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Limites e potencialidades do uso de tirinhas na significação de conceitos de física no ensino médio

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0 UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO

GRANDE DO SUL

DIONEI RUÃ DOS SANTOS

LIMITES E POTENCIALIDADES DO USO DE TIRINHAS

NA SIGNIFICAÇÃO DE CONCEITOS DE FÍSICA NO

ENSINO MÉDIO

Ijuí 2013

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1 UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO

GRANDE DO SUL

Programa de Pós Graduação de Educação nas Ciências

DIONEI RUÃ DOS SANTOS

LIMITES E POTENCIALIDADES DO USO DE TIRINHAS

NA SIGNIFICAÇÃO DE CONCEITOS DE FÍSICA NO

ENSINO MÉDIO

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Educação nas Ciências da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ

Orientadora: Lenir Basso Zanon

Ijuí 2013

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2 S237l Santos, Dionei Ruã dos.

Limites e potencialidades do uso de tirinhas na significação de conceitos de física no ensino médio / Dionei Ruã dos Santos. – Ijuí, 2013. –

82 f. : il. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí e Santa Rosa). Educação nas Ciências.

“Orientadora: Lenir Basso Zanon”

1. Física. 2. Ensino médio. 3. Ensino de física. 4. Recursos didáticos - tirinhas. I. Zanon, Lenir Basso. II. Título.

CDU: 53:373.5

Catalogação na Publicação

Aline Morales dos Santos Theobald CRB10/1879

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Resumo

A problemática em estudo diz respeito ao crescente e preocupante desinteresse dos estudantes para participar nos processos de construção dos conhecimentos escolares, em especial, nas disciplinas da Física, Química, Biologia, Matemática. Na pesquisa, a atenção foi direcionada para a participação de conhecimentos cotidianos ou científicos expressos pelos sujeitos, em tais processos, a partir do entendimento de que é a recontextualização de ambos na escola que permite os processos de (re) significação conceitual. Nesse contexto, buscou-se compreender a potencialidade e os limites do uso das Tirinhas como recurso didático em sala de aula, quanto a características e relações no desenvolvimento do ensino escolar, cientes de que a apropriação dos conceitos científicos na mente de um aprendiz aliada com significação e evolução conceitual são fatores a serem observados conscientemente pelos professores. Nesse sentido, um dos focos de estudo diz respeito aos possíveis obstáculos epistemológicos (Bachelard, 2004) ao aprendizado das ciências, a exemplo do realismo e animismo, constituindo-se em limites no uso das Tirinhas como

ferramenta pedagógica. A análise dos dados levou em conta, também, o

referencial histórico-cultural. Para construção dos dados a pesquisa de campo abrangeu uma turma de primeiro ano de ensino médio, na disciplina de Física, envolvendo conteúdos de Eletricidade. Foram sujeitos de pesquisa os 35 alunos, nessa disciplina, com utilização das Tirinhas nas aulas, nas quais foram abordados conteúdos e conceitos referentes aos circuitos, mais especificamente, ao circuito série. São inúmeras as potencialidades de uso dessa ferramenta que, no entanto, também apresenta alguns limites, como a formação de obstáculos epistemológicos. A pesquisa permitiu percepções sobre estratégias de uso das Tirinhas no ensino como forma de potencializar a construção conceitual por uma linguagem cognitiva que associa imagem e texto, apresentando-se como forma de interação dialógica entre sujeitos acostumados com elementos da linguagem imagética. Permitiu perceber, também, a necessidade de vigilância quanto aos cuidados ao usar as Tirinhas em sala de aula, no que se refere à formação com evolução dos significados conceituais e à formação de obstáculos epistemológicos ao aprendizados das ciências. As Tirinhas potencializam os processos de significação conceitual, nas interações em aula de física e, assim, contribuem ao desenvolvimento intelectual dos estudantes, à medida que favorecem os sistemáticos movimentos de “ir e vir”, ascendentes e descendentes (Vygotsky, 2001), entre conhecimentos cotidianos e científicos, permitindo, assim, os processos de construção do conhecimento escolar.

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Abstract

The problem under study concerns the growing and worrying lack of interest of students to participate in the processes of construction of school knowledge, especially in the subjects of Physics, Chemistry, Biology, Mathematics. In the survey, attention was directed among everyday and scientific knowledge expressed by subjects in such processes, based on the understanding that it is the recontextualization of both the school allowing the processes of (re) signification conceptual. In this context, we sought to understand the potential and limits of the use of Comic Strips as a teaching resource in the classroom, as the characteristics and relationships in the development of school education, aware that the appropriation of scientific concepts in the mind of a learner coupled with meaning and conceptual evolution are factors to be consciously observed by teachers. In this sense, a focus of study regarding potential epistemological obstacles (Bachelard, 2004) to learning the sciences, such realism and animism, consisting in the use of the limits Strips as a pedagogical tool. Data analysis took into account also the historical and cultural references. For data construction field survey covered a class of first year of high school, the discipline of Physics, Electricity engaging content. Research subjects were 35 students in this discipline, with use of Comic Strips in classes, which have been addressed content and concepts pertaining to the circuits, more specifically, the series circuit. There are innumerable potential uses of this tool, however, also presents some limitations, such as the formation of epistemological obstacles. The research provided insights into strategies for use of Comic Strips in teaching as a way to enhance the conceptual construction of a cognitive language that combines image and text, presenting itself as a form of dialogic interaction between subjects accustomed to elements of language imagery. Allowed to realize, too, the need for vigilance regarding care when using Comic Strips in the classroom, in relation to the formation and evolution of conceptual meanings to the formation of epistemological obstacles to the learning sciences. The Comic Strips potentiate conceptual signification processes, interactions in physics class and thus contribute to the intellectual development of students, as they favor the systematic movements "come and go", ascendants and descendants (Vygotsky, 2001), among everyday and scientific knowledge, thus enabling the processes of construction of school knowledge.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

CAPÍTULO 1- O USO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO ... 15

1.1 - A IMAGEM NO CENÁRIO DA SOCIEDADE ... 15

1.2 - O QUE ACONTECE NA MENTE DO APRENDIZ? ... 37

1.3 - A VIGILÂNCIA AOS OBSTÁCULOS EPISTEMOLÓGICOS NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO ... 45

1.4 – O CAMINHO PERCORRIDO NO PROCESSO DE PESQUISA ... 53

CAPÍTULO 2 – UM OLHAR AOS LIMITES E POSSIBILIDADES DO USO DE TIRINHAS EM AULA ... 58

2.1 - A ABSTRAÇÃO, GENERALIZAÇÃO E EVOLUÇÃO NA SIGNIFICAÇÃO CONCEITUAL ... 58

2.2 – AFETIVIDADE, EMOÇÃO E CONHECIMENTO ESCOLAR ... 69

2.3 – CONHECIMENTO COTIDIANO COMO OBSTÁCULO EPISTEMOLÓGICO AO APRENDIZADO DAS CIÊNCIAS ... 74

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Introdução

Em trabalhos acadêmicos, livros e eventos, muito se tem discutido sobre o preocupante e crescente desinteresse dos estudantes pela participação nos processos de construção dos conhecimentos escolares, em especial, nas disciplinas da Física, Química, Biologia, Matemática. Conceitos apresentados de forma linear, fechada e restrita pouco contribuem à aprendizagem e ao desenvolvimento humano, por impossibilitarem ou interromperem os processos de reflexão crítica e consciente sobre os próprios aprendizados. Vemos muitas aulas limitadas a uma mera reprodução verbal de definições prontas, que permite certa performance na prova, com respostas ‘ao pé da letra’, sem alterar em nada o que havia sido transmitido pelo professor ou livro didático. Não se consegue (re)contextualizar e relacionar os conhecimentos para usá-los na análise e compreensão de outras situações reais.

