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Brinquedos não estruturados: um olhar sensível para o brincar de meninos e meninas em uma escola infantil do município de Ijuí

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL- UNIJUÍ

DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO (DHE) – CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

TATIANA RIBAS BUZETTO

BRINQUEDOS NÃO ESTRUTURADOS: UM OLHAR SENSÍVEL PARA O BRINCAR DE MENINOS E MENINAS EM UMA ESCOLA INFANTIL DO

MUNICIPIO DE IJUÍ IJUI 2018

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TATIANA RIBAS BUZETTO

BRINQUEDOS NÃO ESTRUTURADOS: UM OLHAR SENCÍVEL PARA O BRINCAR DE MENINOS E MENINAS EM UMA ESCOLA INFANTIL DO

MUNICIPIO DE IJUÍ

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Educação Física, Departamento de Humanidades e Educação (DHE) da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), como exigência parcial para obtenção do grau de Licenciada em Educação Física.

Orientadora: Dra Maria Simone Vione Schwengber

IJUÍ 2018

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A Banca Examinadora abaixo assinada aprova o trabalho de conclusão de curso:

BRINQUEDOS NÃO ESTRUTURADOS: UM OLHAR SENSÍVEL PARA O BRINCAR DE MENINOS E MENINAS EM UMA ESCOLA INFANTIL DO

MUNICIPIO DE IJUÍ

Elaborado por

TATIANA RIBAS BUZETTO

Como requisito parcial para obtenção do título de Licenciada em Educação Física

Ijuí (RS)

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________

Professora Dra Maria Simone Vione Schwengber

_______________________________________

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DEDICATÓRIA

Agradeço imensamente a Deus por ter me dado a vida, da mesma forma aos meus queridos pais, pelo amor incondicional e ombro amigo em todos os momentos de felicidade e de fraqueza, obrigada por tudo. Mas em especial ao meu querido e amado avô Valdir (em memoria), por nunca ter me deixado desistir e sempre ter acreditado em mim, sinto muito a sua falta vô, você é meu herói.

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AGRADECIMENTO

À Deus agradeço pelo dom da vida, por ter me dado uma saúde abundante para chegar até aqui. Me proporcionou tudo o que era necessário e a ti sou grata pai.

Aos meus queridos pais, o meu muito obrigado por serem tão presentes na minha vida, e apesar das dificuldades, lutaram e nunca me deixaram faltar nada. Vocês são meus melhores amigos, muito obrigada por tudo. Obrigada por acreditarem em mim, eu amo vocês infinitamente, incondicionalmente.

Ao meu amado avô Valdir (em memória) que apesar de não gostar da profissão que escolhi, devido à falta de valorização, sempre me apoiou, e me deu o melhor colo que alguém poderia ganhar, sendo a minha fortaleza até os seus últimos dias de vida. Apesar de não conseguir estar aqui para me ver graduar, sei que sempre estará vivo em nossos corações, e nunca me deixará só, te amo para sempre vô Vardo.

Á minha avó Jurandi, o meu muito obrigada pelos incentivos, pelo carinho e os bons exemplos que sempre me mostrou. Vó querida, sou grata a você por acreditar e sempre dizer a todos que eu sou o seu orgulho, muito obrigada, minha querida.

Ao meu esposo, companheiro de todas as horas, o meu muito obrigado por compreender a minha ausência devido aos estudos, principalmente aos domingos à tarde, prometo ser novamente a sua companheira, amo você querido.

Aos meus irmãos Eduardo e Raquel, bem como aos queridos afilhados e todas aquelas pessoas que amo e que me amam, que estive mais ausente durante este período, o meu muito obrigada pelo apoio e o carinho. E ao meu primo Jeferson, por todo o apoio na hora da formatação do trabalho, e os incentivos na luta pela graduação, dividindo comigo suas angustias e alegrias da Universidade.

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Aos professores do curso de educação física, e principalmente à minha querida orientadora professora Maria Simone, pela paciência e, orientações para este árduo trabalho de escrita, muito obrigada.

E não poderia deixar de agradecer profundamente a Escola Trilha do Saber pelo acolhimento e apoio, e as crianças, minha fonte de inspiração e motivação todos os dias. Muito obrigada meus pequeninos, vocês são à luz da minha vida.

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RESUMO

O tema deste trabalho, consiste em investigar as vivências pedagógicas com os brinquedos não estruturados de meninos e meninas de uma escola de educação infantil, localizada no município de Ijuí/RS. A pesquisa está pautada na seguinte pergunta de pesquisa: Como as meninas e os meninos das turmas de maternal 2 manipulam e interagem com estes brinquedos não estruturados? O objetivo é compreender como estes meninos, e meninas desta escola de educação infantil, se relacionam os com brinquedos não estruturados. Para isso, as observações aconteceram desde o mês de março de 2017 até o final do mesmo ano, duas vezes na semana, 1 hora e 30 minutos aproximadamente cada encontro com a turma. Os resultados, a partir das observações, é possível depreender que os brinquedos não estruturados, não possui gênero de antemão, e que estes materiais possuem outras variadas vivências, que os brinquedos industrializados talvez não possam proporcionar. E que, as meninas e os meninos brincam juntos livremente, criam apartir destes objetos, brincadeiras dos mais variados tipos, sem interferência conseguem ser e fazer o que sua imaginação permitir, sem quase nenhum tipo de inferência de que isso é de menino ou de menina. Os brinquedos não estruturados envolvem a criança muito nas estratégias de pensar as brincadeiras, e por fazê-las, criam e resignificam os objetos, trabalham a motricidade fina, onde destacamos o manuseio dos objetos, o encaixe, o equilíbrio dos mesmos, fundamental para esta faixa etária, mas também, o convívio social com os outros colegas, e a imaginação, importantíssimo para a educação infantil.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1BUZETTO, T. R. Alguns brinquedos não estruturados na escola, 2017. ... 24

