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O contributo da leitura na motivação das crianças do 1º ciclo para a escrita

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

RELATÓRIO DE ESTÁGIO

O CONTRIBUTO DA LEITURA NA MOTIVAÇÃO

DAS CRIANÇAS DO 1.º CICLO PARA A ESCRITA

Sandra Maria Carvalho Fonseca

Mestrado em Ensino do 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico

Orientadora: Prof.ª Doutora Maria Felicidade Araújo Morais

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ii Relatório Final, correspondente ao estágio de natureza profissional/prática de ensino supervisionada, elaborado para obtenção do Grau de Mestre em Ensino do 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico, de acordo com o Decreto-Lei n.º 43/2007 de 22 de fevereiro e o Despacho n.º 3613/2009 de 22 de janeiro.

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iii Ao meu marido, pela paciência.

À Maria, minha fonte de energia. Ao Pedro Miguel, minha inspiração.

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iv AGRADECIMENTOS

Na fase final do meu curso, resta-me registar os meus sinceros agradecimentos a algumas pessoas que de alguma forma contribuíram para que este trabalho se tornasse numa realidade. Em primeiro lugar, quero agradecer à minha orientadora, Professora Doutora Maria Felicidade Araújo Morais, pela disponibilidade, sabedoria e colaboração. Agradeço ainda as suas palavras de ânimo e encorajamento.

Aos docentes cooperantes responsáveis pelas disciplinas de estágio e aos docentes orientadores de estágio do curso de Mestrado em Ensino do 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, pela partilha de conhecimentos teórico-práticos e por todo o apoio científico e colaboração concedida ao longo da minha prática pedagógica.

A todas as crianças das turmas que me acolheram quer no estágio do 1.º ciclo quer no estágio do 2.º ciclo, por todos os momentos-chave deste percurso e tudo o que aprendi com elas. Um muito obrigado pelo carinho demonstrado.

À Fernanda, pelo empréstimo de livros, incentivos e conselhos reconfortantes, e às minhas colegas de estágio, pelo bom relacionamento e aprendizagens partilhadas.

Por último, agradeço às pessoas mais importantes da minha vida, ao meu marido e filhos, a compreensão e a paciência que sempre demonstraram nos momentos mais difíceis desta minha etapa. Chegar até aqui seria impossível sem o apoio deles.

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v RESUMO

A investigação das últimas décadas tem mostrado que a aquisição da competência leitora e escritora está sobejamente relacionada com hábitos de leitura adquiridos precocemente, bem como com a aquisição do gosto e prazer pela leitura, podendo esta servir de pretexto para a escrita e para o prazer de escrever. No entanto, apesar de em Portugal começar a existir uma evidência emergente de melhoria no desempenho dos alunos em relação à leitura e à escrita, segundo a Avaliação Internacional para o Ministério da Educação (2008), salienta-se que a taxa na melhoria dos resultados dos alunos com classificações mais altas é significativamente reduzida, o que continua a condicionar o percurso académico e profissional de grande parte das crianças portuguesas.

Assim, o propósito deste trabalho é investigar as condições pedagógicas e os fatores cognitivos otimizadores da aprendizagem da leitura e da escrita, atribuindo um especial enfoque à caracterização de ambientes favoráveis ao desenvolvimento do gosto pela leitura e pela escrita, de forma a aprofundarmos conhecimentos que nos permitam desenvolver melhores práticas/métodos e contribuir para que os nossos futuros alunos dominem estas duas competências básicas fundamentais para poderem melhor aprender, trabalhar e realizar-se.

Numa primeira parte, apresenta-se uma revisão geral da literatura relativa ao ensino da leitura e escrita, pondo em foco perspetivas educacionais sobre essa aprendizagem, na qual são contemplados aspetos como: o papel da família na aprendizagem da leitura e escrita; pré- -requisitos para aprender a ler e a escrever; métodos/modelos de aprendizagem da leitura; o ensino da escrita; o problema da ortografia/grafia e a produção textual.

Numa segunda parte, apresenta-se um projeto de leitura/escrita desenvolvido aquando da nossa prática pedagógica no 1.º Ciclo com o objetivo de se verificar até que ponto a fomentação da leitura influenciou a motivação das crianças para a escrita, onde concluímos que o constante estímulo da leitura por prazer motiva e influencia o desempenho na escrita. Numa fase posterior, apresenta-se uma descrição de todo o processo realizado no âmbito do estágio pedagógico no 2.º Ciclo. Pelo que observámos ao longo da nossa prática pedagógica, concluímos que vale a pena investir e cultivar o prazer da leitura para formar o desenvolvimento das competências de interpretação e comunicação oral e escrita.

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vi ABSTRACT

In recent decades researches have shown that the acquisition of reading and writing skills, as well as the taste for reading is widely related to reading habits acquired during early ages, so reading may serve as a pretext for writing and also for the pleasure of writing. Although in Portugal is starting to arise emerging evidence on the improvement of student performance related to reading and writing, it must be noted that, according to the Ministry of Education - International Assessment (2008), the rate of improvement on student results with higher grades is significantly reduced. This continues to affect the educational and professional course of the majority of Portuguese children.

Thus, this work aims to investigate pedagogical conditions and cognitive factors, which are learning optimizers for Reading and Writing, assigning a special focus to characterization environments which could be favourable for the development of Reading and Writing. This will be extremely important in order to increase knowledge that allow the development of better practices / methods and contribute for a better domain of these two fundamental basic skills, as well as better learning, better work and better achievement of prospective students.

In the first part it will be presented a general review of the literature related to teaching Reading and Writing, with a special emphasis on educational perspectives about this specific learning, where it will be included aspects such as the role of family in Reading and Writing learning; Prerequisites for learning to read and write; methods/models of reading learning, writing teaching, spelling/orthography issues and textual production.

In the second part it will be presented a reading / writing project developed during our pedagogical practice in 1st Cycle in order to verify to what extent the enhancing of reading influenced the children's motivation for writing. So we concluded that a constant encouragement of enjoyable reading motivates and influences writing performance. At a later stage, it will be presented a description of the whole process undertaken within the teaching practice in 2nd Cycle. From what we observed throughout our teaching practice, we concluded that it is worth to invest and to cultivate the pleasure of reading in order to develop interpretation, oral and written communication skills.

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vii ÍNDICE GERAL Agradecimentos………..………… Resumo………... Abstract……….. Índice geral………. Índice de quadros………... Introdução……….

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1 – Ensino da Leitura e da Escrita………....………….…...……..…. 1.1. Noções de leitura e escrita……… 1.2. Orientações Curriculares……….. 1.2.1. Objetivos de desenvolvimento da Língua Materna no 1.º Ciclo…... 1.2.2. Atividades para aprender a Língua Materna no 1.º Ciclo………... 1.3. O papel da família na aprendizagem da leitura e da escrita……….

1.3.1. Atividades a desenvolver em contexto familiar………. 1.4. Aprendizagem da leitura e da escrita………...

1.4.1. Pré-requisitos para aprender a ler/escrever……… 1.4.2. O ensino da leitura……….……… 1.4.2.1. Métodos de aprendizagem da leitura……… 1.4.3. O ensino da escrita………. 1.4.3.1. O ensino da escrita e a ortografia/grafia………... 1.4.3.2. O ensino da escrita e a produção textual………... PARTE II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

2 – Estágio pedagógico no 1.º Ciclo……….………..….….…... 2.1. Contextualização/Caracterização da turma……… 2.2. Projeto de leitura e escrita desenvolvido………...

2.2.1. Fundamentação do projeto………. 2.2.2. Objetivos específicos do projeto……… 2.2.3. Atividades desenvolvidas no âmbito do projeto……… 2.2.4. Avaliação do projeto……….……. 3 – Estágio pedagógico no 2.º Ciclo….……… 3.1. Contextualização/Caracterização do estágio……….