Sobre tais aprendizados mecânicos, superficiais, lineares e passageiros, Arroyo (2000, p. 17) discute a não-aprendizagem escolar, questionando que “apesar de muitos professores/as nos dizerem que reprovam e dormem em paz com sua consciência, não o é bem assim. [...] A reprovação tão legitimada nunca foi assimilada pela sensibilidade pedagógica que ainda habita em nós”.

Muito há que se avançar na compreensão de como promover aprendizados escolares significativos e relevantes, que permitam uma verdadeira inclusão das gerações mais jovens no mundo da sociedade tecnologicamente transformada por incessantes novos conhecimentos. Na geração constituída sob forte influência das novas tecnologias de informação, percebe-se certo imediatismo inerente aos jovens, que almejam conseguir tudo o mais instantâneo possível e, não é de se estranhar, anseiam pela obtenção rápida da resposta certa a qualquer problema. O estudante, acomodado ao mundo repleto de informações rápidas, resiste ao universo lento da construção do conhecimento escolar, que lhe exige mobilizar relações dinâmicas entre conhecimentos científicos e cotidianos diversificados.

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Durante minha Graduação sempre ministrei aulas particulares e de reforço para alunos do ensino médio que apresentavam dificuldades em aulas regulares de física. Nessas aulas percebia que: se desenhasse a situação, ou o enredo dos exemplos e exercícios, prendia a atenção dos alunos, motivava-os e interessava-os no conteúdo, trazendo clareza a exercícios que eram julgados, por eles, como complexos, difíceis e confusos. Com essa observação, passei a produzir alguns desenhos mais elaborados que traziam em sua estrutura conceitos da física em meio ao enredo fictício, sempre obtendo muito êxito nos processos de ensino-aprendizagem. Mais tarde, redesenhei essas ilustrações sob forma, então, de Historias em Quadrinhos (HQ) e Tirinhas (pequenas histórias em quadrinhos). E me empenhei, voluntariamente, em uma pesquisa1 qualitativa buscando dados acerca do uso de HQ e Tirinhas pedagógicas, como estratégia de ensino. Essa pesquisa consistiu no meu Trabalho de Conclusão de Curso, na Licenciatura em Física.

Nessa pesquisa, percebi que as HQ e Tirinhas, devido aos contextos que trazem em seu enredo, chamavam ao debate os conhecimentos cotidianos do aprendiz, chamados por alguns autores de conceitos espontâneos. Os conhecimentos cotidianos são aqueles que o estudante internaliza nas interações no meio em que vive, a partir das interações na família, nos grupos de amigos, enfim em seu meio social fora da escola.

Na época, foi organizado e desenvolvido um processo de investigação sobre minha prática, em aulas de física no ensino médio, com uso de Tirinhas, como recurso didático potencializador de aprendizados escolares significativos, ou seja, que envolvessem mais relações com situações da vida cotidiana. A pesquisa foi desenvolvida em aulas da disciplina Eletricidade I, junto a uma turma de um Curso de Eletrotécnica, em uma escola da rede estadual de ensino. A pesquisa abrangeu uma turma de estudantes da primeira etapa (módulo 1) e a escola estadual era de ensino técnico, situada no município de Ijuí, RS, no período de abril a maio de 2010.

Em uma das etapas da pesquisa a Tirinha foi inserida numa aula de física, numa atividade de sistematização com retomada e ampliação dos estudos. A Tirinha havia sido por mim elaborada, com o propósito de favorecer, pelo seu enredo, o estabelecimento de relações com alguns conceitos físicos que já haviam sido inicialmente abordados, ou seja,

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sobre os quais os estudantes já haviam tido algumas explicações em aula formal. Esse momento interativo permitiu que eu focasse o olhar na busca de entender como ocorre a mobilização de conhecimentos quando se usa essa estratégia de ensino e aprendizagem, atento à relação entre referencial teórico e dados empíricos, na perspectiva da reflexão e problematização sobre tal ensino. Busquei observar se os alunos recontextualizam conceitos cotidianos, ao explicarem as situações expressas nas Tirinhas, se conseguiam perceber relações com os conteúdos estudados, potencializando processos de aprendizagem mais significativos, no sentido de promoverem relações com conhecimentos cotidianos.

A pesquisa abrangeu duas etapas, uma com inserção de Tirinhas por mim elaboradas, como professor, no contexto de conteúdos que estavam sendo trabalhados em aula e outra na organização de uma oficina de criação de Tirinhas e HQ pelos estudantes, sobre um conteúdo já ensinado, permitindo analisar registros em agenda de campo e produções dos estudantes. Os resultados indicaram que os estudantes percebem, reconhecem e relacionam conceitos abrangidos nos enredos das Tirinhas. Percebi que as HQ e Tirinhas contribuíram para a verbalização dos conceitos cotidianos na sala de aula, trazidos à tona em seu contexto, concernente ao seu enredo, pois as Tirinhas haviam sido previamente elaboradas, repletas de potencialidades de relação com conceitos científicos.

Na etapa de criação/produção de HQ, os estudantes perceberam a necessidade de ter domínio sobre o conteúdo que estariam representando, o que os levava a expressar e repensar conceitos, estudar, pesquisar em livros, questionar o professor, elaborar textos, enriquecendo seus processos de desenvolvimento.

A maioria dos alunos percebeu as relações com conceitos inseridos na Tirinha. Alguns aprofundaram suas observações e fizeram outras análises. Outros, ainda, relataram mais exemplos de outras situações onde se utiliza o conceito representado na Tirinha, comparando a situação representada na Tirinha com situações vivenciadas em seu dia a dia. Os estudantes percebiam, no decorrer do contexto, como os conceitos podiam ser relacionados com situações cotidianas, contextualizadas e, nesse sentido, foi possível perceber a potencialidade das Tirinhas como material pedagógico enriquecedor de processos de ensino capazes de propiciar aprendizagens significativas aos estudantes.

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O ensino do conteúdo foi iniciado utilizando a Tirinha e percebi que a interação proporcionou vários focos de aprendizagem, comparando-se com o uso dessa estratégia pedagógica no início de um novo conteúdo. A etapa da criação das HQ e Tirinhas ocorreu através de um planejamento regular, ou seja, no início da aula fizeram-se explicações e buscou-se discutir os conceitos escolares sobre um conceito. Após a discussão do conteúdo, foram realizadas algumas experiências (práticas). A seguir, os estudantes foram desafiados a produzirem uma Tirinha, ou HQ, que contextualizasse algum conceito ou fenômeno físico sobre aquele conceito.

Entre o principal desafio percebido nessa atividade destaca-se o fato dos alunos se apropriarem dos conhecimentos para posteriormente usá-los em novos contextos, representando-os sob outra forma de expressão. O resultado foi surpreendente, tanto no âmbito da criatividade envolvida nos desenhos e personagens, quanto no âmbito dos conceitos/conteúdos envolvidos nas situações representadas na forma de Tirinhas. Percebeu-se que alunos que, na aula normal, não demonstraram um desenvolvimento satisfatório, tiveram que, obrigatoriamente, construir e fazer uso do conhecimento escolar, para poderem confeccionar suas Tirinhas. Qualquer ideia teria de ser apresentada e expressa de forma coerente e com correção, além de fazer sentido e, em muitos casos, ainda, utilizar-se do humor. Para tanto, o aluno que estava construindo as Tirinhas necessitava ter completo domínio do conteúdo, suas formas de representação e principalmente de linguagem. O processo os levou a revisar o conteúdo, pesquisar em livros, analisar as anotações no caderno, buscar ajuda para a compreensão, refletir sobre o conhecimento, etc.

Outro ponto a ser destacado foi o comprometimento e a motivação dos alunos ao serem desafiados a construir suas Tirinhas. Eles já haviam demonstrado maior motivação nas aulas anteriores, em que foram utilizadas as outras Tirinhas, mas neste momento ficaram ainda mais envolvidos com o conteúdo e conceitos trabalhados.

