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NARRATIVAS E SIMULAÇÕES: O USO DE INFOGRÁFICOS NA COBERTURA JORNALÍSTICA DA PANDEMIA DE COVID 1

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Academic year: 2021

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NARRATIVAS E SIMULAÇÕES: O USO DE INFOGRÁFICOS NA COBERTURA JORNALÍSTICA DA PANDEMIA DE COVID1

Luigy Bitencourt HUDSON2 Daniel Melo RIBEIRO3

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG

RESUMO

Este estudo objetiva analisar o potencial jornalístico dos infográficos utilizados na cobertura da pandemia de covid-19. Para tanto, foram escolhidos os infográficos How

the virus got out? e Why outbreaks like coronavirus spread exponentially, and how to “flatten the curve”, publicados, respectivamente, pelos jornais The New York Times e The Washington Post em março de 2020. A análise foi fundamentada pela semiótica de

Charles Peirce, uma corrente de estudos que investiga como os signos se comportam nos diversos tipos de discursos, buscando reconhecer e identificar aspectos semióticos fundamentais dos dois infográficos. Conclui-se que ambos fazem uso de recursos que podem auxiliar coberturas jornalísticas (respectivamente, narrativas e simulação); bem como contribuíram de maneira exemplar para explicar questões sobre a pandemia de covid-19, tornando o conteúdo mais claro e acessível.

PALAVRAS-CHAVE

infográfico; covid-19; semiótica; jornalismo.

INTRODUÇÃO

Nos primeiros meses de 2020, o mundo foi acometido por um dos mais relevantes eventos das últimas décadas: a pandemia de covid-19, doença causada pelo vírus Sars-CoV-2, da família dos coronavírus. Trata-se de um acontecimento sem precedentes na história recente e que, principalmente nos primeiros meses da pandemia, estava rodeado por dúvidas e incertezas. As primeiras notícias e reportagens procuraram esclarecer o comportamento do vírus, a real escala de perigo e as medidas que deveriam ser tomadas para evitar um grande número de pessoas infectadas. Em poucas semanas, todo o planeta se viu envolvido não apenas em questões sanitárias, mas também políticas e sociais, evidenciando como a pandemia se configurou como um fenômeno de difícil compreensão. Desse modo, a infografia surge como uma ferramenta jornalística fundamental para facilitar o entendimento acerca dos fatos envolvendo a pandemia.

1 Trabalho apresentado no IJ01 – Jornalismo, da Intercom Júnior – XVI Jornada de Iniciação Científica

em Comunicação, evento componente do 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.

2 Estudante de Graduação do Curso de Jornalismo da FAFICH-UFMG, e-mail: luigy42hudson@ufmg.br. 3 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Jornalismo da DCS-UFMG, e-mail:

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Neste estudo, argumentamos que o jornalismo pode se beneficiar da infografia para cumprir seu papel em traduzir os acontecimentos de uma maneira compreensível para a população. Afinal, é responsabilidade do jornalismo informar sobre a situação do contágio, da capacidade hospitalar, dos efeitos da doenças, dos impactos na economia e assim por diante.

A pandemia também demonstrou, para o jornalismo, a relevância das técnicas de visualização para a compreensão de dados técnicos. O jornalismo se encontra, pois, diante de uma importante tarefa: interpretar os dados das pesquisas científicas geradas sobre a doença para traduzi-los em um formato acessível ao público. Podemos enxergar a pandemia como uma espécie de marco para reportagens que trabalham com visualizações e infografia (SHNEIDERMAN, 2020).

Possuímos, assim, um importante desafio, do ponto de vista da prática jornalística: como comunicar os problemas da pandemia de maneira mais clara e objetiva? Desse modo, nosso estudo irá explorar a infografia como recurso comunicacional, com o objetivo de avaliar seus potenciais para explicar temas complexos, como a pandemia de covid-19. Diante dessa questão, acreditamos que o uso de uma linguagem que articule textos e imagens pode ser uma maneira didática e eficiente de comunicar fatos jornalísticos ao público.

