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o Papel dos Fitoquímicos na Quimioprevenção do Cancro : Monografia : <<The>> Role of Phytochemicals in Cancer Chemoprevention

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O Papel dos Fitoquímicos na Quimioprevenção do

Cancro

The Role of Phytochemicals in Cancer

Chemoprevention

Miléna Sales Henriques Batista

Orientado por: Dr. Themudo Barata

Monografia

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Índice

Lista de Abreviaturas ... iii

Resumo ... v

Abstract ... vi

Introdução... 1

1. Fitoquímicos - classificação ... 4

2. Quimioprevenção - definição e perspectiva histórica ... 8

3. O processo de carcinogénese ... 9

4 Mecanismos envolvidos na quimioprevenção do cancro ... 10

4.1 Bloquear a fase de iniciação da carcinogénese ... 11

4.1.1 Balanço “espécies reactivas de oxigénio/antioxidantes” ... 11

4.1.2 Indução de enzimas envolvidas na destoxificação... 12

4.1.3 Regulação da via de sinalização do factor de transcrição Nrf2 ... 13

4.1.4 Diminuição da Inflamação ... 17

4.2 Bloquear a fase de promoção da carcinogénese ... 19

4.2.1 Indução da apoptose ... 19

4.3 Bloquear a fase de progressão da carcinogénese ... 23

4.3.1 Inibição da angiogénese ... 23

5. Biodisponibilidade dos fitoquímicos ... 25

5.1 Biodisponibilidade da EGCG, da curcumina e dos isotiocianatos ... 28

6. Efeitos sinérgicos dos fitoquímicos ... 31

Discussão e Conclusões ... 32

Referências Bibliográficas ... 35

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Lista de Abreviaturas

ADN – Ácido Desoxirribonucleico

ARE/EpRE - (Antioxidant response elements/electrophile response element) - Elemento de resposta a antioxidantes/elemento de resposta a electrofílicos

bZIP – (basic leucine zipper) CYP 450 - citocromo P 450 COX – ciclooxigenase COX-1 - Ciclooxigenase 1 COX-2 - Ciclooxigenase 2 CNC - “Cap’ n’ collar”

DR (Death receptor) - Receptor de morte EGCG - Epigalocatequina-3-galato

-GCS (gamma-glutamylcysteine synthetase) – Sintétase da - Glutamil cisteína GST - Glutationa S-transférase

HO 1 – heme oxigenase 1

iNOS (Inducible nitric oxide synthase) - Sintetase do óxido nítrico induzida Keap 1(Kelch ECH Associating Protein 1)

Neh – (Nrf2-ECH homology)

NF-kB (Nuclear factor kB) - Factor de transcrição nuclear kB NO (nitric oxide) - Óxido nítrico

NQO - NADP(H):quinona oxidoreductase

Nrf2 (NF-E2-related factor 2) – factor de transcrição

NADP(H) – Nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (forma reduzida) PI3K-Akt - cínase do trifosfato de inositol

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ROS/RNS (reactive oxygen species/reactive nitrosative species) - Espécies reactivas de oxigénio/ espécies reactivas de azoto

TNF-α (Tumor necrosis factor-α) - Factor de necrose tumoral

TNFR (Tumor necrosis factor-α receptor ) - Receptor do factor de necrose tumoral VEGF (vascular endothelial growth factor) – factor de crescimento

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Resumo

Apesar dos progressos significativos no conhecimento da biologia do cancro, o número de mortes causadas por esta temível doença permaneceu inflexível até ao final do século vinte, seguido de uma tendência invertida apenas nos últimos anos. Os achados epidemiológicos relativamente consistentes de que o consumo de frutos, hortícolas e cereais inteiros, está fortemente associado à redução do risco de cancro, originaram a hipótese de que específicos metabolitos secundários das plantas biologicamente activos, designadamente fitoquímicos, podem ser responsáveis pela acção preventiva observada. Os fitoquímicos podem ser tão diversos como os ácidos fenólicos, os taninos, os estilbenos, as cumarinas e os flavonóides. Estes compostos alimentares oferecem um grande potencial na luta contra o cancro ao inibir processos carcinogénicos através da regulação da homeostasia da célula e da “maquinaria” de morte celular. O presente trabalho pretende elucidar alguns aspectos relevantes dos conhecimentos emergentes sobre os mecanismos celulares que parecem estar envolvidos na quimioprevenção do cancro pelos fitoquímicos.

Palavras-Chave: fitoquímicos, cancro, carcinogénese, quimioprevenção, enzimas destoxificantes, apoptose, sinalização celular, biodisponibilidade.

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Abstract

In spite of significant progress in our understanding of the biology of cancer, the number of death caused by this dreaded disease remained unabated until the end of the twentieth century, followed by a reverse trend only for the past several years. The relatively consistent epidemiological finding that consumption of fruits, vegetables and whole grains is strongly associated with reduced risk of cancer, has led to the hypothesis that specific biologically-active plant secondary metabolites, namely phytochemicals, may be responsible for the observed prevention action. Phytochemicals can be as diverse as phenolic acids, tannins, stilbenes, coumarins and flavonoids. These dietary compounds offer great potential in the fight against cancer by inhibiting the carcinogenesis process through the regulation of cell homeostasis and cell-death “machineries”. The aim of the present work is to elucidate some important aspects of emerging knowledge about molecular mechanisms that are likely to be involved in cancer chemoprevention of phytochemicals.

Keywords: phytochemicals, cancer, carcinogenesis, chemoprevention, detoxifying enzymes, apoptosis,cellular signalling, bioavailability.

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Introdução

Desde Hipócrates (460-377 A.C.) que se conhece a correlação entre alimentação e saúde, o qual reconheceu que “as diferenças nas doenças dependem dos nutrimentos”.(1)

No entanto, foi apenas na última década que vários estudos epidemiológicos indicaram uma associação positiva entre o consumo de frutos, hortícolas e cereais inteiros, e uma menor incidência de cancros do estômago, esófago, pulmões, faringe e cavidade oral, endométrio, pâncreas e cólon.(1-5) Estes estudos apoiam a ideia de que mais de 70% de todos os tipos de cancro não são dependentes de um fundo genético e que podem ser prevenidos através de mudanças de estilos de vida, tal como uma alimentação adequada. Com base nestas evidências científicas, vários programas educacionais deram início na Europa e na América para promover o consumo de vegetais a fim de diminuir a incidência do cancro.(2) Contudo, recentemente parece ter ocorrido uma mudança de opinião no sentido de que as evidências são menos fortes do que originalmente se pensava, sobretudo devido a vários estudos prospectivos de grande escala que, pondo em evidência as principais causas de cancro nos países ocidentais, não encontraram nem efeitos protectores, nem efeitos débeis, comparativamente àqueles esperados com base nos estudos prévios de caso-controlo.(2, 4) No entanto, embora tenham sido colocados em questão os reais efeitos benéficos de uma alimentação rica em vegetais na protecção contra o cancro,(2, 4) o interesse nos efeitos biológicos dos seus constituintes aumentou. As evidências emergentes sobre uma variedade de mecanismos anti-carcinogénicos potencialmente importantes, estimulou o interesse no conceito de quimioprevenção, concentrando as atenções em particulares frutos e hortícolas ricos em compostos biologicamente activos,

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designados de fitoquímicos.(4) Estes compostos foram seleccionados ao longo da evolução e armazenados nos tecidos para defender a planta de patogéneos ou predadores.(3, 6) O ser humano foi exposto a uma variedade de fitoquímicos durante milhões de anos: através da cautelosa selecção de espécies de plantas para a sua alimentação, conseguiu evitar as que causam toxicidade aguda. No entanto, vários fitoquímicos presentes nos alimentos vegetais ainda afectam a saúde humana positivamente ou negativamente a longo prazo. Devido à sua grande diversidade, os fitoquímicos podem atingir uma ampla variedade de funções fisiológicas e de vias metabólicas.(3) Vários fitoquímicos tais como os curcuminóides da cúrcuma, os glucosinolatos dos vegetais crucíferos, as isoflavonas da soja ou o licopeno do tomate, evidenciam propriedades anticancerígenas. Estes compostos actuam através de diversos mecanismos celulares e moleculares, incluindo a estimulação de sistemas destoxificantes, a inibição do ciclo de proliferação celular, a indução da apoptose, a imunomodulação ou inibição da angiogénese. Numerosos relatórios destacam as propriedades dos fitoquímicos antioxidantes como sequestradoras de radicais livres, tais como os polifenóis. Parece que os efeitos biológicos desses antioxidantes são diversos e envolvem respostas mediadas pelas células e a modulação de várias vias de sinalização celular. As hipóteses sobre os mecanismos de acção dos fitoquímicos têm procedido frequentemente do conhecimento das suas estruturas químicas e das suas propriedades físico-químicas. Presentemente, o desafio está em interpretar as complexas relações entre os fitoquímicos presentes na alimentação humana e a saúde, tendo em conta, quer a diversidade das suas estruturas químicas, quer a complexidade dos seus efeitos metabólicos.(3) Actualmente, várias centenas de moléculas são

