Resenha
Resenha
João Alexandre Peschanski
Doutorando em Sociologia pela Universidade de Wisconsin-Madison; professor de Ciência Política na Faculdade Cásper Líbero
Email: japeschanski@casperlibero.edu.br
Emoção e ideologia
no ódio ao PT
AB’SABER, T.
Dilma Rousseff e o ódio político.
São Paulo: Hedra, 2015. 78p.
As ciências sociais, especialmente a sociologia e a ciência política, se-guiram à risca com algumas exceções a ideia de que o governo e a política não deveriam ser questões de amor e ódio. Com isso, primaram nas últimas décadas do século 20 e ainda hoje na ambição de abstrair o componente emocional para chegar a lógicas de ação e decisões racionais em situações como o voto e o protesto. Houve avanços consideráveis na compreensão da política a partir da tendência à análise pelo viés da racionalidade, até em suas vertentes mais ortodoxas como o individualismo metodológico, mas essa tendência veio normalmente acompanhada de uma rejeição absoluta às concepções mentais e à noção de prazer na análise política.
Dilma Rousseff e o ódio político, de Tales Ab’Saber, participa de um movi-mento global descoordenado e muitas vezes indutivo, especialmente relevante na última década, de retomada das emoções que de maneiras variadas permeiam a ação política. A ciência social das emoções é especialmente necessária para entender os fenômenos de massa que, no geral, a web e, em específi-co, as redes sociais disseminaram. A tendência racionalista, acompanhada do viés estruturalista, não parece dar suficientemente conta das novas modalidades de atuação na esfera pública e relação com a vida política.
O livro de Ab’Saber propõe-se a fazer uma leitura da política re-cente, o que ele chama de “pequena história política”, a partir de uma chave analítica que, por um lado, considera o esfacelamento “narcísico” do governo de Dilma Rousseff e, por outro lado, revela a emergência de uma oposição “autoritária” e “delirante”, marcada pelo ódio à presiden-te. Ab’Saber alerta, na introdução, que sua análise, escrita no calor da hora, sob o signo da coragem e do risco de falar sobre acontecimentos do mais imediato presente, é necessariamente incompleta, pois “nosso teatro nacional de impotências”, em suma a encruzilhada política brasi-leira que aparece na crise do governo Dilma, expressa fundamentalmen-te “uma real impossibilidade atual do Capital mundial em se reproduzir sem, de imediato, destruir tantas realidades, países, sociedades, espécies, o planeta, psiquismos, corpos, de modo que, simplesmente, ele vai se tornando cada vez mais um impasse universal à simples manutenção da própria regra de seu jogo” (p. 8). A incompletude está, no caso específico, diretamente relacionada à “caduquice” da análise de conjuntura — basta dizer que o livro foi publicado antes mesmo da abertura do pedido de impeachment contra Dilma Rousseff. O pressuposto desta resenha é que se buscará entender a capacidade adivinha do autor, mas a apresentação do vaivém da política brasileira, em suas aparentes contradições e pontos críticos, dentro de um quadro e um repertório de ação determinado em nível mais elevado de abstração.
O objetivo do autor nos doze curtos ensaios relativamente indepen-dentes que compõem Dilma Rousseff… é estabelecer uma narrativa com suficiente congruência de acontecimentos esparsos, traçando uma linha explicativa do primeiro mandato de Dilma, que parece também ser apro-priada para o período que segue à reeleição. Assim, não se trata de um es-tudo convencional da política, pelo menos em comparação com aquilo que se produz em revistas científicas, pois adota um estilo ensaístico, com a vantagem de trazer insights dificilmente identificáveis com métodos tradi-cionais, como as fórmulas para reconhecer e enquadrar a evolução psico--política brasileira, e a desvantagem de não oferecer os meios para testar empiricamente suas asserções às vezes em controvérsia com a literatura. O ensaio não deve portanto ser tomado como “evidência” do fenômeno tratado, mas certamente contribui para a construção da indispensável lin-guagem — que ainda nos falta — para significar os acontecimentos rela-cionados ao esfacelamento do lulopetismo.