3.1.1. Caracterização da escola………. 3.1.2. Caracterização da turma……….. 3.1.3. Direção de turma………. 3.1.4. Projeto Curricular de Turma………

iv v vi vii ix 1 4 4 7 8 8 12 15 17 17 21 27 33 37 43 50 50 51 52 53 54 55 56 56 56 59 60 62

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viii

3.2. Atividades educativas no 2.º Ciclo……… 3.2.1. Área de Língua Portuguesa………. 3.2.1.1. Contextualização programática……….. 3.2.1.2. Concretização da prática de ensino supervisionada……….. 3.2.1.3. Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas…………... 3.2.2. Área de Ciências da Natureza………..

3.2.2.1. Contextualização programática……….. 3.2.2.2. Concretização da prática de ensino supervisionada………... 3.2.2.3. Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas……… 3.2.3. Área de Matemática………. 3.2.3.1. Contextualização programática……….. 3.2.3.2. Concretização da prática de ensino supervisionada……...… 3.2.3.3. Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas………. 3.2.4. Área de História e Geografia de Portugal……… 3.2.4.1. Contextualização programática……….. 3.2.4.2. Concretização da prática de ensino supervisionada………... 3.2.4.3. Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas……… 3.2.5. Reflexão sobre a prática pedagógica no 2.º ciclo……… 4 – Metodologia de Investigação Ação……….….…….... 4.1. Caracterização da metodologia……….. 4.1.1. Aplicação da metodologia na pática educativa………... 5 – O Processo Avaliativo……….……… 5.1. Caracterização do processo avaliativo………...

5.1.1. Aplicação do processo avaliativo na prática educativa…...………… 6 – Conclusões………...

Referências Bibliográficas………..

ANEXOS……….

ANEXO I – Atividades desenvolvidas no âmbito do projeto de Leitura e Escrita... ANEXO II – Estudo realizado aquando do projeto de Leitura e Escrita ……..….... ANEXO III – Inquérito utilizado no estudo………..………...….. ANEXO IV– Planos de aula executados na prática pedagógica do 2.º ciclo……….

63 66 66 68 73 74 74 76 81 82 82 83 87 89 89 91 96 98 99 99 101 103 103 106 108 110 115 116 125 142 145

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ix ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1: Faseamento do treino da discriminação auditiva/consciência fonológica…... Quadro 2: Síntese dos diferentes modelos de leitura………...…. Quadro 3: Incorreções frequentes na aprendizagem da ortografia………..…. Quadro 4: Estratégias para motivar a prática da escrita………...…. Quadro 5: Funções da escrita e modos de ação didática………... Quadro 6: Zona de Influência Pedagógica do Agrupamento………..…... Quadro 7: Horário de funcionamento da Escola EB 2/3 MJA………..…. Quadro 8: Caracterização do Corpo Docente do Agrupamento………... Quadro 9: Caracterização do Corpo não Docente do Agrupamento………..…… Quadro 10: Síntese das unidades lecionadas na área de Língua Portuguesa…………..… Quadro 11: Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas na área de L.P…………... Quadro 12: Síntese das unidades lecionadas na área de Ciências da Natureza………..… Quadro 13: Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas na área de C.N………..…. Quadro 14: Síntese das unidades lecionadas na área de Matemática………..…... Quadro 15: Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas na área de Matemática…... Quadro 16: Síntese das unidades lecionadas na área de H.G.P………..… Quadro 17: Síntese das estratégias/atividades desenvolvidas na área de H.G.P………...

26 31 39 46 47 57 57 58 58 68 73 76 81 83 87 91 96

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x Aprender é a maior aventura da vida. Aprender é desejável, vital, inevitável e, principalmente, o maior jogo da vida e o mais estimulante. A criança acredita nisto e acreditará sempre – a menos que nós a persuadamos de que não é verdade. A regra de ouro é que (…) devem abordar a aprendizagem com alegria (…) Devemos satisfazer a ânsia espantosa da criança por matéria-prima que pretende absorver em todas as suas formas possíveis, mas especialmente em termos de linguagem (…).

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- 1 - INTRODUÇÃO

Devido às dificuldades apresentadas por algumas crianças no que diz respeito à aquisição da linguagem escrita, a partir dos anos 70 do século XX, a investigação tem procurado explicar as causas relacionadas com tais dificuldades e contribuído igualmente para uma profunda alteração das ideias acerca da natureza desta aprendizagem, surgindo assim a necessidade de se caracterizar o objeto (leitura/escrita) e o sujeito (aprendiz-leitor/escritor).

Diversos estudos realizados neste âmbito demonstraram que a aquisição da leitura/escrita é um processo complexo que envolve três dimensões: cultural, linguística e estratégica, e que «as crianças possuem dificuldades de aprendizagem quando ainda não compreendem bem as funções e as finalidades da leitura – dimensão cultural – ainda não dominam o funcionamento do código escrito – dimensão linguística – ou ainda não sabem o que precisam de fazer para ler – dimensão estratégica»1.

Do mesmo modo, é consensual que as práticas familiares e escolares influenciam substancialmente o desenvolvimento dos sentidos e das razões para aprender a ler/escrever, revelando-se determinantes no desenvolvimento do interesse (motivação) pela linguagem oral e pela escrita por parte da criança. Vários autores têm defendido que essa motivação varia em função da qualidade, da frequência e do valor das atividades desenvolvidas por quem mais convive com a criança, nomeadamente pais, educadores e professores, e que um melhor desempenho na leitura motiva e influencia o desempenho na escrita2.

É neste contexto que o título deste trabalho surge: «O contributo da leitura na

motivação das crianças do 1.º ciclo para a escrita». A opção por este tema nasce da

convicção do seu interesse e oportunidade, bem como do gosto de desenvolvimento que em nós desperta, pretendendo conhecer melhor os fatores que contribuem para a aprendizagem e desenvolvimento desta área curricular, assim como adquirir conhecimentos que nos permitam desenvolver melhores práticas, esperando contribuir favoravelmente para que os nossos futuros alunos dominem estas duas competências básicas fundamentais – Ler e Escrever – para poderem melhor aprender, trabalhar e realizar-se.

Deste modo, este trabalho apresenta-se dividido em duas partes. Uma primeira parte aborda a temática escolhida relativa ao ensino do 1.º ciclo e vai ter em atenção algumas teorias de pedagogos e metodólogos eminentes que se debruçaram sobre o tema escolhido.

1

Cf. Chauveau (2001) apud Valente e Martins (2004: 194). 2

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- 2 - Numa segunda parte, será dada relevância à nossa intervenção pedagógica quer no 1.º ciclo quer no 2.º ciclo do ensino básico. Engloba um pequeno projeto relacionado com a temática abordada, desenvolvido aquando do estágio pedagógico no 1.º ciclo, e uma descrição de todos os elementos fundamentais do estágio pedagógico no 2.º ciclo, apresentando-se assim todo o trabalho em cinco capítulos. Façamos uma breve incursão por cada um deles.

Na Introdução lançamos os temas principais do trabalho – Leitura, Escrita, Estágio Pedagógico no 1.º e 2.º Ciclos – e justificamos a escolha dos mesmos. Resumimos ainda, todas as partes constitutivas do trabalho.

No capítulo 1 apresentamos diferentes âmbitos em que a leitura e a escrita podem ser entendidas e definimos o conceito de leitura/escrita subjacente ao nosso trabalho. Neste capítulo será feita uma abordagem à didática e metodologia de ensino da leitura/escrita no 1.º ciclo, assim como uma abordagem ao papel da família relativamente à motivação que a mesma poderá desenvolver nas crianças, face à leitura e à escrita.

No capítulo 2 apresentamos um pequeno projeto desenvolvido durante o estágio pedagógico no 1.º Ciclo, os objetivos que se pretenderam atingir com a sua implementação, as atividades desenvolvidas e sua avaliação. Em anexo a este trabalho, apresentamos ainda um estudo realizado durante o desenvolvimento do projeto com o objetivo de se verificar até que ponto a fomentação da leitura teve influência na motivação das crianças para a escrita.

O capítulo 3 é dedicado ao estágio pedagógico realizado no 2.º ciclo. Engloba uma contextualização e caracterização do estágio supervisionado, uma descrição pormenorizada de todas as estratégias e atividades desenvolvidas nas diferentes áreas curriculares e uma avaliação das mesmas.

