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Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

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Processo n.º 0015305-04.2015.8.19.0031

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RÉU: ATACADÃO ESTRELA DO SUL DE MARICÁ LTDA - EPP

D E C I S Ã O

Ementa: TUTELA ANTECIPADA. COMERCIALIZAÇÃO DE

GÊNEROS ALIMENTÍCIOS. IRREGULARIDADES

PRATICADAS. REITERAÇÃO DA CONDUTA DO RÉU ATESTADA PELAS FISCALIZAÇÕES REALIZADAS PELA VIGILÂNCIA SANITÁRIA. RISCO À SAÚDE E À

INTEGRIDADE FÍSICA DOS CONSUMIDORES.

PRESENTES OS REQUISITOS DO ART. 273 DO CPC. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA.

Cuida-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO em face de ATACADÃO ESTRELA DO SUL DE MARICÁ LTDA - EPP, por meio da qual alega que o réu fora autuado pelo PROCON/RJ em razão de várias irregularidades praticadas, no que tange à comercialização de gêneros alimentícios, dentre elas, a comercialização de produtos com o prazo de validade vencido.

Objetiva a parte autora, desta forma, a antecipação dos efeitos da tutela a fim de determinar ao réu que cumpra as obrigações de fazer abaixo elencadas, sob pena de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por cada item descumprido e, em caso de reincidência de descumprimento, multa majorada para o valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) por cada item descumprido.

1. Acondicionar separadamente os produtos com prazo de validade expirado (para posterior descarte ou entrega aos fabricantes) dos produtos que ainda serão comercializados, e sinalizar o local de armazenamento com a seguinte informação: produto impróprio para consumo;

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2. Comercializar somente produtos dentro do prazo de validade e com esta informação devidamente visível nas embalagens e com a indicação de procedência do produto;

3. Comercializar somente produtos com a devida licença, autorização ou registro perante o órgão competente nos casos definidos em lei;

4. Realizar o armazenamento e estocagem de produtos em local adequado e limpo, respeitando as indicações de temperatura e umidade feitas pelo fabricante e atendendo os cuidados para conservação destes, bem como se abstendo de estocar os produtos sem a devida proteção, em contato com o chão ou próximo a possíveis vetores de contaminação;

5. Manter condições mínimas de limpeza, higiene e conservação de toda a sua instalação e em seus equipamentos, inclusive e principalmente nas câmaras frias, efetuando reformas, adequações, troca ou compra de equipamento e utensílios, conforme as determinações fixadas pela Vigilância Sanitária e/ou Procon/RJ, bem como manter periodicamente a desratização e dedetização do estabelecimento.

É o relatório. Passo a decidir.

Quanto à tutela antecipada postulada, merece prosperar a pretensão da parte autora, haja vista que se encontram presentes os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada.

Adotando como critério para classificação da tutela jurisdicional a necessidade de sua posterior confirmação1, existem duas modalidades de tutela: a tutela jurisdicional

definitiva e a tutela jurisdicional provisória.

1

Cf. BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v.1. p. 293.

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Definitiva é a tutela que se caracteriza por ser obtida com base em cognição exauriente, obedecendo às garantias do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, produzindo resultado imutável predisposto à coisa julgada material.

Provisória é a tutela jurisdicional que deverá ser, no futuro, trocada pela definitiva. Como ensina CASSIO SCARPINELLA BUENO2, “a tutela jurisdicional é

prestada provisoriamente no sentido de que ela, de alguma forma, será confirmada ou, o contrário disto, substituída ao longo do procedimento; isto é, ela vale e produz efeitos enquanto outra decisão não for proferida para ratificá-la ou para valer e ter eficácia em seu lugar”.

A tutela provisória se baseia em uma cognição sumária que, para KAZUO WATANABE3, “(...) é uma cognição superficial, menos aprofundada no sentido vertical”. A tutela antecipada constitui a tutela provisória por excelência, vez que confere eficácia imediata à tutela definitiva, antecipando a satisfação do direito afirmado.