Figura 2 BUZETTO, T. R. Exposição de brinquedos não estruturados na escola, 2017. ... 25

Figura 3 BUZETTO, T. R. Exposição de brinquedos não estruturados na escola, 2017. ... 25

Figura 4 BUZETTO, T.R. Meninos brincando com latas de leite, 2017... 26

Figura 5 BUZETTO, T.R. Foto tiradas durante o momento da pracinha; brincadeira com latas de leite, 2017. ... 29

Figura 6 BUZETTO, T.R. Foto tiradas durante o momento da pracinha; brincadeira com latas de leite, 2017. ... 29

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO AO TEMA DE PESQUISA... 10

2. REFERENCIAL TEÓRICO ... 13

2.1 As crianças na Educação Infantil, luz da pesquisa. ... 13

2.2 Olhando o brincar, os brinquedos não estruturados ... 17

3. METODOLOGIA ... 20

3.1 Escola ... 21

3.2 Procedimentos ... 21

3.3 Instrumentos de pesquisa ... 21

3.4 Análise dos dados ... 22

4. OBJETOS NÃO ESTRUTURADOS, A RIQUEZA DAS APRENDIZAGENS ENTRE MENINOS E MENINAS ... 23

CONCLUINDO ... 32

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1. INTRODUÇÃO AO TEMA DE PESQUISA

Quando escolhi estudar o brincar na educação infantil, não foi por acaso. Desde o sexto semestre do curso de Educação Física/ Licenciatura, dedico-me a estudar sobre a educação infantil, e após isso então procurei ir atrás de possibilidades de vivências e experiências com esta faixa etária em relação ao brincar e aos tipos de brinquedos com que as crianças têm contato. Encontrei dois tipos de brinquedos: os industrializados, aqueles que achamos para comprar prontos no mercado, e aqueles chamados de não estruturados, as antigas sucatas, que são objetos, como potes, latas, colheres, tampas, garrafas que possuem diferentes tamanhos, cores e formas.

Há três anos, comecei a trabalhar de auxiliar de educação em uma escola da rede privada1 de ensino, e tive possibilidades de estar junto às crianças. E assim pude notar diferentes formas de como as crianças costumavam a brincar. Havia brinquedos novos industrializados, coloridos, educativos, mas realmente elas gostavam de ir para a área verde da escola, sentar na terra e cavar com colheres, com madeiras, com potinhos de iogurte e margarina, os chamados brinquedos não estruturados.

As crianças demonstravam que naquele momento de brincar, apesar de ser menor tempo do que os outros, conseguiam criar, imaginar. Parece-me que se sentiam mais criativos e estimulados a investigar e descobrir coisas novas. E isso me deixou muito curiosa. Procurei então descobrir o brincar/manipular os brinquedos não estruturados, que poderiam estimular o imaginário de cada criança, e transformar no brinquedo que ela quisesse, talvez com menos interferência dos modelos de gênero, em que a cor rosa identifica a menina e o azul o menino, ou ainda, meninas brincam com boneca e meninos com bolas. Neste caso, cada criança brinca do que quiser com menos interferências.

No início do ano de 2017, fui nomeada pelo município de Ijuí/RS como auxiliar de educação infantil para trabalhar em uma escola pública. Lá as crianças não possuem tantos

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brinquedos industrializados como na escola privada, também não têm tanto espaço dentro das salas de aula, e ainda ficam o dia todo na escola, ou seja, são matriculadas em tempo integral. Essas crianças brincam dentro e fora da sala, na maioria das vezes, com brinquedos não estruturados, diferente dos outros da escola privada que brincavam menos. Essas crianças da escola pública, por mais que brincassem todos os dias com aqueles mesmos objetos, cada dia desenham e produzem novas ideias, estratégias de brincadeiras diferentes com os mesmos brinquedos não estruturados.

Então conversei com a coordenadora do turno da manhã e com algumas professoras, todas me relataram um pouquinho da sua experiência com esses materiais, como era antes, com está sendo a experiência. Assim, começaram a surgir questões de um olhar sensível para essas crianças, não que antes não houvesse, pelo contrário, muitos estudos estão acontecendo na escola bem como mostras pedagógicas em todo o município de Ijuí, em que as professoras trocam experiências e aprimoraram os seus conhecimentos a respeito desses brinquedos. Foi assim que decidi analisar o brincar, a forma como os meninos e as meninas desta escola interagem, manipulam os materiais não estruturados e os transformam em diferentes brinquedos.

Nesse sentido procurei textos no portal da CAPES com as seguintes palavras chaves: Educação Infantil, Gênero e Brinquedo, e encontrei alguns trabalhos. Destaco quais que se aproximam do meu tema. Finco (2003), traz uma discussão em sua dissertação intitulada Relações de gênero nas brincadeiras de meninos e meninas na educação infantil, “questiona o fato "natural" de que meninos e meninas possuem papéis e comportamentos pré-determinados”. A autora se opõe a essas discussões, afirmando que elas trazem que meninos e meninas têm preferências, mas pelo fato de estes serem impostos na sociedade pela cultura.

Em outra pesquisa, Vianna e Finco (2009, p.01) apresentam uma problematização em seu artigo Meninas e meninos na Educação Infantil: uma questão de gênero e poder, acerca de “buscar compreender como ocorria a educação de meninos e meninas que transgrediam as fronteiras do que lhes era imposto”, fazem uma analogia a respeito dos comportamentos que direcionam o masculino e o feminino.

Já Azevedo (2003, p.07), em sua tese intitulada Brinquedos e Gênero na Educação Infantil, apresenta um olhar voltado sobre os brinquedos e as brincadeiras das crianças da educação infantil, de zero a seis anos. Considera os brinquedos como principal meio de socialização das crianças. Para a autora, a partir do seu diagnóstico, as crianças da pré-escola, quando brincam, acabam por vezes gerando discriminação e desigualdades entre os meninos e as meninas, e isso interfere no seu processo de “formação de identidade de gênero”.

