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Manual de Lingüística, organizado pelo Prof. Martelotta, surge

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Academic year: 2021

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mAnuAl de lingüíSticA

Ivo do Rosário

M

anual de Lingüística, organizado pelo Prof. Martelotta, surge

como uma obra singular no mercado editorial brasileiro. Reunin-do pesquisaReunin-dores de diversas instituições de ensino situadas no Brasil, a obra consegue suprir uma lacuna há muito verificada pelos docentes, especialmente em nível de graduação.

Com foco ampliado, a obra não se destina apenas aos estudiosos de Letras e Lingüística, mas também às áreas de Fonoaudiologia, Comunicação Social e afins, como bem aponta seu organizador, no prefácio. Dialeticamente, tradição e modernidade são cotejadas ao longo da apresentação, como verdadeira metáfora do percurso da história da lingüística, marcada por conservadorismos e rupturas, o que fez com que essa disciplina fosse hoje tão multifacetada e heterogênea.

Organizado em três grandes blocos (Lingüística e Linguagem, Abordagens

Lingüísticas e Aquisição, Processamento e Ensino), Manual de Lingüística

abor-da as principais correntes lingüísticas abor-da atualiabor-dade, além de perpassar outras questões caras à ciência da linguagem, tais como o estatuto científico dos es-tudos da linguagem, a dupla articulação, relação entre lingüística e ensino, entre outras.

Em linguagem didática, os capítulos, escritos por pesquisadores de linhas teóricas diferentes, seguem uma apresentação lógica e organizada, permeados por farta exemplificação, fazendo com que o leitor progressivamente vá se familiarizando com as diversas correntes e vá tomando conhecimento de suas intrincadas interpenetrações. Logo após cada capítulo, são apresentados al-guns exercícios, o que reforça ainda mais o seu caráter didático e inovador.

O livro, com 250 páginas, inicia as discussões acerca dos conceitos de língua, linguagem e lingüística, no capítulo 1. Nessas primeiras páginas, os au-tores caracterizam a capacidade da linguagem como uma técnica articulatória complexa, baseada numa base neurológica composta de centros nervosos que são utilizados na comunicação verbal. Além disso, essa capacidade apresenta uma base cognitiva, que rege as relações entre o homem e o mundo biossocial;

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uma base sociocultural, que atribui à linguagem humana os aspectos variáveis que ela apresenta no tempo e no espaço; e uma base comunicativa, que forne-ce os dados que regulam a interação entre os falantes. Dessa forma, verifica-se claramente a opção dos autores por uma definição holística de linguagem, que não privilegia apenas uma corrente teórica em particular, mas, ao contrário, expressa um esforço bem-sucedido no sentido de reunir diferentes pontos de vista numa caracterização abrangente e multifacetada.

Logo em seguida, ainda no capítulo 1, os autores analisam as relações existentes entre a lingüística e algumas disciplinas afins, como a semiologia, a filologia e a gramática tradicional. Concluem os autores que essa relação é de proximidade ou semelhança, já que todos esses campos de investigação têm a língua como objeto.

No capítulo 2, o Prof. Martelotta analisa a difícil questão das funções da linguagem. Em breves palavras, o pesquisador afirma que tal estudo já fora realizado por eminentes estudiosos, pioneiramente por Karl Bühler, e depois por Roman Jakobson, M.A.K. Halliday, entre outros. Apesar de sua formação fortemente funcionalista, o autor deste segundo capítulo opta por desenvolver a proposta do estruturalista Jakobson, que está focada nas seis tradicionais funções (referencial, emotiva, conativa, fática, metalingüística e poética). Res-salva que tais funções não costumam apresentar-se exclusivas nos textos, mas mantêm sua atualidade, se analisadas hierarquicamente.

No capítulo 3, o Prof. Martelotta recupera outra questão fortemente de-fendida pela lingüística estruturalista, qual seja, a dupla articulação da lingua-gem. Servindo-se de perquirições desenvolvidas ainda no século XIX, o autor sintetiza a idéia de articulação ao afirmar que a linguagem humana “se manifesta por sentenças resultantes da união de elementos menores”, que seriam os morfe-mas (na 1ª articulação) e os fonemorfe-mas (na 2ª articulação). Destaca-se, em seguida, a economia descritiva trazida pelo conceito de dupla articulação. Sem dúvida, a atualidade do conceito respalda a abordagem recebida pelo assunto no manual.

