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Cosmopolíticas evangélico-progressistas no Nordeste: Novas teologias como entidades que abrem novos espaços de práticas comunitárias e rituais.

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Academic year: 2021

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20º Congresso Brasileiro de Sociologia 12 a 17 de julho de 2021

UFPA – Belém, PA CP22 - Sociologia da religião

Cosmopolíticas evangélico-progressistas no Nordeste:

Novas teologias como entidades que abrem novos espaços de

práticas comunitárias e rituais.

Andréa Laís Barros Santos1, PPGCS UFBA

Resumo: O meu objetivo neste trabalho é tratar da emergência de novas teologias

e espaços de práticas comunitárias e rituais entre evangélicos progressistas a partir do Nordeste do Brasil, sob uma perspectiva cosmopolítica. A Aliança de Batistas do Brasil será mobilizada como experiência prática de lideranças religiosas e comunidades de fé. Portanto, uma pergunta guiará nossa investigação: Quais entidades estão surgindo em termos cosmopolíticos? Neste trabalho, apresento como objetivos: 1. Tratar do processo de emergência de novas teologias entre evangélicos progressistas: Teologias Feministas e Teologias Negras; 2. Propor um recorte histórico sobre os evangélicos progressistas no Nordeste; 3. Trazer a experiência prática da Alianças de Batistas do Brasil a partir da atuação do Fórum de Gênero, Fórum de Juventude e do Fórum de Negritude; e 4. Apresentar as novas hermenêuticas bíblicas e práticas comunitárias e rituais como vínculos produzidos pelas novas entidades que povoam o mundo evangélico progressista. Para isto, estou trabalhando com entrevistas de lideranças da ABB, a partir de relatos de memórias de encontros que participei, também com documentos oficiais, cartas e e-mails informais de arquivos pessoais e dos entrevistados, e em função do distanciamento exigido pela pandemia, optei por realizar etnografias de “lives” dos encontros virtuais da Aliança de Batistas realizadas entre 2020 e 2021.

Palavras-chave: Evangélicos; Evangélicos Progressistas; Cosmopolíticas; Aliança

de Batistas do Brasil.

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Introdução

Em nome do Deus de todos os nomes, Javé, Obatalá, Olorum, Oió. Em nome do Deus Mãe e Pai, que a todos e todas, nos faz da ternura e do pó. Em nome do Deus Mãe e Pai, que fez toda carne, a preta e a branca, vermelhas no sangue. Em nome do Deus Mãe e Pai, que amou-nos primeiro sem dividição. Em nome do Povo que espera, na graça da Fé, à voz do Xangô, o Quilombo-Páscoa que o libertará. Em nome do Povo sempre deportado pelas brancas velas no exílio dos mares, marginalizado nos cais, nas favelas e até nos altares. Em nome do Povo que constrói espaços de vida e libertação que celebra a vida em sua integridade e diversidade, que se reconcilia na beleza e na profundidade do Mistério imponderável. E se religam na irmandade das religiões.

Esta oração comunitária é uma adaptação da música “Em nome do deus” de Milton Nascimento, e foi realizada na Liturgia Inter-religiosa e Homenagem ao

Pastor Djalma Torres no I Encontro de Formação da Aliança de Batistas do Brasil,

em 2013, em Feira de Santana. O Pr. Djalma Torres, da Comunidade de Antioquia em Salvador, Pr. Jorge Nery, da Comunidade de Jesus em Feira de Santana e a Ialorixá Antonieta de Oxum, do Terreiro Ilê Omi Odô em Salvador, foram os celebrantes deste culto-ritual. Estavam presentes grupos das principais igrejas fundadoras e filiadas à ABB naquela ocasião: Igreja Batista do Pinheiro em Maceió - AL, Primeira Igreja de Bultrins em Olinda – PE, Igreja Batista Nazareth em Salvador e Comunidade de Jesus em Feira de Santana - BA.

Neste ritual inter-religioso com sua grande maioria de evangélicos batistas e a presença da Ialorixá Antonieta de Oxum, foram cantadas a “Oração de São Francisco” e a canção popular “É D´Oxum”. A Ialorixá ficou responsável pela mensagem daquela noite e tenho lembranças fragmentadas que pregou sobre o amor e acionou a figura de Jesus como exemplo a ser seguido. Muitos dos presentes que nunca tinham tido contato com religiosos de matriz africana repercutiram ao final do culto como estavam surpresos com a mensagem, porque não imaginavam que uma Ialorixá proporia uma reflexão a partir da figura de Jesus.