No capítulo 4 enquadramos a metodologia Investigação-Ação na prática educativa. Para tal, fizemos uma contextualização ao paradigma que a suporta, introduzindo conceitos inerentes à prática reflexiva e apresentando algumas definições do que é a Investigação-Ação. São ainda focadas as características mais importantes que distinguem esta metodologia de outras e a sua importância no campo da ação educativa.

No capítulo 5 apresenta-se uma descrição do processo avaliativo no que se refere ao seu conceito e aplicação prática na educação, bem como uma reflexão do processo avaliativo realizado ao longo de toda a prática pedagógica no 2.º ciclo.

Por fim, têm lugar algumas conclusões/reflexões pessoais, onde reforçamos a ideia de que a leitura por prazer tem um papel importante na promoção e desenvolvimento da escrita e que, quer a família quer a escola influenciam diretamente essa mesma promoção.

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- 3 -

PARTE I

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

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- 4 -

1 - ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA

1.1 -

NOÇÕES DE LEITURA E ESCRITA

Na sala de aula, ler tornar-se-á (...) um momento de dupla aprendizagem: do processo e do mundo e, por este, da língua. Lurdes Sousa, apud Alarcão, Motivar para a Leitura, p. 34 A escrita traduz o Ser, revela-o e, no momento oportuno, liberta-o.

Abreu et al., Ideias e Histórias, p.101

A leitura, a par da escrita, é uma das atividades mais importantes do universo social e escolar dos indivíduos. A sociedade atual e as suas constantes mutações exigem uma profunda reflexão sobre o que é a leitura, o papel que ocupa no currículo e a forma como é ensinada e avaliada.

Assim como a leitura, a utilização da linguagem escrita é igualmente imprescindível na vida quotidiana, tornando-se indispensável saber ler fluentemente e escrever de forma eficiente para a realização de muitas atividades diárias, como ler um jornal, enviar uma mensagem escrita ou simplesmente usufruir da leitura de um livro. É igualmente imprescindível que a escola reconheça a aprendizagem da leitura e da escrita como deveres que a sociedade lhe atribui: «Compete à escola, através da acção dos professores e de outros agentes que nela se integram, e da influência dos manuais, dentre outros elementos que podem afectar o processo de ensino aprendizagem, colmatar as graves lacunas detectadas em estudos relativos à literacia.» (Martins e Sá, 2008: 238).

A aprendizagem da leitura e da escrita é, sem dúvida, um dos principais desafios que se colocam às crianças no início da escolaridade e que por vezes estão na base de elevadas taxas de insucesso escolar. Não saber ler e escrever ou ler e escrever mal é um passo para o insucesso que se reflete em todas as áreas escolares. Contudo, importa acrescentar que a leitura/escrita não se confina às primeiras aprendizagens, mas é um processo longo que começa antes do processo de escolarização pela presença social do escrito através do ensino pré-escolar, bem como do contexto familiar.

Mas, afinal, o que se subentende por leitura/escrita? Poderemos responder de imediato, e de acordo com as autoras Viana e Teixeira (2002), que se trata de uma competência cognitiva, social e cultural. Segundo as autoras supracitadas, no passado, o ato

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- 5 - de ler/escrever eram encarados como meros instrumentos de ação, contudo, esta visão tem vindo a alterar-se até aos dias de hoje, sendo evidente que «estas aquisições têm de ser perspectivadas como meio de formação geral, tomando o indivíduo capaz de funcionar adequadamente como cidadão (…)» (Viana e Teixeira, 2002: 121).

Focando primeiramente a leitura, e de acordo com o Programa de Português do Ensino Básico (2009: 16), por leitura,

entende-se o processo interactivo que se estabelece entre o leitor e o texto, em que o primeiro apreende e reconstrói o significado ou os significados do segundo. A leitura exige vários processos de actuação interligados (decifração de sequências grafemáticas, acesso a informação semântica, construção de conhecimento, etc.); em termos translatos, a leitura pode ainda ser entendida como actividade que incide sobre textos em diversos suportes e linguagens, para além da escrita verbal.

Parafraseando Mendes, citado por Alarcão (1995: 70), «A leitura pode ser e é uma forma de ensinança sem deixar de ser uma forma de diversão. De modo que a palavra estranha ou ignorada é como um monumento que o turista encontra no seu caminho e visita, se é curioso». Para Alarcão (1995: 18), «leitura é entendida na acepção restrita de processo cognitivo de construir sentido a partir de um texto escrito. Ler é por isso, nesse sentido, o mesmo que compreender».

A mesma opinião é partilhada por Mialaret (1974: 16) ao afirmar que «Ler oralmente equivale a encontrar, em face de um símbolo escrito, a sua sonorização portadora de sentido», e por Cassany et al. (2007: 44) que afirmam: «ler é compreender um texto».

Seguindo esta perspetiva, também Sim-Sim (2007: 14) afirma: «Ler é compreender, obter informação, aceder ao significado do texto». Segundo esta autora, todos os símbolos gráficos traduzem uma mensagem e a utilização de qualquer técnica será inútil se não permitir atingir um pensamento, ou seja, saber ler é, neste caso, compreender o que se decifra, traduzir em pensamento ideias, emoções e sentimentos, uma pequena imagem que se estende ao longo de uma linha. Esta delimitação do conceito de leitura remete-nos para uma estreita relação entre a linguagem escrita e a linguagem oral, relação essa que poderemos observar na expressão «qualquer coisa que eu posso dizer posso escrever, qualquer coisa que eu posso escrever posso ler» (Sim-Sim, 2006: 36).

Conclui-se portanto, que ler é uma atividade cognitiva e não uma capacidade sensorial e auditiva que se pensava ser necessário para aprender a ler, e já agora, para aprender a escrever, uma vez que não se pode separar a leitura da escrita já que estes dois processos estão inter-relacionados. Tal como a leitura, nas palavras de Sim-Sim et al. (1997: 29), a escrita

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- 6 - «não é uma actividade de aquisição espontânea e natural, exigindo, por isso, ensino explícito e sistematizado e uma prática frequente e supervisionada».

O Programa de Português do Ensino Básico (2009: 16) define escrita como sendo:

o resultado, dotado de significado e conforme à gramática da língua, de um processo de fixação linguística que convoca o conhecimento do sistema de representação gráfica adoptado, bem como processos cognitivos e translinguísticos complexos (planeamento, textualização, revisão, correcção e reformulação do texto.

A escrita exige assim, «a capacidade de seleccionar e combinar as expressões linguísticas, organizando-as numa unidade de nível superior, para construir uma representação do conhecimento, correspondente aos conteúdos que se quer expressar» (Barbeiro e Pereira, 2007: 17).

A simples constatação de que a escrita é diferente de outras formas gráficas, como por exemplo o desenho, conduz ao conhecimento de que o escrito contém informação que se destina a ser lida e que tal informação é permanente. De acordo com Sim-Sim et al. (1997), uma vez na posse destes dois princípios, o futuro leitor apercebe-se de que a escrita é uma simbolização da linguagem oral e que qualquer indivíduo poderá produzir material escrito, através de diversos meios e múltiplos materiais.

Muitos autores destacam o papel importante que a escrita pode desempenhar no contexto escolar, que vai muito para além do âmbito da disciplina de língua materna, ou seja, que o domínio da escrita pode facilitar a resolução de problemas, permitindo aos alunos o domínio de convenções e estratégias que tornam possível a melhor expressão das suas ideias, promovendo igualmente a capacidade de reflexão crítica sobre o seu próprio trabalho.

Relativamente ao ato da aprendizagem da escrita, Reis e Adragão (1992: 40) afirmam que «nunca se pode dizer que um indivíduo atingiu o grau máximo de domínio da escrita. Há um caminho que se percorre, com etapas, com degraus, mas sem meta conhecida». O mesmo se poderá dizer em relação à aprendizagem da leitura.

