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Orientador/a pedagógico/a: o que você faz na escola? : uma análise dos diferentes estilos e do gênero de atividade

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Academic year: 2021

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FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ANA PAULA SOUZA BRITO

ORIENTADOR/A PEDAGÓGICO/A: O QUE VOCÊ FAZ NA ESCOLA? – uma análise dos diferentes estilos e do gênero de atividade

CAMPINAS 2017

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ORIENTADOR/A PEDAGÓGICO/A: O QUE VOCÊ FAZ NA ESCOLA? – uma análise dos diferentes estilos e do gênero de atividade

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Psicologia Educacional.

Orientadora: Profª Doutora Ana Luiza Bustamante Smolka O ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À

VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ANA PAULA SOUZA BRITO E ORIENTADA PELO(A) PROF. (A) DR.(A) ANA LUIZA BUSTAMANTE SMOLKA

CAMPINAS 2017

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FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

ORIENTADOR/A PEDAGÓGICO/A: O QUE VOCÊ FAZ NA ESCOLA? – uma análise dos diferentes estilos e do gênero de atividade

ANA PAULA SOUZA BRITO

COMISSÃO JULGADORA:

Profª Doutora Ana Luiza Bustamante Smolka Profª Doutora Maria José da Silva Fernandes Prof. Doutor Guilherme do Val Toledo Prado Profª Doutora Selma Borghi Venco

Profª Doutora Daniela Dias dos Anjos

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

CAMPINAS 2017

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Minha mãe e meu pai. Nós não esperávamos! As condições, por vezes, impossibilitam de chegarmos até aqui. Resistimos. Sobrevivemos. Vocês me ensinaram força.

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O processo de desenvolvimento da pesquisa e elaboração das análises foi (in)tenso: muitos acontecimentos, muitas mudanças, algumas transformações e uma Ana Paula ressignificada! Nestes 4 anos vivenciei experiências que me marcaram consideravelmente. Do caos tive que encontrar forças e energia para seguir. Perda significativa, sensação de imobilidade, vontade de parar!

Mas, segui!

A passos vagarosos, calmos...devagar! Um passo por vez. Ou “um posso por vez”!

A Ana Paula que iniciou esse processo foi se modificando, criando novos sentidos e recriando a vida.

E me olhando, hoje, consigo analisar quem fui, quem gostaria de ser, o que consigo realizar, quem me tornei. Nessa perspectiva, parece que a música A Lista, de Oswaldo Montenegro me ajuda nesse processo de reflexão.

Faça uma lista de grandes amigos Quem você mais via há dez anos atrás

Quantos você ainda vê todo dia Quantos você já não encontra mais Faça uma lista dos sonhos que tinha

Quantos você desistiu de sonhar! Quantos amores jurados pra sempre Quantos você conseguiu preservar...

Onde você ainda se reconhece Na foto passada ou no espelho de agora?

Hoje é do jeito que achou que seria Quantos amigos você jogou fora? Quantos mistérios que você sondava

Quantos você conseguiu entender? Quantos segredos que você guardava Hoje são bobos ninguém quer saber? Quantas mentiras você condenava?

Quantas você teve que cometer? Quantos defeitos sanados com o tempo

Eram o melhor que havia em você? Quantas canções que você não cantava

Hoje assovia pra sobreviver? Quantas pessoas que você amava

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Amigos, sonhos, amores! Mistérios, segredos, histórias! Canções!

Viver é, frequentemente, fazer as listas, apagá-las, rabiscá-las, produzir novas.

E nessa elaboração constante, quero me inspirar na música para registrar meus agradecimentos:

Àqueles/as que possuem comigo laços fraternos, de ternura, amor gratuito. Minhas queridas irmãs: Juliana, Cristiane e Valquíria. Meus filhos do coração: Lavínia, Maria, Pedrinho,

Iza, Júlia, Fábio e Juninho. Que possamos andar juntos/as sempre, de mãos dadas.

À tia Lourdes, ao tio Elias e à minha “irmã torta” Márcia, por ser família sempre e por continuar ao meu lado. Agradecendo a eles, estendo minha gratidão aos demais familiares. Aos/às que me estenderam (e estendem) as mãos nos momentos que necessito e que comemoram a vida com gestos de simplicidade: Dih (meu passarinho, irmão), Marcelo (meu Adoro), Vanderson, Fran, Márcio, Agatha, Leandro, Michelle e Eric.

Aos/as amigos/as de outras épocas, que mesmo com o tempo e a distância, continuam se fazendo presentes e demonstrando carisma e solidariedade: Maria, Eliz, Alexandre, Dênis e

Lê.

Àqueles/as que acolheram minha chegada e compreenderam algumas mudanças da caminhada: companheiros/as de Bauru, em especial, ao Jé, um amigo que a vida me presenteou.

A minha querida e estimada orientadora, Ana Luíza, pelas palavras, pelo acolhimento nos instantes que precisei, por compreender meus momentos de dor (e partilhar os seus, possibilitando-me um pouco mais de leveza). Essa produção tem muito de você. Gratidão por mediar minhas análises e por não desacreditar em minhas potencialidades. Você foi e é extremamente importante no meu processo de constituição como pesquisadora.

Aos/as pesquisadores/as que compartilharam suas produções e contribuições no momento da qualificação: Profª Doutora Vera Placco, Prof. Doutor Guilherme do Val Toledo e Profª Maria José da Silva Fernandes (Zezé). Os diálogos me possibilitaram reanalisar os dados e reorganizar as ideias.

Aos/as companheiros/as do GPPL, com os quais refleti sobre concepções, conceitos e propostas. Em especial, à Núbia, essa pessoa encantadora que sempre foi ombro e abraço amigo.

Ao coletivo da escola onde trabalho, que me ensina cotidianamente como ser Orientadora Pedagógica e que me instiga a pesquisar, estudar e atuar.

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contribuíram para a produção da tese. Em especial, agradeço à Isabel, uma amiga querida que, ao falar de seu trabalho, oportunizou condições para que eu pudesse me olhar e analisar o meu fazer.

A meu amor, meu amigo, parceiro e companheiro de todas as horas, Michel. Você é energia constante para mobilizações. Pessoa com a qual compartilho meus dias, minhas angústias, minhas alegrias e conquistas. Quando tenho medo, oferece palavras de incentivo. Quando tenho dúvidas, dialoga comigo sobre possibilidades. Quando tenho ideias, me instiga a caminhar. Divide comigo o trabalho de Orientação Pedagógica. Conversa todos os dias sobre política, atividade, ensino, aprendizagem, sujeitos, amizade, família, vida, humor, amor… Como diria Arnaldo Antunes: “seu olhar melhora o meu”. Nossos olhares têm nos constituído e nos mostrado maneiras outras de ser e agir. Gratidão!

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Este trabalho teve como objetivo investigar o cargo de Orientação Pedagógica, em relação ao contexto histórico, às atribuições vigentes, à constituição dos sujeitos como profissionais da educação, e às condições efetivas de trabalho numa rede pública municipal de ensino, situada no interior do Estado de São Paulo. Para tanto, diferentes modos de atuação de Orientadores Pedagógicos foram problematizados e analisados, tendo em vista contribuir para a configuração deste gênero de atividade profissional. Como procedimentos metodológicos foram realizados 1. encontros de discussão com profissionais da área em questão; 2. a análise de documentos oficiais e de apoio; e 3. a “Instrução ao Sósia”, proposta por Yves Clot, como instrumento de pesquisa que viabiliza possível elaboração da experiência de trabalho pela linguagem. Os diálogos produzidos nessas inter-relações possibilitaram a emergência de significados diversos, que convocaram à problematização das condições de produção dos discursos e do trabalho. A análise dos dados produzidos foi respaldada pelas contribuições de autores da Perspectiva Histórico-Cultural (VIGOTSKI, LURIA, LEONTIEV, BAKHTIN), pela Análise do Discurso de linha francesa (FOUCAULT, PEUCHEUX, MAINGUENAU), pela Psicologia e Sociologia do Trabalho (CLOT, FAÏTA, AMIGUES) e outros estudos sobre o trabalho (MARX, ENGELS, ANTUNES, FREIRE, FRIGOTTO, SAVIANI E DUARTE). Os discursos dos/as profissionais participantes na pesquisa permitiram ressaltar os pontos em comum, evidenciar contradições e apontar possibilidades no trabalho de Orientação Pedagógica; indicaram ainda a oportunidade de constituição de “coletivos de trabalho”, bem como a importância dos processos formativos como instrumentalização das atividades. Com base nas análises produzidas, foi possível dar visibilidade às potencialidades na organização/acompanhamento das atividades e nas proposições de contextos formativos, situações nas quais este/a profissional pode tornar-se um/a colaborador/a do trabalho docente. Ocupando uma posição de mediação no coletivo da escola e participando efetivamente de um processo que se configura pela elaboração de táticas capazes de produzir novas formas de co-laboração, os modos de atuação incitam a considerar a dimensão política implicada na Orientação Pedagógica.

