Módulo 4
Núcleo e Hereditariedade
NÚCLEO 3!
CONSTITUIÇÃO DO NÚCLEO 3!
CROMATINA E CROMOSSOMAS 4!
CICLO CELULAR 6!
INTERFASE 7!
REPLICAÇÃO DO ADN 8!
FASE MITÓTICA 9!
FASES DA MITOSE (DIVISÃO DO NÚCLEO) 9
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CITOCINESE (DIVISÃO DO CITOPLASMA) 11
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REPRODUÇÃO SEXUADA E MEIOSE 11
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MEIOSE 12
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HEREDITARIEDADE 14
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GENÓTIPO E FENÓTIPO 14
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GENÉTICA MENDELIANA 15
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ESTUDOS DE MONO-HIBRIDISMO — 1ª LEI DE MENDEL 15
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INTERPRETAÇÃO ACTUAL DA 1ª LEI DE MENDEL 16
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ESTUDOS DE DI-HIBRIDISMO — 2ª LEI DE MENDEL 17
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RETROCRUZAMENTO OU CRUZAMENTO-TESTE 19
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EXTENSÕES DA GENÉTICA MENDELIANA 19
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DOMINÂNCIA INCOMPLETA 19
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CO-DOMINÂNCIA 20
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HEREDITARIEDADE HUMANA 20
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HEREDITARIEDADE AUTOSSÓMICA 21
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HEREDITARIEDADE ASSOCIADA AOS CROMOSSOMAS SEXUAIS 21
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ALELOS MÚLTIPLOS 22
!
SISTEMAS SANGUÍNEOS E HEREDITARIEDADE 22
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SISTEMA ABO 22
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BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 3
NÚCLEO
O núcleo é uma estrutura celular de grandes di-mensões e limitada por membrana, situada normal-mente numa posição central nas células eucariotas ocupando cerca de 10% do volume total da célula. Esta verdadeira central de controlo celular armazena quase toda a informação genética da célula, estando a parte restante no ADN das mitocôndrias. Todas as células do organismo humano possuem núcleo em determinada fase do seu ciclo de vida, ainda que al-gumas, como os glóbulos vermelhos, o percam no seu desenvolvimento. Outras células, como as do músculo esquelético, possuem mais do que um núcleo.
Constituição do Núcleo
O núcleo é delimitado por um invólucro nuclear formado por duas membranas concêntricas (Figura 1). A membrana externa apresenta continuidade com as membranas do reticulo endoplasmático e o espaço entre esta e a membrana interna é também contínuo com o lúmen (espaço interno) do retículo. Tal como outro tipo de membranas celulares, cada membrana nuclear é formada por uma bicamada lipídica per-meável apenas a pequenas moléculas apolares. O transporte de moléculas maiores que não se podem difundir através da membrana nuclear de e para o
citoplasma é efectuado através de poros nucleares (Figura 1), que resultam da fusão das membranas interna e externa nesses pontos.
Cada poro é formado por um conjunto de várias proteínas, as nucleoporinas, dispostas num arranjo simétrico octogonal originando o complexo do poro
nuclear. Trata-se de uma estrutura proteica complexa
responsável pelo tráfego selectivo de proteínas e ARN. O transporte através destes poros nucleares pode ocorrer por dois mecanismos distintos dependendo somente das dimensões das moléculas. Moléculas polares de menores dimensões atravessam livremente os poros nucleares por transporte passivo. No entanto, a passagem da maioria das proteínas e ARN requer o gasto de ATP (transporte activo). Neste caso, o trans-porte poder ser mediado por uma ou mais proteínas que irão agir como sinalizadoras direccionando e alte-rando o canal para a passagem do material.
Alguns milhões de macromoléculas proteicas (co-mo por exemplo histonas, polimerases e factores de transcrição) atravessam selectivamente o envelope nuclear e alternam a sua localização entre o núcleo e o citoplasma a cada minuto. Este tráfego selectivo é indispensável para a manutenção de todos os aspec-tos estruturais e funcionais do genoma. Este transpor-te ao nível do núcleo só é possível devido à presença nestas proteínas de sequências curtas de aminoácidos (sequências sinal) que funcionam como sinais de
Poros nucleares Envelope nuclear Nucléolo Cromatina Nucleoplasma Lamina nuclear
Membrana nuclear interna Membrana nuclear externa
Poro nuclear
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 4
localização nuclear (NLS, na sigla em Inglês). Essas
sequências são reconhecidas por uma classe de prote-ínas específica, as importinas ou receptores de
im-portação, que se ligam diretamente às proteínas a ser
transportadas e as conduzem até ao complexo do poro nuclear. A exportação pelo núcleo de proteínas e de complexos macromoleculares, como por exemplo as subunidades ribossomais, dá-se de modo similar à importação das proteínas.
A membrana nuclear externa, por estar em conti-nuidade com as membranas do reticulo endoplasmá-tico, apresenta ribossomas ligados à sua superfície citoplasmática e desempenha funções idênticas às membranas do retículo. Pelo contrário, a membrana nuclear interna é sustentada por uma rede de filamen-tos, a lâmina nuclear, composta por proteínas fibro-sas, as laminas — que são filamentos intermediários específicos do núcleo — que conferem suporte estru-tural ao núcleo. As laminas são muito importantes na estabilização da membrana interna do núcleo. Mais de dez distúrbios genéticos, incluindo duas formas raras de distrofia muscular e uma de envelhecimento pre-coce, são causadas por diferentes mutações no gene que codifica estas laminas nucleares.
Dentro do núcleo encontra-se o nucléolo, estrutu-ra que, após a adição de um pigmento de contestrutu-raste, cora mais intensamente por ser rico em ARN (Figura 2). A maioria das células apresenta apenas um nucléo-lo, mas algumas células do corpo humano podem ter
até um máximo de 10 nucléolos. As células de mamí-feros metabolicamente activas contêm 5-10 milhões de ribossomas que têm de ser sintetizados cada vez que a célula se divide (aproximadamente a cada 24 horas). O nucléolo é uma “fábrica” de ARN
ribossó-mico, capaz de regular, produzir e montar as
subuni-dades ribossomais de modo a satisfazer as necessida-des das células.
Disperso por todo o núcleo pode observar-se um emaranhado na forma de uma massa filamentosa chamada cromatina (assim chamada por corar de uma forma característica), onde se encontra a infor-mação genética. Cada fio de cromatina é formado por uma longa molécula de ADN associada a proteínas especificas, as histonas. Entre os grânulos de croma-tina e o nucléolo existe o nucleoplasma, um fluido claro e ligeiramente ácido devido à presença elevada de ácidos nucleicos.
Cromatina e Cromossomas
Todas as células do organismo humano possuem os mesmos genes, pois tiveram origem numa única célula comum. Contudo, cada célula utiliza e expressa apenas os genes que são relevantes para o seu papel específico no organismo. Por exemplo, um neurónio não utiliza os genes que as células do pâncreas ex-pressam para produzir insulina. As porções de croma-tina funcional contendo os genes utilizados por uma determinada célula apresentam-se descondensadas durante a maior parte do ciclo de vida da célula — ou seja, não estão na sua forma mais compactada —para que possam ser transcritas, e designam-se por
eu-cromatina. A porção da cromatina composta por ADN
inactivo — que tem funções estruturais e protectoras — permanece condensada durante todo o ciclo de vida da célula e designa-se por heterocromatina.
Em determinado momento da vida da célula pode-rá ocorrer o fenómeno da divisão celular. Nessa fase, uma série de processos será desencadeada e o mate-rial genético sofre uma forte compactação (“enrola-mento”), os filamentos de cromatina formam uma espiral enrolando-se sobre si mesmos, tornando-se mais curtos e densos, até assumirem o aspecto de bastões compactos, chamados cromossomas (Figura 3). A cromatina e os cromossomas são então o mes-mo: os cromossomas correspondem ao estado mais compactado da cromatina, que os tornam visíveis ao
poro nuclear envelope nuclear eucromatina heterocromatina retículo endoplasmático rugoso nucléolo centro de organização nucleolar
Figura 4.3 - Eletromicrofia de núcleo bem formado de uma célula eucariótica, com a descrição de suas estruturas.