A aprendizagem da leitura e da escrita baseia-se, por isso, em dois pressupostos fundamentais: o de se retirar/partilhar informação visual, através dos sinais gráficos, e também o da compreensão do que se está a ler e a escrever. Aprender a ler e a escrever representa, nesta perspetiva, dar à criança os meios que lhe permitam comunicar com outrem na sua ausência, exigindo-lhe desta forma a conquista de uma autonomia.

(17)

- 7 -

1.2 -

ORIENTAÇÕES CURRICULARES

Cada rubrica específica a estudar na aprendizagem da língua materna não pode ser uma finalidade em si mesma, mas deve constituir um enfoque enriquecedor de uma visão global. L. Cortesão e Mª Arminda Torres, Avaliação Pedagógica II - Perspectivas de Sucesso, p.250

Sabendo que o bom domínio da língua facilita o acesso a novas aprendizagens e que a educação linguística é um alicerce e um fator sinergético da aprendizagem de outros saberes e outras disciplinas, o perfil específico de desempenho profissional do professor do 1.º ciclo segundo o Decreto-Lei n.º 241/2001 de 30 de agosto, no âmbito da educação em Língua Portuguesa, refere que o mesmo deverá:

 Desenvolver nos alunos as competências de compreensão e de expressão oral, mobilizando conhecimentos científicos relativos aos processos através dos quais se desenvolve a linguagem e se realiza a comunicação interpessoal;

 Promover a aprendizagem de competências de escrita e de leitura, mobilizando conhecimentos científicos acerca dos processos de produção e de compreensão de textos escritos e das suas relações com a comunicação oral;

 Incentivar a produção de textos escritos e integrar essa produção nas actividades de aprendizagem curricular, levando os alunos a mobilizar diversas estratégias para a aprendizagem da escrita, servindo-se de materiais e de suportes variados;

 Incentivar os alunos a utilizar diversas estratégias de aprendizagem e de desenvolvimento da leitura em variados tipos de textos e com diferentes finalidades;

 Fomentar nos alunos hábitos de reflexão conducentes ao conhecimento explícito de aspectos básicos da estrutura e do uso da língua, de modo a que as suas competências linguísticas se vão desenvolvendo de forma contextualizada e em interacção comunicativa;  Promover nos alunos de diferente língua materna a aprendizagem da língua portuguesa

como segunda língua.

Assim, é fundamental que o professor do 1.º Ciclo seja um bom utilizador do português padrão, que conheça bem a língua que ensina, que a domine quer sob a forma de registo oral quer na sua forma escrita e que conheça a sua gramática e a metalinguagem que a descreve. Só assim poderá oferecer um desenvolvimento equilibrado das competências de comunicação, criando espaços para a produção efetiva do aluno, ao nível da oralidade e da escrita, bem como para o alcance das metas do currículo de Língua Portuguesa3. Segundo o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 31), a meta no currículo de Língua Portuguesa na educação básica é desenvolver nos jovens um conhecimento da língua que lhes permita:

 Compreender e produzir discursos orais formais e públicos;

 Explicitar aspetos fundamentais da estrutura e do uso da língua, através da apropriação de metodologias básicas de análise, e investir esse conhecimento na mobilização das

3

(18)

- 8 - estratégias apropriadas à compreensão oral e escrita e na monitorização da expressão oral e

escrita;

 Usar multifuncionalmente a escrita, com correção linguística e domínio das técnicas de composição de vários textos;

 Interagir verbalmente de uma forma apropriada em situações formais e institucionais;  Ser um leitor fluente e crítico.

1.2.1 - Objetivos de desenvolvimento da Língua Materna no 1.º Ciclo

Sendo a linguagem simultaneamente um instrumento de acesso ao conhecimento e um objeto de estudo, o professor do 1.º ciclo deverá ser um exímio estimulador das competências comunicativas. É importante que o professor faça das suas aulas um espaço de descoberta para os seus alunos, que lhes saiba despertar a curiosidade pelas palavras e pela língua, bem como pelo conhecimento em geral. De acordo com o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 33-35), ao longo do 1.º ciclo é indispensável alcançar os seguintes objetivos de desenvolvimento:

 Alargamento da compreensão a discursos em diferentes variedades do Português, incluindo o Português padrão;

 Alargamento da expressão oral em Português padrão;

 Aprendizagem dos mecanismos básicos de extracção de significado do material escrito;  Domínio das técnicas instrumentais de escrita;

 Desenvolvimento da consciência linguística com objectivos instrumentais.

1.2.2 - Atividades para aprender a Língua Materna no 1.º Ciclo

Para uma melhor compreensão dos objetivos de desenvolvimento da Língua materna, destacados na secção anterior, subdividimo-los em tópicos, sendo estes seguidos de algumas propostas de experiências de aprendizagem, tomando como referência a obra de Sim-Sim, Duarte e Ferraz (1997), uma vez que a mesma tem sido uma referência relevante na elaboração de manuais escolares, bem como na orientação de grande parte do trabalho dos professores do 1.º ciclo do Ensino Básico.

- Alargamento da compreensão a discursos em diferentes variedades do Português, incluindo o Português padrão

Ao longo do 1.º ciclo e de acordo com o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 33), as crianças deverão desenvolver a «capacidade de extrair e reter a informação essencial de discursos em diferentes variedades do Português, incluindo o Português padrão», assim como aumentar a «familiaridade com o vocabulário e as estruturas gramaticais de variedades

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- 9 - do Português e conhecimento de chaves linguísticas e não linguísticas para a identificação de objectivos comunicativos».

Para que se atinjam os objetivos acima identificados, Sim-Sim et al. (1997: 53) referem que é necessário a escola proporcionar às suas crianças oportunidades de:

 Ouvir pequenas narrativas;

 Ouvir gravações ou assistir a representações teatrais de qualidade;  Ouvir diálogos sobre assuntos bem delimitados;

 Ouvir curtas exposições informativas;

 Participar em jogos para descoberta do significado das palavras integradas num contexto linguístico;

 Participar em actividades que exijam compreensão de estruturas sintácticas específicas.

- Alargamento da expressão oral em Português padrão

Ao longo do 1.º ciclo e de acordo com o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 34), as crianças deverão desenvolver «a capacidade de se exprimir de forma confiante, clara e audível, com adequação ao contexto e ao objectivo comunicativo», assim como o «conhecimento de vocabulário diversificado e de estruturas sintácticas de complexidade crescente». Para que se atinjam os objetivos atrás identificados, Sim-Sim et al. (1997: 69-70) referem que é necessário a escola proporcionar às suas crianças oportunidades de participarem em atividades como as que se seguem:

 Prática de trava-línguas, com objectivos de adaptação articulatória;

 Exercícios que envolvam a função distintiva da entoação (pergunta/ordem/ pedido/asserção);

 Treino das estruturas do diálogo para tomada consciente de palavra e troca de papéis;  Dramatizações, recontos orais (de narrativas e acontecimentos) e completamento de

histórias;

 Descrição de pessoas, objectos e gravuras;

 Planeamento verbal de actividades a realizar (uma visita de estudo, a organização de um jornal de turma,...);

 Exercícios visando a adequação do discurso ao interlocutor (formas de tratamento dirigidas a adultos e dirigidas a pares), à situação (formal, na sala de aula; informal, no recreio) e ao meio de comunicação (em presença ou em ausência), bem como a aprendizagem e rotinização de fórmulas feitas (fórmulas de delicadeza e de saudação).

- Aprendizagem dos mecanismos básicos de extração de significado do material escrito

Ao longo do 1.º ciclo, e de acordo com o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 34), as crianças deverão desenvolver «a capacidade para decifrar de forma automática cadeias grafemáticas, para localizar informação em material escrito e para apreender o significado global de um texto», assim como o «conhecimento de estratégias básicas para a decifração automática de cadeias grafemáticas e para a extracção de informação de material escrito».

(20)

- 10 - Para que se atinjam estes objetivos, é necessário que o processo de decifração (letra-som) esteja automatizado pelas crianças, constituindo condição necessária para que a atenção possa ser canalizada para a extração de significado.