REFERENCIAIS TEÓRICOS

Segundo Juliana Carvalho e Isabella Aragão (2012, p. 166), um infográfico é “um artefato produzido no intuito de comunicar uma mensagem que compõe uma interpretação de dados quantitativos, espaciais, narrativos e/ou cronológicos, contextualizados visualmente através da integração de texto, imagens e/ou formas”. Nesse sentido, o infográfico se apresenta como uma ferramenta comunicacional bastante útil no jornalismo, na medida em que combina imagens e textos na cobertura de notícias ou na explicação de um fenômeno de difícil compreensão. É importante destacar o caráter complementar que esses dois fatores exercem no entendimento do leitor: tanto imagem quanto texto contribuem igualmente para a formação do infográfico e um não deve se sobressair e completar a explicação sem o auxílio do outro (TEIXEIRA, 2008).

Nesse sentido, o infográfico é uma ferramenta que se apoia em recursos gráficos, textuais e interativos para representar uma notícia. Na medida em que nosso objetivo é

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estudar como os infográficos utilizam esses recursos para facilitar o entendimento de determinado fenômeno, desenvolvemos uma análise seguindo a metodologia semiótica, mais especificamente, a semiótica desenvolvida por Charles S. Peirce e sua teoria sobre os signos.

De maneira simplificada, podemos compreender os signos como “alguma coisa que representa algo para alguém” (SANTAELLA; 1995, p. 22). Em outras palavras, os signos são entidades que se manifestam em um determinado suporte material e tentam representar, em parte pelo menos, algo diferente de si (o objeto), carregando um potencial interpretativo (os interpretantes), capaz de sensibilizar um intérprete (SANTAELLA, 1992). Sendo assim, todo infográfico é um signo na medida em que representa um fato ou acontecimento (que é o objeto) e gera efeitos interpretativos na mente dos leitores (interpretantes).

Além disso, o infográfico pode ser classificado como um tipo especial de signo, conhecido como diagrama. Segundo Priscila Farias, um diagrama “pode ser definido, de modo geral, como uma associação entre elementos expressos por meio de relações em um ambiente visual” (FARIAS, 2008, p. 02). O diagrama é um signo que estimula o raciocínio lógico através da articulação visual das relações estruturais entre suas partes (QUEIROZ; MORAES, 2013), destacando fenômenos ocultos e de difícil visualização, que se encontram, por exemplo, nas entrelinhas dos fatos nas reportagens.

METOLOGIA DE PESQUISA

Inicialmente, realizamos a coleta e a tabulação de infográficos sobre a pandemia de covid-19. Em seguida, selecionamos os infográficos mais relevantes, observando os seguintes critérios, baseados em Silveira (2010): clareza, precisão dos dados, usabilidade e relevância do conteúdo.

Assim, escolhemos como objetos de estudo dois infográficos, intitulados How

the virus got out? (figura 1) e Why outbreaks like coronavirus spread exponentially, and how to “flatten the curve” (figura 2) e publicados, respectivamente, pelos jornais The New York Times e The Washington Post, em março de 2020. Ambos se destacam por

utilizarem dois recursos interativos relevantes (narrativa e simulação) e por sua relevância mundial. Argumentamos que esses infográficos facilitam o entendimento dos leitores acerca de alguns aspectos do surto de covid-19, que, à época, ainda era um fenômeno recente e incerto.

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Figura 1: How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

Figura 2: Why outbreaks like coronavirus spread exponentially, and how to “flatten the curve” Fonte: The Washington Post (STEVENS, 2020)

Nosso método de análise possui o formato de um roteiro de perguntas baseado na teoria dos signos de Peirce como compreendida por Santaella (1995). Na primeira parte, foram reconhecidos os aspectos semióticos fundamentais dos infográficos: signo (o infográfico em si), objeto (o que ele representa) e interpretantes (as possíveis interpretações que os leitores podem fazer). Na segunda parte, buscou-se analisar suas propriedades icônicas, indiciais e simbólicas que relacionam o signo com seu objeto. Na terceira, realizou-se a identificação dos possíveis efeitos interpretativos que os infográficos podem gerar, seguindo os conceitos de interpretantes emocionais, energéticos e lógicos. Por fim, foi feita uma análise conclusiva, onde alguns pontos de interesse foram identificados em ambos os infográficos e usados para destacar sua relevância jornalística.