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Diante disso, lanço a seguinte pergunta de pesquisa:

Como meninos e meninas de uma escola pública de educação infantil se relacionam com brinquedos não estruturados?

E destaco o meu objetivo de pesquisa baseado em Compreender como os meninos e as

meninas de uma escola pública de educação infantil se relacionam com brinquedos não estruturados.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 As crianças na Educação Infantil, luz da pesquisa.

Nesta seção, discuto o lugar da educação infantil, sua função, e quais são os principais eixos que devem ser trabalhados, a partir da Base Nacional Comum Curricular- BNCC.

Em meados do século XIX, a escola de educação infantil era conhecida como creche2, e abrigava crianças no tempo em que seus pais estavam trabalhando, no intuito de cuidar. Mas, aos poucos, isso foi mudando até se reconhecer que as crianças dessa faixa etária, precisavam estar nas creches para aprender, desenvolver-se integralmente.

Foi a partir da Constituição de 1988 que a educação infantil passou a ser reconhecida. E a partir daí essas escolas vêm sofrendo constantes alterações e modificações como espaço de educação das crianças. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, em seu artigo 29 decretou que:

A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até cinco anos de idade, em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, linguístico e social, completando a ação da família e da comunidade.

Dessa forma, a criança é então pensada como um sujeito em desenvolvimento que aprende. E assim a educação infantil começa a tomar a forma de escola, e os professores a se dedicar ao ensinar, e não somente ao cuidar, sabendo que “é dever do Estado garantir a oferta de Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade, sem requisito de seleção”. (DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL, 2010, p. 12)

O conceito de creche vai se modificando, e as dimensões educativas nas escolas de educação infantil também. Os profissionais responsáveis pelas crianças nas salas de aula

2 Atualmente a Creche significa a faixa etária, referente de zero aos três anos de idade, mas a escola possui o nome de escola de educação infantil.

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começam a mudar. Eles deixam de ser apenas cuidadores, para serem professores, responsáveis, por proporcionar aos educandos práticas inovadoras que possibilitem as diferentes vivências com o meio, bem como com os outros. Assim, no ano de 2017, foi intitulada a nova BNCC3, que diz respeito também à educação infantil, e seus eixos norteadores.

Os eixos norteadores das Diretrizes Curriculares Nacionais (2017) consideram: O

Conviver com os outros, utilizando e aprimorando a linguagem, bem como o convívio com as

diferenças culturais; o Brincar, de diferentes maneiras e formas, utilizando espaços e tempos diferentes, com os outros, ampliando as diferentes formas culturais; a Participação, que a criança participe das suas atividade, da sua vida, sendo ativo dentro da sua sociedade, para a cada dia melhorar seu desenvolvimento e o convívio com os outros; Explorar tudo que está ao seu redor, desde movimentos, palavras, gestos, sabores, ampliando a cada dia seus conhecimentos sobre a cultura; Expressar seus sentimentos, sendo um sujeito capaz de conversar, interagir, criativo e sensível nas suas necessidades; e conhecer-se, constituindo-se como um sujeito dentro da sociedade.

Isso pode ser identificado na brincadeira, pois o brincar possibilita a convivência, a participação, a exploração, o expressar-se e o conhecer-se. Assim, a organização para a educação Infantil tem em sua centralidade a discussão em proporcionar à criança o espaço coletivo, que é seu por direito, em que possa desenvolver-se integralmente, descobrindo e se apropriando do meio em que se situa. A criança que hoje participa da escola, seja ela de tempo integral ou não, é vista como um todo, e acolhida para que seja este ambiente de cuidado, amor e muita aprendizagem para ser desenvolvida durante aquele período, assim como a base menciona em seus eixos. Compreendendo que a criança aprende em todo e qualquer momento, seja uma conversa com o colega, uma atenta observação, ou ainda com uma brincadeira livre.

Retomamos as DCNEI de 2010, para destacar que a criança é um,

Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura. (2010, p. 12)

3 “A Base Nacional Comum Curricular é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. (...) A Base estabelece conhecimentos, competências e habilidades que se espera que todos os estudantes desenvolvam ao longo da escolaridade básica.” Disponível em

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A criança é referenciada nas diretrizes como sujeito, que questiona e interage nas aprendizagens que constrói. Dessa forma, longe de ser alguém indefeso e incapaz de conhecer, saber e questionar; pelo contrário, questionadora e atenta ao que acontece ao seu redor. É dessa forma que Loris Malaguzzi (1999) nos diz que a criança é feita de cem linguagens e dentro dessas linguagens está o jeito de pensar, falar, se expressar, brincar4, fazendo um recorte daquilo que as diretrizes nos mostram, o que a base mais atual vem afirmar. Loris Malaguzzi orienta-nos no sentido de pensar a criança em suas mais diversas formas de comunicação, apurando em cem linguagens, como expressa o poema a seguir:

Ao contrário, as cem existem

A criança é feita de cem. A criança tem cem mãos

cem pensamentos cem modos de pensar

de jogar e de falar. Cem sempre cem modos de escutar de maravilhar e de amar.

Cem alegrias para cantar e compreender.

Cem mundos para descobrir. Cem mundos para inventar Cem mundos para sonhar. A criança tem cem linguagens (e depois cem cem cem) mas roubam-lhe noventa e nove.

A escola e a cultura lhe separam a cabeça do corpo.

Dizem-lhe: de pensar sem mãos de fazer sem a cabeça de escutar e de não falar

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de compreender em alegrias de amar e de maravilhar-se só na Páscoa e no Natal.

