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1822: a História de um país chamado Brasil

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Academic year: 2021

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1822: a História de um país chamado Brasil

Por: Érica Fabrícia Silva, profª de História

É preciso que voltes com a maior brevidade; esteja persuadido de que não é só o amor, a amizade que me faz desejar, mais que nunca, a sua pronta presença, mas sim as críticas circunstâncias em que se acha o amado Brasil; só a sua presença, muita energia e rigor, para salvá-lo da ruína. As notícias de Lisboa são péssimas.

(trecho da carta de d. Leopoldina a d. Pedro antes da declaração da independência. LUSTOSA, 2008, p.152)

“Amigos, as Cortes portuguesas querem escravizar-nos e perseguem-nos. De hoje em diante nossas relações estão quebradas. Nenhum laço nos une mais”. Arrancou do chapéu o laço azul e branco, símbolo da nação portuguesa, dizendo: “Laços fora, soldados. Viva a Independência, a liberdade e a separação do Brasil!” (LUSTOSA, 2008, p.153)

Lendo estes trechos tão singulares da história da nossa independência, ficamos orgulhosos dessa princesa tão preocupada com o futuro da nossa sociedade e desse príncipe tão garboso que lutou pela “liberdade” do Brasil, como inclusive diz um trecho do Hino da Indepedência “Já raiou a liberdade no horizonte do Brasil”. Porém, há muitos questionamentos girando em torno do sete de setembro (e os outros dias depois deste) e seus reais significados históricos? De fato, nasceu um país do grito de d. Pedro às margens do Ipiranga?

Se na atualidade um dos “lemas” de ser brasileiro é “não desistir nunca” (como eternizou uma emissora de tevê), destaca-se na história que essa é uma grande característica de ser brasileiro desde o príncipio, quando para se conquistar autonomia política teve que enfrentar e vencer obstáculos (internos e externos) que pareciam insuperáveis em 1822. Era tudo impreciso, inseguro e indefinido no cenário brasileiro às vésperas do Grito do Ipiranga. Ou como disse Laurentino Gomes no livro 1822,

Quem observasse o Brasil nessa época teria razões de sobra para duvidar de sua viabilidade como país. Às vésperas do Grito do Ipiranga, o Brasil tinha tudo para dar errado. De cada três brasileiros, dois eram escravos, negros forros, mulatos, índios ou mestiços. Era uma população pobre e carente de tudo. O medo de uma rebelião branca pairava como um pesadelo sobre a minoria branca. Os analfabetos somavam mais de 90% dos habitantes. [...] À beira da falência, o novo país não tinha exércitos, navios, oficiais, armas ou munição par sustentar a guerra pela sua independência [...]. (GOMES, 2010, p. 57,58 e 59

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Assim, fazer o Brasil acontecer não foi tarefa fácil, mesmo para alguém tão jovem e idealista como d. Pedro. Principalmente se considerarmos o fato de que um país não se faz sem um povo que carregará não só a bandeira da liberdade, mas também o orgulho de estar construindo a sua liberdade, situação que não chegou a acontecer em terras brasileiras, já que os interesses vinculados ao “Independência ou Morte” partiram da elite agrária temerosa de ser recolonizada e não da população comum, que sequer sabia o que estava acontecendo. Para variar, não é de hoje que o povo brasileiro é o último a saber sobre os acontecimentos do seu país!

Nesse contexto o novo país nascia falido e de certa maneira sem muita credibilidade. Em 1822 eram poucos a apoiar a separação definitiva de Portugal. Por que? Porque poucos sabiam o que acontecia nos corredores da história política brasileira. Além disso, a elite que amadureceu e influenciou d. Pedro com a ideia da independência, de se tornar rei/imperador do Brasil, se segurou a ele, depois do grito, por temer as possíveis reviravoltas que poderiam acontecer em um território tão dividido e tão pouco informado quanto ao seu futuro. Não havia nada de heroico ou virtuoso na emancipação brasileira que a fizesse triunfar, se consolidar. Pelo contrário, para alguns pensadores, teria sido a sua fragilidade responsável por provocar o primeiro passo de união de ideiais em torno de garantir a nossa separação lusitana. Como bem afirmou Sérgio Buarque de Holanda “[...] foi o sentimento de medo que fez com que a elite colonial brasileira nas diversas provincias se mantivesse unida em torno da Coroa. Conseguiu dessa forma preservar seus interesses e viabilizar um projeto único de país no continente americano”. (HOLANDA, Sérgio Buarque. In: GOMES, Laurentino – Dossiê 1822, Revista História Viva, p.28, Ano VIII, nº 85).