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ANÁLISE DOS CASOS

1) THE NEW YORK TIMES, How the virus got out?

O primeiro infográfico faz parte de uma matéria do jornal The New York Times intitulada How the virus got out?, publicada dia 22 de março de 2020 e escrita por Jin Wu, Weiyi Cai, Derek Watkins e James Glanz4. O assunto tratado é a disseminação da covid-19 desde sua origem, em Wuhan, China, até a situação atual mundial (na época da publicação da matéria, em março de 2020).

Assim, pretende elucidar as etapas e os acontecimentos que levaram o novo coronavírus a se tornar a primeira grande pandemia do século XXI, elencando-os de forma temporalmente ordenada para melhor compreensão do leitor. Além disso, pretende responder o que foi feito pelas lideranças mundiais e como elas trataram o assunto; como as escolhas tomadas geraram graves consequências, principalmente para a cidade de Nova York (onde o jornal é publicado e seu principal público alvo reside).

O infográfico é animado: suas cenas são desencadeadas na medida em que o usuário “rola” a tela com o mouse. Dividido em várias cenas, cada uma conta um capítulo da narrativa, começada em Wuhan, na China, com os primeiros casos de covid-19, seguindo a doença ao se espalhar pelo mundo e terminando em Nova York, até o momento da publicação da matéria. Podemos identificar 6 cenas principais:

1) Mapa da China

Figura 3: primeira cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

2) O mercado de alimentos em Wuhan

Figura 4: segunda cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

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3) A multiplicação dos casos

Figura 5: terceira cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

4) Wuhan como epicentro da doença

Figura 6: quarta cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

5) De Wuhan para outras cidades do mundo

Figura 7: quinta cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

6) Propagação nos EUA

Figura 8: sexta cena de How the virus got out? Fonte: The New York Times (CAI et al., 2020)

Como é possível perceber, de maneira geral, em todas as cenas da narrativa, há uma predominância de diagramas que enfatizam elementos espaciais: distâncias entre as localidades, cidades e países. Há também um uso intensivo de mapas, principalmente para ilustrar a China e os Estados Unidos. As outras formas que se destacam são bolinhas animadas, que se movimentam sobre esses diagramas como fluxos, deslocando-se de um ponto a outro. As imagens de fundo do infográfico são monocromáticas, em tons de cinza. Os únicos elementos coloridos são justamente os fluxos animados que se espalham sobre os diagramas, ora em azul, ora em vermelho.

As imagens são quase totalmente animadas e a interatividade oferecida se dá pela rolagem da página, que avança as cenas do infográfico. As formas que se destacam constituem mapas, onde se dá a animação, acompanhando a narrativa temporal. Quando os eventos narrados, relacionados ao contágio e evolução da pandemia, deixam a China, se expandindo para o mundo, um diagrama que lembra um mapa de metrô é utilizado no

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lugar do mapa mundi. O diagrama ilustra as conexões entre as principais cidades que se conectam à Wuhan, numa disposição espacial que, embora não corresponda à real escala geográfica, privilegia as conexões lógicas entre essas localidades.

Os principais dados presentes estão na parte escrita da notícia e dizem respeito às datas, aos locais e aos números envolvidos em cada acontecimento. São extremamente precisos e as fontes são bem indicadas sempre que necessário. No final da matéria, há ainda uma nota com todas as fontes que não foram citadas ao longo da notícia e indicação de um material adicional usado para sua elaboração. Cada cena possui sua própria legenda, que pode estar integrada ao conteúdo textual. Na verdade, pode-se dizer que há dois tipos de legenda no infográfico: um mais tradicional serve como índice para apontar o significado dos elementos (das cores das bolinhas e seus fluxos, principalmente); e outro que seria o próprio texto, que explica o que o comportamento de cada elemento (das bolinhas) quer dizer.

