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A AMBIENTALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

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AMBIENTALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS DE

DESENVOLVIMENTO NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

The environmentalization of development policies in the Brazilian Amazon

Pedro Rapozo*

In this article we intend to reflect on the po-licies of modernization and development of the Brazilian State by the administrative structure in the course of the twentieth cen-tury. We present a discussion of theories of development and its theoretical framework between the environmental and social con-tradictions pertaining to the development models adopted in the country and in re-gions like the Brazilian Amazon at the end of the century. These aspects are discussed in that our perspective proposes a theoretical reflection from the debates on environmen-tal issues at the heart of the applicability of the models of Latin American Development and the contemporary dynamics of institu-tionalization of the management of natural resources.

Procuramos neste artigo apresentar como se processaram as políticas de modernização e desenvolvimento do Estado brasileiro à luz de sua estrutura jurídico-administrativa no decorrer do século XX. Neste contexto, apre-sentamos uma discussão sobre os modelos de desenvolvimento adotados no país e em regi-ões como a Amazônia brasileira em fins de sé-culo. Tais aspectos são discutidos na medida em que se propõe uma reflexão por meio dos debates sobre as questões ambientais no cer-ne da aplicabilidade dos modelos latino-ame-ricanos de desenvolvimento e as dinâmicas contemporâneas resultantes de um processo ao qual denominamos ambientalização insti-tucionalizada da gestão dos recursos naturais.

Palavras-chave: Amazônia brasileira.

Desenvol-vimento. Meio ambiente.

ABSTRACT

Keywords: Brazilian Amazon. Development.

Environment.

RESUMO

*Doutor em Sociologia pela Universidade do Minho (Portugal) Erasmus Mundus PhD Fellowship Programme – European Commission. Professor da Universidade do Estado do Amazonas e coordenador do Núcleo de Estudos Socioambientais da Amazônia (Nesam) |

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1 Modernização e desenvolvimento do Estado Brasileiro: a integração nacional da Amazônia aos modelos de valorização econômica

Do ponto de vista sociológico, podemos compreender como o pro-cesso de modernização1 do Estado

brasileiro traduziu-se em alguns as-pectos ou elementos de organização das suas estruturas jurídico-adminis-trativas por um lado e, por outro, em um planejamento político-econômico associado a modelos teóricos de de-senvolvimento alheios à realidade so-cialmente diferenciada do país.

As experiências da transição econômica de uma economia agrário--exportadora para uma economia in-dustrial em ritmo acelerado arquite-taram o discurso dominante no início do século XX sobre a priorização dos fatores econômicos como resposta aos problemas sociais. Nesse sentido, a modernização pode ser pensada como reflexo dos processos de racio-nalização do Estado na tentativa de buscar a eficácia do sistema produ-tivo e da administração pública por meio de suas instituições políticas.

O fenômeno das mudanças sociais diante da situação socioeco-nômica do país foi marcado, inicial-mente, por uma intervenção cada

vez maior do Estado na economia, principalmente no campo das con-dições estratégicas do desenvolvi-mento econômico e na consolidação dos ideais de nação. Dessa forma, as teorias do planejamento e da moder-nização deram suporte às políticas de desenvolvimento que buscavam o crescimento econômico nacional.

Reflexos desses contextos foram a urbanização e a industrialização for-jadas, sobretudo, a partir da década de 1930, que apresentavam fenômenos de transformação política e econômica, representando, segundo Ianni (1999), uma ruptura estrutural na sociedade pela qual passava a crise de transição da sociedade brasileira.

A formação econômica de-pendente, que caracterizaria as eco-nomias periféricas em países con-siderados subdesenvolvidos como o Brasil, segundo a abordagem de Mauro Marini (2000), permanece-ria em torno do mercado mundial e subordinada aos centros do capita-lismo. Por conseguinte, essas econo-mias não teriam como constituir de forma consolidada seus mercados internos, perpetuando, assim, um modelo colonial de desenvolvimen-to dependente.

Considerando esses aspectos, segundo o autor, a América Latina ingressaria na etapa da

industria-1Para além de toda a discussão terminológica apresentada nas teorias da sociologia

contem-porânea, consideramos seu entendimento na perspectiva de Habermas (1990), para quem a modernização é vista como um feixe de processos cumulativos que se reforçam mutua-mente por meio da formação de capital e mobilização de recursos, ao desenvolvimento de forças produtivas e ao aumento da produtividade do trabalho, ao estabelecimento de pode-res políticos centralizados e à formação de identidades nacionais, à expansão de direito de participação política, de formas urbanas de vida, formação escolar formal e à secularização de valores e normas.