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estudadas como potenciais “agentes quimiopreventivos” e mais de 50 compostos estão a ser testados em ensaios clínicos. Apesar destes esforços, a quimioprevenção representa um tópico altamente controverso por questões éticas, económicas e científicas.(2) . A carcinogénese é geralmente um processo complexo e multi-etápico no qual ocorrem alterações moleculares e celulares distintas. A fim de simplificar a compreensão das diferentes opções possíveis para a quimioprevenção no desenvolvimento e na progressão do cancro, são descritas as seguintes etapas: iniciação, quando as células estão expostas a um agente carcinogénico; promoção, quando as células “anormais” persistem e iniciam uma etapa pré-neoplásica; progressão, fase final da tumorigénese, quando ocorre crescimento celular descontrolado. Um agente quimiopreventivo do cancro poderia ser efectivo em qualquer uma das etapas clássicas da carcinogénese (iniciação, promoção, progressão). A intervenção na carcinogénese multi-etápica através da modulação das vias de sinalização intracelulares fornece a base da quimioprevenção com uma vasta variedade de fitoquímicos alimentares. As células cancerígenas adquirem resistência à apoptose através da expressão aumentada de proteínas anti-apoptóticas, e/ou por uma repressão ou mutação de proteínas apoptóticas. Por conseguinte, uma excelente abordagem para inibir a promoção e a progressão da carcinogénese, e para remover células pré-malignas e malignas do organismo, seria pela indução da apoptose ou da paragem do ciclo celular através de compostos quimiopreventivos O alcance da eficácia desses agentes pode ser profundo, uma vez que o curso natural do total desenvolvimento de um cancro clinicamente evidente é relativamente longo e por vezes demora décadas.(7)

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1. Fitoquímicos: classificação

Estima-se que os frutos, hortícolas e cereais inteiros, tenham algures entre 5.000 a 25.000 fitoquímicos individuais, dos quais apenas uma pequena fracção foi identificada. Com a presença de milhares de fitoquímicos, é imperativo classificar os diferentes agentes para melhor estudar as complexas misturas encontradas nos vegetais.(8) Os fitoquímicos apresentam uma grande diversidade de estruturas químicas. Estes compostos podem ser classificados em vários grupos, sendo os principais: compostos fenólicos, terpenóides, alcalóides e outros compostos nitrogenados, hidratos de carbono e lípidos.(3) (anexo 1)

Os compostos fenólicos, frequentemente referidos como polifenóis, constituem um dos grupos mais numerosos de metabolitos secundários das plantas. Não são biossintetizados em mamíferos, sendo assim necessária a sua ingestão. Em resultado da sua ubiquidade nas plantas, estes compostos são parte integral da alimentação humana. Nas plantas, estes constituintes participam de uma forma decisiva na morfologia (ex: pigmentação), crescimento, reprodução e resistência a patogenias e predadores (através do aumento da adstringência, o que leva a que a sua ingestão seja pouco atractiva).(9) Estruturalmente, os compostos fenólicos compreendem um anel aromático comportando um ou mais grupos hidroxilo substituintes, originando desde compostos fenólicos simples até moléculas altamente polimerizadas.(10) Os compostos fenólicos podem ser classificados em diferentes classes de acordo com a disposição da cadeia carbonada ligada ao anel aromático (C6)(9): flavonóides, compostos cumarínicos, taninos, ácidos fenólicos e estilbenos.(2)

Grande parte das pesquisas realizadas sobre os efeitos fisiológicos dos compostos fenólicos centra-se no estudo dos flavonóides. Todos os flavonóides

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possuem o mesmo elemento estrutural, o difenilpropano, formado por dois anéis aromáticos ligados por uma cadeia de três átomos de carbono (C6-C3-C6) que, geralmente constitui um heterociclo central contendo oxigénio(11), e têm a presença de, pelo menos, três hidroxilos fenólicos, um deles ligado a uma ose, quando sob a forma de heterósidos (substâncias formadas pela condensação de uma ou mais oses, muitas vezes, a glucose, com um grupo não osídico denominado aglicónico ou genina).(9) Conhecem-se mais de 4000 compostos(11), sendo frequentemente encontrados no meio metabólico na forma heterosídica. Contudo, também podem aparecer na forma livre (geninas - sem unidades de açúcar). Os heterósidos são normalmente solúveis na água ao contrário das formas livres.(9) De acordo com as características estruturais são classificados em subclasses: flavanonas (naringenina, eriodictiol), flavonas (apigenina, luteolina), flavonóis (quercetina, campferol, miricetina), flavanóis ou catequinas (catequina, epicatequina, epigalocatequina, epicatequina galato), antocianidinas (cianidina,malvidina), e isoflavonas ou isoflavonóides (daidzeína, genisteína). (11-12)

Os compostos cumarínicos derivam de lactonas dos ácidos orto-hidroxicinâmico, estando presente em diferentes partes das plantas. O seu nome deve-se ao facto de ter sido primeiramente encontrada na espécie Coumarona odorata. Dos compostos cumarínicos mais conhecidos citam-se entre outros, a cumarina, a umbeliferona, a herniarina, o esculetol, etc. Apesar da grande predominância de compostos cumarínicos simples no reino vegetal, outras subclasses destes compostos são encontrados de forma bastante diversificada entre a taxonomia botânica, como as furanocumarinas (bergapteno, xantotoxina), as piranocumarinas (visnadina) e as furanocromonas (quelina).(9, 12)

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Os taninos são compostos fenólicos com elevada massa molecular (entre 500 e 3000 daltons) e têm capacidade para formar complexos com proteínas. A sua presença em folhas ou frutos confere característica adstringente, importante como mecanismo de defesa geral da planta contra o ataque de insectos. Os taninos são comumente divididos em duas subclasses: os hidrolisáveis (poliésteres de ácidos fenólicos) e os condensados ou proantocianidinas (de estrutura próxima dos flavonóides), estes representados pelos taninos catéquicos e as procianidinas oligoméricas (caso da procianidina B-2) formadas por dois ou quatro monómeros da catequina ou da epicatequina. Já os taninos hidrolisáveis são sempre constituídos por ésteres de uma ose e de um número variável de ácidos fenólicos. Quando o ácido gálhico está presente origina os galhotatinos. O representante mais simples do grupo de taninos hidrolisáveis é o 1 – O – galoilβ-D-glicopiranose (β-glicogalina), identificado há mais de um século como produto natural.(9, 12)

Os ácidos fenólicos derivados dos ácidos hidroxibenzóicos ou dos ácidos hidroxicinâmicos são os ácidos fenólicos mais comuns nas plantas. Os ácidos hidroxicinâmicos ocorrem mais frequentemente como ésteres simples ligados a ácidos carboxílicos ou glucose, e os ácidos hidroxibenzóicos estão geralmente presentes sob a forma de heterósidos (ou glicosídeos). São representativos dos ácidos hidroxicinâmicos, o ácido cafeico, o ácido para-cumárico e o ácido ferúlico. De entre os derivados dos ácidos hidroxibenzóicos, temos o ácido gálhico (um dos constituintes dos taninos), o ácido procatecóico e o ácido vanílico.(9-10, 12)

Os estilbenos são compostos orgânicos que contêm o 1,2-difeniletileno como grupo funcional. O resveratrol (3,5,4’ -trihidroxiestilbeno) é um membro dos estilbenos, sendo muito abundante nas uvas e moderadamente nos mirtilos e