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BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 5
microscópio óptico (Figura 4). Os cromossomas têm como função manter todo o ADN numa forma com-pacta para que possa ser correctamente distribuído pelas células-filhas durante a divisão celular.
Cada cromossoma é formado por uma única
mo-lécula de ADN que contém um determinado número
de genes. Um gene, por sua vez, é definido como uma sequência de nucleótidos de uma molécula de ADN que pode ser transcrita numa das formas de ARN e que, na maioria das vezes, levará à produção de uma proteína. Antes de uma célula de dividir ela necessita de duplicar todo o seu material genético, ou seja, tem de criar uma cópia exatamente igual de todas as mo-léculas de ADN que possui. Quando isso acontece, cada cromossoma passa a ser formado por duas molé-culas, isto é, dois cromatídeos. Cada cromatídeo é então formado por uma molécula de ADN indepen-dente, associada a proteínas e ARN. No cromossoma, os cromatídeos estão unidos entre si por uma região chamada constrição primária ou centrómero. O centrómero é um ponto de referência pois divide os cromossomas em dois braços: p (do Francês petit) para o braço curto e q para o longo. Os braços são indicados pelo número do cromossoma seguido de p
ou q. Por exemplo, 11p é o braço curto do cromosso-ma 11. O tacromosso-manho dos braços dos cromossocromosso-mas de-pende da posição do centrómero. Num cromossoma
telocêntrico, o centrómero encontra-se numa das
suas extremidades e o braço curto é inexistente; num cromossoma acrocêntrico, o centrómero surge entre uma das extremidades e o ponto médio do cromos-soma, definindo dois braços de comprimentos perfei-tamente distintos; num cromossoma metacêntrico, o centrómero surge a meio do cromossoma, dividindo-o em dois braços de tamanhos semelhantes.
Nas extremidades dos cromossomas, encontram-se encontram-sequências repetidas de ADN não activo, denomi-nadas de telómeros, cuja principal função é proteger o ADN de danos, garantindo-se assim a integridade do material genético contida nos cromossomas. Cada vez que a célula se divide, os telómeros são ligeiramente encurtados, isto é, parte do ADN nas suas extremida-des é perdido. Este ADN não é regenerado, pelo que a dado ponto os cromossomas perdem a sua capacida-de capacida-de replicação e a célula fica incapaz capacida-de se dividir. Por outro lado, o encurtamento dos telómeros pode também levar à perda de genes importantes para a célula ou silenciar genes próximos. Existe, portanto, uma correlação entre a diminuição do tamanho dos telómeros e o envelhecimento celular.
Cada espécie possui um número de cromossomas específico, cada um deles também com uma morfolo-gia particular. O conjunto de cromossomas de um indivíduo de uma determinada espécie é denominado de cariótipo (Figura 5), e o seu estudo tem auxiliado no diagnóstico de várias doenças genéticas humanas
Histonas
Cromossoma (metafásico)
Molécula de ADN
Figura 4. Níveis de compactação da cromatina (ADN associado a
proteínas).
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 6
e tem contribuído significativamente para a análise da diversidade biológica. Os cariótipos permitiram obser-var que cada cromossoma diferente está representado por dois exemplares idênticos em todas as células somáticas (isto é, em todas as células excepto as célu-las sexuais), que foram herdados um de cada progeni-tor — são os cromossomas homólogos. Como estas células contêm dois representantes (homólogos) de cada cromossoma da espécie, são classificadas de
células diplóides (2n). Denota-se por n o número de
cromossomas distintos de uma espécie. As células diplóides apresentam, portanto, 2n cromossomas.
As células sexuais (ou gâmetas — óvulo e esper-matozoide) possuem apenas um representante para cada tipo de cromossoma e não um par de homólo-gos, logo têm n cromossomas e são designadas de
células haplóides. Após a fecundação, os núcleos do
óvulo e do espermatozoide fundem-se para formar novamente uma célula diplóide (ovo), reconstituindo os pares de homólogos. Pelo contrário, a formação de
gâmetas consiste num processo de divisão celular que leva à redução do número de cromossomas para me-tade (de 2n para n). Este processo de divisão celular, chamado meiose, será estudado mais adiante.
A espécie humana é caracterizada por possuir 23 tipos de cromossomas diferentes, pelo que em todas as suas células somáticas apresenta 46 cromossomas (23 pares de cromossomas homólogos). Um indivíduo recebe um conjunto de cromossomas (23) do pai que fará par com o conjunto de cromossomas da mãe (23), formando pares de cromossomas homólogos. Destes, 22 pares são compostos por cromossomas semelhan-tes em ambos os sexos e são denominados
autossó-micos. O par restante compreende os cromossomas sexuais, de morfologia diferente entre si, que
rece-bem o nome de X e Y. Na mulher existem dois cro-mossomas X (cariótipo indicado como 46, XX) e no homem existe um cromossoma X e um Y (cariótipo indicado como 46, XY).
Ciclo Celular
O ciclo celular define-se como o fenómeno bioló-gico que compreende o conjunto de todos os eventos que ocorrem na vida de uma célula desde que ela tem origem até ao momento em que ela própria se divide. A reprodução celular é a principal característica dos organismos vivos. As células reproduzem-se dividin-do-se em duas células-filhas, que depois iniciam um novo ciclo celular para elas próprias se dividirem e darem origem a novas células. O ciclo celular divide-se em dois períodos: a interfase e a fase mitótica ou fase M, que corresponde à divisão celular propriamente dita (Figura 6).
QUADRO 1 — Telómeros e Envelhecimento celular
O encurtamento dos telómeros é um efeito irreversível: com as sucessivas divisões celulares os telómeros tornam-se cada vez mais curtos e as células perdem, em dado ponto, a capacidade de se dividir. A eliminação gradual dos telómeros pode mesmo eliminar certos genes que são indispensáveis à sobrevivência da célula. Ultrapassados os limites de encurtamento, o organismo tende assim a morrer “de velhice”. Os telómeros estabelecem por isso um limite para a longevidade.
A morte celular (apoptose) ocorre sempre que algo está errado, sendo por isso um mecanismo natural. As células canceríge-nas ou células maligcanceríge-nas têm a capacidade de resistir à apoptose, sendo esta a característica chave destas células. Pensa-se que a maioria dos cancros tem origem em mutações que reactivam a enzima telomerase, que garante a estabilidade dos telómeros, permitindo-lhes que se continuem a dividir indefinidamente.
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 7
Interfase
A interfase corresponde ao período compreendido entre a divisão celular em que a célula tem origem e o início da sua própria divisão. Não é de estranhar, pois, que as células passem a maior parte do seu ciclo de
vida em interfase, que é um período de actividade
biossintética intensa durante o qual a célula aumenta de tamanho e se prepara para a sua divisão. A interfa-se subdivide-interfa-se em três fainterfa-ses.
— Fase G1: é a primeira fase de crescimento da célu-la. A letra G vem, no entanto, do Inglês gap , que
signi-fica intervalo, e refere-se ao intervalo entre a divisão que originou a célula e o momento em que ela dupli-cará o seu ADN. Para a maioria das células esta é a fase mais longa;
— Fase S: nesta fase a célula sintetiza uma cópia de
todo o seu ADN, ou seja, dá-se a replicação do ADN. A letra S significa síntese;
— Fase G2: é a segunda fase de crescimento em que a
célula se prepara para separar o genoma
recentemen-te duplicado. Esta fase é o inrecentemen-tervalo (gap) entre o final da síntese do ADN e o início da divisão celular. Duran-te o período G2 a célula possui o dobro da quantidade de ADN presente na fase G1. A célula prepara-se para a fase mitótica e duplica o seu par de centríolos, que serão fundamentais na fase M. As mitocôndrias e ou-tros organelos são também replicados nesta fase.