Na referida pesquisa, ficou claro o quanto esse material pedagógico (as HQ e Tirinhas) tem potencialidade para ser utilizado no processo de ensino com função de enriquecer a aprendizagem escolar. Com essas observações, busquei dar sequência ao trabalho de pesquisa que foi desenvolvido. Nesse sentido, minha atenção se voltou para o

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interesse de investigar limites e as potencialidades do uso de Tirinhas e HQ para promover processos de construção de significados conceituais, inserindo-as em temáticas contextualizadas no ambiente sócio-cultural dos alunos.

Se durante anos as HQ e Tirinhas foram vistas como vilãs por intelectuais e pensadores do ensino - que chegavam a afirmar que elas eram o estigma da sociedade -, hoje elas ganham espaço nas salas de aula, sendo importante investigar e compreender seus alcances de contribuição para o aprendizado escolar.

Nessa ocasião minha atenção foi menos direcionada para a construção do conhecimento escolar pela relação entre conhecimentos cotidianos e científicos, em sala de aula. Já, neste presente trabalho de dissertação, diferentemente de uma visão de que os conceitos são construídos com base na observação, manipulação e vivência dos sujeitos no meio cotidiano, o interesse se voltou para a compreensão dos processos de constituição do conhecimento escolar pela mediação, com (re)significação, dos conhecimentos científicos, como constituição social da singularidade humana mediada pela interação com o outro (REGO, 1995; MALDANER e ZANON, 2001). O uso da Tirinha em aula passou a ser focado na perspectiva de que os estudantes pudessem identificar, na situação representada, relações com conteúdos/conceitos físicos que eram objetos dos estudos em sala de aula.

Levando em conta que as respostas dos estudantes demonstram que eles conseguiram associar situações e formular conceitos físicos no contexto de uso da Tirinha, minha atenção se voltou para a investigação de limites e possibilidades de contribuição do uso das Tirinhas em aulas de física, para a potencialização de processos de pensamento, pelo uso da linguagem (re)significada em processos de formação e evolução dos conceitos escolares. Acredito que o estudante passa a produzir novos significados aos conceitos contextualizados por meio das interlocuções que permitem perceber as relações entre os sinais presentes na Tirinha, transformados em signos, a partir das mediações e explicações do professor, pois, de acordo com Vygotsky2 (2005), os significados são internalizados de acordo com as peculiaridades de cada indivíduo.

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Encontram-se, na bibliografia disponível, diferentes grafias para o nome do autor, tais como: Vigotski, Vygotsky, Vygotski, Vigotsky. Optamos por utilizar a grafia Vygotsky, porém serão preservadas, nas referências, as formas utilizadas pelos diferentes autores que as produziram.

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Assim, esta dissertação foi desenvolvida com a intenção de fazer um aprofundamento teórico a essa investigação iniciada na graduação. Planejei e desenvolvi em sala de aula uma nova situação de ensino que permitiu o registro de novas informações a partir da interação com uma Tirinha e posterior análise, embasada em diferentes autores, com vistas a entender melhor as possíveis contribuições do uso das Tirinhas para favorecer os processos de significação conceitual em aulas de física.

As Tirinhas são um recurso pedagógico, cujo uso em sala de aula, ou mesmo em exames como o ENEM, PISA, vestibulares, tem apresentado uma crescente, por isso, busco conhecer a contribuição dessa estratégia de ensino na construção do conhecimento escolar.

A atenção, neste presente trabalho, está direcionada com a participação de conhecimentos cotidianos ou científicos, expressos pelos sujeitos na sala de aula, partindo do conhecimento de que ambos são recontextualizados na escola, nos processos de significação conceitual. Assim, busco compreender a possibilidade de uso das Tirinhas como recurso didático com características que favorecem o desenvolvimento do ensino escolar. A significação dos conceitos científicos na mente de um aprendiz e seu processo de evolução são fatores a serem observados conscientemente pelos professores. Nesse sentido, minha atenção se volta a essa construção dinâmica, tendo em conta possíveis obstáculos epistemológicos (Bachelard, 2004) ao aprendizado das ciências, a exemplo do realismo e animismo, constituindo alguns limites no uso das HQ como ferramenta pedagógica.

Minha hipótese é de que as HQ e Tirinhas, ao potencializarem os processos de significação conceitual, nas interações em aula de física, contribuem ao desenvolvimento intelectual dos estudantes, facilitando os sistemáticos movimentos de “ir e vir”, ascendentes e descendentes (Vygotsky, 2001), entre conhecimentos cotidianos e científicos e, assim, a construção do conhecimento escolar. Embora o uso das imagens e o acesso às mídias e novas tecnologias, incluindo as redes sociais, tenha modificado radicalmente o acesso ‘ao mundo’, o uso desses recursos nem sempre potencializa o desenvolvimento intelectual, uma vez que, embora sistematicamente plugados, os estudantes costumam expressar-se apenas nas formas corriqueiras e repetitivas de informação e comunicação, sem evoluir nas formas de linguagem e pensamento. Acredito que a linguagem imagética das Tirinhas pode contribuir para o desenvolvimento dos processos de significação conceitual, em aulas de

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física, na medida em que elas favorecerem interações com mediação da linguagem própria à física, potencializando interações em que tal linguagem (re)significada atua como constitutiva da mente humana, da singularidade humana. A linguagem imagética da tirinha, ela em si, tende acomodar o pensamento, pois transita entre os conhecimentos cotidianos associados com as ‘impressões primeiras’, mas, problematizada e resiginificada em processo interativo, com uso da linguagem simbólica e do pensamento lógico-matemático da física, aí, sim, ao permitir a construção do conhecimento escolar, ela é constitutiva da singularidade humana inerente à finalidade da escola. Segundo essa hipótese, ao mesmo tempo em que o uso das Tirinhas no ensino apresente inúmeras potencialidades, ele também incorre em alguns limites, principalmente no que se refere aos obstáculos epistemológicos bachelardianos.

Acredito que a atratividade dos estudantes pela linguagem metafórica e imagética favorece o envolvimento e a relação de afetividade que, quando canalizados conscientemente aos processos do ensinar e aprender física pode contribuir significativamente para o êxito desses processos. No caso específico das HQ e Tirinhas, minha hipótese é de que a emoção e afetividade que ela desperta são, de fato, um dos diferenciais dessa ferramenta pedagógica. Isso, sem deixar de prestar atenção aos obstáculos à apropriação dos conhecimentos científicos, a exemplo dos animismos, como alerta Bachelard (2004).

Com isso, meu objetivo é analisar sob esses olhares os dados construídos nesta presente pesquisa, mas sempre com atenção voltada à construção e evolução dos significados dos conceitos de física. Para tal, apresento no capítulo 1, uma revisão bibliográfica que discute alguns fundamentos teóricos sobre essas hipóteses, principalmente sob a ótica da teoria histórico-cultural de Vygotsky.

No subcapítulo 1.1 explano sobre a influência da imagem, em sentido positivo e negativo, na educação contemporânea. Também argumento acerca do trabalho docente, que percebo ser crucial a sua reflexão para o eficaz aproveitamento dessas novas influências no ensino. A ciência e os conhecimentos científicos também são abordados onde reflito sobre o novo paradigma da educação, já encarnado nos PCNs, um paradigma onde a linguagem e a imagem assumem um papel importante.

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No subcapítulo 1.2 abordo a teoria histórico-cultural de forma mais minuciosa, enfatizando a evolução dos significados e a área de desenvolvimento proximal, deixando expressa minha visão acerca do aprendizado e de seus processos.

No subcapítulo 1.3 abordo a visão de Bachelard (2004) acerca dos obstáculos epistemológicos, refletindo sobre a vigilância que o autor recomenda acerca do uso de imagens no ensino, devido a facilidade de incorrerem em obstáculos ao aprendizado.

Apresento, no subcapítulo 1.4, a metodologia e a Tirinha utilizada na pesquisa, descrevendo os processos utilizados na construção e posterior análise dos dados.

No capítulo 2 trato dos dados construídos em campo analisando-os com base nos autores apresentados no Capítulo 1.