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amendoins. Nas uvas, atinge a sua maior concentração na casca (50 100 μg por grama), constituindo os vinhos tintos a sua fonte predominante. O resveratrol pode apresentar-se quer na forma livre (configuração cis ou trans), quer na forma heterosídica. A partir do resveratrol podem formar-se naturalmente uma série de análogos, destacando-se o pteroestilbeno e o piceatanol. (10)

Os terpenóides, outra classe principal de fitoquímicos, têm características lipofílicas na natureza. Os terpenóides apresentam unidades isoprénicas nas suas estruturas e são, por isso, conhecidos como isoprenóides. Podem ser classificados de acordo com o número de unidades isoprénicas C5 incorporadas à estrutura. (anexo 2) Dessa forma, os terpenóides formam uma grande família de compostos estruturalmente diversos, destacando-se os monoterpenos (formados por duas unidades isoprénicas), os sesquiterpénicos (formados por três unidades isoprénicas), os diterpenos (com quatro unidades isoprénicas), e os triterpenos (com 6 unidades isoprénicas). Os monoterpénicos e sesquiterpénicos são constituintes dos óleos essenciais. Nos monoterpénicos, os hidrocarbonetos podem ser acíclicos (mirceno, da folha do loureiro, etc.) ou monocíclicos (limoneno, dos citrinos, etc.). Nos diterpenos podemos encontrar o Gingko biloba. Um exemplo dos triterpenos será o giseng. Algumas transformações nos esqueletos estruturais dos terpenóides levam à biossíntese de classes de produtos naturais com propriedades físico-químicas e farmacológicas próprias, como os esteróides, vitaminas lipofílicas, grande parte dos óleos essenciais, saponinas e glicosídeos cardiotónicos.(9, 12)

Os alcalóides são definidos como constituintes azotados, de origem não-peptídica, tendo aminoácidos como precursores biossintéticos. Encontram-se nas plantas, normalmente combinados com ácidos orgânicos, formando sais solúveis

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e são dotados de grande actividade biológica. Quimicamente, os alcalóides podem ser classificados de acordo com o aminoácido precursor. A título de exemplo, considera-se os seguintes tipos de estruturas para os quais se indica um alcalóide representativo: purina (cafeína) e quinolizidina (lupanina, do tremoço).(9, 12)

No grupo de compostos nitrogenados incluem-se os glucosinolatos (sulfo-heterósidos), particularmente, os glucosinolatos alifáticos (a mostarda-negra - Brassica nigra) e os glucosinolatos indólicos (brócolo – Brassica Oleraceae).(9, 13)

2. Quimioprevenção - definição e perspectiva histórica

Quando Michael Sporn cunhou pela primeira vez em 1976 o termo “quimioprevenção”, referindo-se à actividade da vitamina A e dos seus análogos sintéticos na prevenção de certos tipos de cancro, ele originou um novo domínio na pesquisa do cancro.(2, 13-14) De acordo com uma definição mais moderna e completa, a quimioprevenção inclui o uso de agentes naturais ou farmacológicos para suprimir, interromper ou inverter a carcinogénese(15) nas suas fases iniciais. Nos últimos 5 anos, o termo “quimioprevenção” passou de 4.000 para 10.000 referências na “Pubmed”, e na actualidade é geralmente utilizado para indicar a capacidade de uma molécula, não só prevenir, mas também curar o cancro.(2) Recentemente, o atributo “quimiopreventivo” tem sido associado a um contexto mais amplo, em concreto o estilo de vida, tal como uma alimentação adequada.(2, 13)

Ao longo dos anos, um vasto número de agentes quimiopreventivos presentes em produtos “naturais” tem sido avaliado(8)

através de diferentes abordagens experimentais: estudos epidemiológicos; ensaios clínicos; estudos em modelos com animais em que a carcinogénese é induzida experimentalmente; testes in vitro em linhas celulares.(2) Mais recentemente, o foco tem sido orientado para os

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alvos moleculares dos agentes quimiopreventivos no intuito de identificar os mecanismos de acção destes compostos bioactivos.(8) O Instituto Nacional do Cancro (NCI – “National Cancer Institute”) americano, baseado em numerosos relatórios sobre a actividade anticancerígena de moléculas que ocorrem naturalmente, identificou 40 plantas comestíveis possuindo potenciais compostos quimiopreventivos.(2) Desta forma, o instituto americano mantém uma base de recursos para fitoquímicos com potenciais propriedades quimiopreventivas.1

3. O processo de carcinogénese

Actualmente, o conceito de “carcinogénese multi-etápica” propõe que o cancro é desenvolvido ao longo de um período de tempo por acumulação de mutações somáticas numa única célula, resultando em alterações fenotípicas graduais, desde a célula normal à pré-neoplásica, progredindo para a neoplásica. Estas diferentes etapas na carcinogénese são geralmente descritas como: iniciação (dias), promoção (vários anos) e progressão (1-5 anos).

A iniciação é irreversível e inclui a alteração inicial ao nível do ácido desoxirribonucleico (ADN) pelos agentes carcinogénicos químicos ou físicos.(2) O curso da transformação celular (ou iniciação) envolve a mutação genética, o metabolismo carcinogénico e a reparação deficiente do ADN. Nesta fase inicial, os carcinogénicos ambientais (alimentares, tabaco, poluição) induzem uma ou mais mutações simples, incluindo pequenas delecções nos genes que controlam o processo da carcinogénese.(8)

A promoção envolve mecanismos epigenéticos, sendo um processo relativamente lento e reversível. A fase de promoção é caracterizada por uma

1

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desregulação das vias de sinalização do controlo da proliferação celular e da apoptose, levando à acumulação de divisões anormais de células pré-malignas.(2, 8)

A progressão é geralmente irreversível e caracteriza-se pelas alterações genéticas no cariótipo, as quais surgiram pela acumulação de genes mutados, resultando em anomalias cromossómicas. A fase de progressão desencadeia a última etapa da carcinogénese com invasão, angiogénese e potencial metastização (8)

A transformação de células pré-malignas para malignas envolve a activação de proto-oncogenes e/ou inactivação dos genes supressores tumorais. Ambos os tipos de genes, quando mutados, causam alterações em processos celulares preponderantes, relacionados com o crescimento celular e a proliferação.(2) No desenvolvimento tumoral, as células têm de alcançar certas características para adquirir malignidade: capacidade de serem auto-suficientes, em termos de sinais de crescimento; potencial replicativo ilimitado; insensibilidade a sinais de paragem de proliferação; capacidade de escapar à apoptose; capacidade de induzir e manter a angiogénese; capacidade de invasão de tecidos e de metastização.(5)

4. Mecanismos envolvidos na quimioprevenção do cancro

Muitos fitoquímicos presentes numa alimentação rica em frutos e hortícolas têm sido propostos como potenciais agentes quimiopreventivos.(2) Segundo a classificação proposta em 1985 por Lee Wattenberg, os fitoquímicos podem agir como agentes bloqueadores, imediatamente antes ou durante a iniciação da carcinogénese ou como agentes supressores, actuando no decorrer das fases de promoção e de progressão. Os agentes bloqueadores previnem a activação

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metabólica de pré-carcinogéneos ou aumentam as actividades enzimáticas na destoxificação carcinogénica (biotransformação) para uma eficiente eliminação de carcinogéneos ou espécies reactivas de oxigénio/azoto (“reactive oxygen species”/“reactive nitrosative species” - ROS/RNS). Os agentes supressores inibem a promoção e a progressão do cancro após a formação de células pré-neoplásicas, interferindo com a regulação do ciclo celular, os sinais de transdução, a regulação da transcrição e a apoptose.(2, 4-5, 14, 16) Alguns agentes quimiopreventivos podem funcionar, quer como bloqueadores, quer como supressores através de mecanismos distintos.(14)