Dizem-lhe:

de descobrir um mundo que já existe e de cem roubaram-lhe noventa e nove.

Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho a realidade e a fantasia a ciência e a imaginação

o céu e a terra a razão e o sonho

são coisas que não estão juntas.

Dizem-lhe enfim: que as cem não existem.

A criança diz: ao contrário, as cem existem.

(LORIS MALAGUZZI, 1999)

A partir dessa poesia, entendo que as linguagens são muitas formas de expressão e comunicação, de diferentes maneiras. Mais precisamente, olho o brincar, e é isso que Finco (2004) afirma, dando ênfase à brincadeira e ao brincar como uma forma de linguagem.

Ao pensar a criança em todas as suas dimensões, encontrei na brincadeira uma das formas de expressão: a forma como a criança se manifesta culturalmente. Deste modo as brincadeiras oferecem múltiplas possibilidades de investigação a partir da própria produção cultural infantil e das condições em que isso ocorre. (FINCO, 2004, p. 03)

Foi a partir dessa constatação que passei a olhar para a criança em todas as suas possíveis dimensões, vista a partir do momento que brinca, se expressar, cria, sonha e imagina a brincadeira. As crianças utilizam o espaço do brincar para ter um momento delas, pois são elas que decidem, imaginam, cheias de surpresas e descobertas diárias. (EDWARDS, GANDINI e FORMAN, 2016)

Feita de linguagens, a criança que hoje vive em nossa sociedade é cada vez mais interativa, cheia de perguntas, de descobertas. Suas formas de expressão demostram o quão grandiosa é a sua criatividade para comunicar- se com o mundo que a cerca e com os outros. Cheia de curiosidade, a criança vai além do que imaginamos. Nas coisas mais simples da vida,

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ela enxerga a pluralidade que está ao seu redor e aos poucos vai absorvendo e constituindo sua identidade a partir da cultura em que vive. Crianças são crianças.

2.2 Olhando o brincar, os brinquedos não estruturados

Nesta secção, olho para o brincar baseado nos brinquedos não estruturados e de largo alcance. Faço um comparativo com os outros tipos de brinquedos que conhecemos, como os brinquedos industrializados, aqueles que encontramos para comprar nas lojas.

Acreditando que o brincar possibilita o desenvolvimento da criança, busco Pasquali (2007, p.51) para identificar que o

(...) brincar faz parte de seu esforço de compreender o mundo e requer envolvimento emocional, movimento e contato, tanto com outras crianças quanto com adultos... é a expressão de liberdade, de vida e de sentimentos; é a base da capacidade de pensamento.

Sendo assim, compreendo que o brincar medeia o contato da criança e o mundo cultural. A partir da brincadeira ocorrem seus primeiros modos de organizar o pensamento. Conforme a criança, a idade, a condição financeira, os brinquedos e a maneira de brincar se modificam, geram novos objetos, novas formas. O brincar acorre a todo momento, não tem tempo bom ou ruim que possa atrapalhar o desejo que a criança sente de brincar.

Entendo então que a brincadeira prepara a criança para a vida, que ela pratica a brincadeira sem saber do seu real benefício além do divertimento. Arriscam-se com a imaginação, tornam-se mais independentes e vai, aos poucos se descobrindo.

As brincadeiras, mediadas ou não por um adulto, ajudam-nos a conhecer melhor a criança, identificar seus medos, o que a aflige, seus sonhos, sua personalidade, quais são seus gostos. O brincar não deve ser deixado de lado, nem pelas crianças e muito menos pelos adultos que as cercam, pois é “uma das formas pelas quais a criança se apropria do mundo, e pela qual o mundo humano penetra em seu processo de constituição enquanto sujeito histórico” (ROCHA, 2005, p. 66).

A teoria histórico-cultural aborda o brincar considerando-o como importante e fundamental na constituição do sujeito (ROCHA, 2005, p. 67). Quanto mais oportunidades de brincadeiras livres e de brinquedos favoreçam a imaginação, mais ricas serão as formas que as crianças podem dar aos seus sonhos a realidade.

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Quando falo em brinquedo, não falo sobre a boneca, o carrinho, mas também de brinquedos não estruturados, as antigas sucatas como chamamos, que utilizam a imaginação para criar a forma de brinquedos, por exemplo um galho de uma árvore que pode ser transformado pela criança em inúmeros outros brinquedos, fazendo-a imaginar e sonhar, desenvolvendo o seu psicológico, não limitando a criança às restrições do mundo adulto.

Os brinquedos não estruturados geralmente não transmitem a imagem de um bebê, ou de um carrinho por exemplo, deixando de lado os discursos sobre “esses são brinquedos de meninos, esses são os das meninas”, intitulando cores, como azul para os meninos e rosa para as meninas, mas possibilitam que as próprias crianças escolham que cor elas querem, e como vai ser o brinquedo escolhido. Os brinquedos não estruturados não têm gênero, dando mais liberdade e asas à imaginação das crianças.

Os brinquedos conhecidos como não estruturados e de largo alcance5 permitem imaginar e fazer o que bem entender de determinado objeto, deixando a brincadeira muito mais alargada no sentido de criar, imaginar. A imaginação perpassa tudo o que o mundo adulto espera que aquele objeto possa ser, pois a criança cria algo totalmente diferente. Por exemplo, transformar um pote de margarina vazio em uma piscina, em um chapéu, em uma panela, ou ainda, em uma colher para pegar areia. E ainda outros que a imaginação possibilita. O momento de criação da brincadeira, manipulação de diferentes maneiras do objeto também é momento de aprendizagem, de criar estratégias.

Apesar dessas riquezas dos brinquedos não estruturados, os brinquedos industrializados, como uma boneca ou um carrinho, como já fora comentado, também podem contribuir de diferentes maneiras com as crianças, mas limitam muitas vezes nas questões de gênero e intitulam quem vai usar o quê. Uma boneca dificilmente será um avião, ou uma panela, muito menos um chapéu. Da mesma forma, um carrinho não pode servir de prato, de bola, ou muito menos de parede para um castelo.