Segundo Sim-Sim et al. (1997), automatizado o processo de decifração, cabe à escola proporcionar às crianças a oportunidade de lerem com duas finalidades básicas e diferentes: para recreação (leitura recreativa) e para obter informação (leitura para fins informativos). O principal objetivo da leitura recreativa é a aprendizagem da extração de significado de diferentes tipos de texto que promovam o desenvolvimento do imaginário, do espírito criativo e do pensamento divergente. Por isso é fundamental que as crianças contactem com os mais variadíssimos tipos de textos como: lengalengas, adivinhas, narrativas (fábulas, contos de fadas, aventuras), poesia, revistas infantis, etc.

Em relação à leitura para fins informativos, esta tem como objetivo principal a aprendizagem da extração de significado com o objetivo de transformar a informação em conhecimento. Em relação a esta matéria, Sim-Sim (2007: 9) afirma: «Tal como na compreensão do oral, o importante na leitura é a apreensão do significado da mensagem, resultando o nível de compreensão da interacção do leitor com o texto».

Para que se consiga alcançar este objetivo, Sim-Sim et al. (1997: 61) referem que é fundamental que as crianças contactem sistematicamente com documentos e textos escolares de vários tipos, proporcionando-lhes práticas de:

 Leitura de horários (escola, transportes, bibliotecas, cinemas, lojas,...);  Localização em mapas de cidades, rios, acidentes geográficos,...;  Consulta do calendário com fins diversos;

 Procura de um número de telefone ou de uma morada na lista telefónica;  Leitura de preços de géneros, de bilhetes, de livros,…;

 Consulta de enciclopédias infantis;

 Leitura de textos escolares no domínio da Matemática, do Meio Físico e Social e da História;

 Leitura de instruções que constituam guias para a acção (receitas culinárias, itinerários, regras de jogos individuais e colectivos, (...);

- Domínio das técnicas instrumentais de escrita

Ao longo do 1.º ciclo, e de acordo com o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 35), as crianças deverão desenvolver «a capacidade para produzir textos escritos com diferentes objectivos comunicativos», assim como o «conhecimento de técnicas básicas de organização textual». Sim-Sim et al. (1997: 78) afirmam que, para que as crianças atinjam estes níveis de desempenho, é necessário que a escola lhes dê oportunidade de participarem em atividades de:

(21)

- 11 - Cariz técnico:

 Exercícios de destreza e precisão caligráficas;  Prática de escrita num teclado de computador;

 Exercícios para a automatização das regras ortográficas;

 Exercícios de escrita de textos memorizados (provérbios, lengalengas, poesias curtas).

Escrita não compositiva:

 Elaboração de listas de palavras e de acções ordenadas sequencialmente com vista à realização de uma determinada actividade;

 Identificação e categorização de figuras de uma gravura, por legendagem;  Completamento de frases e substituição de palavras;

 Ordenação e legendagem de sequências narrativas em banda desenhada.

Escrita compositiva para relato:

 Exercícios de reescrita de textos conhecidos;

 Exercícios de escrita visando a automatização das rotinas discursivas características dos textos narrativos e das cartas informais;

 Alteração de um pequeno texto em função de destinatários diferentes;

 Escrita colectiva, em pequenos grupos e individual, de rascunhos e respectiva correcção e melhoramento.

- Desenvolvimento da consciência linguística com objetivos instrumentais

Segundo o Currículo Nacional do Ensino Básico (2001: 34), ao longo do 1.º ciclo, as crianças deverão desenvolver «a capacidade de usar o conhecimento da língua como instrumento na aprendizagem da leitura e escrita e o conhecimento de paradigmas flexionais e regras gramaticais básicas».

De acordo com Sim-Sim et al. (1997: 85-86), para que as crianças atinjam estes níveis de desempenho, é necessário que a escola lhes dê oportunidade de participar em atividades de:

 Exercícios visando a automatização da ordenação alfabética;

 Classificação de palavras quanto ao número de sílabas e quanto à acentuação, identificação de sílabas tónicas e átonas e distinção de vogais, consoantes e ditongos;

 Reconhecimento do significado de palavras contendo alguns prefixos e sufixos;  Descoberta e identificação das classes principais de palavras;

 Distinção e identificação de alguns tipos de frases;  Descoberta e identificação de funções sintácticas centrais;

 Identificação do tipo de relação entre acontecimentos ou situações expresso por conectores de subordinação já usados oralmente;

 Consciencialização e sistematização de aspectos da flexão nominal e adjectival;  Consciencialização e sistematização de aspectos de flexão verbal;

 Treino dos paradigmas de conjugação verbal;

 Treino de consulta de dicionários e de enciclopédias infantis;

 Exercícios visando a sistematização de algumas regras elementares de ortografia e das regras de pontuação;

(22)

- 12 -

1.3 -

O PAPEL DA FAMILÍA NA APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA

A origem do desejo de aprender a ler assemelha-se ao de aprender a falar. (...) Se os adultos que rodeiam a criança escreverem e lerem, isso também despertará na criança o interesse por ler e escrever.

F. Viana e M.ªTeixeira, Aprender a Ler, p. 24

Vivendo numa sociedade onde as crianças contactam cada vez menos com os livros, devido a todos os meios informáticos e tecnológicos que têm ao seu dispor, torna-se cada vez mais urgente estimular o gosto pela leitura e pela escrita dinâmica e criativa. Deste modo, compete ao professor, mas também às famílias, sensibilizar as suas crianças para a importância dos livros, da leitura e da escrita, contribuindo desta forma para a aprendizagem e para o desenvolvimento intelectual e afetivo dessas crianças4.

Nos últimos anos, vários autores, entre os quais Buzan (2007), têm procurado evidenciar a necessidade de, desde muito cedo, se proporcionar e valorizar as experiências precoces em contextos mais ou menos informais com que a criança se vai deparando no seu dia a dia. Para este autor, os pais poderão realmente marcar uma diferença no que diz respeito à aprendizagem e ao desenvolvimento das suas crianças se acreditarem que são capazes disso mesmo. Seguindo a linha de pensamento de Buzan (2007: 284), os pais devem levar os seus filhos a interessar-se por livros desde muito cedo, variando o material de leitura, indo esta ao encontro do gosto da criança, salientando que «o interesse e um maior envolvimento familiar pode ajudar as suas crianças a alcançar níveis mais elevados de desempenho, nomeadamente, ao nível da leitura5». Buzan (2007: 295) chega mesmo a afirmar: «ensine o seu filho pequeno a ler».

Há assim uma nova visão e um novo posicionamento sobre o papel da família, da própria criança e sobre o contributo do contexto familiar para o processo de aprendizagem da leitura e escrita. A par da escola, a família passou a ser considerada um elemento importante neste processo, cuja participação deve ser mobilizada, estimulando a criança para a prática de leitura e de escrita, apresentando-lhe desafios, indo ao encontro dos seus gostos pessoais não

4

Cf. Mata (1999) e Alves e Leite (2003). 5

Veja-se o exemplo da criança que nasceu com graves lesões cerebrais referenciada no livro pelo autor, que segundo vários especialistas nunca iria andar e falar, muito menos ler, e por iniciativa dos pais da criança que ao longo da sua infância foram estimulando-a com jogos, letras, palavras e livros infantis e foi revelando um progresso significativo do domínio físico e verbal para o da leitura e dos conceitos (Buzan 2007: 87-89).

(23)

- 13 - com o objetivo de ensinar a criança a ler ou de como se escrevem as palavras, mas sim fazer com que ela se aventure nelas, pois, como referem Abreu et al. (1990: 102), «A aprendizagem da escrita começa em casa, (...), as suas garatujas deverão ser respeitadas. Uma palavra de apreço, um elogio, uma história ou um diálogo surgidos a partir delas serão suporte e estímulo para que outras, cada vez mais elaboradas, se sigam».

Sobre esta matéria, vários autores, entre os quais Viana e Teixeira (2002), defendem que as crianças que melhor leem na escola são as que se habituaram a ouvir ler histórias desde pequenas e possuem um ambiente familiar onde a leitura e a escrita são atividades diárias. Realçam também que a leitura de livros e histórias é uma atividade estruturada da emergência dos comportamentos de pré-leitura e do desenvolvimento da literacia, ou seja, o hábito de ler para as crianças pequenas permite que estas imitem depois o comportamento do leitor. Assim, os pais ou outros membros da família, através de diversas formas, têm a oportunidade de fornecer às crianças instrumentos e oportunidades para ler e escrever, bem como transmitir razões para desejarem dominar estas duas competências.

