• Nenhum resultado encontrado

Data do documento. 11 de março de 2021

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "Data do documento. 11 de março de 2021"

Copied!
19
0
0

Texto

(1)

Processo

1640/16.1T8TMR.E1

Data do documento

11 de março de 2021

Relator

Conceição Ferreira

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Seguro de acidentes pessoais > Dano > Avaliação

SUMÁRIO

O seguro de acidentes pessoais (corporais) assume caráter meramente facultativo, em nada contendendo, antes sendo normalmente complementares, dos seguros por acidente de trabalho ou de viação, estes sim de caráter obrigatório.

TEXTO INTEGRAL Apelação n.º 1640/16.1T8TMR.E1 (2ª Secção Cível)

ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém - Juízo Local Cível de Tomar, corre termos ação declarativa de condenação com processo comum pela qual (…) demanda (…) Seguros – (…) (…), Grupo Segurador, alegando que foi vítima de acidente de viação, do qual lhe resultaram lesões e respetivas sequelas, peticionando a condenação desta:

- A reconhecer que apresenta incapacidade permanente global, de natureza

(2)

motora e definitiva desde 2016, de 69% (sessenta e nove por cento), a qual confere um grau de desvalorização superior a 50%, segundo a tabela contratual, estando reunidas as condições para ativação das garantias da apólice n.º (…) do contrato de seguro de Acidentes Pessoais relativa ao seguro Protecção de renda, celebrado entre ambos;

- A pagar-lhe a quantia de € 10.000,00 do capital inicial garantido pela referida Apólice bem como a renda mensal de € 250,00 durante 5 anos, juros moratórios legais até integral pagamento.

Citada, a ré veio contestar sustentando que o autor não preenche os requisitos para fazer acionar a apólice de seguro em apreço, não aceitando que as incapacidades alegadas sejam consequência direta do alegado sinistro participado, concluindo pela improcedência da ação.

Corrida a tramitação processual, após realização de audiência final, veio a ser proferida sentença cujo dispositivo reza:

“Face ao exposto julga-se procedente por provada a presente ação com processo comum intentada por (…) contra (…) Seguros – (…) (…), Grupo Segurador e condena-se a Ré a reconhecer que o Autor apresenta incapacidade permanente global, de natureza motora e definitiva desde 2016, de 55,630%, a qual confere um grau de desvalorização superior a 50%, segundo a tabela contratual pelo que, estão reunidas as condições para ativação das garantias da apólice n.º (…) do contrato de seguro de Acidentes Pessoais relativa ao seguro Protecção de acidentes pessoais, celebrado entre o A. e a Ré Seguradora e, consequentemente, mais se condena a Ré a pagar ao A. a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) do capital inicial garantido pela referida Apólice bem como a renda mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) durante 5 (cinco) anos, juros moratórios legais até integral pagamento.

Custas a cargo da Ré.” +

Por não se conformar com a sentença, veio a ré interpor recurso terminando,

(3)

nas respetivas alegações, por formular as seguintes conclusões que se transcrevem:

“1.º O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos presentes autos a fls. …, a qual julgou procedente, por provada, a ação judicial proposta pelo Autor (…), condenando, em consequência, a Ré, ora Recorrente, no pagamento do valor de € 10.000,00, bem como, no pagamento de uma renda mensal no valor de € 250,00, durante 5 anos, acrescido de juros de mora até efetivo e integral pagamento.

2.º Resultou provada nos autos, e tem interesse direto para a decisão das questões levantadas, a seguinte matéria factual:

“1. Entre o A. e a Ré Seguradora foi contratado e vigora um contrato de seguro de Acidentes Pessoais titulado pela Apólice n.º (…).

2. Tal Apólice garante o pagamento de indemnização de € 10.000,00 de capital e 5 anos de renda mensal de € 250,00 cada, em caso de morte ou invalidez permanente (igual ou superior a 50% de acordo com a Tabela de Incapacidades de Acidentes pessoais anexa às Condições Gerais da Apólice), se resultante de acidente.

3. Acontece que, no dia 11 do mês de Julho de 2012, cerca das 15H40M, ao Km 6,5 do IC 9, na (…), concelho de Nazaré, distrito de Leiria, o A. foi vítima de acidente de viação.

(...)