4.1 Bloquear a fase de iniciação da carcinogénese

4.1.1 Balanço “espécies reactivas de oxigénio/antioxidantes”

O balanço entre a carga oxidativa e a defesa antioxidante no organismo é decisivo na manutenção da integridade e funcionalidade das membranas, das proteínas e dos ácidos nucleicos.(17) As ROS incluem uma variedade de moléculas químicas diversas extremamente instáveis, tais como os aniões superóxido, os radicais hidroxilo e o peróxido de hidrogénio. Estes últimos são geradores de radicais hidroxilo e portanto susceptíveis de causar danos no ADN. Os radicais superóxido e hidroxilo podem ser formados exogenamente ou no interior das células a partir das enzimas citosólicas (ex: oxidases do NADPH) e da cadeia respiratória na mitocôndria.(2) A formação de ROS é inevitável em organismos aeróbios, estando a sua produção fisiológica associada a importantes processos celulares. As células mantêm o seu potencial redox através de um sistema intracelular de defesas antioxidantes, em concreto, enzimas como a catalase, a dismútase do superóxido, a peroxídase da glutationa, a

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peroxirredoxina, e a glutationa.(2, 5, 18) Além de ocorrer uma produção de ROS através do metabolismo oxidativo, estas espécies reactivas também podem resultar da destoxificação de compostos xenobióticos.(8) A forma mais efectiva de prevenir a carcinogénese é bloquear a sua iniciação, prevenindo os danos no ADN provocados pelas ROS. Por exemplo, o sequestro directo de ROS altera o metabolismo das moléculas pré-carcinogénicas no sentido de que não são convertidas em espécies carcinogénicas pelas enzimas de metabolização da fase I (em particular o citocromo P 450 – CYP 450), ou então, são removidos da célula por uma segunda linha de defesa que envolve enzimas de conjugação da fase II (ex: glutationa S-transférase (GST), glicuronidases e sulfotransférases). Têm sido classificados vários fitoquímicos como anti-iniciadores, incluindo a genisteína, os indóis, o resveratrol e os compostos sulfurosos alilo.(5, 8)

4.1.2 Indução de enzimas envolvidas na destoxificação

As enzimas de metabolização de xenobióticos têm um papel fundamental na activação e/ou destoxificação de carcinogéneos.(19)

Os agentes bloqueadores (fitoquímicos) contrapõem a actividade de potenciais carcinogéneos exógenos ou endógenos, suprimindo as reacções da fase I e/ou activando as reacções da fase II, ambas catalizadas por enzimas metabólicas. Estas enzimas estão envolvidas nas duas principais reacções de biotransformação: as reacções da fase I que envolvem reacções de oxidação, redução e hidrólise de xenobióticos (nomeadamente fármacos, toxinas e carcinogéneos) e as reacções da fase II que implicam a conjugação de moléculas hidrossolúveis (glicuronidação, sulfatação, acetilação, metilação e conjugação com a glutationa) com xenobióticos.(2) Estes dois grupos de enzimas também são conhecidas como enzimas activadoras e destoxificantes, respectivamente, com

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base nas consequências biológicas das reacções enzimáticas. A família do CYP 450, um grupo importante de monooxigenases, metaboliza muitos xenobióticos e cataliza várias reacções da fase I. Os produtos do metabolismo da fase I são muitas vezes intermediários genotóxicos altamente reactivos que formam substratos para as enzimas da fase II, ou interagem com o ADN e outras proteínas, podendo causar mutações e/ou alterações das vias de sinalização. Alguns fitoquímicos induzem a activação da transcrição de enzimas da fase I ou II, através do elemento de resposta aos xenobióticos (“xenobiotic response element” - XRE) e do elemento de resposta aos antioxidantes (“Antioxidant response elements” - ARE), respectivamente. Os agentes bloqueadores que induzem apenas enzimas destoxificantes são denominados de indutores monofuncionais (sulforafano, tert-butihidroquinona), enquanto que os compostos que induzem, simultaneamente, as monooxigenases CYP e as enzimas destoxificantes são designados de indutores bifuncionais (indol-3-carbinol). (2, 4, 16)

4.1.3 Regulação da via de sinalização do factor de transcrição Nrf2

A propriedade dos agentes quimiopreventivos, quer como indutores monofuncionais, quer como bifuncionais de enzimas metabolizadoras de fármacos, indicou a existência de múltiplos mecanismos regulatórios na expressão de genes das enzimas destoxificadoras. De entre todas estas enzimas, a GST e a NADP(H):quinona oxidoreductase (NQO) têm uma reacção muito aumentada ao estímulo químico e ambiental, especialmente os indutores monofuncionais. O estudo genético da região promotora dos genes da GST e da NQO levaram à descoberta de uma sequência promotora (“enhancer”), nomeadamente o elemento de resposta a antioxidantes/elemento de resposta a electrofílicos (Antioxidant response elements/electrophile response element -

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ARE/EpRE). As evidências indicam que esta sequência ARE/EpRE tem um papel central na regulação do sistema de defesa celular e está fortemente relacionada com os efeitos citoprotectores de agentes indutores quimiopreventivos alimentares, especialmente os indutores monofuncionais. Esforços no sentido de identificar proteínas ligadas ao ARE, revelaram a existência de um factor de transcrição, NF-E2-related factor 2 (Nrf2), o qual tem um papel determinante na regulação da expressão de genes mediada pelo ARE.(2, 16) Várias proteínas têm sido identificadas como reguladores-chave da activação do ARE, mas a descoberta do Nrf2 abriu caminho para elucidar o mecanismo de activação do mesmo. Por essa razão, no ponto seguinte deste trabalho irei incidir sobre este factor de transcrição.

O Nrf2 é um factor de transcrição da família “Cap ’n’ collar” (CNC) e contém um domínio de ligação ao ADN, basic leucine zipper (bZIP). O Nrf2 contém seis domínios altamente conservadores, designadamente, o Nrf2-ECH homology (Neh) 1 até ao Neh 6. De entre estes domínios interessa destacar os seguintes: o Neh 1, que corresponde à região CNC e ao domínio bZIP, necessários para a ligação ao ADN e para a dimerização com outros factores de transcrição; o domínio Nh2, que permite a ligação com o domínio Kelch ECH Associating Protein 1(Keap 1), um regulador negativo do Nrf2; e o Neh3, necessário para a activação transcricional. O papel preponderante que o Nrf2 desempenha na regulação da expressão de muitas enzimas antioxidantes e destoxificantes tem sido verificado em vários estudos in vivo com ratinhos deficientes (Knockouts) em Nrf2, nos quais a expressão das enzimas referidas foi severamente suprimida. Verificou-se adicionalmente que os ratinhos Knockout manifestaram uma susceptibilidade aumentada aos carcinogéneos e que ficaram refractários aos

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efeitos quimioprotectores de compostos quimiopreventivos.(6, 20) Tal como mencionado anteriormente, muitos fitoquímicos poderão exercer os seus efeitos quimiopreventivos bloqueando a etapa de iniciação da carcinogénese. Para um subconjunto destes compostos, a quimioprevenção é sobretudo originada pela indução dos genes reguladores Nrf2/ARE.

Sob condições basais, em que se mantém nas células a homeostasia do sistema redox, o Nrf2 é sequestrado pelo Keap 1, o seu repressor citosólico, e fica bloqueado no citoplasma como um complexo inactivo. O heterodímero Nrf2-Keap 1 funciona como um sensor intracelular contra as alterações nas concentrações de electrófilos ou de ROS. O Nrf2 é uma molécula de semi-vida muito curta, em que a maior parte é ubiquitinada, tendo como destino a degradação proteossomal mediada pelo Keap 1. Daí que em condições basais, o Nrf2 é uma proteína muito instável, e está em constante renovação porque o Keap 1 incide activamente sobre ele para ubiquitinação e degradação. Esta instabilidade é um sistema de feed-back negativo, elaborado para prevenir um excesso de acumulação de antioxidantes na célula.(21)

Em resposta aos indutores do Nrf2 (stresse oxidativo ou compostos quimiopreventivos), este é fosforilado e dissocia-se da proteína inibidora Keap 1. A dissociação do complexo Nrf2-Keap 1 é um pré-requisito para a translocação nuclear. Uma vez no núcleo, o Nrf2 liga-se ao ARE em associação com a proteína Maf, activando a expressão dos genes-alvo. (anexo 3)

Através da indução dos genes das enzimas antioxidantes e destoxificadoras da fase II, os fitoquímicos aumentam a destoxificação de pré-carcinogéneos ou pré-carcinogéneos e protegem as células normais dos danos provocados por electrófilos e intermediários reactivos de oxigénio, portanto,

