem que todavia, neste âmbito, face ao já acima referido se possa

considerar haver nulidade resultante da total falta de fundamentação, conforme refere o apelante). Procedem assim, nesta parte, as conclusões do presente recurso.

Quanto à obrigação de indemnizar:

Conforme já acima referido os réus foram solidariamente condenados a pagar ao autor uma indemnização de € 5.000,00 por danos morais.

Todavia, segundo o apelante “C”, o mesmo foi condenado a pagar tal indemnização, por danos alegadamente sofridos pelo autor, sendo certo que não são alegados nem dados como provados quaisquer danos provocados pelo aqui recorrente com a colocação do portão e reparação do muro. Efectivamente, analisada a matéria de facto, facilmente se concluirá no sentido de neste aspecto assistir inteira razão ao ora apelante.

Com efeito, conforme se alcança da factualidade dada como provada, acima enunciada, os danos de natureza patrimonial, consubstanciados nos factos mencionados em 23) a 25) supra ("Desde que teve conhecimento destes factos, o autor tem andado muito preocupado e atormentado, não dorme e come sossegado, vivendo angustiado com toda esta situação") apenas se referem à construção da estrada e ao seu uso por todos quantos nela querem passar, ou seja são mera consequência da conduta do réu “B”.

Na sequência e com relação à apurada conduta do réu “C” (referente à construção do portão) nada mais se deu como provado, em termos de danos ou prejuízos concretos, fossem de que ordem fossem.

Desta forma, inexiste fundamento para que também o réu “C”, ora apelante, pudesse ser condenado a tal título - impondo-se, também nessa parte, a revogação da sentença. Procedem assim, também nesta parte, as conclusões do presente recurso.

Termos em que, concedendo-se parcial provimento a ambas as apelações, se acorda:

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ao autor as parcelas que ocupam, julgando nessa parte improcedente a acção e absolvendo ambos os réus de tal pedido;

b) E em revogar a sentença recorrida na parte em que (em regime de solidariedade) condenou o réu apelante “C” a pagar ao autor a quantia de € 5.000,00 a título de danos morais, e respectivos juros de mora, julgando nessa parte igualmente improcedente a acção e absolvendo tal réu deste pedido;

c) No mais se confirmando a sentença recorrida.

As custas relativas à apelação do réu “B” serão suportadas por este (na proporção de 9/10) e pelo autor apelado (na proporção de 1/10).

As custas relativas à apelação do réu “C” serão suportadas por este (na proporção de 8/10) e pelo autor apelado (na proporção de 2/10).

Évora, :31 de Maio de 2007

Referências

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