23. Na apreciação levada a cabo pela Assessoria Médica da ora Ré, que teve por base a Tabela de Desvalorização que se encontrava anexa às Condições Gerais contratadas, concluiu-se que a incapacidade alegada pelo ora Autor configurava um grau de desvalorização inferior a 50%.

2 6 . Em sede de conclusão do relatório pericial consta que a incapacidade proposta pela TNI é de 55,630% e a incapacidade conjugada pela tabela da apólice e do Anexo II do Decreto-Lei 352/2007, de 23 de outubro é de 35 pontos (20 pontos conforme

(4)

consta no relatório final e 15 pontos conforme referido no Anexo II.”

(negrito nosso).

3.º Matéria de facto fixada e insindicável.

4.º Resulta dos pontos n.ºs 1 e 2 dos factos provados que a ora Recorrente e o Recorrido acordaram, aquando da celebração do contrato de seguro de acidentes pessoais, que, para que a ora Recorrente procedesse ao pagamento de uma indemnização no valor de € 10.000,00 e de 5 anos de renda mensal de

€ 250,00 cada, o Recorrido teria de padecer de uma incapacidade igual ou superior a 50%, para efeitos da tabela de incapacidades de acidentes pessoais anexa às condições gerais da apólice.

5.º Sendo certo que a ora Recorrente e o Recorrido acordaram, aquando da realização do contrato de seguro de acidentes pessoais, em que as partes foram livres de estipularem as cláusulas e condições que entendessem – artigo 405.º do CC –, que a tabela de desvalorização que servia de base ao cálculo da incapacidade era a que constava no anexo às condições gerais da apólice – cfr.

factos dados como provados.

6.º Efetivamente, resulta expressamente do artigo 4.º, n.º 1, das referidas condições gerais do contrato de seguro em apreço nos autos que, ficam garantidos os seguintes riscos:

“1. Invalidez Total ou Permanente da Pessoa Segura – ficam garantidas apenas as desvalorizações iguais ou superiores a 50%, consideradas como sendo iguais a 100%, constantes da Tabela de Desvalorização anexa a estas condições.

7.º E, mais se diga que, para um qualquer destinatário normal, que é o suposto ser desejado pela ordem jurídica, conforme disposto no artigo 236.º, n.º 1, do CC, o artigo 4.º das condições gerais não oferecia, quer quanto à sua letra, quer quanto ao seu espírito, qualquer dúvida, ambiguidade ou equivocidade.

8.º Ademais, da douta sentença ora recorrida não se depreende que a cláusula mediante a qual se estipula que a incapacidade do lesado se avalia de acordo com a tabela de incapacidades anexa às condições gerais da apólice se

(5)

encontra fora dos limites impostos pelo princípio da liberdade contratual previsto no artigo 405.º do CC, sendo, por isso, a referida estipulação é válida e eficaz, produzindo os seus efeitos inter partes.

9.º A tabela de incapacidades anexa às condições gerais do contrato de seguro celebrado impõe-se às partes, na medida em que consta da apólice, sendo esta o documento que titula o contrato celebrado, donde constam as respetivas condições gerais e particulares livremente acordadas.

10.º Com efeito, estamos no âmbito da liberdade contratual.

11.º Sendo certo que, não estamos aqui perante um qualquer contrato de seguro obrigatório, mas sim de um seguro meramente facultativo, não tendo sido, de resto, alegado, por parte do segurado, aqui Recorrido, qualquer vício na formação da vontade ou qualquer deficiente apreensão do real conteúdo do contrato.

12.º Acresce que, a tabela de desvalorização constante das condições da apólice não é de forma alguma ambígua, e permite (como permitiu) de forma clara efetuar o cálculo de desvalorização do Autor, aqui Recorrido.

13.º Efetivamente, na referida tabela está de forma clara previsto que, a título meramente exemplificativo, a perda completa do uso de uma perna abaixo da articulação do joelho determina uma percentagem de desvalorização de 40%;

ao passo que, a perda completa do movimento do joelho determina uma percentagem de desvalorização de 25%.

14.º Ora, claro está que qualquer intérprete comum, imbuído de boa-fé, entende o conteúdo e alcance desta previsão.

15.º Mais, sempre se dirá que, para um declaratário normal, a tabela de desvalorização anexa à apólice é tão ou mais esclarecedora do que a Tabela Nacional de Incapacidade de Acidentes de Trabalho.