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diminuindo a incidência da iniciação e reduzindo o risco de cancro. Alguns exemplos de fitoquímicos indutores do Nrf2 incluem o sulforafano (vegetais crucíferos), a curcumina (açafrão-da-índia), a epigalocatequina-3-galato (EGCG)/ (chá verde), o resveratrol (uvas), os compostos cinamonil (canela), o zerumbone (gengibre), os compostos organosulfurados (do alho), e o licopeno (tomate). Por exemplo, o sulforafano (isotionianato) demonstrou capacidade de aumentar os níveis da quinona reductase, da uridina difosfato glucuronil transférase (UDPGT), da GST e da heme oxigenase 1 (HO 1). Estes resultados estão relacionados com o facto do sulforafano estabelecer uma ligação covalente com os grupos tiol do Keap 1, permitindo a libertação do Nrf2 com subsequente localização nuclear. Além disso, o sulforafano ainda suprime a degradação proteossomal. Também foi observado que os isotiocianatos induzem a activação do Nrf2 através do aumento da fosforilação, levando à acumulação nuclear, mas teve pouco efeito no atraso da degradação.(20) Os compostos quimiopreventivos podem igualmente causar directamente a clivagem da ponte dissulfídica entre o Nrf2 e o Keap-1. (6, 22)

Embora o Keap 1 seja o maior regulador da activação do Nrf2, existem mais evidências indicando múltiplos níveis de regulação do Nrf2. Por exemplo, a fosforilação do Nrf2 por várias cínases, de entre as quais a cínase da proteína C (PKC) e a cínase do fosfatidilinositol 3 (PI3K).(22)

Desde a descoberta do Nrf2, diversos estudos têm demonstrado o seu papel positivo na protecção contra o cancro e doenças relacionadas com o stress oxidativo. Até aqui, o principal foco da pesquisa tem sido a procura de activadores do Nrf2 para quimioprevenção, contudo, recentes descobertas sugerem que existe um lado “negro” do Nrf2. Estudos in vitro mostram que a expressão aumentada do Nrf2 pode levar a um aumento de proteínas intracelulares do

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balanço oxidativo, de enzimas destoxificadoras da fase II e de transportadores, os quais podem fornecer, às células cancerígenas, vantagens no crescimento e causar resistência às quimioterapias.(22)

4.1.4 Diminuição da Inflamação

Desde longa data se reconhece que a inflamação é um factor de risco para determinados cancros. Um exemplo evidente é o aumento de risco do cancro colo-rectal associado à doença inflamatória intestinal.(23) A inflamação por si só não causa cancro; as mutações e as alterações epigenéticas, decorrentes da exposição ambiental ou de alterações imunitárias, concorrem para o processo carcinogénico. Vários mediadores pró-inflamatórios, tais como as citocinas, as quimiocinas, as prostaglandinas, o óxido nítrico e os leucotrienos desregulam as cascatas de sinalização nas células, o que contribui para o desenvolvimento de neoplasmas. Existem igualmente evidências circunstanciais de que a inflamação sistémica crónica, associada talvez a factores metabólicos adversos, pode ser um meio condutor para cancros do tracto digestivo. Estas linhas de evidência focaram a atenção nos sinais moleculares associados à inflamação e nos fitoquímicos que os modulam.(4) Por conseguinte, nessa área de pesquisa do cancro inclui-se a clarificação dos mecanismos de sinalização intracelulares envolvidos na activação do factor de transcrição nuclear kB, Nuclear Factor-kB (NF-kB), e a indução da ciclooxigenase 2 (COX-2) e da sintetase do óxido nítrico induzida (“inducible nitric oxide synthase” – iNOS), e como é que eles influenciam o processo inflamatório.

O NF-kB é muitas vezes visto como um “elemento decisivo para estabelecer o elo entre a inflamação e o cancro”.(17)

O NF-kB é um factor de transcrição sensível ao sistema redox, (6, 24) encontrando-se normalmente no citoplasma como parte de um complexo inactivo,(4, 6, 17) mas quando as células

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recebem o sinal (radicais livres, estímulo inflamatório, carcinogéneos, promotores tumorais, endotoxinas, e radiação) que activa a via de sinalização do NF-kB,(6) este move-se para o núcleo(4, 6, 17) onde vai induzir a expressão de mais de 200 genes. Estes genes, não só afectam a inflamação como também estão associados à apoptose, à proliferação e à metastização.(4, 17) Muitos desses genes-alvo activados pela via do NF-kB são elementos-chave no estabelecimento de muitos cancros agressivos. (17) Uma série de fitoquímicos, incluindo o resveratrol, o limoneno, a glicirrizina (alcaçuz), o gingerol, o indol-3-carbinol, a genisteína, a apigenina e outros mais, têm demonstrado inibir a actividade do NF-kB em diferentes etapas da sua via reguladora.(4) Por exemplo, a curcumina suprime a produção do factor de necrose tumoral (“tumor necrosis factor-α” – TNF-α), uma citocina pró-inflamatória que leva à activação da cínase da proteína reguladora IkB, necessária à translocação do NF-kB para o núcleo (4, 6); enquanto que o ácido cafeico impede especificamente a ligação do NF-kB à sua sequência-alvo no ADN. Os efeitos a jusante dos inibidores do NF-kB são a diminuição da expressão das enzimas-chave pró-inflamatórias como a iNOS e a COX-2.(4) A ciclooxigenase (COX) existe em duas isoformas: a COX-1 e a COX-2, as quais têm diferentes distribuições nos tecidos e funções fisiológicas. A COX-1 é constitutivamente expressa e produz prostaglandinas essenciais à agregação plaquetária e à manutenção da integridade da mucosa gástrica, enquanto que a COX-2 é pró-inflamatória e é apenas expressa em resposta a certos estímulos, tais como mitogénios, citocinas, factores de crescimento, ou hormonas.(4, 6) É de referir um dado significativo sobre o efeito inibitório da quercetina na transcrição da COX-2, não só in vitro, como também in vivo.(4, 17)

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A iNOS, predominantemente localizada nos astrócitos e na microglia, cataliza a produção de óxido nítrico (NO), um potente mediador inflamatório. O excesso de produção de NO mediado pela iNOS está envolvido em perturbações inflamatórias e imunológicas, cancro, entre outros.(6) Têm sido investigados vários fitoquímicos pelos seus efeitos inibitórios sobre o NO, de entre os quais a curcumina, o gingerol e a quercetina. A supressão do NO poderá provavelmente reflectir a inactivação da iNOS.(17)

4.2 Bloquear a fase de promoção da carcinogénese

4.2.1 Indução da apoptose

A apoptose é considerada um mecanismo pelo qual os fitoquímicos poderiam exercer propriedades quimiopreventivas, as quais têm sido verificadas em células malignas in vitro. A importância desta observação tornou-se óbvia pela constatação do mecanismo de acção pelo qual os fármacos quimiopreventivos exercem o seu efeito, em concreto, a indução da apoptose.(25)

A programação da morte celular, apoptose, desempenha um papel central na homeostasia de vários processos biológicos. O conceito de apoptose envolve a acção concertada de numerosas vias de sinalização intracelulares, incluindo os membros da família das caspases (proteases de cisteína), armazenadas em muitas células na forma zimogénica ou procaspases. Esta definição de apoptose contrasta com outras formas de morte celular, em concreto a autofagia, a oncose e a necrose. A apoptose é um processo de morte celular subordinado a controlos genéticos muito restritos, com aspectos bioquímicos e morfológicos característicos: atrofia celular, formação de vesículas (“blebbing”) membranares, condensação da cromatina e formação de uma “escada” de ADN com múltiplos

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fragmentos resultantes da clivagem do ADN nas zonas internucleossómicas. As caspases implicadas na apoptose são classificadas em iniciadoras (ex: caspases 8, 9 e 10) e efectoras (ex: caspases 3, 6 e 7). A clivagem proteolítica das procaspases é uma etapa essencial na activação da caspase iniciadora que vai ser amplificada pela activação sequencial em cascata. (25)