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As canções congregacionais2 escolhidas para a liturgia reforçavam um senso

comunitário de cooperação, acolhimento e diálogo3.

Naquele ano a ABB estava sob a presidência da sua primeira gestão feminina, a Pra. Odja Barros4. Não foi um encontro somente de lideranças religiosas

e pastores, cada igreja levou um grupo representativo de suas comunidades locais.

Eram mulheres, homens, jovens, velhos e crianças5, moradores de periferias, de

bairros populares e pessoas de classe média, moradores de regiões de alto prestígio social em suas capitais, de diferentes profissões e grau de escolarização formal. Todos hospedados em uma pousada por 2 dias e participando ativamente das atividades propostas. Foram momentos de conflitos e consensos, com alguns desencontros e resistências a experiências rituais e reflexivas propostas no evento.

O encontro de formação tinha como tema “Política, sexualidade e teologia:

a formação de uma nova juventude” e as mesas de discussão foram

respectivamente intituladas: 1. “Teologia e Música Popular”; 2. “Teologia, Sexualidade e Juventude”; e 3. “Teologia, política e juventude. Os conflitos

gravitaram em torno das diferenças dos grupos de cada igreja local6, que tinham

níveis de afinidade distintos com os debates das teologias feministas e queers, divergências sobre pautas de comportamentos e, sobretudo, resistências ao exercício do diálogo inter-religioso, sobretudo com a aproximação com religiosos da umbanda e do candomblé.

A liturgia inter-religiosa do culto de encerramento permitiu uma outra experiência prática ritual ao alargar as presenças e admitir a participação de múltiplas entidades no espaço religioso, provocando a abertura de novos espaços rituais e comunitários. Uma feitura laboriosa que envolve movimentos de estranhamentos e aproximações entre os espaços abertos no processo de instauração de teologias emergentes. É sobre esses processos que pretendo me debruçar, e empreender um esforço compreensivo para esclarecer como estão se dando essas mudanças.

2 São canções entoadas comunitariamente nos momentos de culto. 3 “Baião das Comunidades” e “Momento Novo”.

4 Odja Barros é pastora e teóloga feminista. Trabalha na Igreja Batista do Pinheiro desde 1993, e foi ordenada

pastora em 2002. É doutora em teologia, com ênfase em hermenêutica bíblica feminista pela EST.

5 Não saberia precisar a quantidade de pessoas que estavam no encontro e o percentual desses grupos. 6 Os aspectos que compõe essas divergências internas serão retomados de forma mais detida no capítulo 3,

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Entre autocríticas, experiências religiosas e novas epistemologias de pesquisa

Há algum tempo estou interessada em compreender a articulação de evangélicos progressistas7 no Nordeste, especialmente a efervescência desses

grupos no decorrer da primeira década dos anos 2000. Eu era uma pré-adolescente, filha de pastores de uma igreja que se auto intitulava progressista em Maceió, Alagoas quando comecei a frequentar eventos e encontros com lideranças religiosas e comunidades de todo o Nordeste para discutir e refletir sobre as heranças e limites da Teologia da Libertação, sobre pedagogias e metodologias de formação de igrejas engajadas socialmente, os rumos dos progressismos no Brasil, dentre tantas outras palestras e conversas que atravessavam esses encontros. Lembro que eu gostava de me sentir parte daquele movimento, me sentir vinculada com aquelas pessoas, mesmo sem compreender bem quais eram os limites afetivos e religiosos que mantinham aquelas ligações, por vezes me sentia em uma reunião de movimento social, outras numa grande reunião de família, com participação de todos os parentes distantes possíveis, os afetos estavam sempre borrados no meio dos vínculos religiosos.