A finalidade do infográfico é informar sobre a evolução da covid-19 através de uma narrativa temporal que destaca os principais fatos ocorridos com relação à doença e sua disseminação. A narrativa começa na China (marco zero da pandemia) e se expande para o resto do mundo conforme o surto se alastra descontroladamente. Ao final, dá-se foco especial à situação na cidade de Nova York. Essa mensagem é facilmente identificada tanto pelas escolhas estéticas, estilísticas e de abordagem do infográfico quanto pelo conteúdo textual.

O infográfico exige atenção do leitor. Porém, o conteúdo textual que acompanha cada parte explica com maestria o que se pretende comunicar e minimiza possíveis dúvidas e interpretações diversas. A harmonia é atingida tanto pelo fato de as bolinhas estarem muito juntas e em fluxo (o que diminui a apreensão que vários pequenos objetos se movimentando podem causar) quanto pela utilização do diagrama (com suas linhas verticais, horizontais e transversais) no lugar do mapa mundi. A pequena velocidade na qual as bolinhas se movimentam também diminui a poluição visual. Percebe-se certo caráter de urgência na medida em que se avança na narrativa e a história vai tomando proporções maiores (cresce o número de infectados e o número de localidades envolvidas).

As causas e consequências do fato noticiado estão claras e bem desenvolvidas; inclusive, essa é a abordagem que a matéria dá aos acontecimentos: como um acontecimento local desencadeou as sucessivas expansões do contágio para outras

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regiões, a partir do foco inicial na cidade de Wuhan. Nesse sentido, o infográfico pode causar apreensão e indignação, na medida em que elucida todos os principais acontecimentos envolvendo a disseminação da covid-19 ao redor do planeta. A notícia adota certo tom irônico ao fazer questão de reforçar determinadas falas de autoridades, provocando o leitor a compará-las, visualmente, à situação atual. Por exemplo, na sexta cena (figura 8), o infográfico destaca a seguinte frase: “‘The virus will not have a chance against us’ he [Donald Trump] said.”, ou “O vírus não terá a menor chance contra nós”, em tradução livre. (CAI et al., 2020).

Apesar de a proporção do tamanho das bolinhas e suas quantidades presentes em cada fluxo não corresponderem, de maneira precisa, aos dados reais, a qualidade do infográfico não é comprometida, já que representar minuciosamente as proporções e quantidades na casa das milhões de pessoas o deixaria extremamente poluído e complicado. Portanto, o infográfico é didático e cumpre perfeitamente o que propõe: narrar a evolução da covid-19 da China para o mundo e fazer o leitor compreender melhor a situação em que se encontrava a pandemia naquele contexto (em março de 2020).

2) THE WASHINGTON POST, Why outbreaks like coronavirus spread exponentially,

and how to “flatten the curve”

Já o segundo exemplo, trata de um infográfico veiculado pelo jornal The

Washington Post, publicado no dia 18 de Março de 2020, em uma matéria intitulada

“Why outbreaks like coronavirus spread exponentially, and how to ‘flatten the curve’” (“Por que surtos como o coronavírus se espalham exponencialmente e como ‘achatar a curva’”)5. A reportagem teve grande repercussão mundial por conseguir esclarecer, de

forma bem simples e didática, algumas dúvidas pertinentes, em um momento em que a pandemia ainda se encontrava em seus estágios iniciais.

Como podemos ver na figura 9, trata-se de uma simulação na qual bolinhas coloridas em movimento são utilizadas para representar pessoas em seu dia-a-dia, podendo essas mudar de cor ao colidir umas com as outras, indicando uma suposta infecção causada pela doença “simulitis”, criada pela matéria para fins didáticos. As diferentes cores (azul claro, marrom e roxo) são dadas às bolinhas representando,

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respectivamente, pessoas “saudáveis”, “doentes” e “recuperadas”. Um gráfico de áreas acompanha a simulação expondo matematicamente seus resultados.