Percebo, então, que o fato de os brinquedos serem industrializados, não os torna inúteis, que não sejam bons para as crianças. Eles são e podem ser. A discussão é ver algo que nunca foi dito por alguém e que pode ou deve ser transformado pela própria criança em um objeto ou instrumento para a sua brincadeira, fazendo sua escolha sem preconceitos de brincar com algo que “não é seu”.

5 Largo alcance, pois possibilita ter largas possibilidades de criação e imaginação, sendo apenas limitado pela imaginação de cada um.

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Pensando nesses possíveis rótulos que a sociedade impôs às discussões de gênero nos brinquedos, em que isso ou aquilo pode ser dos meninos, e isso das meninas, trago a autora Finco quando afirma que “Desde o berço, as atitudes, as palavras, os brinquedos, os livros procuram moldar as crianças para que aceitem e assumam os rótulos que a sociedade lhes reservou”. Basta vermos além das possibilidades, e compreender essa nova proposta de brincar “sem brinquedo industrializado”, abrindo espaços para pensar como uma criança se torna mais criativa quando está livre para imaginar o que quiser, afastando-a do discurso que isso é de menina, ou esse de menino, terminando com aquele tipo de “posturas, comportamentos, atitudes diferenciadas para homens e mulheres” (FINCO, 2004, p. 01).

Uma caixa de leite vazia, um pote de iogurte vazio, uma garrafa pet, uma caixa de papelão, uma garrafa de amaciante são objetos que certamente vão para o lixo após o uso do seu produto. Para as crianças, as quais proporciona-se um momento de interação com esses materiais, pode significar muito, ser algo grandioso e de valor inestimável. Desta forma, encerro este eixo, com a compreensão de que os brinquedos não estruturados podem ser de grande valor e, benéficos ás criança, uma vez que possa ter a oportunidade de interação com o mesmo. Nas próximas páginas veremos como aconteceu as observações, bem como quem foram os sujeitos observados, e a análise do que foi visto durante estes meses de trabalho de campo.

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3. METODOLOGIA

A pesquisa é de campo etnográfica, pois vivencio, lanço mão da observação e de outros recursos, como fotos e filmagens. Segundo o Gil (2002, p. 53),a pesquisa de campo é,

Tipicamente, o estudo de campo focaliza uma comunidade, que não é necessariamente geográfica, já que pode ser uma comunidade de trabalho, de estudo, de lazer ou voltada para qualquer outra atividade humana. Basicamente, a pesquisa é desenvolvida por meio da observação direta das atividades do grupo estudado e de entrevistas com informantes para captar suas explicações e interpretações do que ocorre no grupo. Esses procedimentos são geralmente conjugados com muitos outros, tais como a análise de documentos, filmagem e fotografias. —-No estudo de campo, o pesquisador realiza a maior parte do trabalho pessoalmente, pois é enfatizada importância de o pesquisador ter tido ele mesmo uma experiência direta com a situação de estudo.

Opto por uma pesquisa etnográfica, por esta ser “literalmente a descrição de culturas ou de grupos de pessoas” (CANÇADO, 1994, p.01). No caso desta pesquisa, a forma com que as meninas e os meninos de uma escola pública do município se relacionam com os brinquedos não estruturados.

O material de pesquisa encontrei nos brinquedos não estruturados que as crianças têm nas salas de aulas e também na pracinha. A observação desses sujeitos vem desde o fim de março de 2017, durante o turno da tarde, duas vezes na semana e aproximadamente 1 hora e 30 minutos cada vez, assim pude analisar as crianças e suas relações com esses brinquedos.

Os sujeitos da pesquisa são crianças que frequentam o maternal 2 de uma escola pública infantil, do município de Ijuí/RS intitulada Escola Municipal Infantil Trilha do Saber, pois trabalhei na mesma durante todo o ano de 2017, facilitando o contato com as crianças, criando assim um vínculo maior com a escola e com as crianças, uma vez que participava das suas rotinas. Escolhi essa faixa etária dos três e quatro anos, pois estão no último ano da escola de educação infantil. Como critério, frequentarão a pré-escola no ano de 2018, e também porque

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são mais ativos, já sabem falar, caminhar, e se relacionam mais facilmente com os demais colegas.

3.1 Escola

Os sujeitos escolhidos para a pesquisa são 23 crianças de uma Escola Pública Municipal Infantil, localizada no município de Ijuí, noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, com olhar sensível e específico, ao maternal 2, crianças que possuem de três e quatro anos de idade, e que, com seus diálogos e trocas de objetos com os colegas, expressam de muitas formas seus gostos e desejos, falam, cantam, nos dando maior amplitude para poder realizar a pesquisa.

3.2 Procedimentos

A pesquisa consiste na observação e análise das brincadeiras e dos manuseios der materiais que as crianças do maternal 2 da escola Trilha do Saber vivenciam diariamente. O encontro com esses materiais e uma certa intimidade com os mesmos deixam as crianças à vontade para criar e recriar diferentes formas de brincar. As observações eram duas vezes na semana, no período da tarde, 1 hora e 30min por tarde aproximadamente, sempre nas segundas feiras, e o segundo encontro com as crianças variava de semana para semana, podendo ser as vezes nas quartas, nas quintas.

3.3 Instrumentos de pesquisa

Os instrumentos utilizados foram câmera de celular para as fotos, anotações em caderno de campo, conversas. Da mesma maneira, as observações diárias da maneira como manipulam os brinquedos, formam as brincadeiras e interagem entre si, parte principal da pesquisa. Para Gil, “o estabelecimento assistemático de relações entre os fatos no dia-a-dia é que fornece os indícios para a solução dos problemas propostos pela ciência. Alguns estudos valem-se exclusivamente de hipóteses desta origem”. Sendo assim, a pesquisa é baseada principalmente na observação.