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lização por meio das bases criadas pela economia de exportação, ao mesmo tempo em que aprofundaria a contradição própria de seu ciclo do capital e seus efeitos sobre a explo-ração do trabalho. O resultado disso seria o não desenvolvimento de ba-ses tecnológicas e, por consequên-cia, o não surgimento das indústrias mais produtivas, e também a neces-sidade da manutenção da sobre-ex-ploração do trabalho, nos seus mais diversificados aspectos e formas de organização, sem contar com os fato-res ambientais fato-resultantes da explo-ração indiscriminada dos recursos naturais (Correa; Cardeal, 2005).

Segundo Brito (2001), a socie-dade brasileira se encontrava em uma condição em que a industrialização tardia significou a imposição de um ordenamento produtivo sobre a estru-tura social cercada de elementos sociais tradicionais, que acabaram ativando os elementos organizacionais do capitalis-mo industrial, intervindo diretamente na economia e no redimensionando, parcialmente os esquemas políticos tradicionais. Dessa forma, acabaria por não poder constituir as bases para um modelo de desenvolvimento mais con-dicionado à realidade local e suas espe-cificidades regionais, socioeconômicas e ambientais.

Essas transformações, ainda segundo o autor, indicam elemen-tos importantes de compreensão dos fenômenos da dinâmica e rearranjos político-institucionais, sobretudo se considerarmos alguns aspectos. Pri-meiro, a racionalização dos proces-sos de modernização da sociedade não ocorre de forma igual. Segundo,

trutura organizacional e jurídica do Estado não foram absorvidos pela ordem política instituída. Por últi-mo, esse processo induziria ao de-senvolvimento de uma economia in-dustrial, tendo como base um núcleo tecnocrático solidificado no interior da instância estatal.

Na medida em que absorve e não absorve os elementos perten-centes ao padrão de racionalidade do modelo de Estado nacional de-senvolvimentista adotado, a mo-dernização brasileira é marcada por dimensões técnico-burocráticas ad-ministrativas de sua estrutura polí-tica e econômica. Assim, no campo político, essa estrutura consolidar--se-ia propiciando um modelo de desenvolvimento econômico incon-testável, autonomizando a estrutura burocrática que conduziria às con-tradições sociais evidenciadas nas décadas posteriores.

Essa configuração permitiu que se criassem instrumentos polí-ticos eficazes para acelerar o desen-volvimento da economia industrial, rompendo de forma definitiva com a sociedade tradicional sem sequer questionar os modelos e padrões de desenvolvimento aplicados e impos-tos a sociedades regionalmente dife-renciadas, sobretudo no que respeita ao uso dos recursos naturais.

Com as transformações sociais decorrentes dos processos político--econômicos de refuncionalização da estrutura estatal, surgem novas abor-dagens de intervenção direta em se-tores de desenvolvimento do Estado. Nesse contexto, podemos chamar a atenção, segundo Brito (2001), para o

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a separação da instância estatal

corres-pondente à esfera administrativa, que passa por uma reformulação na sua es-trutura burocrática e isola-se da esfera política, demarcando um modelo de desenvolvimento economicista. Nesse sentido, segundo o autor, a moder-nização e o capitalismo industrial na sociedade brasileira fundamentam-se no autoritarismo que demarca a cons-tituição política do Estado nacional e sua forma excludente em relação às questões da sociedade e, ainda, sem nenhuma preocupação inicial com as questões ambientais, vistas como ele-mento exterior ao desenvolviele-mento eminentemente econômico.

Nesse contexto, a estrutura burocrático-racional-legal do Estado brasileiro não se tornaria autônoma dado que sofreu um processo de insulamento, permitindo que iden-tidades estatais executassem ações pautadas pela formalização dos pro-cedimentos legais.