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CAPÍTULO 1- O USO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO ENSINO

Este capítulo foi elaborado com vistas a situar a pesquisa desenvolvida no que se refere aos fundamentos teóricos nos quais ela está embasada.

1.1 - A IMAGEM NO CENÁRIO DA SOCIEDADE

Planejar uma aula de física em uma sociedade irrigada por constantes avanços tecnológicos e inúmeras fontes de conhecimento, como a internet, a televisão, o cinema, os outdoors, as mídias impressas, e outras; é uma tarefa que instiga a maioria dos professores a pensar na praticidade, na atratividade e na eficácia dessa aula. Nesse sentido, em nossa sociedade observa-se, cada vez mais, a valorização do audiovisual, cujos recursos se multiplicam a cada dia. Somos constantemente bombardeados com imagens das mais diversas fontes e, ao pensar no ensino, não podemos desprezar esta influência no cotidiano do aluno quando planejamos e desenvolvemos o ensino escolar.

Após a década de 70 tivemos uma forte inserção das imagens na vida cotidiana das pessoas principalmente através da televisão, que passou a ser colorida. A atratividade havia aumentado e continuou numa crescente até os dias de hoje. Não tardou para que as imagens e cores chegassem aos livros didáticos e materiais pedagógicos.

A teoria histórico-cultural enfatiza que o desenvolvimento cognitivo do indivíduo (pensamento, linguagem, comportamento, memória) tem origem em processos sociais, ou seja, as relações sociais se convertem em funções psicológicas através da mediação (VYGOTSKY, 2001). Ao olhar para o ensino escolar levando em conta o locus do contexto

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histórico-cultural do aluno, mergulhado num universo de informações visuais, considero importante e interessante utilizar as imagens no ensino, no entanto, seria um equívoco utilizá-las tal e como estão no cotidiano do aluno, pois não proporcionam significação dos conceitos, apenas um amontoado de informações, muitas vezes desconexas, sem sentido para a singularidade humana. Segundo Trevisan (2002) “não basta mostrar para os educandos as imagens veiculadas normalmente na sociedade, que são vistas no dia-a-dia pela grande maioria das pessoas, pois elas não educam filosoficamente o indivíduo” (2002 p. 39). O que proponho é o uso das Tirinhas pensadas epistemologicamente, na perspectiva de uma aprendizagem com significado para o aluno, em que a vigilância se faz presente em todo o processo de sua produção, objetivando a construção do conhecimento escolar.

Segundo Waldomiro Vergueiro (2007), o desenvolvimento das ciências da comunicação e dos estudos culturais, principalmente nas últimas décadas do século XX, fez com que os meios de comunicação passassem a ser encarados de maneira menos apocalíptica, procurando analisá-los em sua especificidade e compreender melhor o seu impacto na sociedade. Isto ocorreu com todos os meios de comunicação, como o cinema, o rádio, a televisão, os jornais etc. Segundo o autor, inevitavelmente, também as histórias em Quadrinhos passaram a ter um novo status, recebendo um pouco mais de atenção das elites intelectuais e passando a ser aceitas como um elemento de destaque do sistema global de comunicação e como uma forma de manifestação artística com características próprias.

Isso me faz refletir sobre visões simplistas sobre os meios de comunicação e sua influencia no ensino, incorrendo no extremo de utilizar imagens no ensino pela simples justificativa de sua onipresença nos meios de comunicação, pelo simples pretexto de “dar cor” a aula. A constituição imagética da mente, pelos meios de comunicação, incorre, na maioria das vezes, num acomodamento do pensamento, numa infantilização do cérebro, quando o adolescente e o adulto constroem a estrutura cerebral a partir de imagens. O desenvolvimento intelectual dos estudantes é exigente de muitas formas de trânsito pelos textos longos e pelas linguagens que, como as das ciências, permitem lógicas outras, pensamentos outros, sem os quais fica comprometida a evolução e o desenvolvimento da mente humana.

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Vergueiro (2007) aponta vários motivos que levam as Histórias em Quadrinhos a terem um bom desempenho nas escolas, possibilitando, segundo ele, resultados muito melhores do que aqueles que se obteria sem elas. O primeiro, dos motivos que ele enumera, diz-se ao fato de os estudantes quererem ler os quadrinhos. Há décadas as histórias em Quadrinhos fazem parte do cotidiano de crianças e jovens, sua leitura sendo muito popular entre eles. Então, os alunos não demonstram qualquer sinal de resistência a este recurso pedagógico. Pelo contrário, como foi apontado pela pesquisa anteriormente relatada, os alunos demonstram entusiasmo e interesse colocando-se propensos a uma participação mais intensa nas atividades de aula. Mas ainda assim esse fato, por si só, não justifica o intento de se utilizar as HQ em contexto escolar. Acredito que utilizar um recurso imagético simplesmente pela ferramenta em si não alcança os objetivos da escola, ou da disciplina em que se utiliza tal estratégia. Também por isso, vejo a necessidade de se avançar nesse entendimento, por meio de pesquisas que reflitam sobre a significação dos conceitos através do uso dessa ferramenta.

O segundo motivo, apontado por Vergueiro, refere-se que palavras e imagens, juntas, ensinam de maneira mais eficiente. A interligação de texto com a imagem, existente nas HQ, potencializa a compreensão de conceitos de uma forma que qualquer um dos códigos (ou signos), isoladamente, teria dificuldades para alcançar. Outros argumentos apontados por Vergueiro (2007) são os que seguem: existe um alto nível de informação nos quadrinhos; as possibilidades de comunicação são enriquecidas pela familiaridade com as histórias em quadrinhos; os quadrinhos auxiliam no desenvolvimento do hábito de leitura; os quadrinhos enriquecem o vocabulário dos estudantes; o caráter elíptico da linguagem quadrinhística obriga o leitor a pensar e imaginar; os quadrinhos têm um caráter globalizador; os quadrinhos podem ser utilizados em qualquer nível escolar e com qualquer tema.

O autor menciona esses pontos levando em conta as HQ, em sentido geral. São algumas, dentre as razões existentes, que justificam a importância de ampliar os estudos e investigações com vistas a entender os limites e potencialidades do uso das HQ e Tirinhas no ensino. As revistas de HQ versam sobre os mais diferentes temas, sendo facilmente aplicáveis em qualquer área. Vergueiro (2007) aponta que cada gênero, mesmo o mais

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comum (como o de super-heróis, por exemplo) ou cada história em quadrinhos oferece um variado leque de informações passíveis de serem discutidas em sala de aula, dependendo apenas do interesse do professor e dos alunos.

Acredito sim que as HQ, podem ser utilizadas tanto como reforço a pontos específicos do programa como para propiciar exemplos de utilização dos conceitos teóricos desenvolvidos em aula. Histórias de ficção científica, por exemplo, possibilitam as mais variadas informações no campo da física, tecnologia, engenharia, arquitetura, química etc., que são muito mais facilmente assimiláveis quando na linguagem das histórias em quadrinhos. Mais ainda, essas informações são absorvidas na própria linguagem dos estudantes.

No entanto, discordo da visão sugerida por Vergueiro (2007), ao discorrer que podemos utilizar qualquer HQ ou Tirinha e simplesmente adaptá-las a qualquer aula, como algo simples. Acredito que fazer uso dessa ferramenta em sala de aula requer pensá-la e, na maioria das vezes, produzi-la especificamente para os objetivos da disciplina e dos conceitos a serem trabalhados. Pois as Tirinhas, elas em si, não asseguram que os estudantes vão desenvolver os aprendizados tipicamente escolares, para o que é imprescindível a mediação dos conteúdos e conceitos especializados, como é o caso dos de física, que não serão percebidos nas Tirinhas, nelas por si só.