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3.4 Análise dos dados

A análise dos resultados se dá a partir da revisão de literatura, e da observação e anotações em um caderno de campo das brincadeiras, fazendo uma análise do que é visto. Na rotina das crianças consigo compreender o brincar dos meninos e das meninas, e envolvimento deles com esses materiais não estruturados, sabendo que as mesmas não serão identificadas, respeitando as imagens.

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4. OBJETOS NÃO ESTRUTURADOS, A RIQUEZA DAS APRENDIZAGENS ENTRE MENINOS E MENINAS

A Escola Municipal Infantil Trilha do Saber, localizada no Bairro Ferroviário do município de Ijuí, noroeste do estado do Rio Grande do Sul (RS), conta atualmente com professoras, auxiliares de educação infantil, serviçais, bem como um secretário, duas coordenadoras, uma para o turno da manhã e outra para o da tarde, e uma diretora. A escola possui uma boa estrutura física além de uma bela área verde, uma biblioteca em estágio final de construção.

Na organização do Projeto Político-Pedagógico- PPP a estrutura

[...] revela o compromisso das educadoras, juntamente com a comunidade escolar para com a Escola e sua história num processo democrático, participativo, que se faz ao longo do tempo, buscando novos rumos, trilhando caminhos, criando soluções e construindo saberes. (PPP, 2016, p. 05)

A escola possui um projeto baseado na leitura, conhecido como Sacola da Leitura. Todas as crianças, uma vez na semana, retiram livro da escola para levar para casa e fazer a leitura junto com a família. Foi alimentando este sonho que, em parcerias, começaram a construir a biblioteca da escola, que neste ano de 2017 foi terminada, e intitulada Biblioteca Estação Leitura, com o intuito de proporcionar aos educandos um melhor espaço para atender não só eles, mas a comunidade escolar, construindo uma cultura de leitura e troca de saberes através dos livros.

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A escola tem como principal objetivo e base

[...] a criança em seu processo de desenvolvimento e aprendizagem nos espaços educativos, possibilitando a vivência de interações sociais significativas para a construção de sua identidade e autonomia, como sujeitos de direitos e deveres. (PPP, 2016, p. 05)

Pensando nesta lógica, a partir do ano passado, a Secretária Municipal de Educação- SMEd, propôs como desafio às escolas, às professoras de toda a rede, juntamente com as suas auxiliares de educação infantil, começarem a se integrar e compreender melhor os brinquedos não estruturados, antigamente chamados de sucatas. Foi assim, que as escolas começaram a estudar e a compreender melhor esses brinquedos construindo uma ampla visão dos benefícios para as crianças, além do baixo custo.

Antigamente, as educadoras guardavam as sucatas para fazer brinquedos para as crianças, porém viram que se deixassem os mesmos materiais disponíveis para elas, surgiriam diferentes brinquedos, então esses foram chamados de não estruturados, pois não apresentavam nenhuma estrutura de brinquedo. A seguir, exemplos de brinquedos não estruturados:

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Figura 2 BUZETTO, T. R. Exposição de brinquedos não estruturados na escola, 2017.

Figura 3 BUZETTO, T. R. Exposição de brinquedos não estruturados na escola, 2017.

As imagens acima mostram alguns dos brinquedos não estruturados, em uma amostra realizada pelas escolas do município, com o intuito de mostrar os seus trabalhos e poder expor a importância que estes objetos estão tendo dentro da escola e nas salas de aula. Foi a partir de então que surgiu a dúvida, as meninas e os meninos brincam da mesma forma? A partir de março de 2017, comecei a observar os meninos e as meninas com esses materiais, tanto em brincadeiras na sala de aulas quanto na pracinha, e surgiram criações que nem podíamos imaginar.

As crianças foram observadas diariamente nos espaços da sala de aula e da pracinha. Também na pracinha, as duas turmas de maternal dois se encontravam, e era a oportunidade de

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criar brincadeiras diferentes, não só com os coleguinhas da turma, mas com outros coleguinhas, com os quais não tinham contato o dia todo, e nem todos os dias.

Os materiais não estruturados são diferentes para a pracinha e para a sala de aula, possibilitando assim, inúmeras6 criações e brincadeiras. As crianças, por mais que muitas vezes pegavam os mesmos materiais na pracinha, cada dia era um novo dia, e as brincadeiras mudavam completamente das do dia anterior. Isso mostra que a cada dia, com o mesmo material não estruturado, elas criavam e recriavam outros novos brinquedos, fazendo a alegria e a diversão durante o período permitido na pracinha ou na sala de aula, imaginados sem limites.

Olhando a figura abaixo, como primeira cena:

Figura 4 BUZETTO, T.R. Meninos brincando com latas de leite, 2017.

Na figura 4, vemos um grupo de meninos sentados no chão da pracinha, batendo em latas de leite de diferentes cores. Os meninos estavam tocando em uma banda, para isso viraram as latas de leite para baixo e batiam em cima da lata fazendo diferentes sons através das batidas. O menino que está em pé cantava e dançava, e com os galhos do chão que achara caídos das

6 Os brinquedos não estruturados são diferentes para a sala de aula e para a pracinha, pois, para a sala de aula, alguns brinquedos, como as latas e outros, são muito grandes, não tendo um lugar para guardar, ficando inadequados para o espaço. E o mesmo para a pracinha, que não comporta os brinquedos menores, como pedaços de tecidos(retalhos), que sujam facilmente e pelo tamanho não possuem tanta visibilidade em um espaço tão amplo. Os materiais são separados, pois acreditam que existe uma diferença entre eles, e que todos os diversos objetos possam ser manipulados de diferentes maneiras.