16.º Ou será mais fácil a um qualquer intérprete comum, imbuído de boa-fé, entender o conteúdo e alcance da Tabela Nacional de Incapacidades de Acidentes de Trabalho?! Com o devido respeito, não nos parece que assim seja.

(6)

17.º Não se descortina de que forma é que a douta sentença ora recorrida, após defender que estamos no âmbito da liberdade contratual das partes e após considerar como provado que, no contrato de seguro em apreço, ficou estipulado que a incapacidade seria aferida de acordo com a tabela de incapacidades de acidentes pessoais anexa à apólice, acaba por concluir que a tabela em anexo apresenta lacunas e que, portanto, terá de ser por apelo à TNI de Acidentes de Trabalho que passará a decisão da presente ação.

18.º Sendo certo que, a aplicação da TNI de Acidentes de Trabalho encontra-se expressamente excluída pelo contrato em apreço nos autos, designadamente, pela alínea g) constante da tabela de desvalorização anexa à apólice (página 12 das condições gerais juntas aos autos com a Contestação).

19.º De facto, prevê-se na supra referida alínea o seguinte “salvo convenção em contrário, na Proposta de Seguro, nas Condições Particulares da Apólice ou Certificado Individual, o grau de desvalorização de Invalidez Permanente Total ou Parcial, é sempre atribuído conforme Tabela de Desvalorização de Acidentes Pessoais, que faz parte integrante das Condições Gerais da Apólice, não sendo reconhecido pela Seguradora, para efeitos de indemnização, outro grau de desvalorização que tenha sido atribuído à pessoa segura, baseado noutra tabela, nomeadamente, na TNI – Tabela Nacional de Incapacidade de Acidentes de Trabalho.”.

20.º E nem se diga que, por não considerar as lesões do foro psiquiátrico, a tabela de desvalorização anexa à apólice apresenta lacunas e deixa margem para dúvidas, porquanto, tanto na alínea a) do ponto 1.1. do artigo 4.º das condições gerais, como na alínea a) da página 12 das condições gerais, encontra-se expressamente previsto que “a) As lesões não enumeradas na Tabela de Desvalorizações, mesmo de importância menor, são indemnizadas na proporção da sua gravidade comparada com a dos casos enumerados, sem ter em conta a profissão exercida;” (negrito nosso).

21.º Quer isto dizer que, mesmo as lesões não enumeradas na tabela de

(7)

desvalorização serão aferidas por comparação com as lesões que constam da referida tabela e não com recurso à TNI de Acidentes de Trabalho.

22.º Assim sendo, a Recorrente não pode concordar com a douta sentença ora recorrida, porquanto, esta aplica a TNI de Acidentes de Trabalho ao presente caso, violando, assim as normas previstas nos artigos 217.º, n.º 1; 219.º; 227.º, n.º 1; 236.º a 239.º; 405.º, n.º s 1 e 2; 406.º, n.º 1, todos do CC.

23.º In casu, estamos âmbito da responsabilidade contratual, uma vez que, o seguro em apreciação, é um seguro facultativo, pelo que, a TNI que vigora para os acidentes de trabalho não vincula fora deste âmbito, devendo o Juiz decidir de acordo com o princípio da livre apreciação das provas.

24.º Ora, não podemos ignorar que resultou provado que a incapacidade do Recorrido conjugada pela tabela da apólice e do Anexo II do Decreto-Lei 352/2007, de 23 de outubro é de 35 pontos!

25.º Assim sendo, e tendo em conta que o Tribunal a quo na fundamentação da douta sentença ora recorrida refere a dada altura que “o elemento probatório mais relevante dos autos, dir-se-ia mesmo decisivo, face à questão apreciar é o relatório pericial devendo atentar-se às conclusões aí formuladas”, não entende a ora Recorrente a razão pela qual o douto Tribunal a quo ignora as conclusões do referido relatório pericial.

26.º De facto, não pode deixar de ser surpreendente a decisão do Tribunal a quo face àquela que foi a conclusão do relatório pericial.

27.º Ora, não podemos ignorar que o Exmo. Sr. Perito do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML), pese embora, tenha, em primeira análise, atribuído ao Recorrido uma percentagem de incapacidade decorrente da aplicação da TNI de Acidentes de Trabalho, posteriormente, numa segunda análise, concluiu que, por aplicação da tabela de desvalorização anexa às condições gerais da apólice, o Recorrido padecia de uma incapacidade de 20 pontos, sem contar com as sequelas do foro psiquiátrico, porquanto, no que diz respeito a estas, a tabela de desvalorização anexa à apólice não previa

(8)

expressamente qualquer incapacidade.