No capítulo 4, o mesmo autor explora diferentes conceitos de gramática e suas diversas implicações teórico-metodológicas. Partindo da gramática tradicio-nal, abordam-se também a gramática histórico-comparativa, a gramática estrutu-ral, a gramática gerativa e a gramática cognitivo-funcional. Dessa forma, Manual

de Lingüística sintetiza em linhas gerais a visão de gramática apresentada pelas

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No capítulo seguinte, discute-se a questão da arbitrariedade e da iconici-dade do signo lingüístico. Wilson e Martelotta resgatam as primeiras perqui-rições dos filósofos gregos quanto às relações entre as diversas línguas com o mundo e o funcionamento da mente humana. A discussão, com efeito, gira em torno da existência ou não da relação de similaridade entre a forma lingüística e o sentido por ela expressa. Na verdade, não há consenso entre os lingüistas quanto à motivação do signo lingüístico. Dessa forma, o tema continua a fasci-nar os estudiosos da linguagem, que se embrenham ora pela arbitrariedade, ora pela iconicidade. As freqüentes retomadas desses assuntos, desde a Antigüida-de, retratam bem a premência desse assunto, desenvolvido pelos autores sob a égide tanto da semiótica quanto da lingüística propriamente dita.

Sob o título de Motivações pragmáticas, Wilson apresenta, no capítulo 6, alguns estudos desenvolvidos no bojo do que se denomina Pragmática, área de

per si ampla e multifacetada, e que adquire várias acepções conforme o enfoque

adotado. No livro, a autora contempla alguns estudos bem delimitados: as im-plicaturas conversacionais, a teoria dos atos de fala, a teoria da polidez e a análise da conversação. Devido ao grande número de vertentes analisadas, os estudos são apresentados de forma bem sintética, o que obriga o leitor mais interessado no assunto a buscar bibliografia adicional para maior aprofundamento.

As primeiras 110 páginas de Manual de Lingüística, como se vê, lidam com questões gerais acerca da linguagem, sem se ater a uma corrente lingü-ística em especial. A preocupação dos autores está centrada na apresentação de uma visão holística dos assuntos tratados, permeados por diversas teorias. Ao contrário, no segundo bloco, são apresentadas as principais abordagens lingüísticas de forma singular e unitária, ou seja, dedica-se cada capítulo a um maior aprofundamento de cada teoria lingüística em particular.

No capítulo 7, Costa apresenta o Estruturalismo, dando especial ênfase às propostas de Ferdinand de Saussure e de Leonard Bloomfield. Desde o início, assevera o autor que não podemos falar em um conceito único de

es-truturalismo no interior da Lingüística, e nem mesmo em outras áreas, como

a antropologia, a sociologia e psicologia. Conceitos como sistema e estrutura são amplamente discutidos e as linhas mestras do Curso de Lingüística Geral são revisitadas com rigor e apuro teórico. As tradicionais dicotomias saussure-anas (língua e fala, sincronia e diacronia, significante e significado, sintagma e paradigma) são didaticamente apresentadas e ilustradas com exemplos

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escla-recedores. Após essa apresentação, Costa apresenta sucintamente a corrente estruturalista norte-americana, também chamada distribucionalismo ou

lingü-ística distribucional e suas maiores preocupações, como a descrição das línguas

indígenas da América do Norte.

Logo em seguida ao Estruturalismo, é apresentada outra corrente for-malista, denominada Gerativismo, pelo pesquisador Eduardo Kenedy. Como o próprio autor assevera, a apresentação desse tópico é geral, introdutória e simplificada, já que o público alvo costuma ser composto por quem conhece pouco ou nada sobre o gerativismo. A faculdade da linguagem, ponto central dos estudos chomskyanos, é detalhadamente explicada de maneira bastante acessível ao grande público. O gerativismo é apresentado como uma retomada a alguns princípios racionalistas outrora vigentes em séculos passados. Logo em seguida, Kenedy apresenta os principais modelos teóricos que procuram descrever a lingüística gerativa, desde a gramática transformacional até a teoria

de princípios e parâmetros e sua bifurcação na fase da teoria da regência e da ligação e do vigente programa minimalista. O autor apresenta o grande mérito

de simplificar as linhas gerais do pensamento gerativista e de apresentar um es-tudo ainda bastante recente da genética da linguagem, ligado à descoberta do gene FOXP2. Assim, alia-se clareza expositiva e atualização teórico-empírica.