Quando iniciei minha trajetória acadêmica não tinha outra coisa que me motivava tanto a pensar, queria compreender os processos dos aprendizados religiosos, éticos e políticos que eu recebi através dos meus pais, da igreja que eu cresci e de tantas pessoas que me rodeavam. Me recordo que durante a graduação o primeiro trabalho que realizei se intitulava “Mundo social popular como ética

religiosa em Alagoas”. Um dos aspectos fundamentais que norteavam minha

pesquisa era buscar entender como se constroem as crenças, visões de mundo ou propriamente uma proposta ética que sustentam as práticas religiosas das lideranças comunitárias progressistas.

7 Progressistas é um termo proposto pelo sociólogo e bispo anglicano Robinson Cavalcante em seu livro

“Cristianismo e Política: Teoria Bíblica e Prática Histórica” em 1985 para denominar um grupo de protestantes que estavam engajados nos debates sociais e políticos no país e se posicionaram contra a ditadura e a favor dos direitos humanos no Brasil. O livro parte do problema da ausência protestante na atuação política e da construção da afirmação de que todos somos políticos. O termo se popularizou nas décadas seguintes e passou a ser um dos rótulos de autodenominação de igrejas e lideranças protestantes engajadas social e politicamente. Portanto, considero uma missão difícil nomear e conceituar esse grupo de evangélicos, alguns preferem serem reconhecidos como evangélicos de esquerda ou como adeptos da teologia da libertação.

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No decorrer da minha pesquisa de mestrado8, interessada nas

transformações da comunidade em que cresci, passei a observar um processo de reconfiguração dos sensos de pertencimento de gênero que a Igreja Batista do Pinheiro atravessou nas últimas décadas a partir de um movimento feminista de

leitura e hermenêutica bíblica, o Grupo Flor de Manacá9, e através da discussão

sobre a aceitação de pessoas LGBTQIA+ como membresia plena da igreja, o que

redundou numa decisão10 formal em assembleia regular pela equidade de direito

de todas as pessoas, e na posterior exclusão11 da IBP e dos seus pastores12 da

Convenção Batista Brasileira e da Ordem de Pastores Batistas do Brasil, respectivamente.

Nessas trajetórias de pesquisa caminhei por diversas perspectivas teóricas e realizei diferentes esforços compreensivos, desde trajetórias de racionalização ética religiosa, passando pelas economias simbólicas das trocas religiosas, mercado de concorrências entre ofertas e demandas de serviços religiosos até processos de reconfiguração de balanças de poder entre homens e mulheres, passeando por Max Weber, Pierre Bourdieu e Norbert Elias substancialmente. Portanto, antes de seguir com as reflexões que me proponho a desenvolver neste trabalho, sinto a necessidade de olhar para trás e questionar algumas dessas escolhas anteriores.

A missão obstinada em que me envolvi para desvelar os jogos

desinteressados e as lutas concorrenciais “escondidas” como camadas submersas

às narrativas religiosas e de fé me levou a cair na armadilha do autoengano bourdiesiano. Numa postura um tanto quanto academicamente arrogante, me coloquei no lugar de pesquisadora com inserção privilegiada, me sentindo quase

8 Dissertação defendida em 2017 no PPGS UFAL e intitulada “As fronteiras mutantes do pecado:

Informalização erótico-religiosa, formação pastoral e o batismo de homossexuais na Igreja Batista do Pinheiro”.

9 “A semente de onde floresceu o Grupo Flor de Manacá foi um grupo de estudo bíblico, formado em 2006,

inicialmente denominado Grupo Bíblia e Gênero. Na origem da formação desse grupo, estava a minha experiência pessoal e pastoral com a Leitura Popular e Feminista na comunidade IBP. Foi esse grupo que deu origem ao que veio se tornar o Grupo Flor de Manacá”. (SANTOS, Odja Barros. Flores que rompem raízes: Leitura popular e feminista da Bíblia, p. 149).

10 A decisão aconteceu em fevereiro de 2016, numa assembleia regular da Igreja Batista do Pinheiro.

11 A exclusão da IBP da Convenção Batista Brasileira foi oficializada em julho de 2016, o processo de exclusão

mais curto da história da CBB.

12 Meu pai, Wellington Santos, é pastor-presidente da IBP desde 1993 e minha mãe, Odja Barros, é educadora

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uma detetive em filmes policiais, responsável em desvelar os segredos e expor os “reais” motivos e motivações de determinados discursos e tomadas de posição religiosa, dos líderes ou instituições que estava estudando. As tentativas de utilizar

conceitos economicistas13 para analisar trocas simbólicas e fenômenos religiosos

foi frustrada e injusta em alguma medida, tentei encaixar narrativas e experiências de fé em uma fórmula redutora que articulava e media como numa equação interesses, posições e afetos.