Seguindo esta linha de pensamento, o caminho para a progressiva clareza cognitiva6 acontece bem antes da aprendizagem formal da leitura/escrita, tendo a família um papel muito importante, na medida em que de forma intuitiva, esta explora a interação com o escrito, ajudando assim a criança a ir fazendo as suas próprias descobertas.

Hoje em dia sabe-se que, desde cedo e sem ter havido ensino formal, muitas crianças sabem já o que serve para ler ou por onde se começa a ler. Naturalmente, descobrem as funções e as formas da leitura/escrita ao mesmo tempo que desenvolvem um vocabulário específico para falar sobre esta forma de linguagem. Crianças que cresçam num ambiente rico em experiências de leitura e escrita tomam também mais cedo consciência das relações essenciais entre a língua falada e a língua escrita, permitindo-lhes construir e desenvolver «algumas concepções relativas aos aspectos figurativos e conceptuais da linguagem escrita: a direccionalidade, a diferença entre escrever e desenhar, etc.» (Programa de Português do Ensino Básico, 2009: 22).

Assim, aprender a ler/escrever começa muito antes da entrada para a escola e envolve quer a criança quer as pessoas que interagem significativamente com a mesma. O desenvolvimento da literacia começa muitas vezes nos jogos simbólicos de faz-de-conta, e na imitação deliberada das atividades de leitura e escrita dos adultos, transmitindo estes

6

Fase caracterizada pela construção de uma representação global da tarefa, dos seus objetivos e da sua natureza, ou seja, a criança tenta perceber os objetivos da leitura/escrita e os meios necessários para os atingir. Cf. Sim-Sim et al., (1997), Niza (1998), Viana e Teixeira (2002), entre outros.

(24)

- 14 - consciente ou inconscientemente, as suas atitudes e expectativas acerca da leitura e da escrita, para além de contribuírem significativamente para o desenvolvimento de comportamentos linguísticos e metalinguísticos, competências que a investigação tem demonstrado estarem altamente relacionadas com a aprendizagem da leitura/escrita.

Pesquisas levadas a cabo por Sim-Sim et al. (1997) sobre comportamentos emergentes de leitura e de escrita equacionam novas perspetivas pedagógicas sobre o ensino destas competências. Para estas autoras, hoje em dia é inquestionável que o sucesso na iniciação à leitura/escrita depende essencialmente «da exposição à linguagem escrita a que a criança foi submetida antes da entrada na escola», e salientam que «a maior ou menor facilidade na aprendizagem inicial da leitura e da escrita vai depender do que o pré-leitor já sabe sobre a linguagem escrita antes de iniciar o ensino formal da mesma» (Sim-Sim et al., 1997: 48).

Assim, aquando da entrada para o 1.º ciclo, quanto melhor as crianças compreenderem a finalidade comunicativa da linguagem escrita, e quanto mais clara for a conceção da função simbólica da escrita, melhor será a compreensão dos processos de descodificação e codificação que relacionam a linguagem escrita com a linguagem falada.

Importa acrescentar que as avaliações levadas a cabo pela OCDE7 através do PISA8 com base no ano 2000 vêm revelar o impacto educativo de as crianças nascerem e crescerem em contextos familiares, sociais, económicos e culturais variados. Com o objetivo de avaliar as competências dos alunos em literacia da Língua Materna, em 2006 estes relatórios revelaram que os desempenhos fracos não resultam automaticamente de um contexto familiar desfavorecido, porém, contêm larga evidência de que os resultados obtidos nos testes são fortemente influenciados pelo ambiente familiar, destacando Jesus (2009: 23) os seguintes fatores que influenciam o desempenho das crianças:

 Nível de escolarização e tipo de ocupação dos pais;

 Heterogeneidade cultural, social e económica do ambiente familiar;  País de nascimento e língua que falam em casa;

 Natureza e frequência da comunicação em casa.

Poder-se-á dizer que hoje, mais do que nunca, as escolas precisam de estar preparadas para acolher e proporcionar oportunidades de aprendizagens bem-sucedidas a um leque variado de alunos, cabendo ao professor a importante tarefa de avaliar o desempenho dos seus alunos ao nível da expressão oral, da compreensão de leitura e escrita para posteriormente colocar em prática estratégias diversificadas capazes de darem resposta às dificuldades

7

Organização Internacional para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, da qual Portugal é membro. 8

Programme for International Students Assessment, a que Portugal aderiu e apresentou os primeiros resultados em 2001.

(25)

- 15 - apresentadas pelos alunos nesta área.

A par disso, nas escolas portuguesas têm sido levados a cabo diversos projetos com o objetivo principal de aumentar os níveis de desempenho em literacia. É o exemplo do projeto

Já sei ler9, que pretende fundamentalmente incentivar a leitura em família, através da interação entre a escola e as famílias dos alunos do 1.º ciclo, disponibilizando materiais e sugestões de atividades com o objetivo de dar continuidade ao trabalho desenvolvido pelas escolas no âmbito da motivação para a leitura e de tirar partido do contexto favorável criado em torno dos livros.

Salientando a responsabilidade da escola pela tarefa de ensinar as crianças a ler, este projeto do PNL10 parte do pressuposto de que a colaboração da família é determinante para a criação de hábitos de leitura nos primeiros anos de escolaridade, considerados relevantes para o sucesso escolar dos alunos.

1.3.1 - Atividades a desenvolver em contexto familiar

Apresentamos de seguida alguns exemplos de atividades que poderão ser exploradas em contexto familiar e que poderão ajudar a criança a melhorar os níveis de expressão oral, de compreensão de leitura e de expressão escrita, segundo Alves e Leite (2003: 81-82):

 Obedecer às regras básicas de comunicação - respeitar a vez, intervir oportunamente, ouvir as opiniões alheias;

 Relatar experiências, acontecimentos vivenciados durante o dia;  Contar histórias, anedotas;

 Expressar opiniões, justificar pontos de vista sobre assuntos do quotidiano, programas televisivos, artigos, etc.;

 Debater um tema de um programa de TV, um filme, ou um assunto de um livro;  Discutir um tema familiar (tempo permitido de TV por dia, quantia da mesada, etc.

 Jogo: dramatizar uma parte de um filme, de uma peça de teatro ou de um capítulo de um livro, cujo título os restantes elementos da família têm de adivinhar;

 Ouvir contos tradicionais, lendas;

 Reproduzir trava-línguas, rimas, pregões, provérbios;  Jogo: concurso de adivinhas, charadas;

 Ir a uma livraria/biblioteca com a criança e deixá-la escolher um livro, a partir da observação da capa, contracapa, ou das ilustrações;

 Ler um excerto de um bom livro ao seu filho e pedir-lhe para imaginar o que antecede e motiva aquele momento da obra. As respostas poderão ser depois confirmadas com a leitura do restante;

 Jogo: pedir à criança para imaginar que é uma personagem do livro que leu que, por engano, entrou noutra história e solicitar-lhe que conte o que se passou;

 Recitar poemas;

9

Projeto desenvolvido no âmbito do Plano Nacional de Leitura com o objetivo de promover a leitura em família e a interação escola-família. Pretende valorizar este contexto favorável e disponibilizar materiais de apoio para o desenvolvimento de atividades que incentivem a leitura e o gosto pelos livros, abrangendo todas as escolas do 1.º ciclo públicas e privadas que pretendam aderir.

10

Plano Nacional de Leitura, lançado no ano de 2006 pelos ministérios da Educação, da Cultura e dos Assuntos Parlamentares - Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2006 de 12 de julho.