As Tirinhas que foram utilizadas nesta pesquisa – assim como as que foram utilizadas na pesquisa anterior – foram todas produzidas especificamente, ou seja, não foram utilizadas histórias, ou enredos, prontos, de personagens já conhecidos. Eu mesmo as desenhei elaborando o seu enredo com o propósito de contemplar relações com conceitos científicos em conjunto com discussões de seus aspectos históricos, étnicos, políticos e socioeconômicos procurando atender aos objetivos da disciplina. Nesse sentido, diferem da abordagem e do uso pesquisados por Vergueiro (2007).

O professor deste novo tempo, desta era universalmente imagética, será capaz de mobilizar o desejo de aprender, à medida que ensinar despertando o interesse, a motivação e a emoção do aprendiz. O que é uma árdua tarefa nesses tempos modernos. Mesmo mergulhado neste universo imagético e repleto de informações, observamos os alunos apresentarem inúmeras dificuldades nos processos de significação conceitual, e, com maior

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intensidade, na área das ciências exatas como, por exemplo, a física. Mas não é unicamente na motivação que o professor consciente deve ater-se, pois na maioria das vezes o professor terá que aprofundar o conceito abordado na Tirinha, incorrendo em caminhos de dificuldades, de textos delongados, de conceitos abstratos, para a evolução daquele conceito e desenvolvimento daquele sujeito.

Segundo Gadotti (2004) os alunos de hoje, formados na era imagética, não têm mais o hábito de ficarem 40 minutos concentrados em torno de algum árduo raciocínio, sendo difícil para um professor “dar aulas” sem apelar para o sensitivo.

Antes o professor podia se utilizar com mais intensidade da curiosidade dos alunos, desejosos de desvendar mistérios que ainda lhes eram vedados e dispostos, para isso, a pagar o pedágio de saberes instrumentais, muitas vezes de aquisição trabalhosa. Agora, porém, as crianças já chegam abarrotadas de mil informações e visões multiformes, que não lhes custou nada adquirir, que receberam até sem querer. (SAVATER, 2005).

Mas esses conhecimentos que chegam até o aluno são frágeis, superficiais muitas vezes. Na escola, o professor consciente, terá de contextualiza-los, utilizando para isso arsenais de conhecimentos cotidianos que farão movimentos de ir e vir dialogando com os conhecimentos científicos. Segundo Gadotti (2004):

A educação é ao mesmo tempo, ciência e arte. A arte é a ‘técnica da emoção’ (Vygotsky). O novo profissional da educação é também um profissional que domina a arte de reencantar, de despertar nas pessoas a capacidade de engajar-se e mudar. (2004, p. 468)

Hugo Assmann (2000) também discute a ideia de reencantar a educação. No entanto, ser um profissional do encantamento em salas de aulas, com ou sem o uso de altas tecnologias, é algo muito desafiador e preocupante para os professores, que não pode ser visto de forma idealizada, como algo simples. O professor, sendo responsável por apresentar aos estudantes o universo do conhecimento escolar, não pode ser alijado ao encantador, agradável, estimulante. Acredito que relativizar este “movimento pendular”, entre motivação e desmotivação, a respeito da complexidade dos conteúdos e conceitos a

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serem ensinados na escola, é um constante desafio ao professor atento a sua função social mais essencial: a de disponibilizar o acesso aos conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade, em especial, os das ciências, como é o caso da física. Assim, expressões como “profissional do encantamento” necessitam ser criticamente discutidas, a exemplo da ideia de “hipnotizar”, criticada por Savater (2005). Esse trabalho, diferentemente de ideias simplistas sobre como tornar o ensino escolar interessante aos estudantes, parte do entendimento do trabalho docente como uma profissão, no seio da problemática que diz respeito ao papel essencial da escola (Young, 2007).

A reflexão acerca do trabalho docente constitui-se uma das chaves para a compreensão das transformações atuais. Conforme Tardif (2005), o trabalho docente é visto como uma profissão e que, assim como as demais, exige formação, aperfeiçoamento e o envolvimento dos diferentes sujeitos, entendendo a docência como um ato de profissionalização.

A realidade de muitas escolas é a de professores exercendo a profissão em áreas distintas das quais tiveram a formação acadêmica. E mesmo os que estão em sua profissão de formação estão estagnados e sem um contínuo aperfeiçoamento tão necessário à profissão: professor. Nesse sentido, a docência só pode ser entendida e avaliada, se for levado em conta o contexto social que ela se insere.

Para que isso ocorra, Tardif (2005, p.28) propõe que é preciso ir mais longe porque as transformações atuais que caracterizam o mundo do trabalho constituem um momento intelectualmente propício para refletir de maneira mais ampla e crítica sobre os modelos teóricos do trabalho que têm servido, até hoje, de referência à análise da docência.

O autor ainda argumenta que o trabalho docente pode ser analisado a partir de três dimensões: a atividade, o status e a experiência. Como atividade, pois necessita do agir do professor em sala de aula na escola e no processo de ensinar. Como status, por remeter a ideia de identidade do trabalhador tanto dentro da organização do trabalho quanto na organização social, considerando que essa identidade é construída, portanto, fruto de um trabalho coletivo. Considera-se para o status, três aspectos: a formação, a constituição e a identidade do professor. A formação é a que pode ser associada à formação inicial ou

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mesmo nas vivencias na condição de estudante, a exemplo de professores que acabam ensinando certo conteúdo da forma como o aprenderam. A constituição acontece a partir do exercício da profissão. E a identidade constrói-se a partir dessas duas anteriores. A docência como experiência pode ser entendida de duas maneiras, a primeira relacionada ao processo de vivências em sala de aula, e os anos de profissão, e a segunda como algo que “toca”, que faz refletir, que organiza a docência.

O autor nos conduz a pensar o trabalho docente, também, considerando as condições subjetivas, na formação do professor, que são próprias do trabalho humano, pois este constitui-se numa atividade consciente. O significado de seu trabalho é formado pela finalidade da ação de ensinar, isto é, pelo seu objetivo e pelo conteúdo concreto efetivado através das operações realizadas conscientemente pelo professor, considerando as condições reais na condução do processo de apropriação do conhecimento pelo aluno. As condições objetivas são entendidas como as condições efetivas de trabalho, englobando desde a organização da prática, participação no planejamento escolar, preparação de aula etc., enfim, relacionadas aos diferentes programas de ensino. O trabalho docente é um trabalho cujo produto e objeto sempre escapam à ação do trabalhador.

Outros fatores importantes no trabalho docente são as relações professor-aluno, vivência cotidiana – vivência escolar, que podem ser entendidas como assimétricas. Segundo Tardif (2005, p.73)

A cultura escolar impõe à vasta maioria dos alunos, como cultura escrita, codificada, formalizada, uma verdadeira ruptura em relação ao seu universo cotidiano. [...] Historicamente, a expansão da escolarização está ligada à edificação de uma cultura e de saberes escritos que apresentam um alto grau de abstração em relação aos saberes locais das comunidades e à cultura diária: são saberes objetivados, codificados, formalizados; seus modos de transmissão e de apropriação são objeto de procedimentos delimitados e regulamentados.

Nesse sentido, cabe dirigir a reflexão para a relação dicotômica entre a realidade do contexto escolar e a realidade cotidiana na família, dos amigos, e demais grupos dos quais o sujeito participa e interage.

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Considerando esses aspectos, o autor acrescenta que uma das características do trabalho docente é, assim, “condicionar os alunos a esta cultura estranha, fazer com que eles a interiorizem e acabem por conhecê-la, ou mesmo reconhecer-se nela” (Tardif, 2005, p.74). Young (2007) é um dos autores que enfatiza a distinção entre conhecimento cotidiano e escolar, denominando este como “conhecimento poderoso”. O autor aborda as características básicas de cada um dos dois tipos de conhecimento:

Um é o conhecimento dependente do contexto, que se desenvolve ao se resolver problemas específicos no cotidiano. Ele pode ser prático, como saber reparar um defeito mecânico ou elétrico, ou encontrar um caminho num mapa. Pode ser também procedimental, como um manual ou conjunto de regras de saúde e segurança. O conhecimento dependente de contexto diz a um indivíduo como fazer coisas específicas. Ele não explica ou generaliza; ele lida com detalhes. O segundo tipo de conhecimento é o conhecimento independente de contexto ou conhecimento teórico. É desenvolvido para fornecer generalizações e busca a universalidade. Ele fornece uma base para se fazer julgamentos e é geralmente, mas não unicamente, relacionado às ciências. É esse conhecimento independente de contexto que é, pelo menos potencialmente, adquirido na escola e é a ele que me refiro como conhecimento poderoso (2007, p. 1296).