É preciso fazer essa mea-culpa para retomar minhas reflexões e apresentar os caminhos que escolho a partir de agora. Do autoengano bourdieasiano ao levar a sério proposto por Bruno Latour. Parto desta autocritica para apresentar um primeiro fundamento deste trabalho, levar a sério as experiências das pessoas com quem conversei, as reuniões que etnografei, as instituições que estou me propondo a analisar.

Para alargar o chão deste fundamento, recorro a proposta epistemológica feminista de “Saberes Localizados” de Donna Haraway que defenda a produção de conhecimento a partir de uma perspectiva corporificada e localizada, que assume suas parcialidades e se compromete com o respeito a vida das pessoas.

Estou argumentando a favor de políticas e epistemologias de alocação, posicionamento e situação nas quais parcialidade e não universalidade é a condição de ser ouvido nas propostas a fazer de conhecimento racional. São propostas a respeito da vida das pessoas; a visão desde um corpo, sempre um corpo complexo, contraditório, estruturante e estruturado, versus a visão de cima, de lugar nenhum, do simplismo. (Haraway, 1995, p.30)

Partir dessas “políticas e epistemologias de alocação” significa escrever um trabalho assumindo as ambivalências de uma “visão parcial e voz limitada” e defendendo esta posição como potência interpretativa. Romper com uma tradição sedutora que prega uma sociologia feita a partir de “visões de cima” é meu compromisso nesse trabalho. Assumir uma epistemologia feminista com o auxílio de Donna Haraway vai me ajudar neste exercício.

Não buscamos os saberes comandados pelo falogocentrismo (saudades da presença da Palavra única e verdadeira) e pela visão incorpórea, mas aqueles comandados pela visão parcial e pela voz limitada. Não

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perseguimos a parcialidade em si mesma, mas pelas possibilidades de conexões e aberturas inesperadas que o conhecimento situado oferece. O único modo de encontrar uma visão mais ampla é estando em algum lugar em particular. A questão da ciência para o feminismo diz respeito à objetividade como racionalidade posicionada. Suas imagens não são produtos da escapatória ou da transcendência de limites, isto é, visões de cima, mas sim a junção de visões parciais e de vozes vacilantes numa posição coletiva de sujeito que promete uma visão de meios de corporificação finita continuada, de viver dentro de limites e contradições, isto é, visões desde algum lugar. (Haraway, 1995, p.33 e 34)

Outro encontro que contribuiu para reposicionar minha pesquisa foi durante a experiência do doutorado e a aproximação com minha orientadora Prof.ª Miriam Rabelo. Através dos seus trabalhos, pesquisas e grupos de estudo com outros pesquisadores dos estudos afrorreligiosos, tive a oportunidade de conhecer outras perspectivas teóricas e epistemológicas dos estudos da religião. Inicialmente, apesar de achar interessante, não via como absolver essas perspectivas nas minhas construções analíticas, até que resolvi me aventurar. Não é comum encontrar trabalhos sobre experiências cristãs, sobretudo entre sociólogos do protestantismo e de grupos evangélicos “tradicionais”, que levem em conta os vínculos dos crentes com suas entidades, ou com os seus objetos sagrados e rituais. Com exceção de trabalhos antropológicos sobre experiências evangélicas pentecostais ou neopentecostais em seus diálogos com entidades afro religiosas que inauguram e propõe essas aproximações (Birman, 199614; Almeida, 200915;

Bianchetti, 201116).

Em Bourdieu o ator é humano e o campo relacional é mediado pela luta entre sujeitos, lutando pelo controle do capital em seus respectivos campos. Um campo redutível a um princípio, onde as únicas entidades que agem são os humanos. Portanto, a partir destes encontros com outras perspectivas fui me dando conta como não seria possível levar a sério as experiências de fé e as práticas religiosas dos meus interlocutores, sem que eu me arrisque num exercício de ampliação das presenças e multiplicação das entidades que existem e interferem nos espaços religiosos que estou estudando. Os grupos protestantes não se encontram fora

14 BIRMAN, Patrícia. Cultos de possessão no pentecostalismo no Brasil: passagens. In: Religião e Sociedade,

ISER vol. 17, nº1-2, Rio de Janeiro, 1996, pp. 90-109.