Durante a interfase, os cromossomas não são visí-veis, pois possuem várias regiões descondensadas, e estão distribuídos pelo núcleo, pelo que este tem um aspecto uniforme.
A divisão celular ou mitose é a fase final e micros-copicamente visível do ciclo celular, durante a qual os cromossomas atingem o estado de máxima conden-sação e se tornam visíveis. A fase mitótica culmina com a divisão dos cromossomas duplicados e a dife-renciação da célula em duas células filhas.
A duração do ciclo celular varia consideravelmen-te com os diferenconsideravelmen-tes tipos de células de um mesmo organismo. Geralmente, uma célula com taxas de proliferação (ou divisão) elevadas completa um ciclo celular em cerca de 24 horas, em que a fase G1 dura cerca de 11h, a fase S cerca de 8h, a G2 cerca de 4h e a mitose ocorre em aproximadamente 1h. Já no caso das células de embriões de animais o ciclo pode ser completado em menos de 20 minutos. No entanto muitas células dividem-se ocasionalmente, apenas quando é necessário substituir outras que foram dani-ficadas ou morreram, e neste caso o ciclo celular pode durar bastante mais tempo. Por exemplo, algumas células do fígado humano têm ciclos celulares que duram mais de um ano.
Em condições que favoreçam o crescimento, o
conteúdo total de proteínas de uma célula típica
aumenta mais ou menos continuamente durante o ciclo. Da mesma maneira, a síntese de ARN é realizada QUADRO 2 — Estudos de Cariótipo
Uma técnica interessante de estudo de cariótipo é o mapeamento cromossómico, onde sondas marcadas com proteínas fluo-rescentes se ligam a regiões específicas do ADN, tornando mais fácil a sua visualização e a detecção de anomalias.
A análise do cariótipo revela que pode existir uma variação considerável no tamanho dos cromossomas dentro de um mesmo genoma. Por exemplo, no caso do Homem o cromossoma 1 pode ter três ou quatro vezes o tamanho do cromossoma 21.
Mais importante nos estudos de cariótipo é a detecção de anomalias cromossómicas como por exemplo a trissomia 21, res-ponsável pelo síndrome de Down, onde se observa a presença de três cromossomas 21 quando apenas existem dois num indivi-duo normal. Outro exemplo são as células cancerígenas, que se dividem descontroladamente e acumulam muitas mutações; algumas delas dão origem a genomas aberrantes com duplicação de cromossomas, como o caso das triploidias (3n) e tetraploidi-as (4n), facilmente observáveis num cariótipo.
Fase G2
Fase G1
Mitose (divisão
do núcleo) Citocinese (divisão do citoplasma) FASE M
Fase S
(replicação do ADN)
INTERFASE
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 8 a uma velocidade constante, excepto durante a fase M
ou mitótica, quando os cromossomas estão demasia-do condensademasia-dos para permitir a transcrição.
A divisão celular tem que ser cuidadosamente
re-gulada de modo a garantir a formação de
células-filhas com genomas intactos iguais ao da célula-mãe. O sistema de controlo do ciclo celular assenta num conjunto de proteínas que interagem entre si e que coordenam os processos essenciais à duplicação do material genético e divisão dos conteúdos celulares.
Replicação do ADN
A replicação do ADN é o evento que caracteriza a fase S do ciclo celular, e consiste no processo através do qual duas novas cadeias de ADN são produzidas, usando as já existentes como molde, que envolve um grande número de processos químicos, enzimas e um consumo elevado de energia. Essa energia provém dos próprios nucleótidos, que neste caso possuem três grupos fosfato. A quebra da ligação entre o pri-meiro fosfato e os dois mais terminais liberta grande quantidade de energia e permite a ligação do nucleó-tido à cadeia em formação. A energia libertada é tão elevada que torna a reacção irreversível. A replicação do ADN acontece uma única vez no ciclo de vida das células e, em humanos, ocorre a uma taxa de 50 nu-cleótidos por segundo. Para isso, os nunu-cleótidos têm que se encontrar disponíveis no interior do núcleo em número abundante para poderem ser utilizados.
A molécula de ADN é a única molécula que pode
ser replicada, enzimaticamente, produzindo cópias exactas da original. Isto ocorre porque cada uma das suas cadeias serve de molde para a formação de uma nova cadeia complementar. A replicação inicia-se num local bem definido da molécula de ADN designado
origem da replicação. A replicação propaga-se
de-pois de forma bidirecional, isto é, para ambos os lados da origem, criando as bolhas de replicação. No ponto das bolhas de replicação, em ambos os lados, onde a hélice de ADN é aberta, constitui-se a chamada
for-quilha de replicação, que é efectivamente o local
onde ocorre a replicação. As duas cadeias de ADN são copiadas em paralelo e de forma simultânea até ao
ponto de terminação da replicação, que
correspon-de também a uma zona específica do genoma. A replicação do ADN ocorre no núcleo das células e envolve diferentes enzimas: a ADN helicase, a ADN polimerase III, a ARN primase, a ADN polimerase I e a ADN ligase. A ADN helicase desenrola a molécula de ADN quebrando as pontes de hidrogénio que as bases azotadas formam entre as duas cadeias, ou seja, ela separa as duas cadeias de ADN. A sua acção deixa as cadeias expostas e torna possível o emparelhamento dos novos nucleótidos com os existentes em ambas as cadeias, que servem de molde. A ADN polimerase III é a enzima que adiciona e une entre si os novos nu-cleótidos através de ligações fosfodiéster, por com-plementaridade de bases, formando uma nova cadeia de ADN em cima de uma cadeia original. A ADN poli-merase III adiciona os novos nucleótidos na
extremi-Primer de ARN Cadeia líder (contínua) Cadeia atrasada (descontínua) 2º primer de ARN Forquilha de replicação Forquilha de replicação 1º primer de ARN Primer de ARN Fragmento de Okazaki Nova cadeia
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 9
dade 3’ da cadeia molde, pois a síntese da nova cadeia dá-se obrigatoriamente no sentido 5’–3’. Além disso, esta enzima só inicia a síntese a partir de um segmen-to já duplicado, para conferir esse emparelhamensegmen-to e prosseguir para o emparelhamento do nucleótido seguinte. Assim, depois de aberta a dupla hélice, a enzima ARN primase sintetiza um pequeno segmen-to chamado primer de ARN, a partir do qual a ADN polimerase III pode então iniciar a síntese de novo ADN. A cadeia molde com a orientação 3’–5’ no senti-do em que progride a forquilha de replicação, depois de formado o primer de ARN, é replicada de forma contínua à medida que a helicase continua a abrir a dupla hélice, sendo por isso chamada de cadeia
con-tínua ou cadeia líder. A outra cadeia molde do ADN,
pelas mesmas regras, tem de ser replicada no sentido oposto ao da cadeia contínua. Esta cadeia é chamada de cadeia descontínua ou cadeia atrasada, e é repli-cada por partes, os chamados fragmentos de
Okaza-ki. Também na cadeia atrasada ocorre a mesma
sínte-se prévia de um primer de ARN para que a ADN poli-merase III prossiga com a síntese de novo ADN, ape-nas com a diferença de que a síntese se dá no sentido oposto e por fracções. Uma outra enzima, a ADN
po-limerase I, encarrega-se de substituir os nucleótidos
de ARN do primer por nucleótidos de ADN, especial-mente trocando nucleótidos com uracilo por nucleó-tidos com timina. Por fim, a enzima ADN ligase une os vários fragmentos de Okazaki formados, através de uma ligação fosfodiéster entre os nucleótidos adja-centes. Este processo está ilustrado de forma simplifi-cada na Figura 7, que omite as acções da ADN polime-rase I e da ADN ligase.
Com a replicação formam-se duas novas cadeias de ADN. O processo diz-se semi-conservativo porque cada nova molécula de ADN formada (molécula “fi-lha”) conserva metade da molécula de ADN original
(molécula ADN “mãe”). Como são complementares, ambas transportam a mesma informação genética e podem mais tarde ambas servir de molde a duas no-vas cadeias complementares.