(26)

- 16 -  Ler expressivamente parte ou a totalidade de textos;

 Dramatizar momentos ou a totalidade de narrativas;  Recontar oralmente histórias;

 Ilustrar textos;

 Ler artigos de jornais e revistas em busca de informações específicas;  Procurar informação na enciclopédia ou na internet;

 Jogo: pedir à criança para, num minuto, encontrar no dicionário o máximo de palavras que lhe são apresentadas numa lista;

 Pedir ao seu filho para analisar uma fotografia de um episódio familiar passado e para escrever o que imagina que tenha acontecido nessa altura;

 Jogo: fazer um texto colectivo, em que cada elemento participante tem de continuar a história, sem poder mudar nada do contributo do elemento anterior;

 Incentivar a criança a escrever as cartas, ou os postais de boas festas e aniversário para a família e amigos;

 Colar recados para diferentes membros da família, por exemplo, no frigorífico;  Escrever e enviar convites para um jantar ou espetáculo;

 Fazer entrevistas aos familiares;  (...)

Conclui-se, assim, que o ambiente familiar aparece também como relevante para as aprendizagens dos alunos. Aparentemente, mais do que os recursos estritamente económicos, é marcante para um bom desempenho a existência de bens culturais e educacionais na família, bem como de um clima em que as interações sociais entre pais e filhos sejam frequentes.

(27)

- 17 -

1.4

- APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA

1.4.1 - PRÉ REQUISITOS PARA APRENDER A LER/ESCREVER

O meio mais seguro e de que nunca nos lembramos é criar o desejo de aprender. Dêem à criança esse desejo e deixem o resto (...).

Daniel Pennac, Como um romance, p. 51.

As conceções sobre os pré-requisitos para aprender a ler/escrever têm variado ao longo do tempo. Há décadas atrás, a idade ligada à maturidade biológica era considerada determinante para a aprendizagem da leitura/escrita. Para aprender a ler, por exemplo, considerava-se como pré-requisitos para a sua aprendizagem, «todo um conjunto de aptidões psicológicas gerais tais como a organização percetivo-motora, a estruturação espacial e temporal, o nível de desenvolvimento intelectual, o esquema corporal, a lateralidade, entre outras.» (Neves e Martins, 2000: 19).

Sob influência da teoria maturacionista, não valeria a pena ensinar a ler/escrever crianças que não tivessem atingido uma certa maturidade, dependendo esta de uma idade cronológica. Vários estudos realizados a partir dos anos 60, inícios dos anos 70, vieram mostrar que ler não é fundamentalmente um ato percetivo, mas sim um ato cognitivo; hoje em dia, poder-se-á dizer que a avaliação dos processos de cariz metalinguístico e dos processos inerentes à leitura e à escrita num sistema alfabético ganharam alguma relevância. Sobre esta matéria, Viana e Teixeira (2002) destacam o desenvolvimento da linguagem oral e a capacidade para refletir sobre essa mesma linguagem como variáveis essenciais para o sucesso da aprendizagem da leitura e da escrita.

Apesar de em alguns países, como por exemplo a Finlândia, que em 2003 liderava o 1.º lugar entre 43 países no que diz respeito às performances de leitura dos alunos11, o sucesso alcançado no desempenho nesta área estar também relacionado com o facto de as crianças iniciarem a aprendizagem formal da leitura/escrita apenas aos sete anos de idade, vários estudos têm vindo a demonstrar que o desenvolvimento cognitivo não desempenha um papel tão preponderante na aprendizagem da leitura/escrita, pelo menos na sua fase inicial.

11

Cf. Resultados da avaliação internacional de 2003 do PISA (Program for Internacional Student Assessment) em Robert (2010: 7).

(28)

- 18 - Nas palavras de Viana e Teixeira (2002: 63), «a criança pode ter atingido o domínio das operações mentais subjacentes à aprendizagem da leitura e, mesmo assim, ter insucesso». Acrescentam também que «o desenvolvimento cognitivo é necessário mas não suficiente». Vários autores têm defendido que a facilidade em aprender a ler/escrever nos estádios iniciais resulta das oportunidades que são oferecidas desde cedo às crianças para se tornarem conhecedoras das propriedades simbólicas e independentes do contexto, que caracterizam a linguagem escrita, assim como do conhecimento que a criança tem acerca das finalidades da leitura/escrita, uma vez que, só desta forma, será possível a criança motivar-se para a sua aprendizagem e desejar ser um aprendiz leitor/escritor12.

Assim, antes de se iniciarem as crianças nas técnicas de decifração, é necessário que esta confusão cognitiva seja ultrapassada. Uma das formas de o fazer, segundo Sim-Sim, (2001), para além da exploração de práticas de leitura diversificadas e com sentido na sala de aula, é estimular e levar as crianças a refletirem sobre a linguagem oral e escrita, promovendo trocas e diálogos sobre as suas conceções, partindo sempre daquilo que as crianças já sabem para que elas sejam capazes de reformular as suas conceções e evoluir.

Para Marques (1999a: 26), «a criança não aprende a ler apenas porque o adulto assim o quer, mas porque a leitura se lhe apresenta como um problema com significado que provoca na criança um desequilíbrio momentâneo e uma necessidade interna (motivação) para compreender o seu ambiente». Seguindo a mesma linha de pensamento, Cassany et al. (2007) defendem que, antes de se iniciar essa aprendizagem, dever-se-á primeiro motivar as crianças para a leitura, identificando os autores a motivação para a leitura como um dos pré-requisitos para a aprendizagem da mesma, para além da capacidade de discriminar sons, formas e imagens parecidas, do domínio aceitável de tempo e espaço, da vivência da linguagem como elemento de comunicação, bem como o desenvolvimento da competência de representação simbólica. Parafraseando os autores Cassany et al. (2007: 209), «a aquisição do código escrito, a correspondência som-grafema, deveria ser apenas a porta de entrada para um mundo novo, com níveis profundos de compreensão e temas inesgotáveis».

Também para Freitas et al. (2007), um dos passos cruciais na iniciação à leitura e à escrita consiste na promoção da reflexão sobre a oralidade e no treino da capacidade de segmentação da cadeia de fala: segmentar o contínuo sonoro em frases, as frases em palavras, as palavras em sílabas e estas nos sons que as compõem. Freitas et al. (2007: 9) referem que «Para aprender a ler e a escrever em função de um código alfabético, é necessário saber que a

12

(29)

- 19 - língua, no seu modo oral, é formada por unidades linguísticas mínimas – os sons da fala ou os segmentos – e que os caracteres do alfabeto representam, na escrita, essas unidades mínimas». De acordo com as autoras supracitadas, apesar de hoje em dia a maior parte das crianças à entrada na escola ser capaz de segmentar oralmente a fala em partições silábicas, as mesmas não possuem ainda a facilidade de identificar e isolar conscientemente os sons da fala, revelando um fraco desenvolvimento da consciência fonológica, «entendida como a capacidade de identificar e de manipular as unidades do oral» (Freitas et al, 2007: 10).

As autoras realçam portanto que a primeira tarefa da escola deverá centrar-se na promoção, através de um treino sistemático e profundo, do desenvolvimento da sensibilidade aos aspetos fónicos da língua, promovendo assim a consciência fonológica, ou seja, que o treino sobre as unidades do oral deverá anteceder a introdução das unidades do código alfabético.

Nas últimas décadas, vários estudos, entre os quais o de Sim-Sim (2006)13, vêm mostrar que a eficácia do domínio da correspondência depende essencialmente do nível de consciência fonológica que a criança possui dos sons da sua língua materna. Se a criança manipular conscientemente os sons da sua língua será capaz de os isolar e, em seguida, fazê-los corresponder a uma forma visual até aí desconhecida. Segundo a autora, esta capacidade será tanto mais beneficiada quanto mais estimulação pedagógica a criança receber do adulto nesse sentido, daí a importância de cada vez mais se desenvolverem, desde o jardim-de-infância, assim como no seio familiar, atividades educativas que facilitem a compreensão do princípio alfabético e o desenvolvimento da consciência fonológica, a par da leitura e da interação verbal.

Assim, torna-se primordial que se insista em trabalhar e estimular a consciência fonológica antes do ensino formal da decifração.