De uma forma geral, a apoptose pode ser dividida em duas vias distintas: a via extrínseca (através de receptores de morte, DR - “death receptor”) e a via intrínseca (mitocondrial).(8, 20, 25) Os DR são receptores da superfície da membrana celular que desencadeiam a apoptose mediante a interacção com o seu ligando específico.(20) De entre eles destacam-se: Fas (CD95 ou Apo1), o receptor do factor de necrose tumoral (“Tumor necrosis factor-α receptor” - TNFR), o DR3 (também designado por Apo3, WSL-1, TRAMP ou LARD), o DR4, ou o DR5 (também designado por Apo2, TRAIL-R2, TRICK2 ou KILLER).(25-26) Ambas as vias apoptóticas vão ser activadas pelas caspases, sendo a primeira activada pela caspase 8 e a segunda pela caspase 9.(25)

Na via extrínseca, a activação do DR (Fas) pela interacção com o seu ligando Fas (FasL - “Fas Ligand”) induz uma agregação de receptores e a formação de um complexo de sinalização indutor de morte (DISC Death-Inducing Signaling Complex). O complexo recruta a procaspase 8, via Fas-associated death domain (FADD), resultando a activação da caspase 8. Esta caspase activada cliva e activa directamente a caspase 3 que, por sua vez, cliva outras caspases.(20, 25) A caspase 3 activada, cliva a poli (ADP-ribose) polimerase (PARP), a qual é determinante no processo apoptótico.(8)

No mecanismo intrínseco, a mitocôndria é um organelo central na sinalização da morte celular, através da sua capacidade de regulação

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diferenciada do movimento de proteínas pró-apoptóticas (Ex: Bax) e anti-apoptóticas (como o Bcl2) no seu espaço intermembranar, dependendo do tipo de estímulo. (26-27) Os danos no ADN e o stress oxidativo são exemplos clássicos de sinais que podem activar a via apoptótica mitocondrial. Estes sinais de stresse geralmente resultam na ruptura da membrana mitocondrial e libertação de proteínas internas como o citocromo c, um factor crucial no processo de apoptose.(20) Ocorre a dissipação do potencial de membrana mitocondrial e a redistribuição do citocromo c do espaço intermembranar para o citosol, possibilitando a activação da caspase 9. Posteriormente, o citocromo c libertado, em conjunto com uma proteína reguladora, Apaf-1, e a caspase 9, clivam a caspase 3, activando-a. (8) Portanto, as caspases 8 e 9 activadas, activam caspases efectoras, as quais por sua vez vão clivar uma série de proteínas celulares, nomeadamente, proteínas estruturais, proteínas nucleares, proteínas do citoesqueleto e moléculas de sinalização.(25)

Além disso, os membros da família de proteínas Bcl2 (anti-apoptótica) são decisivos no controlo da apoptose mediado pela mitocôndria: o Bcl2 e os seus homólogos são capazes de interromper as perturbações na membrana mitocondrial e a libertação do citocromo c, e de outros factores apoptóticos. Contrariamente, o Bax (pró-apoptótico) promove todos esses eventos. O balanço entre Bcl2/Bax, as duas proteínas antagonistas, é considerado um critério decisório na morte celular programada.(8)

Recentemente tem sido publicado um número considerável de estudos que estabelecem uma relação entre fitoquímicos alimentares e apoptose.(20) A indução da apoptose pode eliminar completamente células geneticamente danificadas de um tecido.(4) Em grande parte dos fitoquímicos têm sido observados efeitos na

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regulação das vias intrínsecas da apoptose.(8) É o caso da EGCG que demonstrou, em numerosas linhas celulares, aumentar a caspase 9 e a Bax, modular membros da família de proteínas Bcl2, e aumentar o Fas. De igual modo, a quercetina, a genisteína e a apigenina revelaram induzir a apoptose em várias células cancerígenas. Através de resultados obtidos em diversos estudos com modelos de animais, praticamente todos os fitoquímicos mencionados anteriormente demonstraram retardar o desenvovimento de tumores.(20) Várias outras classes de fitoquímicos, incluindo compostos organosulfurados provenientes do alho (Allium sativum) e isotiocianatos, têm demonstrado a capacidade de induzir apoptose em linhas celulares. Num estudo experimental, verificou-se que a administração oral do glucosinolato sinigrina (o precursor do isotiocianto de alilo) na sua forma pura ou através de couves de Bruxelas cruas (brassica oleracea var. gemmifera) ricas em sinigrina leva a uma amplificação da resposta apoptótica ocorrida nas criptas colorectais 24 horas após a exposição a um carcinogénio químico, o 1,2 dimetilhidrazina. Quer nos modelos animais, quer em indivíduos, um elevado nível de ocorrência de processos apoptóticos nas criptas torna-se um factor protector contra a neoplasia colo-rectal. Constatou-se que o sumo de couve de Bruxelas exerce os mesmos efeitos anti-proliferativos do isotiocianto de alilo in vitro, embora não contenha o mesmo composto na forma livre. Ainda não está bem esclarecido quais serão os produtos secundários e metabolitos na couve-de-bruxelas responsáveis por esta actividade biológica, mas alguns produtos já estão identificados.(4)

Muitos fitoquímicos evidenciaram a capacidade de induzir a paragem do ciclo celular. É o caso dos isotiocianatos, dos flavonóides, dos polifenóis, dos estilbenos, das antocianidinas e das procianidinas – todos eles causaram a

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paragem de G2/M em numerosas linhas celulares.(20) Os genes que controlam o ciclo celular sofrem, muitas vezes, mutações que resultam na proliferação contínua das células “transformadas”. Por exemplo, mutações no gene p27 são comuns na maioria dos tumores pancreáticos; da mesma maneira, a maioria dos cancros do cólon exibem mutações no gene p53.(8)

4.3 Bloquear a fase de progressão da carcinogénese

4.3.1 Inibição da angiogénese

A angiogénese, a formação de novos vasos a partir de uma rede vascular pré-existente, é um processo decisivo em diversas doenças, em concreto o cancro.(28) A angiogénese tumoral é um dos processos-chave no microambiente tumoral, e portanto, controlar este processo é uma estratégia importante na prevenção de cancros invasivos(5, 29). De entre os fitoquímicos mais estudados na modulação da angiogénese encontram-se a EGCG, o resveratrol e a curcumina.(28) Muitas moléculas reguladoras da angiogénese foram identificadas e caracterizadas recentemente, incluindo o factor de crescimento Vascular Endothelial Growth Factor (VEGF). No microambiente tumoral, as células progenitoras endoteliais (“endothelial progenitor cells” - EPC) também têm um papel preponderante na angiogénese tumoral. A mobilização de EPC a partir da medula óssea para o sangue periférico é regulada por citocinas derivadas do tumor. Em resposta a estas citocinas, a EPC pode contribuir para a angiogénese tumoral e o crescimento de certos tumores. Desta forma, a EPC é considerada um importante alvo para a terapia anti-angiogénica. Estratégias que bloqueiam a mobilização da EPC para a circulação sanguínea poderão fornecer uma nova abordagem na inibição da angiogénese tumoral. Durante a angiogénese, a

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sinalização do VEGF é mediada pelo ligando dependente da via de sinalização da cínase do trifosfato de inositol (PI3K-Akt). A cínase Akt tem um papel central nas células endoteliais maduras. A activação de Akt promove a sobrevivência da célula pela inibição da apoptose e intervém na indução da migração do VEGF na célula endotelial. Novas evidências sobre o mecanismo pelo qual a EGCG inibe a angiogénese tumoral sugerem que a EGCG inibe a migração celular do VEGF nas células endoteliais associadas ao tumor e nas células progenitoras endoteliais, mas não nas células endoteliais normais. Além disso, demonstrou-se que a EGCG inibe a via de sinalização da PI3K-Akt, através da inibição da fosforilação da Akt, especificamente nas células endoteliais associadas ao tumor, mas não nas células endoteliais normais. Desta forma existe a possibilidade de usar a EGCG, seja como um agente isolado, seja como co-adjuvante de tratamentos anti-cancerígenos, por períodos relativamente longos, uma vez que não é tóxica para células normais.(29) No que diz respeito ao resveratrol, ele tem demonstrado efeitos na diminuição da produção de VEGF e da interleucina-8.(28) Além disso, o seu efeito protector nas células vasculares é muitas vezes apontado como estando relacionado ao sequestro de ROS.(13, 28) Curiosamente, o peróxido de hidrogénio também parece ser crucial na angiogénese, induzindo a expressão de mediadores angiogénicos como o VEGF. As ROS também são produzidas pelas células endoteliais em resposta a estímulos com factores de crescimento, tal como o VEGF. Deste modo, alguns dados indicam que as propriedades sequestradoras do resveratrol poderão contribuir para o seu efeito anti-angiogénico.(28) O efeito da curcumina no crescimento tumoral também tem sido estudado. A curcumina demonstrou prevenir totalmente a indução da síntese de VEGF e poderá também afectar a angiogénese através de outros factores de