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árvores fazia de microfone ao longo da brincadeira para cantar músicas que ele mesmo criava conforme o ritmo da batida que os colegas faziam nas latas. Às vezes, uma menina que também estava brincando ali perto se aproximava, e ora tocava junto com os meninos no chão, e ora cantava com o menino que estava em pé.

As latas, nesta brincadeira, se transformaram em bateria, e permitiram a cada uma daquelas crianças que através das batidas, criassem diferentes músicas e sons. Pouco a pouco, os meninos se deslocavam com as latas, e iam para outros lugares, o que representava que estivessem indo fazer outros shows em outros lugares. Esses objetos que escolheram para brincar durante um certo tempo, como cantar e dançar, contribuíram para desenvolver duas habilidades associadas geralmente às meninas. Isso nos permitiu entender que:

Culturalmente, há mais estímulo para a dança na vida das meninas (mulheres) do que na vida dos meninos (homens). As academias, as oficinas ou ainda as aulas de educação física, de um modo geral, são cheias de meninas na pista quando o assunto é a prática de danças, embalando aulas, ensaios, festivais e talvez sonhos. (GOETTEMS E SCHWENGBER, 2012, p. 01)

As autoras Goettems e Schwengber (2012, p. 01) ajudam-nos a pensar que, culturalmente, há sim um estímulo maior para que a dança seja praticada por meninas/mulheres, ou seja, o sexo feminino historicamente aceito pela sociedade. Era os corpos femininos que demonstravam sensibilidade, sentimentos. No caso observado, no entanto, quando a menina se aproximava dos meninos, ela fazia o que eles estavam fazendo, sem diferença do que ela podia ou não fazer. Todos se divertiam e brincavam, imaginavam sem nenhuma restrição de diferenças de gênero, igualando-se na brincadeira.

Assim vemos na imagem que essa miscegenação dos corpos acontece com naturalidade, e as crianças brincam com os materiais não estruturados sem preconceito algum. Possibilita aos meninos serem também mais sensíveis ao movimento, à dança e à expressão corporal, sem discriminar a sua atuação na brincadeira, da mesa forma que a menina, podendo esta também ser protagonista das suas vontades, e brincando com os meninos como e quando quiser.

Menino brinca com coisas de menina e vice-versa. As crianças acabam tendo uma variedade muito maior de brinquedos ao seu dispor. Esses registros mostram que, quando as crianças brincam, não existe diferença de gênero. Elas querem brincar e nessa brincadeira não estabelecem separação entre brincadeiras e brinquedos de meninas de e meninos.

[...] a Educação Infantil pode ser o lugar onde as crianças encontrem o espaço para viver a infância. Não somente uma infância que lhes garanta o direito à brincadeira, mas que lhes possibilite protagonizar seus desejos e suas escolhas; que lhes permita

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usufruir o direito à diferença e à livre expressão, trazendo novas forças, novas vozes e novos desejos (FINCO, 2003, p. 89).

Se estiverem livres para “transgredir”, aponta Finco (2003), as crianças podem dar novos significados à cultura na qual estão inseridas. Se uma criança vê o coleguinha brincando de algo, logo fica interessada em participar, independente do que seja. Geralmente quando a criança brinca, quase tudo que está em seu entorno interessa, desperta curiosidade: elas querem experimentar. Quanto mais livre ela estiver para explorar, descobrir, mais rica será essa experiência, e maior, a sua aprendizagem.

A segregação de gênero começa aos 2,5 a 3 anos de idade e aumenta em força e intensidade durante o período da vida. Como consequência, as crianças têm geralmente mais probabilidade de serem socializadas por pares do mesmo gênero. Quando meninos e meninas se integram, se reúnem, criam-se oportunidades para se socializarem umas com as outras.

A socialização de pares de crianças menores no desenvolvimento de gênero, sugere que os meninos e as meninas crescem em mundos sociais juntos tendo de aprender sobre os outros e aprender uns com os outros. Essa integração ajuda nos relacionamentos posteriores entre homens e mulheres, na adolescência e na idade adulta.

Para Goettems e Schwengber “Uma criança saudável transita pelos universos feminino e masculino com naturalidade, pelas aprendizagens decorridas, e toma a diferença como condição/desejo de aprender”. (2012, p.01) A brincadeira com as latas de leite, meninos e menina a realizam de maneira livre, sem nenhuma restrição das relações de gênero. As crianças brincam com o que querem, e as latas de leite, classificadas como materiais não estruturados possibilitaram essa intervenção. A imaginação das crianças mostradas na imagem 1, “transita pelos universos com naturalidade”, assim como dizem as autoras Goettems e Schwengber (2012, p.01), citadas acima.

A seguir mostro, outras duas imagens, com as mesmas latas de leite, e com brincadeiras totalmente diferentes:

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Figura 5 BUZETTO, T.R. Foto tiradas durante o momento da pracinha; brincadeira com latas de leite, 2017.

Figura 6 BUZETTO, T.R. Foto tiradas durante o momento da pracinha; brincadeira com latas de leite, 2017.

Na figura 5, vemos outra forma de brincar em que a imaginação e a manipulação do mesmo objeto usado anteriormente, em outro grupo de crianças. Agora as mesmas latas se transformaram em uma grande torre que abriga animais de estimação. Uma de cada vez, andava

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pela pracinha a fim de buscar mais latas para que mais animais pudessem se abrigar naquela torre. Os demais protegiam a torre para que as outras crianças que estivessem passando por ali não a derrubassem.

A brincadeira se sucedeu por um grande período de tempo em que meninos e meninas brincavam, imaginavam, criavam, sonhavam, conversavam e interagiam, sem definição de certo para uns, ou errado para outros As meninas e os meninos desempenhavam o mesmo papel dentro da brincadeira, sendo todos responsáveis pelas ações.