Dessa forma, entendo que um dos papéis da escola, é manter a sociedade, ou seja, transmitir para as próximas gerações os saberes (ou conhecimentos) necessários para que os humanos continuem sendo humanos, ou até mesmo, para tornar os humanos, humanos. Para ser homem não basta nascer, é preciso também aprender (Tardif, 2005). Assim, na escola, o aprendiz constrói uma formação em duplo patamar: uma instrução e uma moralização. Instrução no âmbito de conhecer/aprender os saberes/conhecimentos legitimados pela ciência. Moralização no âmbito de se formar um homem que atento às necessidades do contexto socioambiental em que está inserido.

A escola, sem dúvidas, está vinculada aos interesses da sociedade. Assim como a família, a escola quer formar sujeitos que saibam viver em sociedade, de forma justa, solidária e com responsabilidade em suas decisões e em seus atos no ambiente. Quem pretende ensinar torna-se responsável pelo mundo diante do aprendiz e, de certo modo, responsável pelo aprendiz diante do mundo.

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Cabe salientar que a escola é uma instituição, composta por pessoas, e que, assim sendo, sofre a influência de vários fatores (internos e externos), como pais, professores, comunidade, autoridades, etc., que muitas vezes promovem mudanças na rotina escolar, ou pelo menos, criam conflitos, ou seja, geram tensões, que conforme Marques (2000) são características inerentes às instituições, e que as move.

Nessa perspectiva, Tardif (2005) discute a questão do sucesso ou do fracasso escolar dos alunos destacando que:

[...] cada dia e várias vezes durante o mesmo dia, as crianças saem das classes sofrendo diversas influências sobre as quais os mestres não têm nenhum controle direto. Neste sentido, o objeto de trabalho docente escapa continuamente às medidas do trabalhador. Trata-se de um objeto social que vive em diversos mundos socializados: família, quarteirão, grupos de jovens, atividades de lazer, etc. É este fenômeno de exterioridade do objeto do trabalho que explica o fato de a ação dos professores não constituir o único e exclusivo, tampouco o mais importante determinante do sucesso ou fracasso escolar do aluno. (p.67)

Pela minha vivência e, posso afirmar, experiência escolar, entendo que a grande maioria dos “alunos-problemas”, sejam problemas de aprendizagem ou de conduta, tem origem em processos complicados – e complexos – existentes nos seios das famílias. Nesses casos, esta exterioridade do objeto de trabalho escapa às medidas do trabalhador de forma mais intensa. É difícil para a escola intermediar esta relação aluno-família, que é um par de relações que percebo influenciar continuamente nos aprendizado escolar. Assim, vamos percebendo o quão complexo e carente de sucessivas e contínuas análises reflexivas é o trabalho docente na sua práxis.

Nesse sentido, aponto a relação do aluno com as inúmeras tecnologias em uso crescente neste novo tempo. É fácil de ver muitos alunos ligando seus i-pods, tablets, Notebooks, Smartphones, assim que “toca o sinal” liberando-os para o intervalo ou para o fim da aula; dessa forma também libertando-os para o mundo digital, onde a maioria maçante prefere estar.

Entendendo o trabalho docente como uma relação coletiva de sujeitos, pode-se afirmar que essa é uma relação que nem sempre ocorre de forma natural, pelo contrário muitas vezes ela é forçada, não acontece por vontade própria, principalmente no que diz

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respeito aos alunos, que são “obrigados” pela família e pela própria sociedade, a frequentar a escola, sem, muitas vezes, nem saber o real motivo. E nessas condições, o professor precisa, pelo menos, tentar despertar no aluno o interesse e a necessidade do seu estar na sala, promovendo a aprendizagem dos conteúdos, de conhecimentos e saberes, e permitindo que os mesmos se reconheçam como sujeitos sociais, compreendendo que precisam passar por essa instituição, chamada escola, e por todos os processos educativos que a mesma envolve, para poder conviver a agir diante da tomada de decisões que permeiam a vida em sociedade.

A instituição educativa escola constitui-se num espaço de organização do trabalho docente, não apenas em um espaço físico, mas também um espaço social, que faz parte de uma evolução histórica. As relações que nela são estabelecidas são mediadas pelas regras de vida desse ambiente específico, ou seja, é uma profissão coletiva. Assim, percebe-se que a escola modifica os sujeitos, mas essa modificação, ou o resultado disso, depende de cada sujeito.

Ensinar é lidar com o objeto humano. É um trabalho centrado em coletividades humanas, e por isso distingue-se das outras ocupações. Ensinar de forma eficaz sem dar ênfase ao diálogo entre os pares (professor – escola, professor – aluno, escola – família, aluno – família, escola – aluno, professor – professor, etc.) é praticamente inconcebível.

Através de um trabalho crítico e da busca pelo exercício da cidadania, cabe à escola mostrar às novas gerações a importância de cada indivíduo e seu papel na sociedade, enquanto cidadãos conscientes de seus direitos e deveres. É preciso atentar para a evolução do mundo. É necessário que a escola compreenda que também é seu papel, dar ao aluno condições para se inserir e compreender o meio social, e por consequência, esse trabalho deve ser desenvolvido pelo professor, mas como pode ele obter bons resultados, se o aluno também não fizer a sua parte?

A escola necessita promover condições adequadas para a aprendizagem que cabe a ela propiciar aos estudantes, garantir estrutura material para um serviço de qualidade, criar um ambiente de trabalho coletivo que vise à superação do sistema educacional apático diante de suas reais finalidades, e ao mesmo tempo possibilitar a inter-relação desse sistema

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com a organização da sociedade e do ambiente como um todo, com a organização política, com a definição de papéis do poder público, com as teorias do conhecimento, as ciências, as artes e as culturas.

Isso, sem nunca esquecer que os programas de ensino são estruturados a partir das disciplinas ensinadas na escola, sendo que essa linha de organização corresponde a uma separação analítica e ideológica dos saberes escolares, tendendo a privilegiar disciplinas consideradas pelos pais e pela sociedade como mais importantes à formação. Embora seja importante a organização curricular por área de conhecimento, a existência de cada área se justifica a partir da existência, por sua vez, das próprias disciplinas que a compõem, com seus objetos específicos.

O ensino com as HQ em sala de aula exige um distanciamento da visão centrada nos conteúdos imediatos. Ele indica uma constante contextualização e um diálogo entre o aprendiz, o professor e o conteúdo abordado. Exige um envolvimento do professor nos processos de criação das HQ por onde transita uma diversidade de conhecimentos oriundos das diversas áreas do saber.

Nesse sentido, os programas escolares exercem papel importante, pois possibilitam a ação coletiva, e permitem aos professores organizar ações de acordo com os objetivos do ensino. Em sua obra, Tardif (2005) apresenta resultados de uma pesquisa, em que os professores fazem críticas quanto a “ausência de consulta aos professores ou o pouco peso acordado a suas concepções curriculares, a falta de tempo para cobrir todo o conteúdo, a ausência de suporte material”, constituindo-se em fatores que indicam a importância da organização curricular no trabalho docente, bem como alguns obstáculos para o desenvolvimento dos programas.