15 ALMEIDA, Ronaldo. A Igreja Universal e seus demônios: um estudo etnográfico. São Paulo: FAPESP, Ed.

Terceiro Nome, 2009.

16 BIANCHETTI, Thiago Angelin Lemos. Entidades e rituais em trânsito simbólico: uma análise dos exus no

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destas experiências, nem mesmo os evangélicos progressistas. Desta forma, gostaria de demarcar a multiplicação das presenças e das entidades e considerar os vínculos produzidos entre humanos e não-humanos como outro fundamento deste trabalho.

Por que vale a pena pensar numa perspectiva compolítica?

Para nos auxiliar neste exercício compreensivo farei um diálogo com a proposta cosmopolítica de Isabelle Stengers, e com os desdobramentos e

conversas de Bruno Latour com a autora. Os textos “Quais cosmos? Quais

cosmopolíticas?” de Latour e “The challenge of ontological politics” de Stengers vão

nos ajudar a construir o fundamento de multiplicação das presenças, importante para o argumento deste trabalho.

Como explicitei no tópico anterior, um dos objetivos desse trabalho é ampliar as presenças e mediações das nossas interpretações sobre experiências de fé evangélicas e progressistas. Desmonopolizando o lugar do ator humano, para democratizar os espaços religiosos que são construídos por crentes, entidades, objetos sagrados, compromissos, rituais, etc. De outra forma, não é possível deixar de fora da compreensão das experiências religiosas as entidades com quem os humanos estão vinculados e comprometidos, é preciso admitir todas as negociações em volta da mesa para que seja possível acordos de paz que deem conta de “todas as problemáticas de uma política” referidas ao cosmos em construção. Latour (2018) explica “Mas se o cosmos designa tudo que é, ele deve então ser expandido, conforme seu sentido literal, ao conjunto das entidades não

humanas que participam nas ações humanas”17.

Mais uma vez, não há cosmos no seu cosmopolitismo: parece não suspeitar do fato de que os homens sempre se consideraram menos importantes do que a vasta população de divindades ou entidades mais ou menos transcendentais que lhes dão a vida. Para muitas pessoas, em muitos lugares, durante séculos, os homens possuem “proprietários”, para retomar os termos de Tobie Nathan; e proprietários exercem ascendência sobre os homens a todo custo. (Latour, 2018, p. 434)

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Partir desta perspectiva opera mudanças significativas nas formas de olharmos e interpretarmos as experiências de fé e religiosas. Esta premissa precisa nos levar a perceber o mundo comum como resultado de um processo trabalhoso que implica engajamento, onde os envolvidos estejam dedicados na criação e construção deste mundo comum. Segundo Stengers, quanto mais a definição de um acordo é laboriosa, melhor é a sua qualidade.

Portanto, gostaria de propor a superação da percepção de existência de um “cosmo único” evangélico que é povoado pelas mesmas entidades e mobilizado pelos mesmos vínculos, para passar a compreender a heterogeneidade dos evangélicos, que é consenso sociológico, para além das diferenças das suas visões de mundo e “crenças”. Esclarecer que evangélicos não compartilham o mesmo cosmos e não estão implicados com as mesmas políticas é premissa fundamental para a feitura de uma proposta de paz mais sólida.

A partir desta compreensão rompemos com a perspectiva naturalista de “cosmo único” e aceitamos o convite de Latour que propõe colocarmos o “cosmos em jogo”. Desta forma, partimos da constatação da heterogeneidade dos evangélicos para pensarmos o desaparecimento desse “cosmo único” e a construção de cosmopolíticas evangélicas.

Latour (2018) afirma que “uma proposta de paz não faz sentido se não levar em consideração a medida dos conflitos que ela poderá vir a resolver18” e nos

convida a levar em consideração as dissidências, também em relação ao cosmos em que os homens vivem.