TEORI ALBINO ZAVASCKI4 assim conceitua a antecipação da tutela:

“Antecipar significa satisfazer, total ou parcialmente, o direito afirmado pelo autor e, sendo assim, não se pode confundir medida antecipatória com antecipação da sentença. O que se antecipa não é propriamente a certificação do direito, nem a constituição e tampouco a condenação porventura pretendidas como tutela definitiva. Em outras palavras: não se antecipa a eficácia jurídico-formal (ou seja, a eficácia declaratória, constitutiva e condenatória) da sentença; antecipa-se a eficácia que a futura sentença pode produzir no campo da realidade dos fatos.”

Uma vez preenchidos os requisitos do art. 273 do CPC, abre-se possibilidade de o juiz conceder à parte, desde que haja requerimento, um provimento imediato que,

2

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v.1. p. 293, p. 294.

3

WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo: Perfil, 2005, p. 145.

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como diz HUMBERTO THEODORO JÚNIOR5, “(...) provisoriamente, lhe assegure o

bem jurídico a que se refere à prestação de direito material reclamada como objeto da relação jurídica envolvida no litígio”.

Contudo, para o seu deferimento a lei exige o preenchimento dos requisitos previstos no art. 273 do CPC.

Para a concessão da tutela antecipada genérica, se faz necessário o preenchimento de determinados pressupostos tipificados no art. 273 do CPC. Além da iniciativa da parte (que restou preenchido no presente procedimento, posto que a parte autora efetivamente requereu o deferimento da tutela antecipada), o caput do dispositivo supra aborda aqueles requisitos denominados de concorrentes, pois deverão estar sempre presentes, são eles: prova inequívoca e verossimilhança da alegação.

Aderido a esses existem os pressupostos alternativos (constantes nos incisos do dispositivo acima mencionado), assim denominados porque bastará a presença de um deles para possibilitar a concessão tutela antecipada. Trata-se do fundado receio de dano irreparávelou de difícil reparação e do abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. Cada um deles serão analisados separadamente de modo a identificar se na presente demanda estão presentes ou pressupostos necessários para o deferimento da tutela provisória requerida.

A prova inequívoca que a lei exige para a concessão da tutela antecipada trata-se daquela prova capaz de conduzir o juiz a um juízo de probabilidade apto a antecipar o pleito solicitado. Consoante SIMONE DIOGO CARVALHO FIGUEIREDO6, apesar de o texto legal utilizar essa expressão, “(...) o legislador não

5

THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 45. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. v.2.,p .668.

6

FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho. Das tutelas de urgência. In: Direito processual civil, 2. Coleção

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pretende a apresentação de prova ‘plena’, que demonstre certeza acerca do direito alegado, e sim, tão-somente, prova que demonstre alto grau de probabilidade”.

Esse tipo de prova não basta para declarar a existência ou a inexistência de um direito, pois, caso pudesse, não estaríamos diante de uma tutela antecipada, e sim de uma sentença. O juiz julga provisoriamente baseado no que provavelmente é. Como aduz HUMBERTO THEODORO JÚNIOR7 “é inequívoca (...) a prova capaz, no momento

processual, de autorizar uma sentença de mérito favorável à parte que invoca tutela antecipada, caso pudesse ser a causa julgada desde logo”.

Para que seja concedida a medida urgente satisfativa, havendo prova inequívoca, o magistrado deve se convencer da verossimilhança da alegação. Ambos os pressupostos estão interligados, de modo que “(...) é de uma valoração conjunta desses

conceitos que se dimensiona a exigência contida no ‘caput’ para a antecipação de tutela”8.

