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Consentimento e dissentimento informado

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Academic year: 2021

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Doutor em Direito Comparado (Florença/Itália). Mestre em Direito Civil pela Universidade de São Paulo. Professor Titular dos Cursos de Graduação, Mestrado e Doutorado em Direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Professor e ex-diretor da Escola Superior da Magistratura/Ajuris. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. facchini@tj.rs.gov.br

Recebido 09.08.2015 Pareceres 27.10.2015 e 21.11.2015

ÁreaDo Direito: Consumidor; Civil

resumo: O presente estudo concentra-se no de-ver do médico de buscar o consentimento infor-mado do seu paciente, antes de iniciar qualquer tratamento. Para tanto, é mister que ele forneça ao seu paciente todas as informações neces-sárias para uma decisão esclarecida e racional. Depois de se indicar as normas nacionais e in-ternacionais que regem o tema, indicam-se os modelos existentes de atuação médica quanto ao dever de informar, os pressupostos inafastá-veis para que se possa falar em consentimento esclarecido, bem como se aprofunda a análise de algumas situações especiais e polêmicas, como o consentimento de incapazes, de doentes termi-nais, de pessoas casadas, de pacientes de inter-venções puramente estéticas. Atenção também é dada aos limites da intervenção médica e ao direito ao dissentimento, que sempre é reconhe-cido ao paciente. Perpassa o ensaio a ideia de que a necessidade de se obter o consentimen-to informado do paciente está ligada ao direiconsentimen-to

abstraCt: This study focuses on the doctor’s duty to seek the informed consent of his patient, before starting any treatment. To do so, he must provide to his patient all the information needed for an informed and rational decision. After indicating national and international standards governing the subject, the existing models of medical practice as to the duty to inform, it focuses on some special and controversial cases, such as the consent of minors, of terminally ill, married people, patients of purely aesthetic interventions. Attention is also given to the limits of medical intervention and the right to dissent, which is always recognized to the patient. It is strongly affirmed that the need to obtain the patient’s informed consent is linked to his fundamental right to private autonomy and self-determination, in turn linked to the notion of human dignity. The entire study is done under the focus of comparative law.

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fundamental à autonomia privada e à autode-terminação do paciente, por sua vez vinculadas à noção de dignidade humana. Todo o estudo é feito sob o enfoque do direito comparado.

Palavras-Chave: Consentimento informado – De-ver de Informar – Princípio da autonomia priva-da – Responsabilipriva-dade civil médica.

KeyworDs: Informed consent — Duty to inform – Principle of private autonomy – medical civil liability.

suMário: Introdução – 1. O princípio da autonomia e sua evolução normativa – 2. Modelos de atuação médica, quanto ao dever de informar – 3. Pressupostos para um consentimento esclarecido – 4. Situações especiais: 4.1 Consentimento envolvendo menores; 4.2 Consen-timento envolvendo doentes terminais; 4.3 ConsenConsen-timento no âmbito das pesquisas mé-dico-científicas; 4.4 Consentimento nas cirurgias estéticas; 4.5 Consentimento envolvendo pessoas casadas; 4.6 Consentimento nas internações hospitalares – 5. Limites à atuação médica – quando o consentimento esclarecido não é suficiente – 6. Revogação do con-sentimento e direito ao discon-sentimento. Considerações finais – Referências bibliográficas.

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ntrodução

Considerando-se que a medicina é praticada deste a antiguidade,1 a ideia de

um dever de informar, por parte do médico, é relativamente recente, tendo sur-gido somente no século XX. No curso da história multimilenar da medicina, reconheceu-se, no médico, o detentor exclusivo do conhecimento técnico e, portanto, autorizado a tomar as decisões que, a seu exclusivo juízo, representas-sem o que era melhor para seu paciente. Este era tido como objeto de atenção e cuidado por parte do médico. Não era visto propriamente como um sujeito autô-nomo de direitos, cuja opinião devesse ser seriamente levada em consideração.2

1. Na tradição ocidental, considera-se Hipócrates (460 – 377 a.C.) o pai da medicina. Todavia, na tradição islâmica (sendo sabido que os árabes, durante praticamente du-rante toda a idade média, estiveram muito à frente dos europeus na área das ciências em geral, especialmente na medicina), afirma-se que a origem da medicina remonta ao Império Aquemênida, ou Primeiro Império Persa, fundado no século VI a.C. por Ciro, o Grande.

2. Ou, nas palavras de Heloisa H. Barbosa: “Desde os tempos de Hipócrates até os nos-sos dias, busca-se o bem do paciente, ou seja, aquilo que, do ponto de vista da me-dicina, se considera benéfico para o paciente, sem que esse em nada intervenha na decisão. Esse tipo de relação, apropriadamente denominada paternalista, atribui ao médico o poder de decisão sobre o que é melhor para o paciente. Similar à relação dos pais para com os filhos, foi durante longo tempo considerada a relação ética ideal, a despeito de negar ao enfermo sua capacidade de decisão como pessoa adulta.

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Isso porque não se trata apenas de curar o paciente. Trata-se de garantir a este sua coparticipação responsável na definição do que será feito com seu corpo. Atualmente atingiu-se um consenso no sentido de que a vontade do paciente, desde que esclarecida, é soberana: mesmo que a ciência médica possa recomen-dar enfaticamente determinada atuação, é direito do paciente recusá-la, ainda que sob risco de grave piora do estado de saúde ou mesmo com risco de morte.

Ou seja, adotou-se o chamado modelo contratual na relação médico-pacien-te, na qual os valores básicos de liberdade, transparência, veracidade, boa-fé, respeito à dignidade e justiça são essenciais. Nesse modelo interativo, ‘o médi-co sabe da enfermidade, mas o paciente sabe de suas necessidades’.

Todavia, como se viu ao longo do ensaio, o tema do consentimento infor-mado pode revelar-se bastante complexo em determinadas situações especiais, como é o caso do consentimento envolvendo pacientes menores de idade ou em situação de vulnerabilidade acentuada, quer em razão da idade, quer em virtude de patologias de que sejam vítimas. O menor, se tiver condições míni-mas para entender o que está acontecendo e quais as opções razoáveis existen-tes, deve também ser envolvido no processo, dando sua opinião, a ser necessa-riamente levada em consideração. O mesmo vale para o paciente terminal, cuja decisão consciente sobre o que deve ser feito consigo deve ser levada em conta, mesmo que manifestada em momento anterior à sua perda de consciência, através de ‘testamento vital’ ou ‘procuração de saúde’.

Enfim, o desenvolvimento técnico e o aperfeiçoamento ético devem evoluir de mãos dadas, a fim de que a sociedade aproveite os notáveis benefícios pro-piciados pela medicina moderna, mas que também se respeite o direito à auto-nomia de cada ser humano, especialmente quando fragilizado pela doença. A doença torna o ser humano vulnerável e dependente de auxílio alheio, mas não neutraliza sua natural dignidade humana, da qual a autonomia é a capacidade de autodeterminação são elementos integrantes.

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• Consentimento do ofendido: breves considerações de dogmática penal e suas conse-quências na relação jurídica médico-paciente, de Giselly Campelo Rodrigues e Talita da Fonseca Arruda – RCP 14/63-105 (DTR\2011\1820).

Referências

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