Palavras-chave: Orientação Pedagógica, Trabalho, Prescrições, Formação Docente,

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This article aims to investigate the position of Pedagogical Guidance, regarding to the historical context, to the current assignments, to the individual’s constitution as educational professionals and to the effective working conditions in a municipal public education network, located in the countryside of São Paulo state. Therefore, different means of Pedagogical Counselors performance were problematized and analyzed, with a view that contributes to the professional configuration asset genre. Methodological procedures were achieved: 1. discussion meetings with professionals of the object studying area; 2. analysis of official supporting documents; and 3. Yves Clot’s Instruction au Sosie, as a research tool that enables the elaboration of the work experience through language. The dialogues produced in these interrelationships permited the emergence of diverse meanings, which brought up to the problematization of the conditions about speeches and work production. The data analysis produced were supported by contributions of the Historical-Cultural Perspective authors (VIGOTSKI, LURIA, LEONTIEV, BAKHTIN), analysis fom the French Speech line (FOUCAULT, PEUCHEUX, MAINGUENAU), Psychology and Sociology of Labor (CLOT, FAÏTA, AMIGUES) and other studies on the work (MARX, ENGELS, ANTUNES, FREIRE, FRIGOTTO, SAVIANI AND DUARTE). The professionals’ quotes in the research allows to highlight common points, evidencing contradictions and pointing out possibilities in the Pedagogical Guidance work; they also indicate the opportunity for the constitution of "collective working groups", as well as the importance of formative processes as an instrument for the activities. Based on the analyzes produced, it was possible to give visibility to the potentialities in organization/monitoring activities and to the propositions of formative contexts, situations in which this professional can become a collaborator of the teaching work. Occupying a mediating position in the school collective and effectively participating in a process that is shaped by the elaboration of techniques capable of producing new co-work means, the action methods encourage to consider a political dimension inherent to Pedagogical Guidance.

Key words: Pedagogical Guidance, Work, Prescriptions, Teacher Training, Political

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Para começo (ou continuação) de conversa………..13

Faz de conta ...…...18

Espelho, espelho meu...22

Não compreendo! – a inquietude...30

NO PAÍS DO OUTRO: A RELAÇÃO ENTRE A PESQUISA, O MÉTODO E A PRODUÇÃO DE SENTIDOS...34

O estranhamento...37

Na cozinha da pesquisa: histórias narradas pela pesquisadora...39

NO JOGO ENTRE PESQUISAS, PRESCRIÇÕES E CONCEPÇÕES: AS CONTRADIÇÕES NA CONFIGURAÇÃO DO TRABALHO DE ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA...………...51

As atribuições como ponto de partida das análises……….………..52

Buscando ancoragem teórico-metodológica……….65

Discursos sobre a Orientação Pedagógica: da análise de imagens produzidas às tentativas de configurar ações………..………..71

ANÁLISE DO TRABALHO NA/ PELA LINGUAGEM: CONCEITOS, DIMENSÃO DO COLETIVO E (IM)POSSIBILIDADES...……….……..89

Conceito de trabalho e trabalho na sociedade capitalista: alguns apontamentos……….……….106

O processo educativo e a configuração do trabalho de Orientação Pedagógica………..112

Os coletivos de trabalho: reflexões sobre posições, poder e atividades……….………...120

CONTEXTOS FORMATIVOS E A ATUAÇÃO DE ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA: INSTRUMENTOS POTENCIALIZADORES...135

A formação inicial e continuada na constituição da Orientação Pedagógica...135

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REFLEXÕES...………...164

REFERÊNCIAS ……….…..178

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Para começo (ou continuação) de conversa

Inserir-me novamente no contexto formal de pesquisa foi experimentar o drama entre a exultação e a complexidade, a contradição entre a alegria e o receio.

O “ponto final” da dissertação de mestrado me impulsionou até aqui. Não queria encerrar. Coisas por dizer. Desejo por continuar. Dúvidas que surgiram e que me acompanharam.

Na problematização de minhas ações na Orientação Pedagógica1, relacionadas

intrinsecamente ao fazer docente e ao Projeto Político Pedagógico da escola, o que encontrei? - muito trabalho, estudo, muitas leituras, um bocado de embates e a vivência do processo (belo e tenso) de constituição do coletivo de trabalho.

Inúmeras foram as situações que me provocaram a vontade de desistir. E me coloco a pensar em que situações ancorei a persistência.

Olhando daqui, do lugar que atualmente ocupo, das posições assumidas e de quem me transformei, consigo ter alguns indícios de que havia um ideário que conduzia as ações. Um viés que me (nos) colocava num movimento de pensar o que já realizávamos na escola e de como ressignificar as ações na perspectiva de contribuir com o desenvolvimento das crianças, concomitantemente, com os processos formativos dos/as trabalhadores/as daquele contexto. Modos de re-existir, de resistir.

As produções teóricas e as pesquisas elaboradas estavam ali, presentes naquele cotidiano, num embate e numa luta constantes. A permanência deles também era uma forma de resistência, no intuito de colocar aquelas vozes em diálogo com as vozes produzidas na escola.

Estava na escola. Era, também, uma trabalhadora. Parte que constituía aquele emaranhado de sujeitos, de concepções, de visões e de modos de agir. E minha voz já tinha as marcas de um processo de constituição no qual a interlocução com autores e pesquisadores foi

1 Orientação Pedagógica é o termo atribuído, na cidade pesquisada, ao cargo responsável pelo acompanhamento

e coordenação do trabalho pedagógico da escola. Denominações diferentes são utilizadas em outros municípios e estados para esse cargo/função, como Coordenação Pedagógica, Professor Coordenador, Coordenação Educacional, Supervisão Pedagógica. No desenvolvimento desse trabalho, optei por utilizar o termo Orientação Pedagógica, mas ao me referir a autores/as e pesquisadores/as da área, respeitarei a denominação utilizada pelos/as mesmos/as.

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central. O meu trabalho docente havia sido ressignificado pelas análises, reflexões e reformulações de diferentes produções teóricas.

Destaco, aqui, as contribuições, especificamente, da perspectiva Histórico-Cultural. Questões como a natureza social do desenvolvimento humano, a construção histórica do conhecimento, a (trans)formação histórica do funcionamento mental, a cultura como produto da atividade social, o estatuto do signo e a linguagem como constitutiva, foram princípios importantes que impulsionaram aproximações e constituição de concepções outras sobre sujeito, desenvolvimento, aprendizagem. Sobre sociedade. Sobre mim mesma.

E carreguei essas reflexões para a Orientação Pedagógica.

O trabalho de reflexão na escola, subsidiado pelo conhecimento historicamente produzido e pela relação entre os diferentes sujeitos, significou contexto de negociações de sentidos na produção de novos significados, oportunizando impactos no trabalho docente e na constituição da escola. Foi esse trabalho que problematizei na Dissertação de Mestrado, a partir do desenvolvimento de um projeto de pesquisa no local onde atuo como Orientadora Pedagógica. A partir de três eixos de atuação (planejamento docente, acompanhamento das atividades das crianças e Hora de Trabalho Pedagógico Coletiva – HTPC), teci relações possíveis referentes à ressignificação das ações no contexto de sala de aula e, principalmente, no contexto da escola, como instituição.

Na reflexão sobre potencialidades de desenvolvimento dos sujeitos, dos/as trabalhadores/as e da organização escolar, utilizei como interlocução algumas contribuições da perspectiva Histórico-Cultural (VIGOTSKI, 1989; 1994; 1995; 2000; 2005), do princípio dialógico (BAKHTIN, 1992; 1997) e dos estudos no âmbito da sociologia e psicologia do trabalho (CLOT, 2006; FAÏTA, 2004; SAUJAT, 2004; AMIGUES, 2004).