Fase Mitótica
A fase mitótica corresponde ao período de divisão
celular propriamente dito. No organismo humano,
com excepção das células que dão origem às células sexuais, todas as outras células se dividem da mesma forma. Depois da divisão as células filhas entram no-vamente no fase G1 da interfase.
O processo de divisão celular das células eucario-tas animais consiste na divisão nuclear, a mitose, seguida da divisão do citoplasma, a citocinese. Como referido atrás, os centríolos foram duplicados na fase G2. Os centríolos são estruturas cilíndricas constituí-das por microtúbulos e de extrema importância para a organização espacial dos cromossomas durante a mitose. Os dois pares de centríolos serão responsáveis por uma rede de microtúbulos que se ligará aos cro-mossomas, determinará a sua localização na célula ao longo das fases da mitose e, por fim, fará a sua separa-ção. Durante a divisão celular, organelos como o complexo de Golgi e o retículo endoplasmático são fragmentados em vários pedaços menores durante a fase M, assegurando a sua distribuição relativamente equitativa entre as células filhas durante a citocinese.
Fases da Mitose (divisão do núcleo)
A mitose envolve tradicionalmente 4 fases: prófa-se, metáfaprófa-se, anáfase e telófase.
PRÓFASE: A cromatina, que está difusa na
interfa-se, vagarosamente compacta-se em cromossomas bem definidos. Cada cromossoma foi duplicado du-rante a fase S precedente de maneira que cada um QUADRO 3 — Mutação e Reparação do ADN
A replicação do ADN em organismos eucariotas é bastante precisa. Em média, ocorre a inserção de um nucleótido errado apenas entre cada 1.000.000.000 (mil milhões) a 100.000.000.000 (cem mil milhões) de nucleótidos incorporados na hélice. Quan-do ocorrem, estes erros dão origem a mutações. Uma mutação é uma alteração na sequência original de uma molécula de ADN que pode afetar a expressão de um ou mais genes.
Durante a evolução, os seres vivos desenvolveram mecanismos para corrigir esses erros naturais: o chamado sistema de re-paração. Este sistema consiste num conjunto de enzimas especializadas em reverter as mutações. Estas enzimas podem variar na sua eficiência de pessoa para pessoa, dependendo da informação genética da mesma.
Pessoas com maior capacidade de reparação têm menor probabilidade de vir a desenvolver cancro. Um exemplo extremo é a doença genética xeroderma pigmentoso: há uma total ausência da enzima de reparação, que corrige os efeitos nocivos do UV. O paciente sofre de cancros de pele repetidos, crónicos.
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 10
deles é constituído por dois cromatídeos irmãos unidos pelo centrómero. Os cromatídeos irmãos cor-respondem a duas moléculas de ADN rigorosamente iguais entre si (Figura 8). Os dois pares de centríolos (que produzem os microtúbulos na célula) começam a afastar-se para pólos opostos da célula e produzem uma rede crescente de microtúbulos de tubulina, formando entre si o fuso acromático. Quando os centríolos atingem os pólos, a membrana nuclear fragmenta-se e os nucléolos desaparecem. Esta é a fase mais longa da mitose; alguns autores separam-na em profase e pro-metafase.
METÁFASE: Os cromossomas atingem o estado de
compactação máxima e encurtamento. O fuso acro-mático completa o seu desenvolvimento e alguns dos seus microtúbulos ligam-se aos cromatídeos irmãos de cada cromossoma, numa estrutura localizada na região dos centrómeros, chamada cinetocoro. Os cromossomas iniciam assim o processo de deslocação e alinhamento no centro da célula, definindo uma
placa equatorial — um plano a meio caminho entre
os pólos do fuso, com os centrómeros voltados para o centro desse plano e os braços para fora (Figura 10).
ANÁFASE: Activada por um sinal específico, a
aná-fase inicia abruptamente quando os centrómeros de cada cromossoma se separam libertando os cromatí-deos irmãos, passando cada cromatídeo a constituir um cromossomas independente. As fibrilas ligadas ao centrómero encurtam-se agora na direcção dos cen-tríolos e os dois cromatídeos irmãos são lentamente transportados para os pólos opostos. Normalmente, a anáfase dura poucos minutos e é conhecida pela chamada “ascensão polar dos cromatídeos irmãos”.
No final da anáfase, os dois pólos das células têm con-juntos completos e idênticos de cromossomas.
TELÓFASE: Na telófase (telos: “fim”), o envelope
nuclear ressurge em torno de cada conjunto de cro-mossomas separados na fase anterior. Os nucléolos reaparecem, dissolve-se o fuso acromático e os cro-mossomas começam a descompactar, tornando-se mais longos, e deixam de ser visíveis ao microscópio. A célula passa a conter dois núcleos, em pólos opos-tos, terminando assim a mitose.
Replicação Centrómero
Cromossomas
homólogos Cromatídeos irmãos
Cromossomas homólogos
Figura 8. Constituição dos cromossomas homólogos antes à
es-querda) e depois (à direita) da fase S. Na direita tem-se o aspecto dos cromossomas compactados após a prófase da mitose.
Cromatídeo Cromossoma metafásico Cinetocoro Microtúbulos do cinetocoro Região do centrómero Proteínas coesinas
Figura 9. Ligação dos microtúbulos do fuso acromático aos
cineto-coros dos cromatídeos irmãos, durante a metafase.
Figura 10. Alinhamento dos cromossomas e formação da placa
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 11
Citocinese (divisão do citoplasma)
A citocinese é a fase em que o citoplasma se divi-de, e difere entre a célula animal e vegetal. Durante a citocinese das células eucariotas animais forma-se na zona do plano equatorial, um anel contráctil formado por microfilamentos proteicos (actina e miosina). Estes contraem-se e puxam a membrana citoplasmática para dentro por invaginação, formando o sulco de clivagem. Este aprofunda-se gradualmente e o cito-plasma divide-se por estrangulamento até se dife-renciarem as duas células-filhas (Figura 11).
Nas células eucariotas vegetais, devido à presença de uma parede celular rígida, o processo de citocinese não pode ocorrer por estrangulamento. Estas células
dividem-se devido à formação de novas paredes celu-lares e membranas plasmáticas dentro da própria célula. No plano equatorial da célula vegetal há uma acumulação de vesículas vindas do complexo de Golgi com proteínas da parede celular (celulose). Estas vesí-culas fundem-se com o que ainda resta do fuso acro-mático dando origem à formação de uma placa celular que vai crescendo do centro para a periferia da célula, de forma perpendicular ao comprimento maior da célula, até atingir a membrana plasmática. As duas novas células permanecem em contacto através dos plasmosdesmos, que são interrupções comunicantes da parede das células vegetais.
Todas as fases da mitose, em sequência, podem ser observados no esquema da Figura 12.
Reprodução Sexuada e Meiose
Todas as células somáticas (células do corpo ex-cepto as sexuais) são diplóides (2n) e entram em mito-se para mito-se dividirem em células também diploides, com a mesma quantidade de informação genética. A meiose é uma outra forma de divisão celular, mas específica para a formação de gâmetas (células sexu-ais) e constitui o elemento-chave para a reprodução
sexuada.
A reprodução sexuada envolve alternância cíclica de estados diplóides (2n) e haplóides (n): as células diplóides dividem-se para formar os gâmetas
haplói-Figura 11. Microfotografias electrónicas de células em citocinese.
PROFASE
(início) PROFASE (final) METAFASE
ANAFASE
(início) ANAFASE (final) TELOFASE
CÉLULA EM FASE G2
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 12 des; os gâmetas haploides combinam-se para formar
uma célula (e um ser) diplóide. Na espécie humana a meiose ocorre no ovário, originando óvulos, e no ttículo, originando espermatozoides. O óvulo e o es-permatozoide fundem-se durante a fertilização para formar a primeira célula diplóide de um novo ser, o
zigoto (2n). No decorrer do desenvolvimento
embrio-nário, o zigoto sofrerá mitoses sucessivas até o ser atingir o estado adulto. Nessa altura, células germina-tivas diplóides presentes nos ovários e testículos irão dar origem por meiose a gâmetas haplóides, atingin-do-se assim a idade reprodutiva.