É necessário levar em consi-deração a importância de que os modelos dominantes de desenvol-vimento econômico aplicados aos países subdesenvolvidos foram assimilados e forjados no âmbito do processo de consolidação dos discursos legitimadores pertinen-tes a determinados interesses estra-tégicos. Também é inegável que a particular adoção dos modelos de crescimento econômico subjaz às contribuições teóricas engendradas nesse processo, sobretudo, quan-do se discute a relevância quan-do pen-samento econômico brasileiro e de suas matrizes teóricas associadas ao tema do desenvolvimento em uma discussão globalmente mais ampla.

O planejamento, como forma de racionalizar as ações do gover-no em longo prazo, passou a ser o norteador das políticas econômicas, criando no país uma modernização paradoxal ou uma modernização da

superfície da estrutura do Estado

(Bri-to, 2001). Isso significa que, na con-dição de projeto racionalizador das instituições políticas, acreditava-se em soluções por meio das medidas de desenvolvimento na perspectiva econômica; contudo, não se atingi-ria uma camada mais profunda da realidade brasileira relacionada com as contradições sociais expressas no seu discurso.

Esses impulsos desequilibra-ram, de maneira desenfreada, uma tendência desenvolvimentista ao processo de modernização do Es-tado brasileiro. Do ponto de vista contextual, as questões ambientais em regiões impactadas com esse processo – como na Amazônia bra-sileira – ocorreram na medida em que elementos de ordem sociopo-lítica e cultural são arrastados para os planos do desenvolvimento eco-nômico do capitalismo tardio e pe-riférico consolidado.

A compreensão desses fenôme-nos, tratando-se de um projeto de mo-dernidade, é crucial para verificarmos como essas diretrizes norteariam os programas de desenvolvimento eco-nômico para a Amazônia por meio das políticas de integração, sobretu-do consideransobretu-do, a partir da segunda metade do século XX, as modalidades de governo e Estado em transição no país (do regime ditatorial iniciado na década de 1960 ao democrático-repre-sentativo nos anos 1980).

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A política de integração regio-nal significou uma tentativa de dar homogeneidade às estruturas socio-econômicas. Nesse sentido, o papel do Estado brasileiro foi impor um processo de modernização acelerada (forçada) pela crença nos programas de desenvolvimento e valorização econômica sem se ater às consequên-cias socioambientais desse processo profundamente contextualizadas no modo de vida das sociedades locais.

Particularmente nos estados da Amazônia brasileira, essa po-lítica de valorização iniciou-se na década de 1950, demarcando um processo de homogeneização dos espaços econômicos nacionais como uma consequência da integração, por meio das políticas de desenvol-vimento em regiões pouco integra-das ao espaço econômico nacional e global, isso, evidentemente, a custo de uma dissolução ou de uma lesão das estruturas regionalmente homo-gêneas (Altvater, 1989 apud Brito, 2001), sobretudo no que diz respeito aos aspectos socioculturais que de-marcam as fronteiras de organização das sociedades locais.

Esse modo de inserção da Amazônia é marcado pelo naufrágio de sucessivas tentativas da consoli-dação de políticas de governo com o interesse estratégico de potencializar o uso dos recursos naturais e a timi-dez dos processos de industrializa-ção nas capitais amazônicas.

A valorização tardia da econo-mia local trouxe, para além de impac-tos a uma modernização forçada, a procura de melhores ações aplicadas com o objetivo de implantar um

sis-lecer estratégias de aplicação de uma forma centralizada pelo governo federal (Brito, 2001). Essas ações fo-ram pautadas pelo aprofundamento do conceito de valorização mediante a discussão sobre o modelo político de desenvolvimento adotado para a re-gião da Amazônia Legal.

Dessa forma, a criação de uma Superintendência do Plano de Valo-rização da Amazônia (SPVEA) daria uma conotação muito mais econô-mica, adotando-se um modelo de política que recebeu a incumbência de incentivar a valorização econômica em detrimento de uma política de transformações sociais alcançáveis pela sociedade em geral.

As primeiras ações que demar-caram a consolidação do SPVEA fo-ram o estímulo ao desenvolvimento econômico de setores considerados potencializáveis, intensificando a produção de matérias-primas, ali-mentos, financiamento por meio de créditos capazes de capitalizar a iniciativa privada, estimulando, so-bretudo, a criação de colônias

agrí-colas pelo estímulo estratégico da

agricultura mediante a ocupação de fronteiras e a introdução de uma

mentalidade agrícola na população

lo-cal, permitindo, assim, “superar há-bitos e concepções de trabalho e de organizações advindas do modo de produção local marcado pelos ciclos extrativistas” (SPVEA, 1961 apud Brito, 2001, p. 136).