A crise do governo relaciona-se a um suposto processo de desencan-tamento na sociedade brasileira com o lulismo, diz o autor. A tese tem duas implicações científicas, que são reveladas e discutidas no decorrer do livro: a construção do encantamento e a anulação e esvaziamento dos “motivos encantatórios daquele monumental amor dos brasileiros pelo ex--presidente” (p. 11). A tese sustenta-se sobre duas discussões de base: a apreciação real da eficiência, eficácia e efetividade política do governo e a compreensão do que, na citação acima, Ab’Saber chama de “os brasileiros”, provavelmente subentendendo a cultura política dominante no Brasil.
Em grande medida, a primeira implicação é tratada no livro anterior de Ab’Saber, Lulismo, carisma pop e cultura anticrítica (2011), em que expõe um suposto pacto social entre forças sociais aparentemente diver-gentes, que a figura do Lula organizou e de certo modo expressou. Nes-se Nes-sentido, o primeiro presidente do PT teria agido como solução para o praticamente inescapável dilema do prisioneiro dessas forças sociais, es-tabelecendo um princípio robusto de cooperação entre atores que antes mantinham uma relação expressamente desconfiada e antagônica. Talvez o símbolo maior desse suposto pacto — se estiver correta a exposição — tenha sido o Conselho de Desenvolvimento, Social e Econômico - CDS, instância de articulação política criada nos primeiros momentos do man-dato inicial de Lula, que serviu para organizar clivagens sociais até então explosivas, com a participação de empresários, financistas, fazendeiros, sindicalistas e integrantes de movimentos sociais. O carisma pop de Lula teria servido como sustentáculo do pacto social, agora institucionalizado, e como vetor de reverberação para a população no geral.
O argumento de Ab’Saber sobre o carisma pop de Lula curiosamente transpõe um conceito-chave da análise da política eleitoral para o univer-so da governabilidade. Sabe-se que, na medida em que regras eleitorais determinam comportamentos estratégicos de partidos e candidatos que pretendem ganhar os pleitos, o sistema majoritário absoluto vai impor uma força centrípeta nas campanhas para presidente. (Vale notar que há quem diga que a pista para entender o sucesso eleitoral do lulismo não foi sua capacidade de atingir o centro do eleitorado, mas seu investimento maciço para estabelecer uma praticamente incontestável hegemonia sobre o voto do Nordeste, estrategicamente regionalizando bolsões de apoiado-res e opositoapoiado-res [Singer, 2009].) Aplicada a máxima ao controle do poder, Lula teria então governado não apenas sob pressão da correlação das for-ças sociais em disputa, na sociedade e em seu gabinete, mas como ponto central e fiel da balança das demandas e influências políticas e sociais, uma figura paterna que a todos ouvia, a todos falava, a todos seduzia e, com isso, tornava-se referência absoluta e universal, acima das querelas próprias, agora expressas como infantis e não patriotas, da sociedade civil.
A explicação do autor sobre por que a concertação social brasileira ou, nos termos agora antigos da CUT, o “entendimento nacional” ruiu — a segunda implicação científica que o livro revela — centra-se na persona-lidade do(a) governante. Aprendemos assim, no terceiro ensaio, “Dilma Rousseff: anti-príncipe”, que Dilma não é Lula, que a “mãe do PAC” não teria então a capacidade para ser a “mãe de todos”, a referência absolu-ta e universal de seu antecessor, na cola de quem teria se eleito para a Presidência da República. Dilma teria rompido com a harmonia reinante nos mandatos de Lula, por conta entre outros motivos da “[m]istura de sua necessidade de afirmação da última palavra, de controle de todas as ações e de demonstrar-se a ativa matriarca de seu próprio poder — em uma imagem de self político primitiva — infantilizando e confundindo os seus agentes de governo e de Estado — com constantes sinalizações de desorganização e de desencontros denunciados por ela própria — [e] tal comportamento gerou o mito da mulher política autoritária e de acesso improvável, que só fez crescer” (p. 21-2). O insight sobre a inaptidão po-lítica de Dilma — e consequentemente de Lula, que poderia ter escolhido segundo o autor quem ele quisesse para ser seu sucessor e tomou uma má decisão — é ilustrado por situações vexatórias que a presidente teria im-posto a seus subordinados, transcritas de veículos de comunicação.