A meiose, conjugada com a fecundação, permite a manutenção do número de cromossomas característi-co de cada espécie. Durante a meiose, os genomas herdados de ambos os progenitores do indivíduo são misturados e recombinados, produzindo gâmetas com diferentes colecções de genes. A reprodução sexuada permite depois a combinação de gâmetas entre os indivíduos da espécie e contribui, assim, para a variabilidade genética dentro de cada espécie.
Meiose
A meiose, tal como a mitose, inicia-se logo após a fase S do ciclo celular, assim que termina a replicação dos cromossomas parentais, passando cada um a ser constituído por dois cromatídeos-irmãos ligados pelo centrómero. No entanto, o mecanismo de divisão da meiose é muito diferente do da mitose, e começa pela existência de duas divisões celulares (divisão I e II) (Figura 13).
Divisão I da meiose
Na primeira divisão, os cromossomas homólogos emparelham e são separados. Os cromatídeos irmãos permanecem juntos e unidos pelo centrómero. Assim, a primeira divisão da meiose termina com a formação de duas células-filhas com apenas um dos cromosso-mas homólogos. A informação genética herdada dos progenitores foi dividida pelas duas células-filhas, ou seja, o número de cromossomas é haplóide, mas cada cromossoma possui dois cromatídeos.
PRÓFASE I: A prófase é longa e muito mais
com-plexa que na prófase da mitose. Os cromossomas, inicialmente finos e longos, compactam-se e tornan-do-se mais curtos e visíveis. Ocorre o primeiro fenó-meno essencial da meiose, o alinhamento e
empare-lhamento dos cromossomas homólogos (Figura 14).
Os pontos de contacto entre os cromatídeos empare-lhados chamam-se pontos de quiasma. Durante este processo, designado de sinapse, há uma justaposição gene a gene dos cromossomas homólogos e ocorre a troca de segmentos entre eles, um fenómeno caracte-rístico e designado por crossing-over (Figura 15). Dá-se uma recombinação de Dá-segmentos cromossómicos entre dois cromatídeos pertencentes a diferentes cromossomas homólogos.
Cada cromossoma é um bivalente (formado por dois cromatídeos) e o par de cromossomas empare-lhados é uma tétrada composta por dois homólogos (quatro cromatídeos).
Os cromossomas emparelhados começam a sepa-rar-se embora permaneçam unidos nos pontos de intercâmbio ou pontos de quiasma. O número de
Célula
diplóide
Replicação (fase S)
Meiose I
Meiose II
Células haplóides
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 13
quiasmas por cromossoma é variável, podendo existir um, dois ou mais, dependendo do comprimento do cromossoma. No final da prófase I, os nucléolos desa-parecem e o involucro nuclear desagrega-se, os cro-mossomas homólogos ficam unidos somente pelos pontos de quiasma.
METÁFASE I: A compactação dos cromossomas
atinge o nível máximo. Os microtúbulos do fuso li-gam-se aos centrómeros de cada par de homólogos, com os pontos de quiasma voltados para o plano equatorial. A orientação de cada par de homólogos em relação aos pólos da célula é aleatória, indepen-dentemente da origem materna ou paterna. Ou seja, os homólogos herdados de um dos progenitores não ficam necessariamente virados para o mesmo pólo do fuso acromático: esse alinhamento ocorre ao acaso.
ANÁFASE I: Os homólogos ainda estão unidos no
local dos quiasmas, enquanto os centrómeros são levados em direcção a pólos opostos. Consequente-mente, os dois cromatídeos comportam-se como uma unidade funcional e movem-se juntos em direcção a um pólo. O modo como migram, por causa do ali-nhamento anterior, é puramente aleatório podendo ocorrer vários tipos de recombinação de cromosso-mas maternos e paternos. No entanto, aqui ocorreu a separação dos pares de cromossomas homólogos em vez da separação dos cromatídeos irmãos verificada na mitose.
TELÓFASE I: Inicia-se a descompactação dos
cro-mossomas, a formação do invólucro nuclear, dando origem a duas células, cada uma com metade do nú-mero de cromossomas da célula inicial (células haplóides), pois apenas possuem um dos homólogos para cada tipo de cromossoma.
Divisão II da meiose
Depois da telófase I, existe uma interfase de curta duração onde não ocorre replicação do ADN. Nesta fase, a célula é haplóide porque possui apenas um dos homólogos, mas cada cromossoma possui dois cro-matídeos. É na segunda divisão da meiose que ocorre a separação dos cromatídeos irmãos (Figura 13). As etapas da divisão II da meiose são muito semelhantes às da mitose:
PRÓFASE II: Em cada célula, o invólucro nuclear
desintegra-se, os cromossomas compactam e forma-se o fuso acromático;
METÁFASE II: Os cromossomas, cada um com dois
cromatídeos, dispõem-se no centro da célula com os centrómeros voltados para o plano equatorial;
ANÁFASE II: Os centrómeros dividem-se e cada
cromatídeo migra para o pólo respectivo, que passam a constituir cromossomas independentes. Estes cro-mossomas podem ser geneticamente diferentes devi-do ao fenómeno de crossing-over (troca de informação genética) na prófase I;
TELÓFASE II: Inicia-se quando os cromatídeos
atingem os pólos. Ocorre a descompactação dos cro-mossomas e a restabelece-se o invólucro nuclear e nucléolo em cada um dos novos núcleos.
Em conclusão, na divisão I da meiose ocorre a se-paração dos cromossomas homólogos, enquanto na
Centrómero
Homólogos Cinetocoro
Cromatídeos irmãos
Complexo sinaptonémico
Figura 14. Emparelhamento dos cromossomas homólogos
(forma-ção da tétrada cromossómica) durante a profase I da meiose.
Local de crossing-over (ponto de quiasma)
Figura 15. Exemplo do crossing-over entre cromatídeos de
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 14
divisão II são os cromatídeos irmãos que se separam. Consequentemente, a citocinese produz quatro célu-las-filhas haplóides no final da meiose.
Em indivíduos que se reproduzem sexuadamente, a transmissão dos genes depende da replicação do ADN e da ordem na separação dos cromossomas du-rante a meiose. A meiose permite que o número de cromossomas e, consequentemente, dos genes, seja reduzido para metade de modo a que, após fecunda-ção, o número de cromossomas da espécie se mante-nha constante de uma geração para a outra. Simulta-neamente, a meiose permite a variabilidade
genéti-ca, quer por causa do crossing-over na prófase I, quer
pela migração aleatória dos cromossomas maternos e paternos durante a anáfase I.
HEREDITARIEDADE
Desde há séculos se percebeu que de geração em geração há características que se mantêm. Embora os indivíduos da espécie humana sejam todos diferentes, eles são semelhantes entre si quando comparados com seres de outras espécies como o cão, o gato ou o rato. A hereditariedade não é mais do que a trans-missão das características de geração para geração, isto é, dos progenitores para os descendentes. As características transmitidas são os caracteres
heredi-tários. O estudo dos mecanismos de hereditariedade
começou no início do século XIX pela mão de um monge, Gregor Mendel (1822-1884), mas continuam a ser alvo de intensa pesquisa científica. A natureza do material genético só foi desvendada em meados do século XX, com os avanços da bioquímica e da biofísi-ca e a apresentação do modelo molecular do ADN por Watson e Crick (1953).
Genótipo e Fenótipo
O gene é a unidade discreta (isto é, não contínua) de hereditariedade. É o factor responsável pela trans-missão das características hereditárias e corresponde a uma sequência de nucleótidos da molécula de ADN. Cada característica genética de um indivíduo é contro-lada por um par de genes herdados de cada um dos seus progenitores. Esses genes são denominados de
genes alelos e ocupam a mesma posição relativa em
cromossomas homólogos (Figura 16). A zona de um cromossoma onde se situa um gene designa-se por
locus. Os genes para uma dada característica podem
apresentar versões alternativas, variantes. Quando um indivíduo possui um par de alelos idênticos para uma determinada característica é chamado homozigótico (puro) para essa característica; quando possui alelos diferentes é heterozigótico (híbrido) para aquela característica.