Esse processo dialético colocou-me na condição de refletir sobre a atuação do/a Orientador/a Pedagógico/a. Para além de minha forma de organizar o trabalho, existem diferentes outras maneiras de atuar e trabalhar com o grupo de professores/as. Assim, ao encerrar o mestrado, tinha por objetivo investigar esses diferentes modos. O projeto do Doutorado se iniciou, então, nessa reflexão.

Pretendia ampliar a análise, com a finalidade de pesquisar para quê se desenvolve a função de Orientação Pedagógica, quais os compromissos e quais as finalidades e os impactos da ação e da existência deste/a profissional na escola. Ou seja, investigar modos de organizar o trabalho de Orientação Pedagógica e problematizá-los, a fim elaborar possíveis contribuições para a configuração do gênero de atividade profissional. Para esse trabalho, o

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intuito era pensar essa atuação, relacionando-a às prescrições vigentes – legislações, resoluções, comunicados e orientações – ao contexto histórico, à constituição do sujeito e às condições efetivas de trabalho.

Dessa forma, apresento este trabalho que foi elaborado a partir de muitos outros: da análise dos dados produzidos (momentos compartilhados com trabalhadores/as da educação), dos diálogos possibilitados pelos contextos de aprendizagem nas orientações sobre a pesquisa (momentos compartilhados com Ana Luiza Smolka, profissional que respeito pela produção acadêmica, mas sobretudo pelas possibilidades de trans-form-ação), das conversas informais no cotidiano (momentos compartilhados com diferentes outros que não participaram efetivamente da pesquisa, mas que me ouviram e dialogaram sobre dúvidas, descobertas, angústias e receios, em especial Michel, que além de ser Orientador Pedagógico, estudioso e pesquisador do tema, é meu companheiro de vida) e do exame de qualificação e defesa (momento compartilhado com Zezé, Guilherme, Vera, Selma e Daniela, pessoas que olharam para meus registros apontando perspectivas outras e que impulsionaram a reorganização das ideias).

O presente trabalho, então, se inicia com narrativas de/sobre mim, nas quais contextualizo os processos de formação e constituição pessoal e profissional. Nesse sentido, relato o processo de elaboração do projeto de pesquisa de Doutorado e ressalto a importância da apropriação do conhecimentos historicamente produzido no desenvolvimento das ações na escola.

Posteriormente, adentro-me no país do outro para relatar o processo de pesquisa. Assim, produzo relações entre a pesquisa, o método e a produção de sentidos, ressaltando a dificuldade de se distanciar do objeto a ser analisado, por fazer parte e por participar efetivamente do trabalho. O estranhamento é apontado como procedimento possível, na perspectiva de tentar compreender os modos de ser e estar na Orientação Pedagógica.

A fim de oportunizar elementos para auxiliar o/a leitor/a com informações referentes às condições de trabalho, apresento uma breve contextualização histórica do cargo em questão na Rede Municipal de Ensino, locus da pesquisa.

Sobre procedimentos de pesquisa, cito alguns instrumentos que foram desenvolvidos no percurso: 1) encontro com Orientadores Pedagógicos; 2) encontro com Diretores que eram Orientadores Pedagógicos; 3) análise de prescrições sobre o cargo ou função de O.P.; 4) diálogo sobre a produção de uma prescrição da Rede de Ensino pesquisada.

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No trabalho de análise dos dados, optei por organizar três eixos diferentes, com as seguintes denominações: 1) No jogo entre pesquisas, prescrições e concepções: as contradições na configuração do trabalho de Orientação Pedagógica; 2) Análise do trabalho na/ pela linguagem: conceitos, dimensão do coletivo e (im)possibilidades de atuação e 3) Contextos formativos e a atuação de Orientação Pedagógica: instrumentos potencializadores.

A análise e a constituição desses eixos foram subsidiadas pelos seguintes referenciais: a perspectiva Histórico-Cultural (Vigotski, Luria, Leontiev), a Crítica literária (Bakhtin), a Análise do Discurso de Linha Francesa (Foucault, Pêcheux, Mainguenau), a Psicologia e a Sociologia do Trabalho (Clot; Faïta; Amigues) e outros estudos sobre o trabalho (Marx, Engels, Antunes, Frigotto, Saviani e Duarte).

No primeiro eixo “No jogo entre pesquisas, prescrições e concepções: as contradições na configuração do trabalho de Orientação Pedagógica”, problematizo as diferentes atribuições do/a Orientador/a Pedagógico, a partir das prescrições, de produções acadêmicas e dos discursos produzidos pelos sujeitos trabalhadores e participantes da pesquisa.

Com objetivo de aprofundar essa reflexão, o segundo eixo “Análise do trabalho na/ pela linguagem: conceitos, dimensão do coletivo e (im)possibilidades de atuação”, traz considerações sobre conceito de trabalho, configuração de atividades profissionais e as organizações coletivas. Essas considerações foram possibilitadas na/ pela linguagem e permitiu elencar pontos comuns, contradições e potencialidades no trabalho de Orientação Pedagógica. Também apresento neste eixo a contextualização do cargo na história da educação brasileira e indico possíveis coletivos que podem ser constituídos no trabalho: entre a equipe gestora, com os/as docentes e entre os/as próprios/as Orientadores/as Pedagógicos/as. Para que esses coletivos se consolidem e possam elaborar/produzir ações, enfatizo a importância dos processos formativos, temática do último eixo de análise “Contextos formativos e a atuação de Orientação Pedagógica: instrumentos potencializadores”. Dessa maneira, finalizo com a problematização da formação inicial e continuada do/a Orientador/a Pedagógico/a, ressaltando possibilidades de atuação nas escolas, a partir da organização de ações formativas com os/as docentes, na perspectiva de desenvolvimento do trabalho e de intervenção na organização escolar.

Quero destacar que no desenvolvimento da pesquisa, deparei-me com diferentes situações que oportunizaram reflexões sobre o trabalho dos profissionais da educação, tendo como eixo a dimensão política. Não que isso, anteriormente, deixasse de estar presente em minhas elaborações. Mas, me parece que o cotidiano escolar e as mazelas presentes nele nos

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fazem esquecer dessa dimensão, por vezes reproduzir ações e focar apenas em práticas que mais são de execução de projetos elaborados em outras instâncias. A necessidade de elaborarmos formas de superação das condições de exclusão e segregação humana emergiram no contexto de desenvolvimento da pesquisa de Doutorado, tanto no âmbito local (organização da Rede Municipal de Ensino, políticas públicas de precarização do trabalho), quanto em âmbito nacional (tempos de recessão, reformas políticas, retirada de direitos, retrocesso social e desmonte da educação pública).

Nesse sentido, as considerações apresentadas ao término dessa produção, trazem como bojo a discussão do trabalho de Orientação Pedagógica a partir da dimensão política. É na análise sobre os diferentes modos de organizar as ações na escola que tento elaborar possíveis contribuições para a configuração do gênero de atividade dessa profissão. Um desafio instigante.

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Faz de conta...

[...] fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, [...] faz de conta que ela não ficava de braços caídos de perplexidade quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que ela era sábia bastante para desfazer os nós de corda de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua, pois ela era lunar, faz de conta que ela fechasse os olhos e seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos de gratidão, faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta. (Clarice Lispector)

Vamos fazer de conta! Brincar com as palavras, assim como as vejo brincando comigo quando estou imersa na leitura ou quando ouso conjecturar algumas ideias no papel. Brincam com/ e imbricam os sujeitos e as relações!

É nessa tentativa de colocar-me novamente nesta brincadeira que buscarei alguns fios da trama de minha história... Das muitas histórias que me constituíram e, ainda, me constituem. São os “fios de ouro” das sensações! São os múltiplos e infinitos sentidos que foram produzidos desde a infância “prateada de brinquedos”. Tenho, então, um “cesto de pérolas” para olhar e para contar.

Talvez eu devesse começar com a questão que uma colega elaborou quando me ouviu relatar a ideia do projeto de doutorado – o que você pretende com isso? Pergunta que ecoou por muitos momentos; pergunta que me mobilizou e me fez (re)olhar meus escritos e minhas práticas, (re)visitar as vivências a partir da atividade de análise do presente.