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crescimento. Num estudo em ratos foi referido que a curcumina inibiu o factor básico do crescimento dos fibroblastos (“Basic fibroblast growth factor” – bFGF).(5, 28)

5. Biodisponibilidade dos fitoquímicos

Apesar da extensa literatura sobre a actividade anticancerígena dos fitoquímicos alimentares, a importância fundamental da sua biodisponibilidade e do seu metabolismo tem sido por vezes negligenciada. De acordo com as declarações emitidas pelo Grupo de Trabalho de Quimioprevenção americano, um dos principais aspectos de um potencial agente quimiopreventivo é a sua “segurança”: deve ser administrado em doses muito mais reduzidas comparativamente às de um fármaco quimiopreventivo, uma vez que os indivíduos “receptores” poderão ser “saudáveis”. No entanto, a partir de uma apreciação da literatura, parece claro que as concentrações dos agentes quimiopreventivos geralmente descritas nos artigos científicos, encontram-se dentro de um intervalo semelhante ou superior ao das doses farmacológicas. (2)

Apesar de alguns estudos estimarem uma média de ingestão total de 1g/dia de compostos fenólicos na alimentação humana, torna-se extremamente difícil calcular com precisão a ingestão desses compostos.(2) Para avaliar a ingestão são necessários registos alimentares e tabelas de composição alimentar para os fitoquímicos. Porém, esta abordagem apresenta um número de limitações, inerentes às dificuldades de avaliar ingestões alimentares e a carência de tabelas detalhadas de composição alimentar para os fitoquímicos. Os métodos mais comuns para estimar a ingestão baseiam-se em questionários de frequência alimentar ou a recordação das 24 horas precedentes repetidos, mas a precisão desses questionários e dos auto-relatos ainda é incerto. Várias tabelas de

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composição alimentar para os fitoquímicos têm sido elaboradas nos últimos anos. Incluem-se, por exemplo, as diferentes bases de dados do Departamento de Agricultura da América, a base de dados “Phenol-Explorer” para todos os compostos fenólicos, inclusive os ácidos fenólicos, etc. No entanto, estas bases de dados ainda estão incompletas tendo em conta a diversidade considerável de fitoquímicos nas plantas.(2) Vários parâmetros têm um profundo impacto nos níveis de fitoquímicos nos alimentos, tais como, genéticos, factores ambientais (incluindo local de produção ou práticas agrícolas), processamento alimentar e armazenamento.(2, 5)

Visto que as propriedades dos compostos fenólicos dependem da sua biodisponibillidade, torna-se imperativo investigar esta questão antes de analisar a sua eficácia quimiopreventiva.(2) Tal como foi referido no início, a maioria dos compostos fenólicos estão armazenados nas plantas conjugados a um grupo glicosídico, sendo que este pode variar no seu grau de polimerização. Embora tenha sido observado em ratos a absorção de compostos fenólicos através do estômago, o local predominante de absorção no ser humano ocorre no intestino. A extensão da absorção intestinal, por exemplo, da quercetina, que ocorre nos frutos na sua forma glicosídica, rutina, é determinada pelo tipo de glicosídeo.(10) De facto, as diferentes estruturas químicas dos compostos fenólicos determinam a sua selectividade na absorção intestinal. No entanto, apesar dos compostos fenólicos estarem geralmente presentes no intestino delgado na forma de derivados glicosilados,(2) estes geralmente não são encontrados no plasma, na urina e nos tecidos, porque para permitir a sua passagem pela barreira intestinal, as glicosidases removem a parte glucídica.(10) Os níveis plasmáticos e urinários representam bons marcadores para verificar a biodisponibilidade dos compostos

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fenólicos e dos seus metabolitos. De uma maneira geral, menos de 10% dos compostos fenólicos (ou dos seus metabolitos) ingeridos são detectados na urina e no plasma, onde as concentrações dificilmente atingem 1 μM.(2)

Após a hidrólise pelas glicosidases e correspondente formação das agliconas, os compostos fenólicos são submetidos ao mesmo processo de biotransformação dos fármacos: são conjugados por metilação, sulfatação, glucuronidação ou uma combinação dos anteriores.(2, 30) Este processo é um ponto crucial em termos de actividade quimiopreventiva, ou seja, os conjugados podem alterar significativamente as propriedades biológicas do composto original.(2) Os resultados de um estudo em ratos indicaram que a ingestão de elevadas doses de quercetina origina uma maior formação do composto conjugado, isoramnetina, o qual é ainda mais activo na inibição da xantina oxídase do que a sua correspondente aglicona.(30)

Outro aspecto relevante é o facto de que, quando os compostos fenólicos são administrados em doses farmacológicas (centenas de miligramas), ou consumidos numa alimentação rica nesses mesmos compostos (superior a 1g/dose), eles podem rapidamente saturar as vias de conjugação, levando à detecção de compostos não conjugados no plasma. Portanto, as concentrações utilizadas influenciam, não só a qualidade e a quantidade das espécies em circulação, mas também a distribuição dos compostos fenólicos e dos seus respectivos metabolitos nos tecidos. De facto, enquanto que grandes doses são metabolizadas no fígado, as pequenas doses são primeiramente metabolizadas pela mucosa intestinal.

As concentrações sanguíneas de um composto fenólico não conjugado (forma livre), ou dos seus metabolitos, não influenciam significativamente a capacidade antioxidante do plasma. No entanto, quando a contribuição dos

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compostos fenólicos alimentares (0,5-1g da alimentação) é considerada no seu conjunto, o poder antioxidante no plasma aumenta para um valor situado entre 50 a 75 μM equivalentes de vitamina C. A baixa biodisponibilidade comum nos compostos não conjugados, em conjunto com as complexas reacções de transformação, torna difícil uma análise causa-efeito. Pelo contrário, quando ingeridos através do alimento, a “combinação” dos fitoquímicos antioxidantes pode sugerir um fundamento para a quimioprevenção.(2)

5.1 Biodisponibilidade da EGCG, da curcumina e dos isotiocianatos

A EGCG tem sido proposta como o mais activo constituinte responsável pelos efeitos quimiopreventivos do chá verde. Dados recolhidos a partir de muitos estudos clínicos, experimentais e epidemiológicos suportam claramente que o consumo de chá verde pode diminuir a incidência de muitos tipos de cancro, incluindo o gástrico, o esofágico, o colorectal, o pancreático, o pulmonar, o da mama, o da próstata e o ovárico. Os mecanismos anticarcinogénicos têm sido elucidados em vários modelos experimentais. A EGCG demonstrou actividade sequestradora de radicais livres e capacidade de aumentar a destoxificação através da indução selectiva ou modificação de enzimas da fase II. Adicionalmente, a EGCG consegue inibir marcadores bioquímicos da iniciação e promoção de tumores, inibindo assim o desenvolvimento e crescimento do cancro. Embora a baixa biodisponibilidade sistémica(10) registada em modelos de animais seja um obstáculo no que diz respeito à administração de EGCG, os seus efeitos benéficos promissores convenceram os investigadores a conduzir estudos em humanos. A investigação em humanos na área da farmacocinética indica que, após a administração oral de EGCG, a qual apresenta baixa absorção intestinal, encontram-se níveis séricos sub-micromolares ou dentro de intervalos

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nanomolares, enquanto que as concentrações séricas fisiológicamente relevantes estão a níveis micromolares (10-100 μM) Após a ingestão, a EGCG está principalmente na forma livre e é seguidamente excretada pela urina como um conjugado α-glucoronídeo ou sulfato. Além disso, observaram-se grandes diferenças individuais nos níveis plasmáticos de EGCG. Portanto, os factores que influenciam a biodisponibilidade e a biotransformação da EGCG ainda carecem de esclarecimentos.