É interessante observar que a adoção dessas estratégias instituía uma dimensão conceitual daquilo que viria a ser chamado de desen-volvimento para a Amazônia, sendo

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gão que centralizaria e administraria

os recursos destinados ao plano de valorização econômica da Amazônia.

Na década de 1960, com a decadência das políticas desenvol-vimentistas instituídas no pós-guer-ra, a falta de critérios técnicos para balizar as ações do Estado e a crise política entre a SPVEA e a transição para um governo autoritário-mili-tar eram visivelmente agravadas, criando, dessa forma, as condições de falência do plano de valorização econômica da Amazônia, sobretudo diante do embate ideológico instituí-do no períoinstituí-do ditatorial.

A “Operação Amazônia” anunciada pelo presidente da Re-pública Marechal Humberto Castelo Branco, em setembro de 1966, im-pulsionava outra vertente adotada para o desenvolvimento da Amazô-nia: a extinção da SPVEA e a criação da Superintendência do Desenvolvi-mento da Amazônia (Sudam), como alternativa ao desenvolvimento de projetos e programas de estímulo à economia regional, efetivada me-diante a captação de recursos com a criação anterior do Banco da Ama-zônia (Basa), sendo diretamente o agente financeiro das ações governa-mentais, administrando os recursos oriundos de repasses do Orçamento Geral da União para a Amazônia como dos fundos de investimento Privados (Brito, 2001).

No entanto, ao longo das dé-cadas em que se estendeu o plano de atuação política adotado pelo governo militar em se tratando de um quadro geral, o modelo de de-senvolvimento econômico manteve, segundo Brum (2009), a

característi-ca concentradora porque beneficiou a grande empresa em detrimento da média e pequena, estimulando a fu-são de empresas dos setores indus-triais, comerciais e financeiras. Des-sa forma, favorecendo, segundo o autor, a concentração da proprieda-de da terra viabilizando a granproprieda-de e a média empresa rural em detrimento da propriedade familiar.

Essas ações, do ponto de vista macroeconômico, possibilitaram em seu reflexo a expansão econômica nos estados e nas regiões mais ricas, deixando as demais regiões, como a Amazônia, em segundo plano, ainda que, por conta das superintendên-cias e programas de desenvolvimen-to regional e valorização econômica criados, se tornariam retardatários, ainda que privilegiasse a lucrativi-dade do capital em detrimento de ganhos do trabalho e medidas palia-tivas de crescimento econômico em regiões periféricas dos grandes cen-tros urbano-industriais produtivis-tas, criando desigualdades sociorre-gionais históricas.

As políticas governamentais, na medida em que se baseavam na consolidação de uma valoriza-ção econômica do desenvolvimen-to na região, resultaram em gran-des transformações sociais, que se traduziram, de fato, em impactos negativos nas populações locais, sobretudo nas comunidades rurais de habitantes indígenas e não indí-genas, as quais, até então, disponi-bilizavam pouco contato com a so-ciedade envolvente. Nas próximas décadas, esse processo se agravaria, produzindo relações conflituosas pelo acesso aos recursos e bens

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na-turais de consumo, reconfigurando as formas de apropriação dos am-bientes e espaços de uso comum.

Do ponto de vista das consequ-ências de um projeto modernizador que excluía a sociedade amazônica local, grande parte dos problemas de-correntes dos modelos de desenvol-vimento adotados refletia os conflitos socioambientais, geralmente marcados pelo acesso à apropriação, manuten-ção e exploramanuten-ção dos recursos naturais disponíveis como fonte de subsistência da vida dos moradores locais, e como matéria-prima para as forças produti-vas do capital na região.

Esses aspectos, mais do que nunca, só possibilitariam o deba-te entre Estado, desenvolvimento e economia em uma perspectiva so-cioambiental tardiamente, entre as décadas de 1980 e 1990 com a ins-titucionalização do regime da de-mocracia representativa e o fim da ditadura militar, já que, em termos globais, a questão ambiental estava em discussão há algum tempo e não havia um espaço político e institu-cionalizado consolidado nesse perí-odo do país.