O que eu pretendia quando me arrisquei neste projeto está nas entrelinhas, nas linhas e nos fios de ouro de minha história. É a minha memória que desempenhará a função de instrumento técnico-semiótico na configuração de uma resposta não só a essa colega, mas à pesquisa, às escolas, aos/as professores/as e, principalmente, aos/as Orientadores/as Pedagógicos/as que, na lida (tensa e complexa) cotidiana, buscam a identidade de seu trabalho.

Registrarei o processo da arquitetônica do projeto de pesquisa, permeada pela narrativa de si e sobre si, ora desfazendo os “nós” embaraçados, ora perplexa com os seres

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que surgiram, ora (des)encantada com aquilo que não é “faz de conta” no universo da educação (e, olhem, são muitas as situações!).

Estar na Orientação Pedagógica foi uma “opção” dentre as possíveis. Poderia estar em sala de aula, desenvolvendo meus projetos junto aos/as alunos/as, construindo as dramatizações, realizando as pesquisas, produzindo os livros juntamente com as crianças, ações que marcaram meus últimos anos (2006, 2007) efetivamente em sala de aula. Porém, algumas condições concretas do último ano como docente impactaram não somente a decisão profissional, como a pessoal. Talvez seja por isso que hoje, ao ler Clarice Lispector (e trazê-la na epígrafe deste texto), consiga identificar-me em tantas palavras. São elas que dizem por mim o que parece indizível. São elas que agem como lembretes de cenas das quais recordo-me.

Na tessitura deste trabalho registrarei algumas memórias, acontecimentos e vivências os quais me recordo (ou quero recordar-me) com o objetivo de contextualizar o sujeito que sou, a profissão e a pesquisa. São indícios que oportunizarão ao leitor condições para (re)construir significados e sentidos sobre essa produção.

Sigamos, então, o caminho.

Ora, pergunta-se, mas qual caminho?

Recordo-me do conto escrito por Lewis Carroll que gera grandes discussões, entre diferentes campos, sobre seu significado: Alice no país das maravilhas. É evidente que há diferentes olhares sobre essa história, contudo parto do princípio de que houve uma “queda” em sua trajetória: a personagem principal cai num mundo desconhecido que, na verdade, pode ser interpretado como “cair em si mesma”. Olhar para si. Um olhar, evidentemente, constituído pelas inúmeras e diversas vivências.

A trajetória narrada, estará, assim, articulada com os (des)caminhos da profissão que me convocaram à pesquisa. Foi na mudança – de profissão, de lugar, de cidade, de amigos/as, de contexto – que descobri “ah, então é verdade que eu não imaginei: eu existo” (LISPECTOR, 1998, p.19). Foram as partidas (e, aqui, destaco as partidas de meus pais) que trouxeram receios, ansiedades, medos. No caos, precisei (re)organizar-me. Foi no processo de (trans)formação que ressignifiquei o cotidiano, a vida.

Este processo, também, desencadeou a (re)elaboração das formas de ser e estar no cargo de Orientadora Pedagógica, sobretudo, constituí-la como objeto de pesquisa. O meu trabalho (e o trabalho de tantos outros colegas) tornou-se elemento de análise e problematização. É a partir deste movimento, do desenvolvimento da pesquisa, que pretendo

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dar voz e vez aos diferentes modos de ser Orientador/a Pedagógico/a e narrar as múltiplas vivências nesta profissão.

Sobretudo, registrar análises configuradas no desenvolvimento da pesquisa, nos muitos diálogos realizados, na escuta atenta dos sujeitos trabalhadores, no registro daquilo que realizo e na reflexão sobre possibilidades do que posso fazer.

Análises elaboradas a partir de inúmeras vivências, especialmente as dos últimos anos, nos quais experimentei três situações políticas marcantes: a eleição do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais do município em que trabalho (processo no qual me envolvi, participando da elaboração, com outros/as companheiros/as, do plano de gestão da nova diretoria sindical, na campanha de eleição e na constituição de uma proposta de atuação que, de fato, atendesse a classe trabalhadora; pós eleição, foi possível perceber, nas ações do Presidente do Sindicato, indícios de alianças na perspectiva de atendimento a interesses próprios em detrimento a interesses comuns – o “sonho coletivo” foi literalmente atravessado e interrompido pelas forças opressoras do capital e das negociações políticas), a elaboração do Plano Municipal de Educação (PME) do mesmo município (processo no qual a Prefeitura articulou, inicialmente, uma dinâmica que impedia a ampla participação da sociedade civil; como resistência, constituímos um movimento – o qual denominamos Fórum Popular de Educação – que pressionou o poder público a ampliar os prazos de elaboração e viabilizar maior participação dos munícipes; porém, na ocasião de aprovação do PME na Câmara, o executivo se articulou com o legislativo e alteraram a redação elaborada em assembleia, aprovando um documento que não condiz com as efetivas demandas e necessidades educacionais do município) e o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff (processo no qual os parlamentares e o judiciário se articularam com diferentes instâncias contra o Estado democrático de direito e pelo qual estamos presenciando alterações nas legislações vigentes no que diz respeito, principalmente, aos modos de organizar a educação e o trabalho, ocasionando precarizações e perda de direitos já conquistados).

Três situações (in)tensas!

Ainda perplexa com a realidade desenhada no meu mundo de “Faz de conta” (realidade perversa!), tento elaborar com os coletivos dos quais participo, formas de enfrentamento e resistência, seja no Fórum Popular de Educação, nos grupos de acompanhamento dos processos sindicais, no coletivo da escola ou no coletivo de Orientação Pedagógica. É nessa conjuntura que penso sobre minha atuação cotiana, sobre as implicações

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de meu cargo e de meu trabalho na configuração dialética das tentativas de luta contra esse sistema que oprime, divide, segrega, coopta e desumaniza os sujeitos.

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Espelho, espelho meu...

Pareceu-lhe, então, meditativa, que não havia homem ou mulher que por acaso não se tivesse olhado ao espelho e não se surpreendesse consigo próprio. Por uma fração de segundo a pessoa se via como um objeto a ser olhado. (Clarice Lispector)

Na tentativa de encontrar na figura exterior os ecos da figura interna (ou na interna, os ecos da figura exterior), apresentarei um esboço de minha trajetória profissional. Diferente do registro para a Dissertação de mestrado, neste texto buscarei problematizar o presente (ou seja, meu trabalho de Orientadora Pedagógica) a partir dos fios, dos dramas e da tessitura da caminhada na formação e na profissão docente.

Olhando para o espelho, aventuro-me na análise e na escrita de mim – leitura e escrita que se implicam, porque este processo de escrever sobre/a minha história está imbricado ao movimento de leitura dos acontecimentos, no exercício de olhar e dar sentido ao vivido.

Sou Orientadora Pedagógica na Rede Municipal de Ensino de um município localizado a 100 km de São Paulo. Atuo neste cargo desde 2008, trabalhando na mesma unidade escolar que atende aproximadamente 400 alunos entre as modalidades de Educação Infantil e Ensino Fundamental.

Minha inserção nesta Rede de Ensino se deu via concurso público de provas e títulos, algo que irei detalhar em outro momento deste texto. Importante esclarecer que, antes deste cargo, atuava como professora de Ensino Fundamental na Rede Estadual de Ensino de São Paulo, no município de Oriente. Optei por arriscar-me em outra cidade com o intuito de mudar a trajetória e dar novos sentidos à caminhada. As intempéries da vida, por vezes, provocam necessidade de mudanças. Precisava respirar outros ares! Oriente transformou-se em um cubículo deveras asfixiante.

Contudo, a experiência docente vivida nos dois anos que atuei na Rede Estadual marcaram consideravelmente a maneira como analiso o trabalho pedagógico e como desenvolvo minhas atividades na Orientação Pedagógica. Realizei com os alunos de Primeira Série do Ensino Fundamental propostas muito diferentes das que desenvolvi com as duas primeiras turmas no início da carreira do magistério. As interlocuções (outros profissionais, estudo/pesquisa, universidade) foram instrumentos significativos para a reelaboração nos

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modos de ensinar em sala de aula. Ou, como registrou Smolka (2012), nos gestos de ensinar em sala de aula.