Na implicação de que o esfacelamento do governo petista deve ser explicado por uma suposta inaptidão da sucessora de Lula jaz talvez a principal frustração na leitura de Dilma Rousseff…. Ab’Saber sugere que
supostas características extraordinárias de Lula seriam condição impres-cindível para sustentar o lulismo. Na medida em que diagnostica que tais características faltaram a Dilma, o lulismo ruiu, diz. E esta parece ser uma explicação fraca, ironicamente encantada por uma questionável sobrena-turalidade do primeiro presidente petista. Mais interessantemente, o que aconteceria se trabalhássemos com a hipótese, mais crível, de que, por mais que seja um hábil político, Lula é uma pessoa comum, sem as tais características mágicas indecifráveis? O que teria então sustentado o lulis-mo, se não foi o próprio Lula?
Provavelmente esses questionamentos nos fariam abandonar a ideia de que, por suas aptidões, Lula nos enfeitiçou e começaríamos a pensar sobre o aparato ideológico que sustentou o lulismo. Assim, desloca-se o objeto da análise, de um Lula sobrenatural para a construção ideológica da figura carismática. Se de fato é real, a construção espetacularizada depen-deu necessariamente de um aparato tecnológico sobre expectativas sociais em torno dos mandatos petistas, assim alimentando coletivamente uma concepção de mundo e uma performance emocional que, se não foram umbilicalmente funcionais ao lulismo, com ele estabeleceram alto grau de compatibilidade. Se de fato é real que Lula foi visto como “o mago que transformava coisas inertes, postes, em verdadeiros seres vivos” (p. 12-3), devemos nos perguntar as condições que fizeram com que acreditássemos nisso, não apenas aceitar que testemunhamos uma taumaturgia.
A formulação sobre as modalidades e as crises de reprodução da ideo-logia, pouco presente na reflexão de Ab’Saber nesse livro em questão, deve-ria ser central, pois isso permitideve-ria aprofundar uma teodeve-ria da sustentação e colapso político do pacto lulista, sem abandonar o insight sobre a expressão espetacular da ascensão e governo de Lula, o “filho do Brasil” agora em posição de pai, e a ineficácia de reprodução de sua sucessora. Nesse ponto, é obviamente fundamental entender a fundo como, se de fato é real a inap-tidão de Dilma e o colapso do pacto lulista, se operou a reeleição de 2014, que por conta do momento de redação é pouco tratada no livro.
O risco real na referência à ideologia é adotar a noção na linhagem da teoria clássica do marxismo, remontando aos próprios fundadores des-sa tradição, Marx e Engels, em que a concepção de mundo que garante a estabilidade em situações de pujante conflitividade, se dá pelo mecanismo da “falsa consciência”. E a impressão é que, ao aventar um fetichismo em torno da figura de Lula, especialmente no lulismo…, Ab’Saber flerta com essa forma de pensar a ideologia. De modo geral, nessa visão a ideologia é um conjunto de mecanismos e processos que, no extremo, impede a com-preensão individual dos reais mecanismos que determinam as condições
da vida social. Uma variação dessa definição, importante no debate dos anos 1970, é que não só os indivíduos não entendem e reconhecem as re-lações em que se inserem (função negativa da ideologia, de ocultar e obs-curecer), mas as justificam e perpetuam, assim pressupondo um envolvi-mento ativo e criativo destes (função positiva da ideologia, de fortalecer e alimentar o sistema). A ideologia como falsa consciência é insustentável, que seja porque supõe uma realidade efetivamente cognoscível e porque, num argumento tão caro a ortodoxos, sugere uma lógica necessária sobre essa realidade.