Destaco a importância do planejamento do professor, que serve como organização, delimitação do trabalho, mas não pode ser muito “fechado”, pois tem que contar com os imprevistos, considerando que se trabalha com coletivos e com humanos, e por isso, o planejamento deve ser flexível. Assim, na criação de uma Tirinha e de uma aula com Tirinha o professor consciente está atendo a estas possíveis “mudanças” no roteiro pensado, pois é muito comum ao se utilizar esse material a “interferência” do aluno em elementos da

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narração e no enredo. Schön (2000) discute a imprevisibilidade e a singularidade da prática profissional, enfatizando a ideia da pratica como terreno pantanoso.

Também é importante ressaltar que um dos problemas da organização dos programas de ensino, e até mesmo do currículo das escolas, é que muitas vezes fecham-se a refletir sobre concepções epistemológicas relacionadas à saberes a serem ensinados e esses muitas vezes aparecem de forma precipitada nos currículos escolares, ou seja, priorizando os conteúdos, ou desenvolvendo o programa com base nos conteúdos e não nos fins do ensino. Nessa perspectiva, entende-se que a atividade docente é composta por dois tipos de trabalho: codificado e não codificado. O trabalho codificado diz respeito às normas e rotinas, àquilo que é previsível. O trabalho não codificado são os aspectos implícitos, invisíveis, e é esse que revela a complexidade dessa profissão.

O trabalho curricular dos professores consiste fundamentalmente em intermediar o programa oficial com a sua concretização prática, suas limitações temporais, os recursos limitados dos quais dispõem, esforçando-se, para respeitar o espírito dos programas. Um trabalho no qual há envolvimento e possibilidade de escolhas, por sua vez, pode apresentar-se como uma nova forma de fazer e pensar o planejamento curricular e o trabalho docente.

Tardif (2005, p. 198) ao tentar definir os objetivos gerais da escola, afirma ser uma tarefa difícil, uma vez que eles são histórica e socialmente muito variados. Argumenta que os fins da escola atual não são claros e evidentes, ou seja, “dados de uma vez por todas”. Que estes objetivos são muitos e variados.

No entanto, eu destaco a função específica da escola: o ensinar. Destaco que necessitamos sempre tomar o máximo de cuidados para não “perder” este foco em meio a tantas variáveis, influências, etc. É uma função irrevogável à instituição escola, algo que nenhuma outra instituição tem o papel de fazer. (Young, 2007)

Se o aprendiz não aprender na escola os conhecimentos construídos pela ciência, onde aprenderá? Alguém poderia me responder rapidamente e com facilidade: “nos meios de comunicação, por exemplo na internet.”. Concordo que estamos em um momento histórico em que as inovações tecnológicas superam em atratividade qualquer aula, no

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entanto, receber e repetir uma enxurrada de informações difere em muito do aprendizado escolar esperado, em que os conhecimentos em interação chegam até o aluno de forma dinamicamente transformadora.

Assim, penso que se não definirmos claramente a especificidade da escola o profissional do trabalho docente perde seu norte educativo em meio aos inúmeros objetivos que podem emergir e que são cobrados da escola. Se firmarmos esta especificidade como intrínseca à profissão, traremos segurança ao desenvolvimento da práxis da profissão. Assim, ao produzir uma Tirinha, o professor precisa manter-se em seu objetivo, o ensino; correndo o risco de perder-se em estratégias somente de motivação e atratividade, onde o aluno se divertirá em sala de aula, mas pouco construirá o conhecimento escolar.

Acerca do trabalho docente, acredito que o bom profissional é aquele que desenvolve seus “dons”, buscando um diferencial na profissão, no meu caso, no sentido de um avanço na execução de minhas atividades docentes. Procurando fazer isso, descobri uma importante ferramenta de ensino: o desenho. O desenho encanta os olhos de quem vê, emociona o coração de quem o sente e ilumina a mente de quem o pensa. Se existem dons, certamente um dos meus é a aptidão para o desenho. Caricaturas, Quadrinhos, pinturas, desenhos realistas, natureza morta, etc., estão presentes em inúmeras folhas e capas de meus cadernos do ensino fundamental e médio.

Um observador atento ao comportamento das crianças percebe facilmente que a criança tem uma forte relação com o desenho. Desenhando ela expressa ideias, desejos, sonhos, fantasias, transmite informações; comunica coisas que não faria apenas com a fala ou escrita. Vemos que o desenho como linguagem antecede a escrita no desenvolvimento da criança. Acredito que a familiaridade a este tipo de linguagem oferece um importante potencial de aprendizagem.

Na maioria das vezes a criança representa algo fantasioso, fictício. No entanto, para Vygotsky (2005), toda atividade criadora fruto da imaginação é uma reconstrução do que já é conhecido. A criança cria a partir do que lhe é familiar. Assim o desenho se torna um excelente instrumento para resgatar e representar conhecimentos do cotidiano, no intuito de utilizá-los na sala de aula.

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28 O desenho também é uma manifestação da Inteligência. A criança vive a inventar explicações, hipóteses e teorias para compreender a realidade. O mundo para a criança é continuamente reinventado. Ela reconstrói suas hipóteses e desenvolve a capacidade intelectiva e projetiva, principalmente quando existem possibilidades e condições físicas, emocionais e intelectuais para elaborar estas “teorias” sob forma de atividades expressivas. (DERDYK, 1989, p. 54)

Nestes processos de reconstruções evidenciados nos desenhos podemos observar as relações que a criança faz entre a realidade exterior e a realidade interior, ou seja, os sentidos e significados que ela atribui.

Acredito, embasado nas pesquisas e experiências já relatadas, que o desenho como informação visual deva ser interpretado e analisado a partir de informações verbais, ou seja, a fala ou a escrita. Assim, vejo que as HQ assumem um papel importante quando pensamos em utilizar as imagens como recurso pedagógico, pois realçam a aliança entre a linguagem imagética e a linguagem escrita. Também nesse sentido Derdyk (1989) afirma:

A aquisição verbal redimensiona a relação que a criança mantém com o desenho e com o ato de desenhar. Nomear desencadeia ações. A ação gráfica no papel sugere figuras. A palavra representa o objeto, a pessoa, o fato. Desenhar e falar são duas linguagens que interagem, são duas naturezas representativas que se confrontam, exigindo novas operações de correspondência. A linguagem verbal e a linguagem gráfica participam de uma natureza mental, cada uma com sua especificidade e sua maneira particular de participar de uma imagem, uma ideia, um conceito. (p. 97)

Nas funções mentais, uma palavra sempre está conectada ao seu (s) sentido (s), que permitem que formulemos uma imagem mental, uma ideia, um conceito, que dão amplitude e complexidade ao agrupamento de letras inicial. No entanto esta associação, ou seja, seus significados, não é algo pronto, dados de imediato pela palavra, mas sim produto de uma construção durante as diversas utilizações da palavra em diferentes contextos e situações. Vygotisky (2005) analisa a relação do pensamento e linguagem e o processo de (re)significação dos conceitos, assuntos que será detalhado no item 1.3.

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Nas Tirinhas de Histórias em Quadrinhos e as imagens agem, de modo geral, num primeiro momento, de forma a negar o real, o sensível, o vivido, substituindo as coisas do mundo pelo desenho. Em seguida resgata o real, mas apresentando-o no interior de seu próprio enredo desenhado, desde o ponto de vista dos personagens. É essa passagem que encanta as crianças, o jogo de substituição e cristalização do mundo nas duas dimensões do papel, na criação de um universo paralelo ao vivenciado e sensível. É a partir das percepções, do afetivo e do vivencial da criança que devemos empreender nosso trabalho. Após evidenciarmos o sensível e indicial, o contextual nas histórias em análise, devemos progredir rumo à compreensão das relações simbólicas presentes da obra, para em seguida, relacioná-la ao universo da criança e do jovem. (PATO, 2007)

Assim, para trabalhar com os quadrinhos em sala de aula, o profissional docente necessita entender de que forma deverá transformar sua prática diária imbuído de senso reflexivo; implica uma visão holística dos quadrinhos, permitindo um acompanhamento seguro aos alunos enquanto a leem, pois, estes, mergulham em seu universo com facilidade, indo além do imediato, do óbvio. Os alunos, acostumados a esta linguagem, percebem o não dito, captam a mensagem incutida na expressão do personagem, no tipo de balão, no indício de movimento, etc. Por isso, o professor, enquanto profissional, carece de constante preparo e pesquisas ao trabalhar com esta ferramenta de ensino.