Comentando sobre a expressão verossimilhança trazida pelo CPC, KAZUO WATANABE9 afirma que esse vocábulo é utilizado “(...) no sentido

de probabilidade elevada de ser verdadeiro (...)”. Assim, a princípio parece haver uma

contradição aparente devido ao emprego simultâneo dos requisitos prova inequívoca e verossimilhança da alegação. Na concepção de ALEXANDRE FREITAS CÂMARA, tais expressões são antagônicas, vez que prova inequívoca é aquela sobre a qual não restam dúvidas, apta a formar no julgador um juízo de certeza, enquanto verossimilhança é a verdade aparente, provável, inapta a levar o juiz a um juízo de certeza, em suas palavras:

“(...) ao unir esses dois conceitos radicalmente opostos, pretende a lei a formação de um conceito que se coloque em posição intermediária entre aqueles dois: a cognição sumária, à qual leva a formação de juízos de probabilidade. Observa-se, alias, que, ao exigir prova que convenção juiz da verossimilhança da alegação, a lei processual deixa

7

THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. 45. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. v.2.,p .674.

8

NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA, José Roberto F.; BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Código de processo civil

e legislação processual em vigor. 41. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 421.

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bastante claro que a mera verossimilhança não é suficiente para a concessão da medida. Mais do que isso, exige-se que a existência do direito alegado pelo demandante seja provável (...). Assim sendo, conclui-se que o primeiro requisito para a concessão da tutela antecipada é a probabilidade de existência do direito afirmado pelo demandante.”10

Portanto, prova inequívoca deve ser aquela hábil de produzir no julgador um juízo de verossimilhança, de probabilidade sobre os fatos narrados por quem pleiteia a medida, capaz de autorizar o deferimento da medida urgente satisfativa.

Assim, neste contexto e num juízo de cognição não exauriente, portanto de prelibação, vislumbro a possibilidade de atender o pleito do autor, uma vez que os elementos apresentados me convencem da prova inequívoca apta a ensejar o convencimento necessário no sentido da verossimilhança da alegação da parte autora. Isso porque, toda a documentação acostada aos autos, demonstra a prática reiterada realizada pela empresa Ré.

A propósito:

"Só a existência de prova inequívoca, que convença da verossimilhança das alegações do autor, é que autoriza o provimento antecipatório da tutela jurisdicional em processo de conhecimento" (RJTJERGS 179/251).

"A tutela antecipada, que tem como característica a provisoriedade e é admitida nos casos em que ocorra a verossimilhança da alegação do autor (...)". (RT 742/350).

Verifica-se que a narrativa constante nos autos encontra reflexo no acervo probatório colacionado com a petição inicial. Vejamos: diversos laudos da Vigilância

Sanitária e o do PROCON.

Sem sombra de dúvida, num juízo superficial e rarefeito, típico das tutelas provisórias, restam preenchidos os requisitos necessários e obrigatórios, para o seu deferimento.

10 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. v. 1,

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Como cediço, ainda que o deferimento da tutela antecipada não dependa de profunda dilação probatória, devem estar presentes os requisitos constantes no artigo 273 do diploma processual civil, quais sejam, a prova inequívoca capaz de convencer da verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Assim:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.

IMPOSSIBILIDADE. Tutela antecipada (...) que se mostra descabida, no caso concreto, em face da ausência dos requisitos autorizadores de sua concessão, a que se refere o art. 273, I, do CPC. Agravo de instrumento a que se nega seguimento, de plano". (Agravo de Instrumento Nº 70027904549, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Julgado em 07/01/2009).

O que efetivamente restou comprovado, conforme se pode observar dos documentos juntados.

Prova inequívoca, segundo o jurista mineiro ERNANE FIDÉLIS DOS SANTOS, não é prova pré-constituída, mas aquela existente naquele dado momento processual, capaz e passível de demonstrar ser o fato alegado parecido com a verdade. Portanto, prova inequívoca é aquela que conduz à probabilidade máxima da verdade a respeito do fato alegado. (TJMG - AG 000.293.858-7/00 - 7ª C. Cív. - Rel. Des. Antônio Carlos Cruvinel - J. 18.11.2002)

O processualista FREDIE DIDIER JR. afirma que: "se o legislador não se utiliza

inutilmente de expressões, a exegese imposta é a de que prova inequívoca para a concessão da tutela antecipada é a alma gêmea da prova do direito líquido e certo para a concessão do mandamus. É a prova estreme de dúvidas, aquela cuja produção não deixa ao juízo outra alternativa senão a concessão da tutela antecipada". (Publicada no Juris Síntese nº 36 - julho/agosto de 2002).