Aprender a ler e a escrever pressupõe igualmente que haja um conhecimento do léxico da língua, que inclui a posse de vocabulário e a sua utilização. Este conhecimento é fundamental para dominar novas palavras e compreender o que se vai lendo. As crianças transportam consigo e utilizam um determinado código de que se apropriaram pelo contacto com os seres significativos para elas, nomeadamente a família, e a utilização desse código poderá facilitar o processo de aquisição de competências para a leitura e escrita. Quanto maior for o conhecimento lexical da criança, melhor será a sua aprendizagem da decifração, já que permitirá o reconhecimento automático e direto das palavras que lhe são familiares – modelo

13

(30)

- 20 -

descendente – inserido nos métodos globais de aprendizagem da leitura, que iremos abordar

mais à frente neste trabalho.

Como refere Sim-Sim (1995: 213), «um mau domínio do código oral refletir-se-á na compreensão do que é lido, uma deficiente descodificação originará erros de tradução e ambos serão responsáveis por uma má compreensão da leitura». Sendo a leitura e a escrita atividades que implicam um elevado nível de capacidade para refletir sobre a linguagem, a informação que é transmitida ao aluno deverá assim ser objeto de uma fácil compreensão – tal exige que os itens de aprendizagem possuam sentido e façam parte das vivências anteriores dos alunos. Desta forma, a linguagem envolve também uma aprendizagem que se efetua através do ensino, pelo que a escola terá um papel importante, devendo a mesma:

 Promover na criança o desenvolvimento da linguagem oral;  Estimular na criança o contacto com material escrito e de escrita;  Provocar na criança a descoberta dos princípios gráficos;

 Desenvolver na criança a consciência fonológica;  Promover na criança o prazer da leitura e da escrita

Em síntese, na fase que antecede o ensino formal da decifração, o desenvolvimento de

comportamentos emergentes de leitura/escrita, o desenvolvimento da linguagem oral na língua de escolarização e o desenvolvimento da consciência fonológica são investimentos

seguros e fatores determinantes no sucesso da aprendizagem da leitura e da escrita e na consequente formação de leitores/escritores. Pelas suas características, estes fatores são inseparáveis da principal causa que está na origem da motivação para a aprendizagem da leitura/escrita e que se consubstancia na vontade de aprender a ler/escrever para ler/escrever

sozinho. A promoção dos fatores atrás mencionados implica, portanto, que seja oferecido à

criança o contacto diário com a linguagem escrita, estimulando o convívio num ambiente de leitura e provocando o diálogo desafiante sobre o que ouviu ler, e se desenvolvam junto das crianças atividades desafiadoras, lúdicas e motivadoras em que a oralidade é privilegiada, podendo igualmente o desenvolvimento de competências neste domínio ser mais beneficiado caso o mesmo seja promovido quer em contexto escolar, quer em contexto familiar, como medida preventiva do insucesso no desempenho de tarefas de leitura e de escrita.

(31)

- 21 -

1.4.2 -

O ENSINO DA LEITURA

O desejo interior de ler não nasce sozinho: ele é provocado por todo um meio ambiente que inclui o livro como elemento positivo. L. Lentin, apud Abreu et al.,Ideias e Histórias, p. 85

Antes de formalmente ensinada, a maioria das crianças descobre a linguagem escrita, sabe já o que serve para ler ou mesmo por onde se começa a ler. Do ponto de vista instrumental, ler é na realidade uma técnica de decifração, correspondendo o ensino desta, à fase de identificação de palavras escritas e ao primeiro passo no percurso formal da aprendizagem da leitura. Contudo, ler é muito mais do que reconhecer uma sequência de palavras escritas. Como refere Sim-Sim (2007: 7),

A essência da leitura é a construção do significado de um texto escrito e aprender a compreender textos é o grande objectivo do ensino da leitura. Ensinar a ler é, acima de tudo, ensinar explicitamente a extrair informação contida num texto escrito, ou seja, dar às crianças as ferramentas de que precisam para estratégica e eficazmente abordarem os textos, compreenderem o que está escrito e assim se tornarem leitores fluentes.

Sobre esta matéria, Sim-Sim (2006: 19) refere que um leitor fluente deverá «possuir uma rápida capacidade de descodificação e um domínio das estruturas semântico-sintácticas que possibilitem a compreensão do texto escrito», acrescentando que «Aprender a compreender o que se lê significa, acima de tudo, construir conhecimento, tendo por base o que já se conhece sobre o assunto» (Sim-Sim, 2006: 32-33).

Em relação ao processo de aprendizagem da leitura, as autoras Viana e Teixeira (2002: 14) identificam três pontos de vista básicos sobre o processo de aprender a ler, afirmando que aprender a ler significa: «aprender a descodificar palavras; (...) aprender a identificar palavras e a obter significado; (...) trazer significado para o texto, com o fim de obter dele significado». As mesmas autoras identificam três fases para a aquisição da leitura: «na primeira fase a criança vai tomando consciência em que consiste a leitura. Na segunda fase aprende as regras essenciais da codificação e descodificação. Na terceira fase, que se intercepta com a segunda, desenvolve as técnicas de fluência» (Viana e Teixeira, 2002: 33).

Pelo exposto, aprender a ler significa percorrer um caminho de apropriação de estratégias que requerem um ensino explícito, consistente e sistematizado por parte de quem ensina. Seguindo a mesma linha de pensamento, Sim-Sim et al. (1997: 59-60) referem que

(32)

- 22 - independentemente do método de leitura adotado, todas as crianças devem realizar as seguintes atividades:

 Descobertas dos princípios espaciais de organização da representação gráfica (de cima para baixo e da esquerda para a direita);

 Reconhecimento do padrão posicional das letras;

 Distinção entre letras, diacríticos (acentos e cedilha) e sinais de pontuação;  Reconhecimento da representação gráfica da fronteira de palavra (espaço);  Exercícios de reconstrução segmental;

 Exercícios de segmentação da cadeia fónica em unidades (palavras, sílabas, segmentos fonológicos) e respectiva identificação;

 Treino da correspondência letra-som;

 Treino do reconhecimento da representação gráfica de sílabas;  Treino do reconhecimento global de palavras.

Admitindo a existência de diferentes caminhos que se podem percorrer para atingir a competência da leitura, apresentamos de seguida uma síntese da descrição das diferentes componentes da competência de leitura de que as crianças terão de se apropriar progressivamente, segundo Carrol (1987), citada por Viana e Teixeira (2002: 52-53):

 Adquirir e dominar a língua em que vai aprender a ler;

 Aprender a segmentar as palavras faladas nos sons que a compõem;

 Aprender a reconhecer e a discriminar as letras do alfabeto nas suas várias formas de apresentação gráfica;

 Aprender o princípio de orientação esquerda/direita, quer na exploração da palavra escrita isolada, quer no continuum do texto;

 Aprender que há padrões com grande regularidade de correspondência letra/som e aprender a usar estes padrões no reconhecimento das palavras que já conhece na linguagem oral, e na pronúncia de palavras não familiares;

 Aprender a reconhecer palavras impressas, servindo-se de todas as pistas que possam ajudar a configuração global, as letras que as compõem, os sons representados por essas letras e/ou o significado sugerido pelo contexto;

 Aprender que as palavras impressas são transcrições das palavras faladas, e que têm significados idênticos aos das palavras faladas. Ao descodificar uma mensagem escrita no seu equivalente falado, a criança tem de ser capaz de aprender o seu significado;

 Aprender a raciocinar e a pensar sobre o que lê, dentro dos limites das suas capacidades e da sua experiência.

Através da síntese apresentada, podemos constatar que são inúmeros os aspetos a ter em conta ao longo do processo de ensino da leitura, sendo exigidas e desenvolvidas, segundo Viana e Teixeira (2002: 53-82), várias competências durante o ato de ler, nomeadamente:

 Desenvolvimento cognitivo;  Conhecimento lexical e sintático;  Consciência linguística e metalinguística;

 Conhecimento implícito e explícito das funções e funcionamento da língua;  Capacidade para emitir julgamentos sobre a sintaxe e a morfologia;  Consciência fonológica e memória de trabalho para material verbal;

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