Na figura 6, identificamos um menino e três meninas participando de uma brincadeira com as latas de leite e com as tampas das latas. Nessa brincadeira o que mais me chamou a atenção foi um revezamento muito grande das funções ali desempenhadas. Um cozinhava, outro cantava, outro buscava alimentos, outro dançava. Tanto as meninas quanto o menino tinham um mesmo papel, todos faziam um pouquinho cada dez, e sem nenhum desentendimento aceitavam a hora de trocar de lugar novamente com o colega. Um colaborava com o outro, e a brincadeira acontecia sem separação de “meninos não cozinham”, ou ainda, meninas não podiam trazer o “alimento para dentro de casa”.

As figuras mostram diferentes momentos e brincadeiras em que as crianças tinham a oportunidade de um momento livre, quando fariam o que quisessem. As crianças, cada uma com suas vontades, desejos, traduziam suas expressões através dos brinquedos, mostrando que, com um mesmo objeto, poderiam brincar de diferentes maneiras, e com tão pouco para nós, para eles grandes invenções e criações, sem nada de preconceito, ou algo pré-determinado.

Nessas figuras, vemos características do cuidar, do amar, bem como de cozinhar e servir o alimento, atrelados fortemente à cultura como características femininas, coisas que somente as mulheres poderiam fazer. As crianças sem entender isso, sem interferência de adultos, brincam livremente com brinquedos não estruturados, e fazem o que têm vontade de fazer, não o que os outros querem que elas façam.

A brincadeira mostra que os meninos também podem cuidar dos outros (animais como no exemplo da brincadeira). Eles também amam, e nem por isso são considerados ou julgados como se estivessem trocando os papéis, como uma atividade feminina. Por isso, acredito que os brinquedos não estruturados possibilitam uma análise do valor que eles têm em suas mais diversas formas, tamanhos e cores, por deixarem criança livre para brincar e criar o que quiser, o que sua imaginação permitir.

Retomo minha análise sobre os brinquedos não estruturados. Eles não estipulam o que aquele “pote”, por exemplo, pode ser, mas o pote é entregue à criança para ela criar o que imaginar com o mesmo. O fato de não ter uma estrutura pronta, como o carrinho ou a boneca

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que direcionam a brincadeira, o brinquedo não estruturado possibilita a criança imaginar, e não só isso, construir seu próprio brinquedo, um recurso importante para o seu desenvolvimento motor, pois auxilia na motricidade fina. Como o manuseio do objeto, a construção do brinquedo, o equilíbrio que a criança pode ter, seus primeiros entendimentos de medida, de peso, fazendo comparações, aprendendo enquanto brinca.

O fato de a criança criar o seu brinquedo auxilia também na esfera cognitiva, pois ela precisa pensar o que fazer, e como fazer para que o brinquedo/brincadeira funcione. Isso estimula a imaginação, faz pensar sobre o que mais pode auxiliar na construção do novo objeto, qual outro objeto ajudaria para que ela o terminasse. E ainda, na esfera social, não menos importante que as outras, ajuda no desenvolvimento do sujeito no grupo: o saber dividir, entender o colega e suas necessidades, aprender a ajudar os outros, saber respeitar o momento de cada um construir mesma brincadeira no grande grupo, transformando tudo em um grande momento de aprendizagens.

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CONCLUINDO

Longe de finalizar o assunto discutido, mas sim responder à pergunta da pesquisa. Durante todo esse período de março de 2017 até o final do ano, que estive com as crianças na escola, observando-as, pude perceber como elas criam e imaginam situações, brinquedos e brincadeiras diferentes, com objetos tão simples para nós, mas para elas tão grandiosos. Os brinquedos não estruturados, o nosso foco para discutir as relações de gênero, possibilitaram ver que as crianças conseguem imaginar, pensar e brincar sem separar o que é de menino ou de menina.

Vi que os brinquedos não estruturados possibilitam a intervenção da criança por não serem prontos como os industrializados; por não terem apenas a cor rosa ou a cor azul, mas várias cores, além de tudo não introduzem a questão do consumo nas crianças, mas sim a reutilização dos materiais. Assim as crianças, nenhuma vez escolhiam o objeto com que iriam brincar pela cor, mas sim pelo formato, pensando na criação do brinquedo, em que aquilo poderia ser transformado, fazendo algo novo a cada dia, em uma grande imaginação, cheia de possibilidades e sonhos.

Meninas que brincam de casinha de boneca, não eram mais as protagonistas das brincadeiras na pracinha ou na sala de aula. Da mesma forma que, os carrinhos e as bolas também não eram mais algo tão visto, principalmente em um mundo que era visto e chamado de azul. As crianças ao invés disso, criaram e inventaram o que elas queriam brincar, imaginando tudo aquilo que a fantasia permitisse.

Em uma visão panorâmica da pracinha da escola, o colorido das latas de leite, das tampas, das garrafas de amaciante, dos potes plásticos, enfim, o colorido dos objetos não estruturados dava a oportunidade de ver meninos e meninas na maioria das vezes brincando juntos, criando as brincadeiras e se divertindo, sem nenhum constrangimento sobre as relações de gênero, e ainda trabalhando sem saber outros fatores como a motricidade fina no manuseio das peças, no encaixe, para a criação do seu objeto.

Aqueles mundos rosa e azul se transformaram em um lindo arco íris. As meninas brincavam livremente com os objetos azuis, e os meninos com rosa, mas também com todas as

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outras cores, possibilitando aí, na visão de uma esfera social, que eles pudessem brincar juntos, saber dividir, não criar preconceito algum, e um ajudar o outro, sendo solidário na invenção da brincadeira. Ambos brincavam de casinha, de comidinha, de escolinha, de pista, e de tudo que a imaginação possibilitava inventar.

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