No caso vertente, tem-se que a parte autora comprovou de forma inequívoca a verossimilhança de suas alegações, viabilizando assim o deferimento da medida antecipatória nos moldes em que postulados.

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Desta forma, ao meu falível juízo, neste momento, se apresenta necessário o deferimento da medida.

Deste modo, tudo leva a crer que não estamos no âmbito das coincidências, e de fatos esporádicos e excepcionais. O dano que se descortina é grave e de difícil reparação, inclusive em relação a terceiros consumidores.

Aqui, já adianto que se encontra presente também o pressuposto alternativo constante no inciso I do art. 273 do CPC: fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

O magistrado deverá conceder tutela antecipada quando, havendo prova inequívoca (já demonstrada acima) capaz de levá-lo a um juízo de verossimilhança (também comprovado), o direito material que a parte pleiteia sofre um receio de dano irreparável ou de difícil reparação em virtude da demora processual.

Destaca-se que “o risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja antecipação

assecuratória é o risco concreto (e não hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela”11.

Não basta o mero temor subjetivo da parte. O dano preconizado pela lei pressupõe um temor alicerçado com bases concretas, tangíveis, trazidas aos autos para serem analisados pelo magistrado caso a caso.

Esse dano deve ser irreparável ou de difícil reparação. Sobre o caráter irreparável, corresponde àquele dano de efeitos irreversíveis, que não podem ser remediado, enquanto de difícil reparação significa que o dano tem poucas probabilidades de ser revertido, pois, v.g., “(...) as condições econômicas do réu não autorizam

11

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supor que o dano será efetivamente reparado”, ou que o dano “(...) dificilmente poderá ser individualizado ou quantificado com precisão”12.

Em suma, presente os demais requisitos analisados outrora, havendo fundado receio de dano irreversível, ou de pouca probabilidade de se reverter, o provimento jurisdicional imediato deverá ser concedido, sob pena do direito substancial em litígio se tornar impraticável a posteriori.

Posto a questão nesses termos a tutela deve ser deferida no caso em análise, posto que preenchido, todos os requisitos, tendo em vista que o dano de difícil reparação se confirma, pelo risco que os consumidores estão sendo expostos.

Saliente-se que o deferimento da tutela pleiteada não representa violação ao principio constitucional do contraditório e da ampla defesa, de vez que a doutrina que se ocupou do tema entende que a tutela antecipatória de mérito, que passou a ser prevista no ordenamento processual após a reforma operada nos anos de 1994 e 1995, pode ser deferida inaudita altera parte sem que isso importe qualquer violação aos supramencionados cânones. Aliás, nas hipóteses em que a situação do direito afirmado pela parte autora é periclitante, como acontece no caso em tela, soa intuitivo que a tutela antecipada pode e deve ser concedida liminarmente, sob pena de se esvaziar o próprio instituto, que se reduziria à letra morta na lei. É a conclusão que se depreende, com facilidade, da norma contida no inciso I, do artigo 273, do CPC.

À evidência, apenas nas hipóteses em que a tutela antecipatória é deferida com fulcro no inciso II do mesmo dispositivo processual - abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu - caberá, sempre, a prévia intimação deste para se manifestar, precisamente porque, em casos que tais, a relação processual, por óbvio, já terá se aperfeiçoado.

Desta forma se faz presente o requisito da verossimilhança das alegações autorais, tal como dispõe o artigo 273, caput, do CPC.

12

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Por oportuno, cabe ressaltar que a cognição exercida para efeito de concessão, ou não da tutela antecipatória de mérito é sumária, e não exauriente, de vez que se funda em um juízo de probabilidade, mas não de certeza, o qual só tem lugar em provimentos definitivos, ou seja, aqueles que resolvem o mérito da causa, reclamando, assim, a apreciação de todos os pontos fáticos e jurídicos apresentados pelas partes.

Note-se que a concessão da tutela, não se afigura como medida irreversível, porque se o pedido formulado na ação vier a ser julgado improcedente, o Réu não terá cumprido nada mais que sua obrigação.