A proposta cosmopolítica nos desafia a pensar em outros termos, sobretudo

propondo uma alternativa de compreensão dos conflitos como “guerras

cosmopolíticas”, que envolvem a disputa não somente por visões de mundo divergentes. Se tratam de conflitos entre mundos em se fazendo, povoados por vínculos, suas entidades e as diferentes mediações. Parte da premissa de mundos plurais que estão em confronto enquanto se constroem, se refazem, se criam a partir dos vínculos que importam e promovem engajamento. Latour (2018) afirma que Isabelle Stengers “reinventou o termo apresentando-o como um compósito do significado mais forte de cosmos e de política”19.

18 Latour (2018), p. 428. 19 Latour (2018), p.432.

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A presença do cosmos nas cosmopolíticas resiste à tendência da política em conceber as trocas em um círculo exclusivamente humano. A presença do político nas cosmopolíticas resiste à tendência do cosmos em conceber uma lista finita de entidades que devem ser levadas em consideração. O cosmos previne o encerramento prematuro do político, assim como o político em relação ao cosmos. (LATOUR, 2018, p. 432)

Portanto, gostaria de lançar mão desses conceitos para continuar respondendo no desenvolver deste trabalho: Por que vale a pena pensar numa

perspectiva cosmopolítica? Quais possibilidades analíticas estão sendo abertas

quando eu adoto essa perspectiva? Ou de outra forma, o que eu estou ganhando? Muito tem se falado sobre as entidades, vínculos e mediações em experiências de fé evangélico-pentecostais e neopentecostais. Todavia, meu intuito aqui é falar sobre cosmos não tão populares, que não tem espaços de divulgação nos canais das grandes mídias, mas também não estão sendo amplamente discutidos nos nossos GTs de religião e congressos de ciências sociais: as cosmopolíticas de grupos evangélicos progressistas.

Em um cenário nacional de maior visibilidade e legitimidade dos discursos conservadores e levantes de grupos religiosos fundamentalistas e negacionistas, é preciso falar sobre as experiências de grupos religiosos que se contrapõe às narrativas de fé como dispositivo opressor e excludente, que recuperam as narrativas sagradas de libertação dos povos oprimidos na história da humanidade.

“Comprometimento com uma causa pela qual se vive e pela qual se pode morrer”: Sobre as cosmopolíticas evangélico-progressistas e suas experiências de fé.

Isabelle Stengers em “The challenge of ontological politics” afirma que ontologia é questão de comprometimento, propõe ontologia não como concepção de mundo, mas como engajamento por e com o mundo a que se está vinculado e se precisa honrar. Aborda esta dimensão ético-política “como comprometimento com uma causa pela qual se vive e pela qual se pode morrer” e nos coloca a seguinte pergunta: “Por quais engajamentos podemos nos imaginar morrendo?”.

Gostaria de partir desta pergunta para desenhar os primeiros traços do que estou chamando aqui de “cosmopolíticas evangélico-progressistas”. O que pretendo não é reconstruir o processo de formação histórica dos evangélicos

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progressistas no Brasil ou dar conta dos movimentos progressistas a partir do Nordeste, mas apresentar retratos desse cosmos que nos ajude a elucidar sobre quem estamos falando e quais as perguntas que vamos perseguir no trajeto deste trabalho. A experiência que desagua na organização da Aliança de Batistas do Brasil em 2005 e alguns desdobramentos e eventos nesses 15 anos da instituição será nosso ponto de partida para o recorte metodológico.

É possível recorrer a muitos trabalhos nas ciências sociais, na história ou na própria teologia que dissertam sobre as origens sócio-históricas-religiosas do Cristianismo da Libertação no Brasil e na América Latina, refletindo os contextos nacionais de ditadura militar e os acentuados índices de desigualdades sociais e violências. É consenso afirmar o berço da esquerda católica, disseminado em diferentes contextos no mundo, e os seus desdobramentos na América Latina que fazem emergir uma proposta teológica com sangue latino, a Teologia da Libertação, que nasce a partir da experiência de grupos cristãos católicos, e depois de espalha para alguns nichos protestantes. A história de muitos movimentos sociais e partidos de esquerda importantes no Brasil está misturada a história de grupos religiosos adeptos à TL. Apesar do grupo ser minoritário frente a maioria protestante, é preciso visibilizar essas experiências. Mesmo que atualmente, com a ascensão evangélica das últimas décadas, essa configuração só tenha sido acentuada com os evangélicos fundamentalistas ultraconservadores performando o “rosto” do evangélico brasileiro.