2 A ambientalização institucional

das políticas de desenvolvimento

No fim da década de 1980, tornaram-se mais visíveis as ações políticas que caracterizaram um período de profundas transforma-ções na Amazônia brasileira no que diz respeito às questões ambien-tais. A consolidação da ocupação humana na região, a intensificação do desmatamento e a concentração

predador de desenvolvimento pos-sibilitaram um amplo debate na-cional e internana-cional sobre o tipo de desenvolvimento que se preten-dia para a região e para os recursos naturais de uso comum.

A introdução de diversos mecanismos de gestão ambiental possibilitaria um controle integra-do integra-dos recursos naturais, fortale-cendo o estabelecimento de dire-trizes claras sobre administração integrada dos ambientes físicos, por parcerias com diversas agên-cias e instituições de cooperação nacionais e internacionais.

O surgimento de uma legis-lação específica para as questões ambientais consolidaria, com a normatização dos órgãos responsá-veis, as dimensões representativas do significado atribuído ao uso dos recursos naturais e sua relação com o Estado, a sociedade e o modelo de produção vigente.

A construção de um discurso ambiental aparece como elemento norteador das políticas de reestrutu-ração do Estado brasileiro pós-dita-dura. A instituição de uma política nacional do meio ambiente trataria de duas questões fundamentais da realidade social contemporânea, as quais a sociedade brasileira viven-ciou: as perspectivas de desenvolvi-mento econômico e sua relação com os modelos de gestão dos recursos naturais. A preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental assegurando as condições de desen-volvimento socioeconômico apare-cem como elementos fundamentais aos interesses da segurança nacional

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Tais elementos compreendem

um eixo discursivo sobre o planeja-mento e a gestão dos recursos natu-rais disponíveis. É claro que essas ações, incorporadas por um mode-lo central de reordenamento dos bens necessários à sociedade, re-sultam de objetivos centrais quanto ao modelo de política adotado pelo Estado brasileiro, sobretudo, com a tomada de decisões políticas no ce-nário internacional diante dos pa-râmetros de conservação do meio ambiente e a reconfiguração teórica dos modelos dominantes e discur-sivos sobre o desenvolvimento.

Nesse caso, a formulação de uma política ambiental brasileira in-cidia, ao mesmo tempo, mediante a preocupação com a exploração e o desgaste dos recursos naturais dispo-níveis, na medida em que transpare-ceriam os objetivos e a compatibiliza-ção do desenvolvimento econômico social aliado à preservação e ao equi-líbrio do meio ambiente.

É nesse contexto que as trans-formações socioeconômicas e políti-cas do Estado brasileiro se articulam em um processo histórico global que insere a Amazônia em um discurso em que a intensificação de estratégias suscetíveis de solucionar a assimetria entre o desgaste dos recursos naturais e o modo de produção vigente se tor-naria uma preocupação global, sobre-tudo, do capital, em que se localizam processos mundiais a determinar o impulso ou a imobilização das dinâ-micas sociais, políticas e econôdinâ-micas em curso na Amazônia brasileira.

Contudo, o plano de ação para modelos de desenvolvimento eco-nômico possibilitou a articulação de

propostas que assegurassem ainda o discurso da sustentabilidade ambien-tal e do crescimento econômico, ao mesmo tempo em que assegurava a reacomodação estratégica do capital (Leff, 2000) como modelo de produ-ção vigente e inserido na região. Essa relação, de fato, impõe a região ama-zônica não só como objeto de preo-cupação geopolítica estratégica, mas também reflete suas feições históricas e políticas moldadas nos surtos de na-cionalização/internacionalização dos seus lugares, configurando essas es-tratégias e transformações decorren-tes uma ruptura entre as realidades pretéritas e presentes (Silva, 2002).

3 Considerações finais

Ao interpretarmos as signi-ficativas transformações do Esta-do brasileiro e de suas políticas de planejamento econômico por meio da influência dos modelos desen-volvimentistas, possibilitamos uma compreensão das mudanças sociais causadas pelos modelos de desenvol-vimento adotados com a ideia de uma modernização forçada de sua estrutu-ra jurídico-burocrática. O desdobestrutu-ra- desdobra-mento desta discussão refere-se, so-bretudo, à racionalização das esferas de organização econômica e política quanto à repercussão das consequên-cias e problemáticas sobre as questões socioambientais a partir da segunda metade do século XX e sua articula-ção com as novas abordagens sobre a questão do desenvolvimento.