Tomo como eixo de análise das reelaborações na prática docente, especialmente, as propostas de alfabetização e de trabalho com a linguagem escrita. Talvez esse eixo seja para mim um dos pontos mais significativos de desenvolvimento do trabalho na escola, não só como professora, mas também como Orientadora Pedagógica. As vivências na alfabetização, hoje revisitadas por intermédio das diferentes leituras, discussões, reflexões e dos diferentes estudos, diálogos e acompanhamento de outras práticas docentes, foram (e são) formas de elucidar as dúvidas, as dificuldades, as conquistas, as descobertas, as atividades. É uma rede complexa de múltiplos significados sobre a aprendizagem, o ensino, as relações, a intersubjetividade, a docência e a dimensão política do ato pedagógico.

Fui alfabetizada por Maria Julia!

Registrar esse fato pode nos remeter à professora da 1ª série2 do Ensino Fundamental.

Lembrar da cartilha “Caminho Suave” utilizada diariamente nas aulas daquela escola de São Bernardo do Campo, em 1987: desenhos, letras, sílabas...frases. Tudo muito colorido! Um livro!

Mas, Maria Julia não era a professora! O nome dela era Maria José! Duas Marias que marcaram meu processo de alfabetização!

Entretanto, a que me recordo, emocionada, é a Maria Julia (mãe), que estudou até a 4ª série. Leitora do mundo, da vida, das pessoas... e, também, dos diferentes escritos: das palavras. Talvez ela seja, no sentido elaborado por minhas vivências, a imagem verdadeira da frase teorizada por Paulo Freire (1992): “A leitura do mundo precede a leitura da palavra”!

Através dos nomes dos sujeitos da nossa família, Maria Julia ensinou-me a ler.

As letras não eram apresentadas isoladamente, mas na conjuntura daquelas palavras repletas de significados e sentidos. Eram os nomes das pessoas com as quais eu compartilhava os meus dias, o meu cotidiano, a vida!

Na escola, utilizando a cartilha da Maria José, Ivo via a uva! E eu, com a Maria Julia, via os gibis! Via meu pai, leitor assíduo do jornal, curioso, interessado. Demonstrava grande entusiasmo através da relação com a leitura: queria conhecer, obter informações, compreender este mundo! E só havia cursado a 1º série!

2 Em janeiro de 2006, o Senado aprovou o Projeto de lei n° 144/2005 que estabelece a duração mínima de nove

anos para o Ensino Fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos seis anos de idade. Anteriormente, o Ensino Fundamental era organizado em 8 anos e subdividido por série.

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Tantas foram as leituras realizadas, tantas foram as intervenções, as relações, que aprendi a ler: apropriei-me desse sistema complexo.

Contudo, no primeiro ano de magistério, Maria Julia não estava presente em minhas propostas. No exercício árduo de ser professora, de ensinar a ler e escrever, contraditoriamente, optei por Maria José. Não usava a cartilha “Caminho Suave”, mas as atividades planejadas e desenvolvidas com os alunos seguiam, no geral, a mesma metodologia: letras, sílabas, palavras.

Por ter estudado no CEFAM3 (Centro de Estudos, Formação e Aperfeiçoamento do

Magistério), queria fazer diferente. Ainda em tenra idade (apenas 14 anos), no âmbito de uma formação contextualizada por atividades diversificadas, pude conhecer alguns teóricos e diferentes perspectivas. Pude analisar, junto aos/as meus/minhas colegas de turma e aos/as mediadores/as (professores/as), muitas situações de sala de aula que só fizeram sentido em anos posteriores.

O desejo de ser uma professora diferente era imperioso! E esse objetivo estava relacionado às críticas elaboradas durante os estágios realizados nos três últimos anos de formação.

Algumas cenas podem ser registradas: turma de 2ª série, 30 alunos (cópia de texto registrado na lousa, professora tentando explicar a proposta, alunos correndo, arrancando partes do piso para jogar nos colegas; carteiras jogadas, chutes); turma de 1ª série, 32 alunos (na lousa “Ma-Me-Mi-Mo-Mu”, cópia das palavras Macaco, Mala, Mola); turma de 4ª série, 34 alunos (professor passando lição na lousa: situações problema de matemática; muitos alunos não compreendiam o que era para ser realizado; perguntavam, falavam; alguns gritavam; professor jogava giz, quebrava régua na cabeça de aluno).

Em outro contexto de estágio, após uma semana em sala de aula, presenciando propostas de cópia e silabação, tivemos que realizar atividades externas de reforço. Os/as professores/as não queriam estagiários/as em sala, utilizando o argumento de que estavam sendo vigiados e analisados. De fato, as nossas análises eram realizadas, baseadas em críticas relacionadas à prática docente de alfabetização. Eram análises marcadas pelos estudos desenvolvidos no Curso de Formação. Não sabíamos como proceder de maneira diferente,

3“Pelo Decreto nº 28.089, de 13/01/1988 e Resolução SE nº 14, de 55 28/01/88 , é criado o Centro Específico de

Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM) na rede estadual de ensino paulista. Projeto que já se efetivara em nível nacional. Experiência concreta do MEC na intenção de formar um bom professor” (SALVADOR, 2000, p. 61). Em 2005, no Governo de Geraldo Alckmin, o Projeto foi extinto.

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porém não concordávamos com as propostas trabalhadas com os alunos: listas de sílabas e palavras soltas, descontextualizadas.

Atuando como professora alfabetizadora, no meu primeiro ano de magistério na Rede Municipal de Ensino de Marília, algumas questões eram frequentes: quais as relações entre meu trabalho e as teorias aprendidas? Em quais pastas ficaram arquivadas as grandes reflexões e ideias do estágio realizado? Por qual motivo estava reproduzindo as mesmas propostas das quais critiquei e não conseguia desenvolver um trabalho diferente com meus/minhas alunos/as?

Talvez essas questões estejam relacionadas às críticas existentes entre a formação inicial e a atuação docente em sala de aula, no que se refere às poucas contribuições referentes aos aspectos metodológicos.

Trabalhando com uma turma de 1ª série, encontrei diferentes e complexas dificuldades, dentre elas a organização e o planejamento de propostas significativas e qualitativas aos/as alunos/as. Tinha dúvidas quanto ao que iria propor. Entretanto, não recebi nenhuma orientação. As professoras que já trabalhavam na escola trocavam poucas informações com as iniciantes. Era como se todos soubessem o que, exatamente, fazer em sala de aula. Via-me na solidão da profissão, sem quase nenhum saber fazer. Como salientou Fontana (2000), na escola, dificilmente, se encontra quem nos ensine no próprio trabalho. Anjos (2006) também problematiza a questão do início da carreira docente: os modos de atuar e fazer não são discutidos, expostos e refletidos.

Fui percebendo, no cotidiano escolar, que as demais professoras iniciantes, também, apresentavam dúvidas sobre como alfabetizar, como planejar as atividades e sobre a metodologia a ser utilizada em sala de aula. Num determinado encontro, solicitamos apoio das demais professoras, entretanto apenas uma delas mostrou seu caderno de planejamento e relatou: “a gente utiliza o texto...depois escolhe uma palavra e estuda a palavra com os alunos”. Observando o planejamento e algumas propostas da professora, verifiquei que se tratava de atividades envolvendo a silabação como recurso, utilizando-se do discurso de trabalho com o texto.

Na solidão da sala de aula, frente aos 38 alunos de 6 a 7 anos, vi-me utilizando a mesma metodologia que tanto teci fortes críticas. Tentava algumas inovações e atividades diferenciadas, buscando referência nos estudos já realizados no contexto de formação (CEFAM), mas a base do trabalho estava estritamente imbricada ao meu percurso de aluna no ensino fundamental.

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Dois anos depois, aceitei o desafio de assumir a função de Professora Coordenadora4.

Hoje penso que foi uma grande ousadia de minha parte. Se enfrentava dificuldades em sala de aula, como assumir um trabalho de Coordenação Pedagógica?

Contraditoriamente, foi nessa função que mais aprendi sobre a docência. Coordenava o trabalho no sentido de organizar as demandas/ necessidades dos/as professores/as, pesquisar referências e materiais, mediar as reuniões pedagógicas, analisar as propostas e compartilhá-las. Todavia, foi na leitura dos planejamentos semanais, nas observações de sala de aula, na escuta atenta às queixas, às dúvidas, às dificuldades, aos relatos de cada docente, na relação construída com os/as profissionais, alunos/as e comunidade, que constituiu-me num processo de ressignificação sobre a atuação inicial de professora.