No capítulo 9, Cezario e Votre apresentam a Sociolingüística, área que estuda a língua em seu uso real, rompendo com a tradição formalista desen-volvida pelo Estruturalismo e pelo Gerativismo. Os autores desenvolvem os conceitos de mudança e variação, bastante caros à sociolingüística e informam o leitor da importância de analisar os fatores que motivam esses fenômenos. O advento da corrente sociolingüística variacionista é recuperado desde os trabalhos de Labov, Gumperz e Dell Hymes e da relação com a dialetologia, surgida na década de 1930. Por fim, Cezario e Votre analisam os aspectos teórico-metodológicos da sociolingüística tal como é praticada nos dias de hoje e apontam para o uso de tais aspectos por outras correntes, como o fun-cionalismo norte-americano.

Em seguida, Cunha apresenta o Funcionalismo, caracterizado como uma corrente lingüística assumidamente oposta ao Estruturalismo e ao Gerativis-mo, já que a preocupação dos funcionalistas é com a relação que se estabelece entre a estrutura gramatical das línguas e os diferentes contextos comunicati-vos em que elas são usadas. A autora optou por apresentar o Funcionalismo a

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partir de duas grandes vertentes: a européia e a norte-americana. O chamado funcionalismo europeu abarca principalmente os trabalhos do holandês Si-mon Dik e da Escola de Londres, representada por Halliday, cujos trabalhos reconhecem a inadequação do formalismo e propõem a incorporação da se-mântica e da pragmática à análise sintática. Quanto ao funcionalismo norte-americano, a autora recupera os primeiros trabalhos desenvolvidos nos EUA que tinham como preocupação fornecer evidências das motivações discursivas geradoras das estruturas sintáticas. Assim, Sankoff, Brown, Givón, Hopper, Traugott, Thompson e vários outros autores são citados, além de outros como Heine e Kuteva, que mesmo estando na Alemanha, identificam-se com os princípios da escola norte-americana. Informatividade, iconicidade, marca-ção, transitividade, planos discursivos e gramaticalização são alguns dos tópi-cos analisados pela autora neste capítulo.

No capítulo 11, Martelotta e Palomanes abordam a lingüística cogni-tiva, que com o funcionalismo tem dialogado produtivamente ao longo dos últimos anos, haja vista os trabalhos de Langacker, Lakoff, Tomasello e Taylor. Perseguindo uma abordagem fortemente anti-gerativista, a lingüística cogniti-va ataca os princípios da modularidade da mente, da matematização da lingua-gem e da autonomia da sintaxe, todos altamente defendidos pelos seguidores de Chomsky. O chamado sociocognitivismo, visto como um desdobramento do cognitivismo clássico, postula uma mudança de perspectiva no estudo da linguagem, “colocando os usuários da língua no centro da construção do sig-nificado”. Rompendo com a abordagem racionalista, a análise cognitivista, defensora de uma visão integradora do fenômeno da linguagem, leva em conta a “captação de dados da experiência para construção da significação referente ao nosso universo cultural”, ao que ela dá o nome de pensamento corporificado. Ademais, diversos outros conceitos como molduras comunicativas, esquemas

imagéticos, modelos cognitivos idealizados, mesclagem e projeção são

apresenta-dos com grande clareza ao leitor ainda não-familiarizado com os princípios dessa moderna linha de investigação lingüística.

Oliveira, no capítulo seguinte, apresenta a chamada Lingüística Textual, cujo foco central é analisar o texto em seus variados matizes e interseções. Partindo de um rápido histórico, a pesquisadora apresenta os autores mais representativos dessa linha de investigação lingüística, como Beaugrande, Dressler, Fávero e Koch. Em seguida, Oliveira analisa duas grandes

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proprieda-des dos textos: a coesão e coerência. Servindo-se dos estudos proprieda-desenvolvidos por Halliday e Hasan, Oliveira examina os cinco mecanismos básicos de coesão, a saber: referência, substituição, elisão, conjunção e coesão lexical. No tocante à coerência, a autora analisa os componentes lingüístico, pragmático e extra-lingüístico, quem compõem toda produção textual. Concluindo o capítulo em questão, Oliveira reconhece que a lingüística textual ainda tem um longo caminho a percorrer haja vista a novidade de seus pressupostos teóricos.