Deste modo, preenchido também se encontra o requisito negativo previsto no art. 273, § 2º do CPC “não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de

irreversibilidade do provimento antecipado”. A reversibilidade é uma das características da

tutela antecipada, de modo que, via de regra, para que ocorra a concessão da medida urgente de caráter satisfativo, o provimento antecipado não pode ser irreversível (o que não ocorre na hipótese dos autos).

Irreversível é aquilo que não pode ser revertido, “que se efetua numa única

direção, sem possibilidade de retornar a etapa anterior”13. Assim, a regra geral é que, mesmo preenchidos os rigorosos requisitos constantes no caput e incisos do art. 273, caso o provimento antecipado possua feições de irreversibilidade, ou seja, que não possa ser revertido, o magistrado não poderá conceder a medida de urgência, razão pela qual a doutrina denomina a irreversibilidade de pressuposto negativo da antecipação da tutela.

Cabe ressaltar que é entendimento consolidado pela melhor doutrina que irreversível não é o provimento em si, nunca irreversível por se tratar de decisão provisória e revogável, e sim os efeitos dele decorrente. Como assevera ATHOS GUSMÃO CARNEIRO14, “(...) a ‘irreversibilidade’ não se refere propriamente ao

13 HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 1653. 14

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‘provimento’ antecipatório, mas sim aos efeitos do provimento. O provimento, em si mesmo, como decisão judicial passível de recurso e que pode ser revogada ou modificada a qualquer tempo (art. 273, § 4º), é eminentemente reversível. Neste ponto convém a maioria dos processualistas (...)”.

Ao instituir o presente pressuposto negativo para concessão da medida urgente, o legislador buscou com que fosse observado o direito ao devido processo legal, com seus consectários do contraditório e ampla defesa, ou seja, busca-se preservar o princípio da segurança jurídica. É sabido que a tutela antecipada é uma forma de prestigiar a efetividade da prestação judicial, combalida pela morosidade da justiça. Entretanto, esse instrumento não pode ser usado como pretexto para se aniquilar a segurança jurídica, vez que as medidas provisórias atuam como ferramenta de harmonização dos direitos fundamentais.

Vale reproduzir, na íntegra, o ensinamento de TEORI ALBINO ZAVASCKI:

“No particular, o dispositivo observa estritamente o princípio da salvaguarda do núcleo essencial: antecipar irreversivelmente seria antecipar a própria vitória definitiva do autor, sem assegurar ao réu o exercício do seu direito fundamental de se defender, exercício esse que, ante a irreversibilidade da situação de fato, tornar-se-ia absolutamente inútil, como inútil seria, nestes casos, o prosseguimento do próprio processo”15.

Assim, antes de conceder a tutela antecipada, o juiz deve indagar se é possível retornar à situação anterior, “(...) na eventualidade de não ter o autor direito à pretensão.

Pretende-se, com isso, coibir abusos no uso da medida, preservando o adversário contra excessos na utilização da medida”16. No caso em análise, não existe nenhum risco de irreversibilidade e eventual prejuízo suportado pelo Réu, caso a tutela definitiva lhe seja favorável, o autor arcará com as perdas e danos respectiva.

15

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 97.

16 FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho. Das tutelas de urgência. In: Direito processual civil, 2. Coleção OAB

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Como afirma JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE, “ao mesmo

tempo em que foi ampliada a possibilidade de antecipação para qualquer procedimento, procurou-se delimitar, com precisão possível a sua área de incidência”17.

Insta ressaltar, novamente, que a presente decisão não apresenta perigo de irreversibilidade, eis que se ao final se concluir que o Réu tem razão, a questão se resolve em perdas e danos.

Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL Tutela antecipada Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico por vício de consentimento, cumulada com reparação de danos materiais e morais proposta pela agravante Decisão de primeiro grau que indefere pedido de tutela antecipada voltado a obter a suspensão do registro da escritura de venda e compra com renúncia de usufruto e expedição de ofício ao DETRAN e ao CIRETRAN para levantamento e bloqueio de bens Situação de fato que enseja a oitiva da parte adversa, observando-se o contraditório Possibilidade, porém, de ocorrência de dano de difícil reparação Tutela antecipada deferida em parte - Agravo parcialmente provido (TJ-SP - AI: 1815597020128260000 SP 0181559-70.2012.8.26.0000, Relator: Carlos Henrique Miguel Trevisan, Data de Julgamento: 13/09/2012, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/09/2012) AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPARAÇÃO DE DANOS. PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. DEFERIMENTO. A Súmula 59 deste Tribunal só autoriza a revogação da decisão de deferimento de tutela antecipada quando contrária a lei ou as provas dos autos. Recurso negado, na forma do art. 557 do CPC. (0001423-73.2012.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO, DES. CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ - Julgamento: 18/01/2012 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL)

Acrescente-se que, ante a sua provisoriedade, o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela poderá ser revogado sem qualquer prejuízo à parte Ré, que poderá proceder à cobrança dos valores perdidos posteriormente.

17 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. In: DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso

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A verossimilhança das alegações deflui da narrativa da inicial, bem como dos documentos que a instruem, mormente no que se refere às inúmeras autuações lavradas pela Vigilância Sanitária e pelo Procon.

Inegável, também, o fundado receio de dano de difícil reparação na demora do provimento jurisdicional, ante o risco à saúde e integridade física dos consumidores.

Assim sendo, impõe-se a concessão da medida, a fim de se preservar os direitos fundamentais à saúde e à integridade física dos consumidores.

Com efeito, a verossimilhança das alegações da autora está consubstanciada na reiterada prática de irregularidades cometidas pelo réu na comercialização de gêneros alimentícios, irregularidades estas constatadas pela Vigilância Sanitária e pelo Procon/RJ, o que se infere dos documentos de fls. 37/38, 44/53, 56/64.

Quanto ao receio de dano irreparável, este decorre do risco à saúde e à integridade física a que estão sendo submetidos os consumidores.

Por tais motivos, defiro a antecipação de tutela requerida para determinar ao réu que cumpra as obrigações de fazer abaixo elencadas, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por cada item descumprido, ressaltando, desde já, que eventual descumprimento da presente decisão deverá ser apurado pela Vigilância Sanitária/Procon/RJ.

1. Acondicionar separadamente os produtos com prazo de validade expirado (para posterior descarte ou entrega aos fabricantes) dos produtos que ainda serão comercializados, e sinalizar o local de armazenamento com a seguinte informação: produto impróprio para consumo;

2. Comercializar somente produtos dentro do prazo de validade e com esta informação devidamente visível nas embalagens e com a indicação de procedência do produto;

(14)

Processo n.º 0015305-04.2015.8.19.0031

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RÉU: ATACADÃO ESTRELA DO SUL DE MARICÁ LTDA - EPP)

3. Comercializar somente produtos com a devida licença, autorização ou registro perante o órgão competente nos casos definidos em lei;

4. Realizar o armazenamento e estocagem de produtos em local adequado e limpo, respeitando as indicações de temperatura e umidade feitas pelo fabricante e atendendo os cuidados para conservação destes, bem como se abstendo de estocar os produtos sem a devida proteção, em contato com o chão ou próximo a possíveis vetores de contaminação;

5. Manter condições mínimas de limpeza, higiene e conservação de toda a sua instalação e em seus equipamentos, inclusive e principalmente nas câmaras frias, efetuando reformas, adequações, troca ou compra de equipamento e utensílios, conforme as determinações fixadas pela Vigilância Sanitária e/ou Procon/RJ, bem como manter periodicamente a desratização e dedetização do estabelecimento.

Intime-se o réu para cumprimento, com urgência, valendo a presente como mandado/precatória.

Cite-se o réu, valendo a presente como mandado/precatória, para responder a presente ação, no prazo legal, fazendo-lhe, outrossim, a advertência de que, não sendo contestada a ação, presumir-se-ão aceitos, como verdadeiros, os fatos articulados pela parte autora na petição inicial.

Maricá, 16 de setembro de 2015.

FÁBIO RIBEIRO PORTO

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