Figura 9: simulação didática para explicar a tendência exponencial de surtos pandêmicos. Fonte: The Washington Post (STEVENS, 2020)

O objetivo do infográfico, como o próprio título já diz, seria explicar o comportamento exponencial que surtos como o causado pelo novo coronavírus podem apresentar; bem como evidenciar, através de gráficos com diferentes situações, algumas estratégias (por exemplo, o distanciamento social) que podem retardar o avanço dessas enfermidades (figura 10).

Figura 10: gráficos gerados na simulação de diferentes estratégias de combate ao surto. Fonte: The Washington Post (STEVENS, 2020)

Para tanto, utiliza-se um recurso animado e interativo: e as bolinhas começam a se movimentar assim que o leitor executa a animação; seu movimento é aleatório e desordenado, não obedecendo a nenhum padrão pré-existente (o que, por fim, impossibilita que a simulação se repita). As três cores estão presentes nas bolinhas, cujo pequeno tamanho e a rápida velocidade podem dificultar sua distinção; e no gráfico de áreas, onde não ocorre tal problema, fornecendo o contraste necessário para diferenciar facilmente os três estágios (pessoas saudáveis, doentes e curadas).

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Esse esquema representa o comportamento de pessoas em seu dia-a-dia circulando pela cidade e entrando em contato umas com as outras, conforme a figura 10. Quando pessoas saudáveis (bolinhas azuis) entram em contato (se chocam) com pessoas infectadas (bolinhas marrons), também se tornam infectadas e podem fazer o mesmo com outras, aumentando a velocidade de contágio exponencial (transformação de bolinhas azuis em marrons). Após certo tempo, as bolinhas marrons se tornam roxas (representando pessoas que contraíram “simulitis” e se recuperaram).

Figura 11: a simulação do surto já em estágios avançados. Fonte: The Washington Post (STEVENS, 2020)

Sendo assim, por mais que a aleatoriedade do comportamento das bolinhas impeça que uma simulação seja igual a outra, o gráfico de áreas gerado tende a ser parecido ou, até mesmo, idêntico (figura 12). Tal associação entre ambos os gráficos pode exigir do leitor certo conhecimento matemático sobre proporções para compreensão integral da proposta; tarefa que a explicação feita pela reportagem ajuda a cumprir.

Figura 12: gráficos de áreas gerados após se iniciar a simulação duas vezes. Fonte: The Washington Post (STEVENS, 2020)

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A simulação, como um todo, é harmônica; porém, o comportamento caótico das bolinhas pode causar confusão e apreensão no leitor. Os elementos visuais do infográfico são simples, parecendo não seguir o projeto gráfico do jornal The

Washington Post. Essa simplicidade, que, por um lado, pode auxiliar na compreensão

do leitor, por outro falha ao cativá-lo emocionalmente, ao optar por representar pessoas por simples bolinhas iguais e sem rosto, causando distanciamento e indiferença às consequências do espalhamento da doença.

O primeiro gráfico (sem distanciamento social) pode causar preocupação ao leitor pela velocidade com que as bolinhas infectadas se espalham, o que é minimizado nos próximos gráficos (com 25% e 87,5% de isolamento social). Essa tendência reforça a eficácia e importância da adoção das estratégias de distanciamento social.

O infográfico exige que o leitor consiga entender a comparação que é feita entre a “simulitis” e a covid-19; bem como o caráter simulatório, que não representa a pandemia em sua totalidade, o que é muito bem explicado pela a matéria que acompanha o infográfico, inclusive destacando suas falhas (de não conseguir representar as mortes, por exemplo). Não há escalas e números relativos; mesmo o gráfico de áreas que auxilia a compreensão da proporção de pessoas saudáveis, infectadas e curadas, não exige que o leitor faça cálculos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das análises, podemos chegar à conclusão de que os dois infográficos cumprem, de maneira exemplar, os objetivos a que se propuseram: o infográfico do The

Washington Post faz uma simulação para explicar a tendência exponencial de surtos

pandêmicos; e o do The New York Times conta uma narrativa temporal com os principais acontecimentos sobre a pandemia. Isso demonstra, com sucesso, a relevância do uso da infografia como uma linguagem pertinente e enriquecedora do texto jornalístico. Trata-se de um formato que pode e deve ser explorado pela cobertura jornalística de maneira mais intensa, como um recurso didático valioso em contextos noticiosos de alta complexidade. A combinação harmoniosa e estimulante entre textos e imagens animadas conduz o leitor a uma interpretação mais clara sobre o fenômeno em questão.