As múltiplas funções biológicas e as potenciais propriedades anticancerígenas da curcumina (ex: açafrão-da-índia) têm sido amplamente revistas. As actividades da curcumina incluem efeitos anti-inflamatórios, anti.angiogénicos, anti-oxidativos, entre outros. É de salientar que a sua capacidade de prevenir e inibir a tumorigénese em diferentes órgãos tem sido confirmada em vários modelos com ratos. A curcumina consegue inibir a actividade das isoenzimas do citocromo P450 da fase I, resultando na diminuição da activação metabólica de compostos carcinogéneos. Contrariamente, a curcumina tem a capacidade de induzir as enzimas GST destoxificadoras da fase II. Dado que algumas das “enzimas–alvo” destoxificadoras exibem polimorfismos, a influência da variação genética nos efeitos quimiopreventivos da curcumina necessitam de adicionais avaliações. Após uma administração oral, a curcumina exibe baixa biodisponibilidade sistémica. Esta característica farmacocinética da curcumina é o resultado de uma baixa absorção e de consideráveis conjugações metabólicas. A partir de estudos no ser humano verificou-se que as concentrações de curcumina, após uma administração oral, eram apenas na ordem dos nanomolares no plasma, e no tecido hepático, não era detectável. Na maioria dos estudos in vitro, as concentrações detectadas para a obtenção dos

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efeitos biológicos da curcumina, eram na ordem dos 5-50 μM. Embora as concentrações séricas da curcumina sejam consideravelmente baixas, os estudos em modelos com animais reportam que a administração oral da curcumina pode exercer actividades biológicas no local de absorção. É importante destacar que a curcumina deve persistir nos tecidos-alvo para exibir os seus efeitos protectores contra o cancro.

Os isotiocianatos, os metabolitos biologicamente activos dos glucosinolatos, encontram-se abundantemente nos vegetais crucíferos como os brócolos, agriões e couves (couve-flor, couves de Bruxelas). Dados epidemiológicos obtidos a partir de modelos com animais evidenciam que os isotiocianatos poderão prevenir ou atrasar a progressão do cancro do pulmão, do pâncreas, da bexiga, da próstata, dos ovários, da pele, do estômago e do cólon. De entre os isotiocianatos, o sulforafano (produto da hidrólise da glucorafanina) e o fenetil-isotiocianato (“Phenethyl isothiocyanate” - PEITC; produto da hidrólise da gluconasturtina) são os indutores mais eficazes das enzimas de defesa celulares e destoxificadoras (como a GST, NQO1, “gamma-glutamylcysteine synthetase” ( -GCS) – sintétase da - Glutamil cisteína, HO1 e outras). Tal como explicado anteriormente, estas enzimas antioxidantes/destoxificadoras da fase II são “genes-alvo” do factor de transcrição Nrf2 via ARE. Os isotiocianatos também modulam as actividades de outros factores de transcrição nucleares decisivos tal como o factor nuclear-kB (NF-kB) e o activador da proteína 1 (AP-1), os quais estão envolvidos na apoptose e nos processos de proliferação, assim como de transformação de células malignas. Dados oriundos de estudos farmacocinéticos pré-clínicos em modelos com ratos revelaram que as concentrações séricas de sulforafano eram suficientemente elevadas para exercerem um efeito protector

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contra o cancro. Resultados semelhantes foram obtidos em estudos com indivíduos.(14)

6. Efeitos sinérgicos dos fitoquímicos

Recentemente têm surgido evidências de que, combinações específicas de fitoquímicos, podem ser de longe mais protectoras contra o cancro do que os compostos isolados. Numerosos estudos têm vindo a salientar o efeito quimiopreventivo de misturas de compostos fenólicos(11) provenientes do chá verde ou de outras fontes alimentares. Foi descrito que a epicatequina aumentou a indução da apoptose pela EGCG e inibiu a libertação do TNF-α. Os resultados deste estudo indicam que, em resultado dos efeitos sinérgicos entre os compostos fenólicos do chá verde, o chá é uma mistura mais eficiente para a prevenção do cancro do que a suplementação de EGCG. Curiosamente, observou-se que a catalase bloqueou o efeito sinérgico da epicatequina e da EGCG, sugerindo que a produção de peróxido de hidrogénio e das ROS estão envolvidas no mecanismo de sinergia. Os potenciais efeitos sinérgicos entre os compostos fenólicos e outros fitoquímicos também foram investigados.

Estudos sobre o efeito da combinação de isotiocianatos e indóis (fitoquímicos presentes nos vegetais crucíferos), demonstraram que os efeitos sinérgicos podem depender das condições experimentais e das concentrações. A combinação de outros dois fitoquímicos das crucíferas, o indol-3-carbinol e o crambe, foi estudada em ratos, tendo sido observado que o grupo experimental submetido a uma dose elevada ficou protegido contra a toxicidade induzida pela aflatoxina B1, mostrando efeitos sinérgicos, enquanto que no grupo submetido a uma baixa dose não foram observados efeitos. Também têm sido registados efeitos sinérgicos de alimentos e de outras misturas complexas. Em recentes

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estudos com animais, nos quais se avaliou o efeito da ingestão de vegetais na modulação da expressão de genes, foi descoberto que a maioria dos genes que foram expressos de forma distinta antes e depois da ingestão dos vegetais, representaram alterações na expressão que poderiam ser interpretadas como um efeito preventivo contra o cancro. Além disso, os resultados destes estudos indicaram que, o efeito de quatro vegetais isolados nas alterações da expressão de genes no cólon e pulmão de ratos, diferiu do efeito da mistura dos quatro vegetais. Adicionalmente, a mistura dos vegetais apresentou capacidade de modular genes que não foram significativamente modulados por um dos específicos vegetais presentes na mistura. (31) Portanto, a associação de várias moléculas (como naturalmente acontece nos alimentos) poderá ser mais eficaz na prevenção do cancro do que compostos isolados. Estes aspectos originaram o desenvolvimento da “quimioprevenção combinada” no sentido de que, baixas doses de agentes quimiopreventivos, diferindo no modo de acção, podem aumentar a eficácia e reduzir a toxicidade, gerando um efeito sinérgico.

Discussão e Conclusões

O tema desta monografia é com certeza uma área de estudo complexa e sinuosa, porém motivadora e aliciante. A pesquisa realizada permitiu-me indagar diversos ramos da ciência, concretamente, Biologia celular, Genética, Patologia, Bioquímica, Toxicologia, Fisiologia, etc. Reafirmei a minha convicção de que conseguir atingir novas etapas no conhecimento é gratificante.

Neste trabalho foram apresentados apenas alguns dos mecanismos biológicos geralmente mais observados em determinados fitoquímicos. Contudo, esses exemplos ilustram o enorme potencial destes compostos na modulação do processo carcinogénico.

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Da mesma forma que muitos estudos demonstram claramente que os fitoquímicos são altamente eficazes a impedir o desenvolvimento do cancro em cada fase da carcinogénese, também se constata que estes agentes são protectores para as células ditas “normais”. O exacto mecanismo do efeito diferencial entre células “normais” e “anormais” que os fitoquímicos evidenciam, não está completamente esclarecido, mas pensa-se ser o resultado da capacidade destes compostos de induzir ou suprimir de forma diferenciada certos eventos celulares, assim como de regular através da transcrição, a actividade de vários genes de defesa.

O conhecimento dos mecanismos moleculares subjacentes aos efeitos sinérgicos dos fitoquímicos ainda é limitado, mas parece que muitos fitoquímicos agem sinergicamente, o que poderá explicar a razão pela qual alguns alimentos mostram efeitos preventivos contra o cancro que não são explicados com base nos compostos bioactivos individuais.

Paradoxalmente, a preparação quimiopreventiva mais eficaz é a alimentação. As várias centenas de compostos presentes nos alimentos diferem na estrutura molecular, na estabilidade, na solubilidade, no metabolismo e na absorção. Eles são submetidos a actividades sinérgicas e/ou competitivas que não podem ser simplesmente reproduzidas num fármaco.

Embora os modelos de culturas celulares in vitro e de animais têm demonstrado a eficácia quimiopreventiva de numerosos fitoquímicos, o efeito protector desses agentes no risco de cancro nos seres humanos ainda não está estabelecido de forma conclusiva. Estas inconsistências parecem reflectir a natureza complexa dos alimentos e dos sistemas biológicos (i. e., os seres humanos).

Referências

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