Raimundo Barreto em seu livro “Evangélicos e pobreza no Brasil” definiu este grupo como adepto de “um cristianismo evangélico socialmente progressista”:

“um cristianismo evangélico socialmente progressista, que combina uma espiritualidade carismática com uma ação sociopolítica de orientação progressista e democrática, tornando-se assim o fundamento para uma ética social capaz de orientar a transformação substantiva e positiva nos níveis pessoal e social da existência, principalmente das pessoas e comunidades vulnerabilizadas.” (BARRETO JR, p. 22)

A proposição desta “ética social capaz de orientar a transformação substantiva e positiva nos níveis pessoal e social da existência” me levou a acessar memórias da minha experiência pessoal e trajetória religiosa, que permite mediar e continuar o diálogo com Stengers quando descreve as causas que nos mobilizam e nos engajam a ponto de valer a vida.

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Eu como religiosa que cresci dentro de uma igreja evangélica progressista, me perguntei sobre qual o vínculo fundamental para nós, que nos compromete e engaja primeiro, dentre tantos vínculos que consigo visualizar, qual o ponto de

partida? Logo me veio Jesus de Nazaré20 como vínculo fundamental que mobiliza

os comprometidos com esse cosmos. O Jesus dos pobres, que nasceu numa “periferia” e subverteu as leis judaicas priorizando a vida das pessoas, denunciou e foi de encontro ao poder hegemônico religioso e econômico da sua época, é a causa que engaja e reúne os evangélicos progressistas para além de suas muitas divergências internas que tratarei mais para frente. Portanto, a Bíblia é objeto sagrado e é mediação que constrói e fortalece esse vínculo, sobretudo as narrativas

dos Evangelhos21 no Novo Testamento que falam sobre a vida de Jesus.

Me recordo de ainda criança ter contato com um livro que chamava “Em seus

passos o que faria Jesus?”22 numa experiência de discipulado23, e crescer

acompanhada desta pergunta construiu meu vínculo com aquela entidade, em um processo de estreitamento de relação e engajamento. Com o passar do tempo, senti este vínculo se autonomizando, menos dependente da mediação dos meus pais, me senti próxima e comprometida. Outra memória da minha infância que foi acionada foi dos momentos que ouvia meu pai falando sobre como a sua conversão à Jesus de Nazaré salvou a sua vida, ele afirmava que por essa causa estava disposto a morrer, se preciso fosse. Como já mencionei, meu pai é pastor de uma igreja progressista, e quando adolescente presenciei algumas vezes ele denunciando nos púlpitos da igreja as injustiças sociais, violências à grupos vulnerabilizados e crimes de corrupção de figuras políticas em Alagoas. Ele se apresentava como discípulo de Jesus em suas falas, recebeu ameaças de morte algumas vezes por conta dessas denúncias, e sempre reafirmou seu compromisso com essas causas, como Stengers propõe em seu texto já citado, são causas que se trairmos vamos sentir que tudo está perdido.

20 Se refere ao Jesus histórico, que é situado a partir das suas origens familiares, socioeconômicas e de fé. 21 Os evangelhos são os primeiros livros do Novo Testamento que narram a vida de Jesus: Mateus, Marcos,

Lucas e João.

22 Livro de Charles M. Sheldon.

23 O discipulado é uma experiência comunitária de acompanhamento terapêutico e de fé. O discipulador exerce

uma função de tutoria de um grupo pequeno, os seus discipulandos. O exercício é inspirado no processo discipular de Jesus com os 12 apóstolos, de formação prática e espiritual.

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A autora afirma que as ideias são os não-humanos e que os pensadores estão obrigados e vinculados a elas, se reúnem a partir de uma questão. Portanto, ter pai e mãe pastores e teólogos, me fez crescer rodeada de experiências práticas e realçadas do que implica esse engajamento com as entidades que povoam o cosmos que construímos. Estes vínculos com as ideias, os conceitos e as teologias norteavam a minha vida familiar. Logo, as questões que atravessam minha formação religiosa e familiar estão relacionadas ao cosmos que estou implicada e interessada em investigar, por isso, em alguns momentos também me utilizarei de memórias e experiências pessoais como artifício metodológico na construção dos argumentos.