Os inúmeros problemas não poderiam continuar a ser entraves na consolidação do Estado Brasileiro. Mesmo reconhecendo as grandes dificuldades d. Pedro I sabia que era mais que necessário forjar a identidade brasileira através dos símbolos nacionais, como bandeira, brasão, hino. Mas também estabelecendo limites e reconhecendo a partir das leis o apoio das elites. Assim, nasce a primeira Carta Magna brasileira, em 1824, filha do autoritarismo do imperador, pois para executá-la a Assembleia Constituinte foi dissolvida, e apesar de ser um dos textos constitucionais mais inovadores da época, já “nasceu” autoritário porque estabelecia o poder moderador que colocava o imperador acima dos outros três poderes, elitista porque garantia o direito ao grande latifúndio e a

manuntenção da ordem

escravocrata. Dessa forma, o Brasil conseguiu se separar de Portugal, cujo reconhecimento custou uma dívida com a Inglaterra de 2 milhões de libras esterlinas além das dívidas anteriores de Portugal com os ingleses que se tornaram brasileiras, sem alterar a ordem social já estabelecida.

O Brasil que surge é o resultado de uma edificação hierárquica, de cima para baixo. A elite imperial, formada na Europa, portanto bem preparada, que conduziu o processo de construção nacional, evitando a participação do povo com o objetivo de impedir que este exigisse direitos e democracia. E o povo nessa história? Continuou no seu silêncio!

Como podemos perceber na charge ao lado, ao se colocar acima da Constituição, pelo poder moderador, o imperador deixava claro que não se submeteria a ela ou qualquer situação política que o desagradasse.

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A Charge ainda ironiza uma das características mais marcantes do imperador: ser galanteador demais.

Mas o heroi, conquistador de corações, o “foguinho” ou “demonão” como gostava de ser identificado em cartas pessoais enviadas para sua amante mais famosa, a marquesa (que ele presenteou com o título para que ela pudesse circular livremente pela corte) Domitilia de Castro Canto e Melo, pouco a pouco foi se tornando vilão de sua própria história. A sua vida privada de homem boêmio e conquistador era alvo de inúmeras críticas pelos escândalos frequentes. Se houvesse redes sociais na época, essa história iria “bombar” com certeza, já imaginou as rashtags que poderiam existir, do tipo #imperadorplayboy ou #fogãodopedrão. Somada a isso sua dúvida entre o Brasil e Portugal, pois por mais que se declarasse brasileiro ainda continuava ligado à antiga metrópole, principalmente se o assunto fosse a cabeça que usaria a Coroa, de preferência a dele, é claro! Um terceiro motivo para a mudança na identidade do imperador de heroi para vilão com certeza foi a desgastante guerra brasileira pela provincia Cisplatina e a vergonhosa derrota, que deixou em situação lastimável os cofres públicos brasileiros. E por fim, mas não menos importante, a instabilidade política e a forma cruel e autoritária de resolver os problemas internos que o soberano tinha. Dissolver a Assembleia em 1823, censurar a imprensa, massacrar os líderes da Confederação do Equador, estas e outras ações o levaram a perder o apoio e se isolar.

Assim, quando abdicou em 1831, não se lastimou, pelo contrário, algumas fontes relatam que parecia relaxado e até um pouco alegre, como se estivesse livre de um fardo. Isabel Lustosa (2008) relata da seguinte maneira: “[...] segundo o diplomata francês, que a tudo assistiu, d. Pedro soube abdicar melhor do que soubera reinar. [...].Depois do embarque, d.Pedro parecia muito sereno, até mesmo alegre [...] logo que se instalou a bordo tomou da viola e tocou um miudinho, como se tudo não tivesse importância”.(LUSTOSA, 2008p. 301, 304)

E assim, da mesma forma intempestuosa que começou também terminou o primeiro passo “trôpego” da identidade e emancipação brasileira.

Vejamos agora como os vestibulares tem abordado este assunto:

1.(UFTPR 2008 – adaptada do Enem) A independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, é um dos fatos históricos mais importantes de nosso país, pois marca o fim do domínio político português. Sobre o desenrolar desse episódio, podemos afirmar que:

A) consolidou os ideias da Inconfidência mineira.

B) marcou o inicio da participação popular na política brasileira.

C)assinalou a predominância dos interesses ingleses, com a imediata libertação dos escravos.

D) provocou profundas transformações sociais nas estruturas econômicas e sociais do país.

E) preservou os interesses básicos dos proprietários de terras e de escravos. COMENTÁRIO: resposta correta E

O processo histórico que resultou na independência brasileira foi motivado principalmente pelos interesses das elites agrárias (donas de terras e de escravos). Não consolidou os ideais da Conjuração mineira, pois estes queriam a república. Favoreceu apenas a aristocracia latifundiária, uma vez que o povo não participou e não teve direitos reconhecidos, assim como os escravos não foram libertos.

2. Os membros da loja maçônica fundada por José Bonifácio em 2 de junho de 1822 (e que no dizer de Frei Caneca não passava de um “clube de aristocratas servis”) juraram “procurar a integridade e independência e felicidade do Brasil como Império constitucional, opondo-se tanto ao despotismo que o altera quanto à anarquia que o

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dissolve”. Na visão de José Bonifácio e dos membros da referida loja maçônica, o despotismo e a anarquia eram encarnados, respectivamente,

A) pelos que defendiam a monarquia e a autonomia das províncias.

B) por todos quantos eram a favor da independência e união entre as províncias. C) pelo chamado partido português e os republicanos ou exaltados.