28.º Tendo vindo aos autos em sede de esclarecimentos concluir o seu relatório da seguinte forma: “Tendo a Ré esclarecido e solicitado – e sido deferido – que embora não estando as sequelas do foro psiquiátrico contempladas na referida tabela, as mesmas são na mesma valorizáveis, porém com recurso à Tabela Nacional de Desvalorizações em Direito Civil, cumpre-nos informar que, com base nesta, se propõe uma desvalorização de 15 pontos (Nb0902) – a enquadrar por analogia, e se necessário, na Tabela Anexa ao Contrato de Seguro, por quem a Ré mandante para o efeito.” (negrito nosso).

29.º Assim, conforme resultou, inclusivamente, da matéria de facto considerada como provada na douta sentença ora recorrida – veja-se o ponto n.º 26 dos factos provados – o Exmo. Sr. Perito do INML concluiu que a incapacidade do Recorrido, avaliada pela TNI de Acidentes de Trabalho é de 55,630%, no entanto, a incapacidade conjugada pela tabela da apólice e do Anexo II do Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro é de 35 pontos (20 pontos conforme consta no relatório final e 15 pontos atribuídos pelas sequelas do foro psiquiátrico, estas últimas valoradas tendo em conta o Anexo II do Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro (Tabela Nacional de Desvalorizações em Direito Civil), porquanto a aplicação da TNI de Acidentes de Trabalho, conforme acima explanado, encontra-se expressamente excluída pelo clausulado do contrato de seguro em apreço).

30.º Atente-se que, foi com recurso à tabela de desvalorização constante do contrato de seguro que o Exmo. Sr. Perito do INML atribuiu ao Recorrido uma desvalorização de 20 pontos, acrescida de 15 pontos pelas sequelas psiquiátricas (apenas a esta tendo aplicado por analogia a Tabela de Desvalorizações em Direito Civil).

31.º Assim, muito se estranha que o Tribunal a quo, mesmo após a conclusão do relatório pericial, tenha entendido que a tabela apresenta lacunas e que, portanto, sempre seria de aplicar a TNI de Acidentes de Trabalho.

(9)

32.º De facto, tendo resultado provado – vejam-se os pontos n.ºs 1 e 2 dos factos provados na douta sentença recorrida – que as partes estipularam que a apólice em apreço nos autos garantiria o pagamento de uma indemnização de € 10.000,00 de capital e 5 anos de renda mensal de € 250,00 cada, em caso de morte ou invalidez permanente, igual ou superior a 50%, de acordo com a Tabela de Incapacidades de Acidentes Pessoais anexa às condições gerais da apólice, e tendo resultado igualmente provado – veja-se o ponto n.º 26 dos factos provados – que, em sede de conclusão do relatório pericial, consta que a incapacidade do Autor, ora Recorrido, conjugada pela tabela da apólice e do Anexo II do Decreto-Lei 352/2007, de 23 de outubro é de 35 pontos, evidentemente que apenas podemos concluir que não se encontram reunidos os requisitos de acionamento da presente apólice, pelo que, a ação deveria ter sido julgada improcedente, por não provada.

33.º Efetivamente, foi nesse sentido que decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 04B394, datado de 18/03/2004, num caso em tudo semelhante ao dos presentes autos.

34.º Refira-se que, não pôde a ora Recorrente deixar de reparar que a douta sentença ora recorrida tem inúmeras passagens do douto Acórdão, referindo expressamente o mesmo, mas concluindo de forma totalmente díspar, quando comparada com aquele, no qual se decidiu, e bem, absolver a Seguradora.

35.º Também com interesse para a decisão da causa, temos o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no âmbito do processo 6/12.7TBBTC.G1 e datado de 23/06/2016, no qual expressamente se deu ênfase à aplicação da tabela de desvalorização anexa ao contrato de seguro, porquanto, assim estipularam as partes.

36.º E ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo 843/12.2TBVNG.P2.S1 e datado de 29/06/2017, no qual se censurou a aplicação da Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, para apuramento da desvalorização do segurado em resultado de

(10)

sinistro coberto por um contrato de seguro de grupo/acidentes pessoais, ao invés da tabela anexa à apólice de seguro.