Com a lingüística textual, é encerrada a segunda grande parte do livro e, por fim, dá-se início ao terceiro bloco de capítulos, que envolve as questões de aquisição, processamento e ensino. Assim, o 13º capítulo da obra, de au-toria de Cezario e Martelotta, aborda a controversa questão da aquisição da linguagem. Como é característico ao livro, os autores apresentam o assunto com grande preocupação didática. Partindo da hipótese behaviorista, Cezario e Martelotta apresentam a hipótese inatista, além das hipóteses construtivista e interacionistas, que se subdividem em cognitivismo construtivista,

interacio-nismo social e visão sociocognitivista. Dessa forma, é apresentada uma visão

bastante abrangente do fenômeno da aquisição da linguagem, sob a ótica de diversas correntes. Reconhecem os autores, contudo, que mesmo diante de tantas vertentes e pesquisas já encetadas, a aquisição da linguagem permanece como “um segredo a ser desvendado”, já que muito ainda há por ser estudado.

No 14º parágrafo, Leitão apresenta uma linha teórica intimamente re-lacionada à anterior, que é a Psicolingüística experimental. Afinal, processa-mento da linguagem é um assunto bastante afinado com a aquisição da lin-guagem. Recuperando trabalhos clássicos, como o de Humboldt e Wundt, o autor perpassa diversas outras pesquisas já realizadas nesse campo de inves-tigação, indo às descobertas mais modernas, como as produzidas pela neu-rolingüística de Wernicke e Broca. Em linhas gerais, Leitão assevera que a tarefa central da psicolingüística é realizar estudos sobre a percepção da fala, sobre o reconhecimento das palavras, sobre o processamento de frases que investigam a organização das estruturas sintáticas e estudar a interpretação semântica dos enunciados lingüísticos. O autor reconhece que tais tarefas são altamente complexas, já que é difícil ter acesso in loco aos procedimentos mentais que ocorrem durante o processamento lingüístico. É a partir de tais dificuldades que as pesquisas centram-se em experimentos ora on line ora

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avançassem ainda mais por diversos centros universitários situados tanto no Brasil quanto no exterior.

Por fim, o último capítulo contempla algumas discussões centrais acerca da relação entre Lingüística e ensino. Sendo uma obra essencialmente didática, os autores coerentemente dedicam parte de suas investigações à área de ensino. Oliveira e Wilson iniciam as discussões ressalvando que tal capítulo não quer ser uma abordagem estritamente ligada à Lingüística Aplicada, mas intenta lançar luzes sobre as diversas concepções de linguagem, que devem estar calca-das nas dimensões social, funcional, interacional e pragmática. Dessa forma, as autoras optam por um recorte no assunto, o que faz com que ele seja tratado de forma adequada e apropriada.

O livro como um todo proporciona uma leitura agradável e altamente in-formativa, desenvolvendo reflexões de forma acessível ao grande público. Deve-se ressaltar que um livro que trata de tantos assuntos precisa Deve-ser necessariamen-te geral, o que, sem dúvida, não compromenecessariamen-te a sua qualidade e natureza.

Enfim, trata-se de uma obra recomendável para nossos cursos de Letras espalhados pelo Brasil e para todos aqueles que se interessam pela linguagem humana de uma maneira geral. O vocabulário acessível e a exposição didática favorecem a leitura profícua de todos os capítulos sem grandes dificuldades. Ademais, no final, é oferecida uma vasta bibliografia, que possibilita aos inte-ressados o aprofundamento em quaisquer tópicos analisados ao longo da obra. Assim, como se disse no início desta resenha, Manual de Lingüística supre uma grande lacuna constatada principalmente por docentes e pesquisadores da ciência da linguagem, já que a carência de oferta de material desse nível em língua portuguesa era sensivelmente notada.

Recebido em 05/04/2008 Aprovado em 05/06/2008

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