D) pelos partidários da separação com Portugal e da união sul-americana.

E) pelos partidos que queriam acabar com a escravidão e a centralização do poder. COMENTÁRIO: resposta correta C

A expressão utilizada por Frei Caneca serve para nos lembrar a origem socioeconômica dos membros da maçonaria, a aristocracia rural brasileira, que organizou o processo de independência política do Brasil, preocupada em manter seus privilégios econômicos e garantir para si, o controle político do país. Aqueles que apoiaram a outorga da Constituição eram denominados de “partido português e aqueles que pretendiam reformas mais profundas, os republicanos – mais tarde exaltados.

3.(UNESP 2009) A nação independente continuaria na dependência de uma estrutura colonial de produção, passando do domínio português à tutela britânica.Da Monarquia à República - Emília Viotti da Costa. O texto permite concluir que:

a) a Inglaterra teve importante papel na articulação da independência do Brasil, interessada nos amplos mercados que se abririam ao comércio britânico na América Ibérica.

b) após a independência, o país passou por grandes mudanças sociais e econômicas, rompendo com a dependência.

c) os ingleses apoiaram, sem restrições, a política da Santa Aliança, oferecendo ajuda militar para combater a independência das colônias ibéricas.

d) a Inglaterra apoiou nossa emancipação, sem fazer nenhuma exigência de caráter econômico.

e) o liberalismo político e econômico, praticado por nossas elites, mudou radicalmente, após a independência, o quadro sócio-econômico do país.

COMENTÁRIO: resposta correta A

A Inglaterra industrializada e defensora do liberalismo (do séc. XVIII), colocou-se contra a política expansionista de Napoleão e também contra a política recolonizadora da Santa Aliança, defendendo a independência das colônias ibéricas, como forma de ampliar seus mercados consumidores.

4. (Ufrrj 2005) Leia os textos a seguir, reflita e responda.

Após a Independência política do Brasil, em 1822, era necessário organizar o novo Estado, fazendo leis e regulamentando a administração por meio de uma Constituição. Para tanto, reuniu-se em maio de 1823, uma Assembléia Constituinte composta por 90 deputados pertencentes à aristocracia rural.(...) Na abertura dos trabalhos, o Imperador D. Pedro I revelou sua posição autoritária, comprometendo-se a defender a futura Constituição desde que ela fosse digna do Brasil e dele próprio.

a) foi consagrada a extinção do tráfico de escravos, devido à pressão da sociedade liberal do Rio de Janeiro.

b) foi introduzido o sufrágio universal, somente para os homens maiores de 18 anos e alfabetizados, mantendo a exigência do voto secreto.

c) foi abolido o padroado, assegurando ampla liberdade religiosa a todos os brasileiros natos, limitando os cultos religiosos aos seus templos.

d) o poder moderador era atribuição exclusiva do Imperador, conferindo a ele, proeminência sobre os demais poderes.

e) o poder executivo seria exercido pelos ministros de Estado, tendo estes total controle sobre o poder moderador.

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COMENTÁRIO: resposta correta D O modelo social e político que o Brasil assumiu após a independência permaneceu o mesmo da época da colônia – latifundiário e escravocrata. Eram os privilégios da elite agrária que prevalecia na Constituição, confirmado com o direito do voto censitário que excluia quem não podia declarar renda anual de 100 mil réis. Além disso a ligação do Estado com a Igreja ficou ainda mais estreita, refletindo o Padroado, em que Igreja e Estado interferiam mutuamente na área de atuação do outro. E mantendo-se totalmente no poder o imperador criou o poder moderador que se estabelecia sobre os outros poderes.

5. (UEPB 2008)

Em relação aos primeiros anos de independência política do Brasil, é correto afirmar: a) A Constituição de 1824 consagrou o princípio democrático e garantiu às camadas populares o direito de voto e acesso a candidatura para os diversos cargos eletivos. b) O Primeiro Reinado (1822-1831) foi marcado pelas lutas entre as elites regionais das províncias e os partidários de D. Pedro I, que defendiam medidas centralizadoras e não afastavam a hipótese de uma reunificação do império luso-brasileiro.

c) A independência política do Brasil formalizada em 1822 garantiu mudanças estruturais da economia brasileira, inclusive com a extinção do sistema plantation. d) O primeiro país a reconhecer a independência do Brasil foi a França, em 1825, que emprestou dois milhões de libras ao Brasil para pagar de indenização a Portugal. e) O espírito liberal de D. Pedro I garantiu o fim do centralismo político no Primeiro Reinado, bem como maior autonomia para as províncias do Nordeste, sobretudo após a Confederação do Equador.

COMENTÁRIO: resposta correta B

A independência foi resultado dos interesses das elites agrárias, que mesmo depois da ação de D. Pedro I continuou temerosa quanto a fragilidade do recém criado Estado Brasileiro. Havia muitos que brigavam pelo poder político local e permaneceram ligados aos interesses de Portugal, por considerarem a emancipação brasileira fraca demais e sem apoio suficiente para se estabilizar.

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