Considerando uma determinada característica, o termo genótipo refere-se à composição de alelos que um indivíduo apresenta, ou seja, qual o par de genes que possui para essa característica nos cromossomas QUADRO 4 — Animalias Cromossómicas na Meiose
A meiose é uma fonte de anomalias cromossómicas. Um par de cromossomas homólogos pode não ser devidamente separa-do ou os cromatídeos irmãos podem não ser correctamente separasepara-dos, resultansepara-do em células ditas aneuploides. A aneuploidia é uma condição em que um ou mais cromossomas ou partes de um cromossoma estão em falta ou em excesso. Um exemplo disso é a trissomia 21, na qual ambos os membros homólogos do cromossoma 21 migraram para o mesmo pólo durante a anáfase I originando gâmetas com duas cópias do cromossoma 21. Assim que esses gâmetas são fertilizados por outro gâmeta normal originam um zigoto com três cópias do mesmo cromossoma.
As trissomias e monossomias correspondentes são incrivelmente comuns em zigotos humanos, mas a maioria não sobrevive até ao desenvolvimento do embrião causando o aborto espontâneo. Noutros casos, o bebé nasce mas morre antes de completar um ano de vida. Daí a importância da amniocentese quando se suspeita de malformações. Este processo permite a elaboração do cariótipo do embrião e a detecção de anomalias cromossómicas.
Cromossomas homólogos Locus do gene para
uma dada característica Uma versão do gene
Outra versão do gene Figura 16. Ilustração de um exemplo de genes alelos.
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 15 homólogos; o fenótipo é a forma da característica que
se expressa de facto no individuo (morfológica, bi-oquímica ou molecular) em resultado da combinação e relação de dominância no genótipo.
O genoma de um indivíduo não permanece estáti-co, pode experimentar mudanças. Estas alterações genotípicas bruscas chamam-se mutações e os indi-víduos que as manifestam designam-se de mutantes. O efeito de uma mutação pode ser tão pequeno que não seja possível evidenciar-se facilmente, mas tam-bém pode ser tão significativo que provoque à morte do indivíduo. As mutações genéticas podem ser cromossómicas ou génicas. As mutações
cromossó-micas devem-se a erros na separação dos
cromosso-mas durante a meiose (como a trissomia 21, por exemplo). As mutações génicas devem-se a altera-ções ao nível dos genes. A maior parte das mutaaltera-ções génicas são devidas a erros que ocorrem durante a replicação do ADN. A anomalia apenas é detectada pela análise fenotípica (resultado observável) de indi-víduos mutantes. Se muitas vezes essas mutações são refletidas apenas no aspeto físico dos indivíduos, ou-tras provocam o desenvolvimento de patologias sé-rias, como a hemofilia, a polidactilia ou a doença de Huntington, podendo mesmo ser letais.
Genética Mendeliana
Gregor Mendel foi a primeira pessoa a desenvolver observações quantitativas e rigorosas de padrões de hereditariedade e a propor os primeiros mecanismos plausíveis para os explicar. A descoberta das leis da
hereditariedade revolucionou a biologia e traçou as
bases da genética.
Estudos de Mono-hibridismo
— 1ª Lei de Mendel
Nas experiências que desenvolveu, Mendel traba-lhou com várias plantas e alguns animais, mas os seus melhores resultados foram obtidos com pés de
ervi-lheira-de-cheiro.
Numa altura em que nenhum dos termos usados hoje na genética existiam, Mendel considerava que os uma característica, por exemplo a cor das pétalas da ervilheira, apresentava variações — cor púrpura e cor branca — que designou por caracteres. Para iniciar o seu estudo de hereditariedade, Mendel começou por
considerar sete características diferentes da ervilheira — como a altura da planta, a cor ou forma das semen-tes ou cor das flores — e estudar a transmissão dos caracteres um de cada vez, isoladamente —
mono-hibridismo. Para isso desenvolveu linhas puras, isto
é, plantas com um determinado carácter para uma característica que originam uma descendência sempre com o mesmo carácter igual a si. Por exemplo, plantas altas que cruzadas com plantas altas originam sempre plantas altas. Estabelecidas as linhas puras, Mendel efectuou cruzamentos parentais, que são cruzamen-tos entre indivíduos pertencentes a linhas puras com caracteres alternativos da mesma característica. Por exemplo, linhas puras de plantas altas com linhas puras de plantas baixas; linhas puras de sementes amarelas com linhas puras de sementes verdes; e assim por diante. Mendel estabeleceu que as plantas que fornecem e que recebem o pólen constituem a
geração parental, designada por P, e as plantas que
resultam dessa polinização constituem a primeira geração de descendentes, designada híbridos da
primeira geração ou geração F1.
Mendel observou com surpresa que os diferentes caracteres de uma características não eram diluídos de uma geração para a seguinte, nem resultaram num meio-termo, mantendo-se distintos. Por exemplo: — o híbrido resultante do cruzamento de uma planta alta com uma anã era sempre alto, e não de tamanho médio;
— as sementes resultantes do cruzamento entre ervi-lheiras de semente verde com erviervi-lheiras de semente amarela eram todas amarelas e não verde-amareladas. Mendel cruzou depois os híbridos altos da primeira geração (F1) entre si, obtendo o que designou de
geração F2. Observou que esta nova geração retinha
os caracteres distintos encontrados nas plantas "avós": a maioria era alta, porém aproximadamente um quar-to delas eram anãs. Da mesma forma, a geração F2 do cruzamento entre plantas da geração F1 com semente amarela eram 75% amarelas e 25% verdes. Para as sete características estudadas, Mendel verificou que a proporção entre as duas formas possíveis (caracteres) de uma característica na geração F2 era sempre a mesma, 3 para 1 (Figura 17). Concluiu então que, embora o caracter tamanho pequeno (para a altura da planta) ou semente verde (para a cor da ervilha) possa “desaparecer” na geração F1, a informação que o
de-BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 16
termina encontra-se de facto nesses indivíduos. Só isso explica que esse carácter venha mais tarde a sur-gir nos seus descendentes. Apesar de a informação para os dois caracteres de uma característica se en-contrarem presentes na geração F1, apenas um carác-ter se manifesta nesses híbridos. Mendel decarác-terminou assim que o carácter da linha pura parental igual ao observado nos híbridos de F1 era um caráter
domi-nante, e que o carácter da linha pura parental que não
se observava nos híbridos de F1 era um carácter
re-cessivo.
Mendel propôs então que cada carácter de uma
dada característica contém dois factores, e que
quando um indivíduo forma os seus gâmetas (células sexuais) separa esses factores e contribui apenas com um deles para a descendência. Os factores são passa-dos de forma idêntica por cada um passa-dos pais e, em vez de se fundirem, eles mantêm-se separados. Dito de outra forma, para cada característica existe um par de
instruções, com as instruções “dominantes" a
deter-minarem a aparência dos descendentes e com as instruções "recessivas" a serem silenciadas, somente se manifestando quando ambos os factores recessivos estão presentes. Este principio constitui a 1.ª Lei de
Mendel:
Lei da segregação dos caracteres hereditários:
“Cada caracter é determinado por 2 factores hereditários que se segregam na formação dos gâmetas.”
Interpretação actual da 1ª Lei de Mendel
Os factores de Mendel responsáveis pela transmis-são das características hereditárias transmis-são hoje reconhe-cidos como genes alelos. Cada gâmeta transporta apenas um alelo de cada gene, pois cada gâmeta apenas possui um dos cromossomas homólogos. A fecundação permite a união dos alelos e a manifesta-ção da característica.