Como referido, a educação contemporânea abarca alunos oriundos e pertencentes a uma cultura extremamente imagética (cinema, internet, TV, etc.). Utilizar imagens nas salas de aulas, objetivando o aprendizado, é muito importante e válido no processo de ensino-aprendizagem, no entanto, “não é sensato fazer uso das imagens apenas no sentido estratégico, portanto, como meio de conquista de audiência ou de consensos, pois os prejuízos para a formação mostram-se inevitáveis. O Tema da imagem é algo muito complexo.”. (TREVISAN, 2002, p.150)

Assim, destaco a importância da filosofia para auxiliar na formação de um pensar crítico sobre a função da linguagem própria à física (re)siginificada em aulas, em sua dimensão não apenas comunicativa, mas, em especial, no que se refere à sua função constitutiva da mente humana. Com isso, destaco que é importante refletir sempre sobre os

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fundamentos da educação, incitando a visão crítica sobre as concepções educativas, com atenção, também, às formas de decodificação de imagens presentes em livros, revistas, filmes, novelas, cartoons, tirinhas, histórias em quadrinhos, charges, etc. (TREVISAN, 2002).

Ao tratarmos de ensino, para além da inerente comunicação entre aprendiz e mestre, é necessário tratar das dimensões constitutivas da construção dos aprendizados escolares. Antes de pensarmos em “como ensinar”, “o que ensinar”, “o que comunicar”, necessitamos pensar no “por que” ensinar e, então, nunca descuidarmos da mediação dos conhecimentos historicamente construídos pelas ciências.

Quando se discute sobre “o que é ciência”, pretendendo refletir sobre acepções universalmente aceitas, embrenha-se por caminhos sinuosos que serpenteiam pelas teorias filosóficas propostas por autores arraigados em diferentes concepções epistemológicas.

Um importante ponto de vista, que reforça o intuito de não tomar a ciência como detentora da verdade do mundo, é o desenvolvido por Thomas Kuhn. Sua filosofia transcende pensamentos empiristas, positivistas, indutivistas e falsificacionistas, pois volta sua atenção à história da ciência, sistematizando os processos de revoluções existentes dentro dos movimentos científicos, formadores da própria ciência, em que os paradigmas são modificados ou totalmente substituídos. Este filósofo propõe diversas definições de paradigma. Uma delas é a de que se trata de um compartilhamento mútuo de teorias existente dentro de uma comunidade científica, sendo esta constituída por homens que dialogam e entendem-se entre si, precisamente, por estarem dentro dele. Com esta concepção de paradigma, Kuhn distingue com clareza o que pode ser concebido como científico do que é não-cientifico: “A existência de um paradigma capaz de sustentar uma tradição de ciência normal é a característica que distingue a ciência da não-ciência, segundo Kuhn.” (CHALMERS 1981, p. 125).

Kuhn discute a possibilidade de haver um paradigma definitivo e universal, no entanto, em sua ciência menos definitiva, ele não nega o valor (provisório) dos paradigmas com os quais se construía conhecimento, por exemplo, nas ciências naturais (Brandão

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2010): mesmo que a Física Relativística negue incisivamente a Física Newtoniana, as duas operam até hoje, paralelamente, em universos e contextos diferentes.

Diferentemente da visão de Kuhn, a ciência, muitas vezes, é concebida com um caráter dogmático, que a vê como dotada de atributos superiores a outros ramos do conhecimento e como possuidora de uma verdade intrínseca inquestionável. Esta visão é ingênua, superficial, vulgar, banalizada e errônea, pois um simples olhar lançado à história da própria ciência nos indica o quanto ela foi sendo retificada e reconstruída historicamente. Vêm-se teorias sendo reestruturadas ou mesmo abandonadas e substituídas em todas as áreas do saber, principalmente nas ciências naturais, ao longo de todo o percurso científico. Nessa perspectiva, não podemos tomar a ciência como panaceia a todos os problemas e questionamentos da realidade humana, pois a própria ciência se construiu - e ainda se constrói - sob os próprios erros.

Percebemos, também, mudanças como essas ocorrerem na área da educação. Um exemplo são as HQ, hora refutadas pelos pensadores do ensino que afirmam que elas geram “preguiça mental” nos estudantes e afastavam os alunos da chamada “boa leitura”, hora vistas como salvacionistas e intensamente utilizadas e pesquisadas neste contexto. (VERGUEIRO e RAMOS, 2009).

A predisposição em deificar a ciência pela ingenuidade intelectual inerente a uma visão sem aprofundamentos filosóficos ou epistemológicos se dá, em grande parte, pela objetividade anunciada por correntes filosóficas da modernidade que tomam a lógica como manancial de suas leis, concebendo a realidade como origem da teoria. Percebem a natureza como uma plantação de dados onde um olhar atento e “científico” pode identificá-los e colhê-identificá-los; sendo que a soma destes dados com os de outras sucessivas colheitas, constituem suas leis e teorias. Segundo essas concepções o conhecimento advém da experiência, originando-se de sensações e percepções sensoriais. Talvez por esse caráter objetivo, associado à realidade palpável, e que permite diagnósticos e previsões lógicas, considera-se pelos incautos como “o método”, como a “ciência das ciências”.

Há quem diga que a ciência tem sede de verdade, ou seja, procura-a incessantemente; no entanto, tomar a verdade como sinônimo de ciência é, no mínimo,

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ingênuo. Ainda persiste o pensamento empírico, na primazia da crença na ação sensorial do homem sobre os objetos da realidade, “descobrindo” a verdade que depende diretamente dos sentidos físicos. Considera-se que o conhecimento está no objeto, como se a verdade estivesse, antes, já escrita na natureza.

Essas discussões e reflexões esboçam o período compreendido como Modernidade, onde emerge e se solidifica o princípio da subjetividade, consolidando o domínio da racionalidade. Razão esta, que abala as certezas e verdades metafísicas, colocando em crise o antigo modelo de ciência.

A metafísica antiga e medieval é substituída pela mentalidade moderna. Assim, as concepções de verdade, antes imutáveis e inquestionáveis, passam a serem analisadas pela luz da razão, e perde-se a ilusão de um chão firme onde se podem ancorar certezas. Não podendo mais apelar à tradição clássica, Descartes (1975) busca no próprio indivíduo as bases e fundamentos para as novas teorias científicas. A nova concepção de conhecimento cria seu alicerce na razão subjetiva.

No entanto a “eficácia autolegitimadora da razão será questionada, colocando a modernidade em crise no exercício mesmo da razão” (MARQUES, 1993, p.54). Percebendo-se que o conhecimento, antes pensado fiel à realidade, é apenas um “discurso” dela, não o seu espelho. Uma tradução, na forma de construção discursiva, repleta de signos e de elementos que apenas fazem referência à realidade, e não a refletindo com fidelidade inquestionável. Assim a razão exausta e esgotada, em seus fundamentos, esboça o período compreendido como pós-modernidade, onde toda realidade é uma construção discursiva. Na crise da ciência moderna:

O Incontestável progresso da ciência não é acúmulo de verdades, segundo o critério da validação; nem é simples eliminação de erros, na crivagem da falsificabilidade. Rompem-se as ilusões do caráter empiricamente unificado do conhecimento e da realidade. Desfazem-se as categorias indiscutíveis e unívocas, de identidade, de substância, de causalidade, que se expressavam numa linguagem matemática de poder ilimitado. (MARQUES, 1993, p. 56)

Estas discussões, assim como as levantadas por toda teoria do conhecimento, têm a preocupação fundamental ligada ao tema do auto-esclarecimento da consciência em frente

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