A Coordenação Pedagógica, vivenciada por 5 anos, foi uma “escola formativa” no sentido apresentado por tantos/as pesquisadores/as, que caracterizam a escola como contexto de formação continuada.

Ao optar por retornar à sala de aula, em outra Rede de Ensino, as propostas trabalhadas com os/as alunos/as estavam marcadas pela experiência na Coordenação Pedagógica, articulada a outros contextos (Universidade e grupos de pesquisa). As atividades, ora trabalhadas no início da docência e desenvolvidas com as duas primeiras turmas, “deram espaço para escrita de textos (individuais, em duplas, em grupos). “A escrita e a leitura faziam parte da rotina da sala: varal do fim de semana, produção de livros e álbuns, autoria de histórias, dramatizações, reescritas de poesias...” (BRITO, 2011, p.42).

Narrar acontecimentos desses diferentes lugares ocupados – aluna, estudante de magistério, professora iniciante, Professora Coordenadora, professora alfabetizadora e Orientadora Pedagógica – possibilita indícios para a leitura do que faço, do que falo, do que concebo e de como desenvolvo algumas ações e atividades.

É o olhar para o espelho e flagrar-se (ou não!). São imagens produzidas que nem sempre coincidem com as imagens que os outros possuem/ constroem de mim (BAKHTIN, 1997).

Para dialogar com a epígrafe de Clarice Lispector sobre o espelho e o objeto a ser olhado, faço também referência à obra de Frida Kahlo que mais me impacta, seja pela imagem (in)tensa, seja pelos sentidos provocados: As Duas Fridas.

4 Importante esclarecer que nessa Rede de Ensino o trabalho de Professor/a Coordenador/a é realizado por um/a

professor/a afastado/a de sala de aula. Não há concurso público para preenchimento de vagas referentes a essa função.

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Figura 01 – As Duas Fridas, 1939

O encontro com essa obra se deu na ocasião de uma Disciplina do curso de Mestrado, oferecida pela professora Corinta Geraldi, em 2009. Foi a partir do filme e da análise de algumas obras que tecemos reflexões sobre autoconhecimento, imagens produzidas sobre o/ do “eu”, “olhar-se no espelho”. Frida retratou a sua alma, a situação da mulher, pintou ela mesma justificando que era o que mais conhecia. Essa singular artista apresenta, em seus registros, a multiplicidade de mulheres, as quais se constituía. Me faz pensar, também, no meu processo de constituição. Na mulher que me tornei (a qual me torno, cotidianamente). Na luta contra a opressão de uma sociedade culturalmente marcada por concepções machistas. Eu:

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muitas mulheres! Um feixe de inúmeras mulheres! Na resistência, no combate frequente para marcar que há muitas possibilidades de ser mulher. Não preciso seguir, nem me adequar a padrões. Nas vivências (entre mim e os/as outros/as, entre mim e as imagens que produzi/ tenho, entre mim e os contextos). Posso transgredir. Posso trans-por. Posso trans-seguir. Trans-vestir. Trans- ser. Trans-formar. Travessias. Deslocamentos. Mudanças.

As obras emanam possibilidades de pensar em/sobre si, revisitar acontecimentos, deparar-se com o entrecruzamento de tempos para refletir sobre o que somos e o que poderíamos/podemos ser. Essa reflexão pode criar, através da memória e do discurso narrativo, oportunidades de se olhar.

Dessa forma, a obra As Duas Fridas, me traz à memória recordações e lembranças. As

Duas Fridas – no elo entre a Criança e a Estudante: as festas em família, os aniversários, o

almoço de domingo, os passeios com o pai, o cuidado da mãe, a aprendizagem da leitura e escrita, a observação das irmãs a caminho da escola, o desejo de estudar, a ida à escola no Ensino Fundamental, as dificuldades nas aulas de Educação Física, a cartilha “Caminho (nada) Suave”, o Raul Seixas cantado pelas irmãs, as mudanças constantes de casa e de cidade, as peças teatrais escritas, a timidez e o medo de falar em público, os estudos na área de casa, os questionamentos de minha mãe, o controle inquestionável de meu pai, o medo, a chegada dos sobrinhos. As Duas Fridas – no elo entre a Aluna de Magistério e a Professora

Iniciante: o anseio por estar no CEFAM, a seleção, a lista com os aprovados, as aulas, a

banda Legião Urbana, o Grêmio Estudantil, as greves, as manifestações, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o estágio (horas que nunca tinham fim), a caixa de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), as amizades, os primeiros namoros, as primeiras decepções, mais sobrinhos, o vestibular, a UNESP (o sonho), a formatura, os concursos, as aprovações, a escolha, a Rede Municipal de Ensino de Marília, a primeira turma, os 38 alunos, o não saber ser professora, a vontade de desistir. As Duas Fridas – no elo entre a

Professora e a Coordenadora: as relações (tensas) na escola, o prédio novo, a chegada da

diretora, a inserção da função de Professor/a Coordenador/a, o processo seletivo, a avaliação do trabalho, a ousadia, os desafios, os choros angustiantes no banheiro, o encontro com o Alexandre, o casamento, a chegada de mais sobrinhos, o envolvimento com a igreja, a mudança de escola, a participação no grupo de pesquisa, as aprendizagens sobre a/da docência. As Duas Fridas – no elo entre a Profissional desencantada e a Pesquisadora: a desistência da função, um novo concurso, a inserção na Rede Estadual de Ensino de São Paulo, a escola de Oriente, as vivências com os/as alunos/as, as aulas, a vontade de lecionar, a

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aprendizagem das crianças, a aluna ouvinte de mestrado, o rascunho de um projeto de pesquisa, a perda de meu pai, o sufoco, o medo de não conseguir continuar, mais decepções, a vontade de mudar, a configuração da coragem, os novos concursos, a nova cidade, o retorno à Orientação Pedagógica, os novos desafios, as novas amizades, o encontro com Odirlei (meu Diretor, amigo e irmão de jornada), a busca por grupo de pesquisa, a reescrita do projeto de pesquisa, a chegada à UNICAMP, o encontro com Ana Luíza Smolka para além dos livros e textos, as novas relações, uma nova possibilidade de trabalho, os obstáculos, os dramas, a dissertação, uma escola outra, as idas e vindas de profissionais, as partidas das vices, a chegada da Fran (Vice Diretora e companheira), as dúvidas sobre as ações no cargo, a inquietude, o desejo de continuar a pesquisa. As Duas Fridas – no elo entre a Profissional e

a Militante: o doutorado, as aulas de francês, a separação, o reencontro com sensações, o

amigo transformado na possibilidade de uma nova história (Michel), as leituras, os congressos, os grupos de discussão, o Plano Municipal de Educação, as lutas, a política, o sindicato, as (in)compreensões, a ilusão descortinada, o flagrar(se), os discursos libertos (enunciados, gritados), a tentativa de organizações, a morte de minha mãe, as transformações, o personagem estilhaçado, a dor (imensa dor), a falta constante de ar (deixaria de respirar?), a força para seguir.

São As Duas Fridas que dão indícios das contradições, dos diferentes lugares ocupados, das diferentes posições assumidas, do ontem e do hoje, do hoje e do amanhã, da dor e da alegria, da covardia e da coragem, dos inúmeros sujeitos e das emoções que foram (são) desenvolvidas neste emaranhado complexo que é a vida.

Mergulhada nas (não) compreensões, a pesquisa, então, se configura por minhas inquietações.

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Não compreendo! – a inquietude

Mas de vez em quando vinha a inquietação insuportável: queria entender o bastante para pelo menos ter mais consciência daquilo que ela não entendia. Embora no fundo não quisesse compreender. Sabia que aquilo era impossível e todas as vezes que pensara que se compreendera era por ter compreendido errado. Compreender era sempre um erro – preferia a largueza tão ampla e livre e sem erros que era não entender. (Clarice Lispector)

O não entender, as dúvidas, as incertezas, os conflitos e os dramas constituem o tecido da atividade investigativa.