Os alelos dominantes exprimem-se tanto nos in-divíduos homozigóticos dominantes como nos
hete-rozigóticos porque prevalecem sobre os alelos re-cessivos; estes últimos manifestam-se apenas quando
existem duas cópias recessivas (homozigóticos
re-cessivos). Por convenção, pode representar-se o alelo
dominante por uma letra maiúscula e o alelo recessivo pela mesma letra minúscula. Por exemplo para o cru-zamento relativo à altura da planta, utiliza-se T para alta (do Inglês tall, “alto”) e t para baixa. Os indivíduos da geração parental (linhagens puras) são
homozi-góticos (possuem dois alelos idênticos de um
deter-minado gene), e cada um produz apenas um tipo de
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 17 gâmetas, T ou t. O progenitor homozigótico
domi-nante (TT) transmite o alelo T através dos gâmetas e o homozigótico recessivo (tt) transmite o alelo t. Deste
cruzamento surgem indivíduos heterozigóticos (híbri-dos Tt). Como o alelo T domina sobre o alelo t, as plantas de F1 são todas altas.
Quando se formam os gâmetas dos indivíduos da geração F1, os dois factores separam-se novamente por segregação, levando à formação de gâmetas com o alelo T e outros com o alelo t. Na fecundação, estes gâmetas juntam-se ao acaso formando zigotos na geração F2 com todos os tipos de combinações possí-veis dos respectivos factores, TT, Tt e tt, sempre na proporção de 1:2:1 ou de 3 dominantes (TT e Tt) para 1 recessivo (tt). O factor recessivo (plantas baixas ou ervilhas verdes) apenas se manifesta em indivíduos puros, ou seja com ambos os factores recessivos (tt).
Para tornar mais fácil a visualização dos alelos en-volvidos num cruzamento pode utilizar-se um dia-grama designado por xadrez mendeliano. Trata-se de um quadro de dupla entrada onde se inscrevem os tipos de gâmetas que podem ser transmitidos por um e por outro progenitor. Todas as combinações possí-veis entre os diferentes gâmetas são inscritas nos respectivos quadros do xadrez, pareando os factores doados em cada combinação. A análise do xadrez mendeliano permite prever com facilidade quais os tipos de genótipos e fenótipos possíveis naquele cru-zamento e qual a probabilidade de ocorrência de cada um (Figura 18). Gâmetas da “mãe” Gâ m et as d o “p ai ”
T
t
T
TT
Tt
t
Tt
tt
Figura 18. Xadrez mendeliano para um cruzamento entre híbridos
da geração F1.
Estudos de Di-hibridismo
— 2ª Lei de Mendel
Para analisar a transmissão simultânea de dois pa-res de alelos (di-hibridismo), Mendel seleccionou linhas puras de ervilheiras com sementes lisas (L) e amarelas (A) e cruzou-as com linhas puras de ervilhei-ras com sementes rugosas (l) e verdes (a). Os descen-dentes de linhas puras que diferem entre si em dois caracteres são di-híbridos, e apresentam o genótipo
LlAa. Cada progenitor da geração parental possui dois
genes para cada característica, LLAA ou llaa.
Durante a formação dos gâmetas, cada par de ge-ne é segregado de forma independente. Assim, todos os gâmetas do progenitor de sementes amarelas e lisas transportam um gene L para a forma lisa e um gene A para a cor amarela, tendo então a combinação
LA. De forma análoga, o progenitor de sementes
ru-gosas e verdes produz gâmetas que possuem um gene l para a forma rugosa e um gene a para a cor verde (la). Os híbridos resultantes da fecundação des-tes gâmetas são heterozigóticos LlAa e apresentam o fenótipo de sementes lisas e amarelas devido à ex-pressão dos alelos dominantes. Na geração F2 são obtidas ervilhas lisas e amarelas, rugosas e amarelas, lisas e verdes, e rugosas e verdes, na proporção
9:3:3:1. Os resultados destes cruzamentos (parental e
entre indivíduos de F1) estão representados na Figura 19, que mostra as combinações prováveis e prevê os diferentes genótipos e fenótipos para a geração F2.
Para cada fenótipo individual, os resultados são iguais aos observados num cruzamento de mono-hibridismo:
— 3/4 de sementes amarelas (9/16 + 3/16) para
1/4 de sementes verdes (3/16 + 1/16);
— 3/4 de sementes lisas (9/16 + 3/16) para
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 18
Mas os resultados mostraram também que as ca-racterísticas lisa e amarela, ou verde e rugosa, não se transmitiam sempre de forma agregada: a geração F2 apresentou sementes lisas e verdes e sementes rugo-sas e amarelas. Isto mostra que a forma e a cor da semente são transmitidas de forma autónoma. Assim, os genes que determinam as características distribu-em-se independentemente e ao acaso nos gâmetas. Este comportamento dos genes foi inicialmente pos-tulado pela 2.ª Lei de Mendel, onde aos genes eram na altura designados de factores:
Lei da segregação independente dos factores: “os
factores que determinam características diferentes dis-tribuem-se independentemente nos gâmetas.”
De acordo com as Leis de Mendel, a contribuição de cada progenitor é determinada pelas leis da pro-babilidade: a probabilidade de um gâmeta possuir qualquer um dos alelos presentes no progenitor é a
mesma, ou seja 1/2 (50%). Todas as características herdadas nos descendentes resultam de distribuições independentes durante a formação dos gâmetas onde os genes se combinam aleatoriamente, ou seja, ao acaso.
Surgiu assim, como um reflexo das leis de Mendel, a teoria cromossómica:
— os dois factores hereditários são os alelos dos ge-nes, e estão localizados, cada um, nos cromossomas homólogos presentes no núcleo de uma célula; — durante a formação dos gâmetas (meiose), os pares de cromossomas com genes alelos separam-se, rece-bendo cada gâmeta apenas um desses cromossomas com um alelo;
— durante a formação dos gâmetas (meiose), a distri-buição dos diversos genes (ou seja, a separação dos cromossomas homólogos) pelos referidos gâmetas faz-se de modo independente e aleatório.
Figura 19. Resultados da experiência de di-hibridismo de Mendel no cruzamento de linhas puras de ervilheiras de semente lisa e
ama-rela (dominantes) com sementes rugosas e verdes (recessívas). QUADRO 5 — Mendel e a origem da Genética
Na época em que Mendel publicou os seus resultados, estes não foram compreendidos e foram ignorados até ao inicio do séc. XX. Nesta fase começavam a surgir acontecimentos verdadeiramente históricos que marcaram a comunidade científica, como a observação da fecundação e divisão celular e a descoberta do cromossoma. Por esta altura vários investigadores foram levados à redescoberta dos princípios que Mendel havia enunciado vários anos antes. Perante estas novas perspectivas a obra de Mendel foi reavaliada tendo sido reconhecida a sua importância fundamental. Nasce assim, em 1905, a Genética.
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 19
Retrocruzamento ou Cruzamento-teste
Em determinadas situações, o genótipo dos indiví-duos com fenótipo dominante não é conhecido, uma vez que tanto podem ser homozigóticos (AA, por exemplo) como heterozigóticos (Aa). Pode recorrer-se, nesse caso, a um cruzamento-teste ou
retrocruza-mento: o cruzamento de um indivíduo de genótipo
desconhecido e fenótipo dominante com um indiví-duo de fenótipo recessivo. O indivíindiví-duo de fenótipo recessivo é homozigótico uma vez que esse fenótipo apenas se manifesta quando estão presentes dois alelos recessivos. Se o fenótipo recessivo surgir na descendência, significa que recebeu um alelo recessi-vo de cada progenitor e, portanto, o progenitor com genótipo desconhecido é heterozigótico; se a des-cendência apenas apresentar o fenótipo dominante, o progenitor com genótipo desconhecido é homozigó-tico dominante. Estas conclusões apenas são possíveis e válidas para um elevado número de descendentes.