Teologias como entidades-conceito que abrem novos espaços de práticas

Cada teologia, como qualquer teoria, não está efetivamente descrevendo coisas no mundo, mas também está lançando entidades neste mundo. Então, toda vez que um conceito surge, esse conceito, em termos cosmopolíticos, é uma nova entidade. O conceito cria um espaço de tensão a partir do qual você vai pensar, ou outras coisas vão ser pensadas, ou outras entidades vão de certo modo confluir ou serem expelidas. Portanto, o conceito-entidade cria o campo e faz exigências, propõe ou força certos compromissos e sacrifícios de quem o opera ou o mobiliza. Ou seja, quando você está inserido no campo daquele conceito, você tem que respondê-lo de certo modo.

É possível tratar o conceito como descritor da realidade, pensando o quanto tal conceito se aproxima de determinada realidade. Ou pensar que o conceito atende a um conjunto de interesses, daqueles que estão o formulando, os que mobilizam determinado campo seriam os interessados. Ou ainda, pensar o conceito como fruto de um processo trabalhoso de construção que enreda pensadores, instituições, grupos de pessoas, etc. Esse conceito tem um efeito, produz um reordenamento, força e exige de quem está operando no seu entorno, que de certo modo satisfaça as suas condições de possiblidade.

Segundo De Deus (2019), é preciso tomarmos os conceitos como ferramentas teórico políticas, não apenas como reflexão para expressar alguma realidade, mas pensarmos os conceitos como ferramentas e armas que produzem

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efeitos e que agregam algo ao mundo. Todo conceito é uma entidade que é agregada ao mundo e vai produzir certos efeitos. “E assim como um remédio só pode ser eficaz quando se sabe a causa da doença, é preciso que manuseemos ferramentas teórico-políticas que potencializem nossas condições de atuar no mundo que a gente tem”24.

Se eu tomo um conceito como uma entidade que me faz pensar, que me provoca, esta entidade tem efeito de reordenar o campo. Ou seja, quando se instaura um conceito no mundo, esses conceitos têm efeitos que vão reverberando. Existem vínculos com aquele conceito que provoca o que é relevante e o que não é relevante, produzindo um novo espaço de práticas.

A partir desta perspectiva que proponho olharmos para as teologias emergentes que estão sendo mobilizadas por grupos evangélicos progressistas como entidades-conceito. Ou até mesmo olharmos para Teologia da Libertação como entidade que criou novos espaçamentos de práticas comunitárias e nos colocarmos perguntas: Em que medida esses vínculos podem ter se enfraquecido, se fragilizado ou perdido força, a despeito dos novos vínculos e espaços produzidos por Teologias Feministas e Teologias Negras, por exemplo?

Em que termos os compromissos exigidos por novas teologias produzem efeitos que reverberam no mundo evangélico progressista? Se pensarmos na perspectiva do conceito como fruto de um trabalho árduo de construção e engajamento, quais os esforços que podemos mapear de determinados grupos e instituições foram realizados para que fossem instauradas novas entidades no mundo? É possível afirmar que instituições religiosas progressistas são mais equânimes ou prezam por uma justiça racial e de gênero? Seriam esses efeitos que estão reverberando? Quais as exigências que essas teologias estão propondo?

Pensar numa perspectiva cosmopolítica é sobre fazermos novas perguntas para, quem sabe, acharmos novas possibilidades de respostas.

Acredito que é importante frisar novamente que minha proposta não é dar conta de todo o movimento evangélico progressista a partir do Nordeste, mas recortar um núcleo de pessoas, instituições e vínculos que vão redundar na experiência da Aliança de Batistas do Brasil, que emerge de encontros e lideranças

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do Nordeste e depois se expande para outras regiões do país. Esse trabalho é o embrião da minha tese de doutorado que está em andamento.

Referências Bibliográficas

ALIANÇA DE BATISTAS DO BRASIL. Religião, utopia e sociedade: diálogos

com Martin Luther King Jr. e Richard Shaull. Lauro de Freitas, BA: Livro.com,

2009.

ALENCAR, Gustavo de. Grupos protestantes e engajamento social: Uma

análise dos discursos e ações de coletivos evangélicos progressistas.

Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, 39(3): 173-196, 2019

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