No lugar de uma ideologia falsificada ou até imposta, a sugestão aqui, na linha de uma reflexão sobre o aparato do lulismo, é pensar na categoria de uma ideologia que se pratica. A prática ideológica exige mecanismos sociais e psicológicos que a despertassem e a sustentassem. O objeto da análise torna-se o aparato tecnológico que gerou o feitiço e a crença no feiticeiro, que influencia o padrão das subjetividades, isto é, a formação da individualidade e a inserção em relações sociais, definindo o que exis-te, o que é bom e o que é possível (Therborn, 2004). A hipótese é então que o fenômeno mágico do lulismo deve ser apreendido por meio das modalidades tecnológicas que o criaram e sustentaram, assim como seu esfacelamento deve ser entendido a partir das dinâmicas e dos requisitos de funcionamento do aparato ideológico de estabilização do pacto social iniciado por Lula, fazendo com que, como diz Ab’Saber, “de repente” hou-vesse um “desrecalque utópico” (p. 32) e a legitimação da transformação do PT em “bode expiatório” da tradição de corrupção do Brasil (p. 63).
Compreender a modalidade ideológica do lulismo, especialmente em seu momento dilmista, parece especialmente relevante se de fato estiver correta a apreciação de Ab’Saber de que o governo foi pelo menos em al-gum momento propositivo. É esta uma das discussões de base propostas pelo autor de Dilma Rousseff…. Um foco fundamental de oposição ao go-verno, para além da dissipação carismática, teria sido, segundo o autor, o enfrentamento de Dilma com os interesses financistas, com a progressiva redução da taxa de juros. Esse enfrentamento, diz Ab’Saber em “A esquer-da contra os bancos”, marcou uma nova concepção política econômica, com a pretensão de intensificar o protagonismo do Estado na condução da economia, entre outros mecanismos pela atuação mais direta dos bancos públicos e pela ampliação do crédito ao consumidor. O que o autor suge-re aqui é um racha suge-real no pacto acordado por Lula, indicando um viés redistributivista e fundamentalmente desenvolvimentista do governo. A sugestão de Ab’Saber está em evidente desacordo com a visão de que o lulismo estava inerentemente alinhado e até determinado pela reprodução
e intensificação dos interesses das classes dominantes, especialmente as financistas, estabelecendo-se como continuidade do modo de reprodução do capital estabelecida com o Plano Real e do pagamento da dívida pública (Braga, 2013; Bin, 2015); o autor indica assim uma relativa autonomia e a incorporação de trajetórias alternativas na compreensão do processo his-tórico do esfacelamento do lulismo. Ab’Saber volta a tratar da política eco-nômica de Dilma em “Economia política: teoria tradicional”, um ensaio um tanto quanto enigmático, do qual a metade é uma transcrição de um texto de opinião do economista Antonio Delfim Netto, onde se revela que, a despeito de tentativas de reordenar a economia brasileira, a ação de Dilma foi estruturalmente determinada por uma economia global em recessão.
Outra discussão de base que emerge do livro é a cultura política do-minante no Brasil. É finalmente nisso que o lulismo se incrusta e que, no governo Dilma, se desenvolve o antipetismo. A questão central que se co-loca aqui, exposta no ensaio “Que horas são?”, é entender as modalidades de interpretação da vida social e da política no Brasil. Este é o cerne dos ensaios “Anticomunismo, antipetismo”, “Tradição, corrupção e PT” e “En-tropia, anomia e nova ordem”, que se constroem a partir do diagnóstico da página 25: “a nova tecnologia de organização de uma ampla nova direita, com seus textos abertos a todos os arcaísmos imagináveis, é ela própria a sinalização de uma crise mais profunda: a das estruturas de enunciação de alguma real perspectiva à esquerda neste campo”. O esfacelamento do lu-lopetismo garantiu assim praticamente o monopólio do discurso público a uma nova fantasmagoria política, também esmiuçada por Ab’Saber no en-saio “Crise e alucinose: anticomunismo do nada”, onde, a partir do pensa-mento do psicanalista Wilfred Bion, diz que o antipetismo sustenta-se em “uma distorção efetiva da capacidade de pensar fundada na necessidade de saturar a realidade com desejos que não suportam frustração, bem como no impacto corrosivo dos mecanismos psíquicos ligados ao ódio sobre o próprio pensamento” (Ab’Saber, 2015:52).