A finalização da escrita da Dissertação5 colocou-me numa atividade de reflexão sobre

a minha forma de atuar no contexto da escola. Essa reflexão foi mobilizada pelo enunciado de uma colega de trabalho, num encontro realizado na pesquisa de doutorado de Anjos (2013), o qual fui uma das participantes. Nesta ocasião, cinco Orientadores/as Pedagógicos/as foram reunidos/as para um diálogo sobre a organização da Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPC (ou Trabalho Docente Coletivo – TDC, como é denominado no município de Campinas/ SP, local de realização do encontro).

Os discursos produzidos nesta reunião deram indícios sobre marcas que caracterizavam um modo de organizar a atividade de HTPC ou TDC. Todavia, surgiram muitas controvérsias6 sobre como conduzir tal atividade.

O relato apresentado sobre meu trabalho evidenciou a ênfase nos estudos para desenvolvimento dos encontros com os/as professores/as, no âmbito da escola. Estudos realizados a partir da seleção de textos que abordavam necessidades apontadas pelos/as docentes e que eram problematizados pelas práticas planejadas e realizadas em sala de aula. Ou seja, os textos se apresentavam como instrumento mediador para reflexão sobre a prática

5 Orientação pedagógica: um trabalho de atuação e intervenção no contexto escolar. Dissertação de

Mestrado. Universidade de Campinas, 2011.

6 De acordo com Clot (2006c, p.106), “o pensamento se desenvolve na discussão, na confrontação e, portanto, a

controvérsia é a fonte do pensamento. [...] Assim, nas situações criadas no método, os trabalhadores são solicitados a pensar. Pede-se a trabalhadores da mesma profissão que discutam seu trabalho. A descoberta prática é de que o diálogo profissional é uma fonte do pensamento individual, assim, o coletivo é uma fonte do pensamento individual. Coletivo entendido como confrontação e intercâmbio”.

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docente e, numa relação dialética, eram (re)significados. Isso porque, conforme enfatizei na dissertação,

É possível afirmar que os professores elaboram conhecimento e utilizam teorias que sustentam e subsidiam as ações em sala de aula. [...] pude perceber que os professores, também, elaboram práticas que embasam teorias e pesquisas historicamente elaboradas. Produzir conhecimento é uma forma de pensarmos a realidade da qual fazemos parte e que, ao mesmo tempo, nos produz. A escola representa, então, contexto de formação por priorizar o diálogo entre as práticas dos professores e os saberes teóricos. (BRITO, 2011, p.182)

Diferentes pesquisas sobre a organização da HTPC ou do TDC apontam um pressuposto genérico de que a reunião pedagógica semanal seja um contexto de formação. Porém, dos/as cinco Orientadores/as Pedagógicos/as presentes, fui a única que defendeu com maior ênfase a prática do estudo, sendo literalmente questionada por uma das colegas: “uma coisa Ana Paula que eu fico... pensando se não fica uma relação de você professora delas.[...] Se eu tivesse dando aula no curso de pedagogia para um grupo de professoras a minha postura seria completamente outra lá do meu grupo de professoras. Entende? Eu acho que assim, eu não sou professora delas. Eu sou uma outra pessoa do grupo, com outra função, e que aí assim... eu acho que tem que trazer mesmo, e isso você falou de, tem hora que tem que ser dito, mas como é que isso pode ser feito? Olha, isso pode ser feito assim, assim, assim assado. Precisa disso, né. A gente precisa disso... Mas a relação, e aí eu fico pensando, que essa coisa, como mobilizar os conhecimentos necessários pra discussão ali sem ser um tom professoral, porque eu não sou professora delas. Eu não sou professora das professoras. Eu não acho que eu sou professora delas”.

Naquele momento, por uma fração de segundos, me vi como um objeto a ser, exatamente, olhado.

Se a HTPC ou o TDC possuem como princípio genérico a formação continuada, o fato de somente eu evidenciar e marcar o aporte teórico como central neste contexto me possibilita elencar algumas questões: seria a formação continuada uma característica da atividade desta reunião semanal? Ou seria essa ação uma marca peculiar da minha concepção de trabalho? Configurada como ação peculiar, que outras possibilidades podem ser planejadas para essas reuniões, pensando na perspectiva de formação continuada?

Importante evidenciar que essa maneira de pensar e realizar a HTPC foi constituída a partir das duas experiências vivenciadas no município de Marília/ SP: como professora em sala de aula e como Professora Coordenadora.

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Conforme relatei, no início da docência enfrentei as dificuldades em trabalhar com os/as demais professores/as no planejamento e reflexão sobre o trabalho pedagógico. As reuniões coletivas não eram organizadas para esse objetivo. Aliás, analisando algumas pesquisas sobre o desenvolvimento dos encontros entre os/as professores/as no contexto da escola, é possível perceber que, geralmente, o foco centra-se em aspectos administrativos (informações sobre eventos e atividades da escola). Porém, as legislações prescrevem que as reuniões coletivas da escola sejam utilizadas para estudo, planejamento e reflexão entre os/as docentes. São inúmeros e múltiplos os aspectos que intervém nessa dinâmica, dentre os quais podemos citar: as condições concretas de trabalho, a formação dos sujeitos envolvidos, os objetivos compartilhados na escola e as relações configuradas neste contexto.

As Horas de Trabalho Pedagógico Coletivas (HTPC), de acordo com o destacado em minha Dissertação, podem significar

contexto de potencialização da produção de saberes, dialogando com teorias, pesquisas e experiências que foram compartilhadas, produzindo, assim, a legitimidade da autoria dos professores, pois o trabalho desenvolvido deu visibilidade ao conhecimento produzido na escola, a partir das reflexões sobre as atividades, sobre o ensino e sobre as condições efetivas de trabalho. (ibidem, p.180)

Vejo neste contexto a possibilidade de interlocução e, principalmente, de apoio aos/as professores/as que estão iniciando o trabalho na carreira profissional ou na escola.

Em 2000, assumi a função de Professor/a Coordenador/a e levando em consideração as dificuldades encontradas em sala de aula e na escola, decidi (junto a outra Professora Coordenadora) organizar as reuniões coletivas de maneira diferente.

Para tanto, encontrei apoio em dois âmbitos: nos encontros semanais entre Professores/as Coordenadores/as da Rede Municipal, organizados pela Secretaria de Educação, e nos estudos oportunizados no curso de Pedagogia (UNESP – Marília/SP), principalmente nas disciplinas do Departamento de Didática.

Nas reuniões semanais entre Professores/as Coordenadores/as, estudávamos temas comuns para o desenvolvimento do trabalho nas escolas. Eram temas definidos ora pela Secretaria de Educação (como princípio de política pública), ora definidos pelos/as próprios/as Professores/as Coordenadores/as, a partir das necessidades observadas nas escolas. Para o planejamento coletivo de ações, partíamos da leitura de diferentes produções acadêmicas, que subsidiavam nossas reflexões.

Foi este movimento (de análise e estudo) que também identifiquei na Universidade. Os/as professores/as do Departamento de Didática (UNESP/ Marília – SP), interlocutores/as

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neste processo de constituição, encontravam-se engajados em projetos de extensão circunscritos em diferentes escolas públicas. Nesse sentido, os textos lidos e discutidos na Universidade eram problematizados a partir da experiência dos/as docentes/as e da experiência dos/as colegas que já lecionavam.

A experiência de trabalho na Coordenação Pedagógica (2000 a 2005) impactou os modos de pensar a docência, o desenvolvimento dos sujeitos e o próprio conceito de educação. Considero como determinantes nesta ressignificação alguns aspectos: as relações entre os/as profissionais da escola, a análise coletiva das propostas planejadas/ desenvolvidas em sala de aula e os estudos das produções e pesquisas já produzidas.

Ao retornar à sala de aula, em 2006 (quando optei por deixar a função de Coordenação Pedagógica por ter sido aprovada no Concurso Público da Secretaria de Educação do Estado de SP), deparei-me com outra possibilidade de trabalho. Um contexto no qual as minhas novas concepções viabilizaram uma produção docente diferente para mim e para os/as alunos/as.

Dessa forma, é possível ter indícios do aporte teórico como fundante em minha constituição profissional. São essas experiências e essas marcas que me fazem enfatizar a importância da escola e do conhecimento.

Concordo com Saviani (2012, p. 13) ao destacar a função da escola pública no desenvolvimento da sociedade e dos sujeitos: “o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens”.

É nessa luta política e ideológica que me inscrevo cotidianamente.