Ao passo que o modelo de de-senvolvimento adotado demarcaria as políticas de valorização econômica e a racionalização do aparelho estatal,

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incorporando um ideal progressista, a constituição moderna do Estado brasileiro seria guiada pela lógica do crescimento econômico, sobretudo no pós-guerra, com os rearranjos po-líticos e institucionais advindos da in-corporação dos modelos teóricos de desenvolvimento legitimados pelo pensamento econômico dominante.

Na medida em que nas esfe-ras políticas e econômicas da socie-dade brasileira se consolidavam os elementos condizentes com uma

ra-cionalidade parcial promovida pelo

modelo de economia planejada para o progresso e desenvolvimento na-cional, os aspectos estruturantes da sua conjuntura socioeconômica e po-lítica tornaram desconexas a relação entre o Estado, a sociedade civil e as questões resultantes desse processo, assim como a discussão dos modelos de desenvolvimento que incorpora-riam a questão ambiental.

Perante os modelos econômi-cos e os programas de desenvolvi-mento adotados, isso representa-ria as principais consequências ao subdesenvolvimento periférico e as graves transformações socioam-bientais decorrentes da valorização do capital investido em determina-das regiões do país, como na Ama-zônia brasileira.

A relação antagônica entre eco-nomia e meio ambiente se traduz na Amazônia como reflexo de um con-traditório sistema de compreensão das dimensões dos modelos de de-senvolvimento e da sociedade brasi-leira, em que as esferas de ordem po-lítica, ao passo que externalizavam os fatores ambientais e internalizavam

tores econômicos, sujeitariam grupos sociais às transformações oriundas do discurso de valorização econô-mica nacional por meio dos grandes projetos desenvolvimentistas.

A criação de hidrelétricas, a exploração sem controle dos recur-sos naturais extrativistas e não re-nováveis, a abertura de estradas e rodovias para a ligação com as gran-des cidagran-des, a sobre-exploração dos recursos pesqueiros, assim como a ocupação das fronteiras nacionais por meio da pecuária extensiva e da exploração madeireira e mineral das terras tradicionalmente ocupadas pe-las sociedades locais indígenas e não indígenas são exemplos claros da su-jeição inapropriada à racionalização dos modelos econômicos de desen-volvimento instituídos na Amazônia.

Marcados pela incapacidade de acompanhar o ritmo de desenvol-vimento planejado, sobretudo, dian-te das insuficiências e contradições acarretadas pelas forças produtivas e pela acumulação e concentração do capital, o caráter de capitalismo peri-férico e de economia industrial res-tringida (Melo, 1982) seria uma das possíveis compreensões sobre as reais incapacidades quanto aos problemas intrarregionais da sociedade nacional contemporânea. As consequências de uma modernização forçada dos mo-delos nacionais de desenvolvimento instituído sob a projeção dos grandes programas de valorização econômica para a Amazônia, sobretudo, consi-derando a relevância do regime de governo militar-autoritário, impossi-bilitariam profundas transformações mais democráticas na estrutura social

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Contudo, tratando-se das

de-sigualdades e da exclusão socioeco-nômicas e políticas instituídas como resultado desse processo, a compre-ensão sobre as contradições do sub-desenvolvimento consolidariam as possibilidades de uma reconfigura-ção atual dos debates para a cons-trução plural das novas formas de interpretação teóricas e práticas dos modelos de desenvolvimento e de suas experiências sociais em esferas não dominantes do mundo econômi-co e politicamente hegemônieconômi-cos.

A circularidade social desse de-bate na esfera pública denotaria gran-des contribuições para o pensamento sobre os modelos de desenvolvimento insurgentes na contemporaneidade entre as propostas de racionalização das questões ambientais, como no caso das alternativas do desenvolvimento local/territorial e a discussão de uma participação política da sociedade em geral. Esses aspectos denotariam um movimento contemporâneo de ressig-nificação da questão ambiental, resul-tante da apropriação do discurso so-bre a temática do meio ambiente e das dinâmicas sociopolíticas instituídas na reconstituição das arenas de debates sobre a questão do desenvolvimento.

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Artigo recebido em abril/2017. Versão aprovada para publicação em junho/2017.

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