Extensões da Genética Mendeliana
Mendel estudou características nas quais existe uma dominância clara, dita completa, de um alelo de
um gene em relação ao outro. Mas são vários os exemplos na natureza em que tal não ocorre e em que surge um terceiro fenótipo possível. São os casos da
dominância incompleta e da co-dominância.
Con-tudo, mesmo nestas situações, o modo de transmissão genética das características continua a respeitar as leis de Mendel.
Dominância Incompleta
Quando um indivíduo possui dois alelos dominan-tes que se expressam e cujos fenótipos individuais se misturam dando origem a um fenótipo intermédio (por exemplo, uma nova cor), ocorre um fenómeno chamado dominância incompleta.
Este caso de mono-hibridismo pode ser observado numa planta comum em Portugal, a “boca-de-lobo”. Cruzando duas plantas homozigóticas para a flor de cor branca (BB) e para a flor de cor vermelha (VV), obtêm-se na geração F1 indivíduos cuja cor das plan-tas é uniforme e rosa (VB). Construindo o xadrez men-deliano para prever a descendência na geração F2 temos 1/4 de fores brancas, 1/4 de vermelhas e 2/4 de rosa (Figura 20).
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 20
Co-dominância
Quando indivíduos heterozigóticos expressam os dois fenótipos em simultâneo e sem mistura, fala-se em co-dominância. Num heterozigótico, ambos os alelos são expressos simultânea e completamente.
Um caso bem conhecido é a do sistema sanguíneo humano ABO. Os fenótipos do sangue dos tipo A e do tipo B caracterizam-se pela presença de um oligossa-carídeo específico na membrana celular das hemácias, em cada um dos casos. O sangue do tipo AB exibe, ao mesmo tempo, o fenótipo do sangue do tipo A e o fenótipo do sangue do tipo B, e não um terceiro tipo de oligossacarídeo nas hemácias. Mais adiante este sistema será abordado em detalhe.
Hereditariedade Humana
Na espécie humana, o estudo da transmissão de características hereditárias é extremamente complica-do devicomplica-do não só ao elevacomplica-do número de cromosso-mas cromosso-mas também porque o tempo de uma geração é muito longo e o número de descendentes por gera-ção é baixo. Por outro lado, é eticamente impensável realizar-se cruzamentos experimentais com humanos.
Assim, os estudos de hereditariedade humana ba-seiam-se, principalmente, na análise de árvores genea-lógicas ou heredogramas (em Inglês, Pedigree) (Figura 21). Um heredograma é uma representação gráfica da transmissão hereditária de uma dada carac-terística ao longo das gerações numa família. Para se QUADRO 6 — Dominância Incompleta e Co-dominância
A maior parte das características genéticas na espécie humana resulta de dominâncias incompletas. É enorme a diversidade do padrão fenotípico encontrado por exemplo na cor da pele. É comum pessoas de pele negra casadas com pessoas de pele branca terem filhos com cor de pele intermédia (mulatos), revelando a não existência de dominância completa entre os genes que determinam esta característica.
Por outro lado, em plantas é também muito comum encontrar relações de co-dominância. A descendência não apresenta flo-res com uma cor uniforme e totalmente diferente da dos progenitoflo-res (tal como na dominância incompleta), mas apflo-resenta zonas com a pigmentação de um dos progenitores e zonas com a pigmentação do outro progenitor. Situações de co-dominância são extensíveis a diversas espécies de reprodução sexuada: gatos, cães, cavalos, etc.
Homem não afectado Homem afectado Mulher não afectada Mulher afectada Pessoa de sexo desconhecido Casamento (acasalamento) Casamento consanguíneo Falecido
Linha vertical = descendência (neste caso, um filho)
Família de quatro irmãos e irmãs; os dois últimos são gémeos não idênticos
Gémeos idênticos Má gestação ou aborto
Afectados Normais
BIOLOGIA E BIOQUÍMICA 2 MÓDULO 4 NÚCLEO E HEREDITARIEDADE 21
construir um heredograma sobre um determinado caracter em estudo, utiliza-se um conjunto de símbo-los convencionais que permitem uma leitura universal dos fenótipos e a previsão dos respectivos genótipos dos indivíduos das várias gerações (filhos, pais, avós, bisavós...). A sua análise permite determinar a origem de certas doenças ou anomalias e inferir os riscos da sua transmissão às gerações futuras.
Hereditariedade Autossómica
Um dos 23 pares de cromossomas que caracteri-zam a espécie humana é o par de cromossomas sexu-ais, designando-se os restantes 22 por autossómicos. A hereditariedade autossómica diz respeito à transmissão de caracteres hereditários codificados por genes que se localizam nos cromossomas autossómi-cos. Neste caso, tanto para homens como para mulhe-res, a probabilidade de transmitir um determinado fenótipo aos filhos ou às filhas é a mesma, pois os genes dessa característica não estão localizados nos cromossomas sexuais X ou Y.
— Hereditariedade autossómica dominante: Neste caso os indivíduos afectados por uma determinada anomalia podem ser homozigóticos dominantes ou heterozigóticos. Pelo menos um dos progenitores de um indivíduo afectado também é afectado, pois este teve de herdar o gene anormal (dominante) de um deles. Desta forma, sucessivas gerações são afectadas, e a transmissão do caracter apenas cessa numa gera-ção em que não se verifica a presença de um único progenitor afectado. Exemplos de patologias ligadas a este tipo de transmissão são a polidactilia — uma anomalia caracterizada pelo aparecimento de mais do que 5 dedos nas mãos ou nos pés — e a doença de
Huntington — doença degenerativa que afecta o
sistema nervoso central e provoca movimentos invo-luntários, rápidos e bruscos, dos braços, pernas e ros-to.
— Hereditariedade autossómica recessiva: Aqui o caracter expressa-se apenas em homozigóticos que herdaram um alelo recessivo de cada progenitor.
A maioria dos genes relacionados com patologias autossómicas recessivas está presente em indivíduos que não manifestam a doença, sendo apenas portado-res dos genes (heterozigóticos). Estes genes podem ser transmitidos por numerosas gerações sem jamais aparecerem na forma homozigótica, isto é, sem apa-recer o fenótipo anormal/doente.
A probabilidade de os genes recessivos surgirem em simultâneo num indivíduo (homozigótico recessi-vo) aumenta caso os pais pertençam à mesma família. Por isso, os casamentos consanguíneos aumentam a probabilidade de aparecimento de anomalias que, de outro modo, poderiam não se manifestar. Exemplos de doenças associadas a este tipo de transmissão são o albinismo, a fibrose quística e algumas formas de surdez.
Hereditariedade associada aos
cromossomas sexuais
Na espécie humana, os géneros masculino (XX) e feminino (XY) são determinados no momento da fe-cundação pela união dos cromossomas transportados pelos gâmetas. Os gâmetas femininos transportam apenas o cromossoma X, enquanto que metade dos gâmetas masculinos transportam o cromossoma X e a outra metade transporta o cromossoma Y. Assim, um filho recebe os genes do cromossoma Y transmitidos pelo pai e os genes do cromossoma X doados pela mãe; uma filha recebe os genes de um cromossoma X transmitido pelo pai e de outro cromossoma X trans-mitido pela mãe.
— Hereditariedade dominante associada ao cro-mossoma X: Um fenótipo ligado ao crocro-mossoma X
(isto é, um fenótipo codificado por um gene que se localiza no cromossoma X) é descrito como dominan-te quando se expressa em mulheres hedominan-terozigóticas ou homozigóticas dominantes. São afectadas todas as filhas de homens afectados, mas nenhum filho, pois um filho recebe o cromossoma Y (não afectado) do pai enquanto as filhas recebem o cromossoma X afectado. Um homem só é afectado se a mãe também for e caso QUADRO 7 — Albinismo
O albinismo é uma característica hereditária, relativamente rara, caracterizada pela incapacidade de produzir um pigmento, a melanina. Os indivíduos possuem cabelos brancos, pele pálida e olhos vermelhos. Devido ao facto de a melanina proteger a pele da acção do sol os albinos são muito propensos a queimaduras solares e cancros de pele.