Assim, ao concluir o mestrado, o intuito era não somente conhecer outras formas existentes de ser e agir na Orientação Pedagógica, mas, sobretudo, analisar a relação entre esta atividade profissional e o desenvolvimento dos/as alunos/as, dos/as professores/as e da escola. Isso devido a importância que atribuo à função da escola e à apropriação do conhecimento historicamente produzido, como instrumentos fundamentais no processo de desenvolvimento dos sujeitos, questões que serão evidenciadas subsequentemente.

Me inscrevi, então, novamente no processo de pesquisa, com a finalidade de dialogar com outros/as profissionais que ocupam o mesmo cargo e analisar os diferentes modos de atuação na escola. Aventurei-me em direção ao “país do outro” (AMORIM, 2004). Uma viagem delineada por imprecisões, (des)encantamentos, embates, jogo de imagens e descobertas.

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NO PAÍS DO OUTRO: A RELAÇÃO ENTRE A PESQUISA, O MÉTODO E A PRODUÇÃO DE SENTIDOS

Na verdade o que queremos propor é a ideia de que o pesquisador pretende ser aquele que recebe e acolhe o estranho. Abandona seu território, desloca-se ao país do outro, para construir uma determinada escuta da alteridade e poder traduzi-la e transmiti-la. (Marília Amorim)

Tentativas de acolher o estranho.

Um estranho não tão estranho assim. Afinal, faço parte do métier. Sou Orientadora Pedagógica.

Assim, tentei exilar-me na investigação com a difícil atividade de construir a escuta da alteridade. Condição de produção complexa.

Inicialmente, é importante enfatizar que o desenvolvimento da pesquisa se torna necessário uma vez que não há relação direta entre a essência e a forma, entre o que é e o que se parece ser (VIGOTSKI, 1999). Dessa maneira, a investigação é imprescindível na perspectiva de elaborar compreensões e interpretações sobre o objeto a ser estudado e as relações produzidas.

A pesquisa, assim, tem por objetivo entender os eventos investigados a partir da descrição dos mesmos, buscando as possíveis relações, integrando o individual e o social (FREITAS, 2010). Ou, nas palavras de Vigotski (1999, p.145) “[...] não devemos estudar os processos psíquicos e fisiológicos de forma separada. [...] considerar ao mesmo tempo os aspectos subjetivos e objetivos”.

Em Ciências Humanas, a pesquisa se diferencia da metodologia das Ciências Exatas, por estudar o homem em sua totalidade e em sua especificidade. Isto posto, precisamos considerar o homem não como coisa ou fenômeno da natureza, mas como um ser expressivo e falante (BAKHTIN, 1997).

A partir dessas considerações, a perspectiva Histórico-Cultural compreende a pesquisa como relação entre sujeitos possibilitada pela linguagem, portanto, um processo dialógico que não é harmonioso e desprovido de conflitos (GERALDI, 2007). Assim, considera-se este processo investigativo como arena de circulação e confronto de discursos (FREITAS, 2010). Isso porque múltiplos discursos são produzidos nessa inter-relação, emergindo significados

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diversos que não são apreendidos numa perspectiva de transparência. Há uma opacidade que convoca o pesquisador ao trabalho de análise, considerando o contexto e as relações de força de produção dos discursos. Seja por oposição ou acordo, há uma composição de diálogo que atravessa o texto e se constitui como tensão. Pressupomos, aqui, a ideia de alteridade em torno da qual se tece a essência do trabalho e pesquisa em Ciências Humanas. É na análise das relações com o outro que se constitui o trabalho do campo de pesquisa e da produção escrita. “O outro aqui é o interlocutor do pesquisador. Aquele a quem ele se dirige em situação de campo e de quem ele fala em seu texto” (AMORIM, 2004, p.22).

O desenvolvimento da pesquisa segue, à vista disso, para a compreensão dos sujeitos envolvidos como também para a compreensão do contexto, a partir de questões que se orientam pela complexidade dos fenômenos em seu acontecimento histórico. Essa compreensão é produzida pelas relações intersubjetivas entre pesquisador e pesquisado, a partir das posições ocupadas, num processo ativo de reflexão e ressignificação dos sujeitos e dos acontecimentos.

Nessa dimensão, há sempre um sujeito que fala e um pesquisador que o estuda, sendo ambos produtores de textos, de enunciados e de discursos. O trabalho de pesquisa visa o encontro com um outro, um interlocutor, destacando o lugar da palavra deste como problema a ser considerado no texto. Ou seja, o pesquisador assume uma posição de produção de sentidos com os sujeitos da pesquisa. Produção constituída no encontro dos diferentes enunciados elaborados entre pesquisador e pesquisado. Neste encontro, o pesquisador é parte e, ao mesmo tempo, assume uma posição exotópica, descrevendo e revelando outros textos e contextos (FREITAS, 2007).

Importante, aqui, explicar o termo exotopia. Segundo Bakhtin (1997, p. 35), exotopia é o

[...] que permite juntar por inteiro um herói que, internamente, está disseminado e disperso no mundo do pré-dado da cognição e no acontecimento aberto do ato ético; que permite juntar o próprio herói e sua vida e completá-lo até torná-lo um todo graças ao que lhe é inacessível, a saber, a sua própria imagem externa completa [...].

Cada sujeito tem de si uma visão temporal e parcial que é completada pelo horizonte de um outro, ocupando uma visão exterior. Possibilita, assim, a compreensão de si mesmo por ampliar o campo de percepção e revelar aquilo que é desconhecido. São os desdobramentos de olhares produzidos por uma posição exterior. Olhares que nunca coincidem, pois cada sujeito ocupa um determinado lugar de onde pode enxergar e produzir sentidos.

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Para Amorim (2007, p. 14), enquanto pesquisador, a tarefa é sempre tentar captar algo do modo como o outro se vê, “para depois assumir plenamente meu lugar exterior e dali configurar o que vejo do que ele vê”.

Aí reside a dimensão ética e o ato responsável do pesquisador. No âmbito do acontecimento, do contexto histórico, torna-se necessário “responder” por ele, no sentido de responsabilizar-se por aquilo que se produz, numa arena de confronto entre diferentes valores. Essa produção se torna ética na medida em que se assume o pensamento ou a obra numa posição singular frente a outras posições singulares.

No jogo de imagens produzidas, entre o que o pesquisador elabora e o que o outro enxerga de si mesmo, há diferenças essenciais de posições e de valores.

A beleza desse processo situa-se exatamente nessas relações constituídas, nas quais o ponto de vista do “cineasta” (pesquisador) é constantemente transformado pelo “personagem” (pesquisado), que, numa alteração recíproca, também se transforma (AMORIM, 2004). O pesquisador assume, portanto, lugar de autor e sujeito da pesquisa, produzindo, na relação com o outro, possibilidades outras de conhecimento.

Isso implica, nas considerações de Bakhtin (1997, p. 291), uma atitude responsiva ativa por parte do pesquisador, uma vez que

[...] concorda ou discorda (total ou parcialmente), completa, adapta, apronta-se para executar, etc., e esta atitude do ouvinte está em elaboração constante durante todo o processo de audição e de compreensão desde o início do discurso, às vezes já nas primeiras palavras emitidas pelo locutor. A compreensão de uma fala viva, de um enunciado vivo é sempre acompanhada de uma atitude responsiva ativa (conquanto o grau dessa atividade seja muito variável); toda compreensão é prenhe de resposta e, de uma forma ou de outra, forçosamente a produz: o ouvinte torna-se o locutor.

Nesse sentido, portanto, não se realiza pesquisa de sujeitos, mas se desenvolve pesquisa com os sujeitos, elaborando análises conjuntas sobre suas vivências históricas, sociais e culturais. O pesquisado, também, assume uma atitude responsiva ativa, visto que o processo investigativo é convertido num espaço dialógico.

A pesquisa é este encontro entre duas consciências, sujeitos que se alteram e se interpenetram num processo mútuo. Este contato elabora/move significados e determina seu desenvolvimento, por intermédio da palavra executada, fonte do comportamento social e da consciência. A linguagem, dessa maneira, possibilita o desenvolvimento de complexas relações e de novas formas de comportamento. (VIGOSTKI, 1999).

Na busca da conversão dos fenômenos concretos em objetos científicos, as concepções de mundo, homem e sociedade configuram a organização metodológica e conceitual do

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