A fantasmagoria do “anticomunismo do nada” é, como diz Ab’Saber, independente de um líder extraordinário, mas constituída em sua fúria por uma “nova tecnologia de organização” (cit.), fundamentada na significa-ção e real-izasignifica-ção de um inimigo inexistente, mas onipresente, um suposto comunismo tão total quanto oculto. O construto que significa o lulismo como o comunismo encerra o debate político “em um polo muito tenso e extremo de negatividade”, que, ao bradar contra o suposto bolivarianismo do PT, se esquiva “de explicar todo o sentido real da política brasileira” (p. 37). O mecanismo da alucinose, tomada de Bion, justifica analiticamente o “ódio”, a conexão com a política via tripas, que leva ao limite a prática da
oposição, ao limite de “desobriga[r-se] radicalmente de checar realidades” (p. 41), num transe e numa excitação que remete às neuroses da Guerra Fria. O contexto da emergência do ódio foi o conjunto de “tensões políti-cas, clivagens e afastamentos sociais reais do governo de Dilma Rousseff ” (p. 35), articulados à crise do que o autor chama de “keynesianismo de consumo”, o que cria condições favoráveis para a nova modalidade de or-ganização do atraso político, de acordo com Ab’Saber. O tipo do impres-sionante fenômeno da nova direita, que tomou de assalto o espaço públi-co e as redes sociais, até mesmo quando este se abriu inicialmente para um modelo social progressista e propositivo (Peschanski; Moraes, 2013), é o homem comum, que pratica em sua ordinariedade o novo atraso da política brasileira, sofisticadamente transformado em discurso legítimo emancipador por amplificação espetacularizada nas novas velhas mídias.
A compreensão da fantasmagoria do anticomunismo do nada é pro-vavelmente a principal contribuição de Dilma Rousseff…. A política de emoções contra o governo, que se manifesta em ódio furioso, teve como principal consequência a desautorização da presidente, de acordo com o autor. “Dilma terminou no mesmo nível de poder de cada agente que se manifestasse no seu processo, e todos podiam dispor de seu governo, cada um decidindo por si mesmo a efetividade de um impeachment” (p. 68). A prática política da fantasmagoria antipetista é portanto a desintegração da comunidade institucional e o bullying de todos contra todos. A nova ordem anômica que surge no último ensaio do livro significa a possível desestruturação das práticas partidárias — quiçá eleitorais —, que deve acompanhar a ruína do PT e, voltando ao diagnóstico norteador da página 25, se dá numa circunstância de afasia da esquerda.
O panorama futuro era evidentemente incerto no momento da pu-blicação do livro, mas o argumento de Ab’Saber nos permitiu e permite estabelecer uma conjectura sobre o tipo de incerteza com o qual lidamos. O risco da desintegração anômica que ele descreve é jogar o Brasil num futuro onde ações esdrúxulas — como as conspirações de Cunhas, a quem o autor dedica todo um ensaio — poderiam tornar-se reais e criar condi-ções para o descontrole perene da democracia brasileira. O ódio político, praticado no comum da vida pública, num grau intenso de excitação, tem o potencial de insuflar a aspiração extremista de direita que paira por nos-sa pequena história política presente. Com a louvável capacidade de trazer conceitos próprios da psicanálise sem fazer um ensaio de jargões, Ab’Sa-ber não apenas contribui em Dilma Rousseff… para apresentar o campo e o significado da disputa, o que já é um grande feito, pois se permite uma linguagem pelos meandros das emoções e do psiquismo da política que é
por vários motivos inacessível aos cientistas sociais, mas principalmente descaracteriza a fantasmagoria do anticomunismo do nada, ao propor uma narrativa minuciosa do lulopetismo, o que projeta sua obra ao rol das re-ferências indispensáveis da análise da política brasileira contemporânea e da atuação progressista na atualidade.
Referências
AB’SABER, T. Lulismo, carisma pop e cultura anticrítica. São Paulo: He-dra, 2011.
AB’SABER, T. Crise e alucinose: anticomunismo do nada, CULT 206, 2015. BIN, D. Fiscal superstructure and the deepening of labour exploitation.
Ca-pital & Class, 2015.
BRAGA, R. Sob a sombra do precariado, In: David Harvey et al., Cidades
Rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil.
São Paulo: Boitempo, 2013.
PECHANSKI, J. A.; MORAES, R. Os protestos de junho e a agenda proposi-tiva: um argumento teórico. Lutas Sociais 17.31, p. 111-124, 2013.
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