No infográfico publicado pelo The New York Times, é interessante notar que a relação imagem-texto é invertida: o infográfico representa o corpo da notícia e o

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conteúdo textual é complementar. Mesmo assim, nas cenas onde o uso do texto para facilitar o entendimento se mostra necessário, a imagem é colocada no fundo e desfocada, cumprindo papel apenas estético, e a atenção é toda voltada para o texto. Isso demonstra que os autores não menosprezam a eficácia que tanto as palavras quanto as imagens podem ter ao passar uma mensagem e conseguem adequar cada tipo a cada finalidade, dominando o potencial explicativo que o binômio imagem-texto pode fornecer à reportagem (TEIXEIRA, 2010).

Já no caso do The Washington Post, tanto o infográfico quanto a matéria apontam para o fato de que quanto maior o distanciamento social, mais lentamente a doença se espalha (sendo essa mensagem seu principal objetivo); porém, é possível que o infográfico falhe ao tentar cativar emocionalmente o leitor: enquanto sua simplicidade facilita a compreensão do problema, acaba podendo causar apatia ao leitor quanto à emergência da situação. A incapacidade de representar as mortes também prejudica a demonstração das reais consequências que o surto de covid-19 pode ter. De modo geral, pode-se dizer que o infográfico prioriza elementos de secundidade (causa e consequência) e terceiridade (reflexão lógica das consequências do contágio, simulação matemática), em detrimento do caráter emocional e icônico, típicos da primeiridade (SANTAELLA, 1992), o que, porém, se encaixa perfeitamente em sua proposta didática e explicativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAI, Weiyi; GLANZ, James; WATKINS, Derek; WU, Jin. How the virus got out?. The New York Times, Nova Iorque, 2020. Disponível em:

<https://www.nytimes.com/interactive/2020/03/22/world/coronavirus-spread.html>. Acesso em: 25 set. de 2020.

CARVALHO, Juliana; ARAGÃO, Isabella. Infografia: Conceito e Prática. Revista Brasileira de Design da Informação. São Paulo, v. 9, n. 3, p. 160-177, 2012.

FARIAS, Priscila. O conceito de diagrama na semiótica de Charles S. Peirce. Tríades em Revista, v. 1, n. 1, p. 1-13, 2008.

QUEIROZ, João.; MORAES, Lafayette de (Org.). A lógica de diagramas de Charles Sanders

Peirce: implicações em ciência cognitiva, lógica e semiótica. Juiz de Fora : Editora UFJF, 2013.

SANTAELLA, Lucia. A teoria geral dos signos: semiose e autogeração. São Paulo: Ática, 1995.

SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica. 10. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992.

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SHNEIDERMAN, Ben. Data Visualization’s Breakthrough Moment in the COVID-19 Crisis.

Nightingale: The Journal of the Data Visualization Society. 30 de Abril de 2020. Disponível

em: < https://medium.com/nightingale/data-visualizations-breakthrough-moment-in-the-covid-19-crisis-ce46627c7db5>. Acesso em: 25 set. 2020.

SILVEIRA, Luciana Hiromi Yamada da. Modelo de caracterização de infográficos: uma proposta para análise e aplicação jornalística. 2010. 175p. Dissertação (Mestrado) - Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

STEVENS, Harris. Why outbreaks like coronavirus spread exponentially, and how to "flatten the curve". The Washington Post. Washington, DC, 2020. Disponível em:

<https://www.washingtonpost.com/graphics/2020/world/corona-simulator/>. Acesso em: 25 set. de 2020.

TEIXEIRA, Tattiana. Infografia e jornalismo: conceitos, análises e perspectivas. Salvador: Edufba, 2010.

Referências

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