37.º Assim se verifica que, atenta a factualidade julgada provada nos autos e, bem assim, aquelas que têm sido as conclusões da Jurisprudência no que a esta matéria diz respeito, designadamente, as decisões dos Tribunais Superiores relativamente a questões semelhantes às discutidas nos presentes autos, o douto Tribunal a quo, com o devido respeito, andou mal ao decidir da forma como decidiu.

38.º Efetivamente, e porque a matéria de facto considerada como provada impunha uma decisão absolutória da ora Recorrente e não condenatória, entende a ora Recorrente, com o devido respeito, que o douto Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 217.º, n.º 1; 219.º; 227.º, n.º 1; 236.º a 239.º;

342.º, n.º 1; 405.º, n.° s 1 e 2; 406.º, n.° 1, todos do CC e 607.º, n.º 5, do CPC.

39.º Com efeito, o Tribunal a quo, com o devido respeito, que é muito, fez tábua rasa de todo o clausulado, tendo, dessa forma, violado frontalmente o teor do contrato celebrado entre as partes e aceite pelas mesmas, o que jamais se poderá aceitar.”

O autor veio contra alegar defendendo a confirmação do julgado.

Cumpre apreciar e decidir

O objeto do recurso é delimitado pelas suas conclusões, não podendo o tribunal superior conhecer de questões que aí não constem, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento é oficioso.

A questão essencial em apreciação, consiste em saber se o tribunal recorrido andou bem, na avaliação do dano, em desconsiderar a aplicação ao caso da Tabela Anexa ao Contrato de Seguro celebrado entre as partes aliada à aplicação da Tabela de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito

(11)

Civil, optando pela aplicação da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho Doenças Profissionais (TNI), o que conduziu ao reconhecimento de o autor ser portador de uma incapacidade superior a 50%.

Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:

1. Entre o A. e a Ré Seguradora foi contratado e vigora um contrato de seguro de Acidentes Pessoais titulado pela Apólice n.º (…).

2. Tal Apólice garante o pagamento de indemnização de € 10.000,00 de capital e 5 anos de renda mensal de € 250,00 cada, em caso de morte ou invalidez permanente (igual ou superior a 50% de acordo com a Tabela de Incapacidades de Acidentes pessoais anexa às Condições Gerais da Apólice), se resultante de acidente.

3.Acontece que, no dia 11 do mês de Julho de 2012, cerca das 15H40M, ao Km 6,5 do IC9, na Ponte da (…), concelho de Nazaré, distrito de Leiria, o A. foi vítima de acidente de viação.

4.O A. circulava como passageiro no veículo ligeiro de passageiros, de matrícula

“(…)” conduzido por (…), veículo este que circulava no sentido Nazaré-Alcobaça e que foi abalroado frontalmente pelo veículo ligeiro de mercadorias de matrícula “(…)” conduzido por (…), que circulava no sentido Alcobaça-Nazaré.

5. O condutor do veículo “(…)” efetivou uma manobra de ultrapassagem a um outro veículo que seguia à sua frente, invadiu a hemi-faixa de rodagem do seu lado esquerdo por onde circulava o veículo “(…)” e foi colidir frontalmente com ele.

6. Como consequência do acidente resultaram para o A. graves lesões, as quais implicaram o seu transporte para o Hospital de Santo André, em Leiria, onde lhe foram prestados os primeiros socorros e daqui foi transferido para o Hospital de Abrantes do Centro Hospitalar do Médio Tejo.

7. Dado que apresentava uma fratura do côndilo femural interno e prato externo da tíbia direita foi submetido a intervenção cirúrgica com osteosíntese

(12)

com parafusos.

8. Após a cirurgia foi transferido para os serviços da Ré Seguradora e, por indicação desta, iniciou fisioterapia, mas não obteve melhorias.

9. Mantendo as queixas e tendo estas agravado o A. foi reavaliado e submetido a nova intervenção cirúrgica em 29 de Novembro de 2012, dela resultando que a fratura do côndilo interno do joelho direito ficou reduzida e fixada com nova osteosíntese – placa e parafusos.

10. O A. reiniciou a fisioterapia a qual esgotou o seu potencial terapêutico.

11. Acontece que, o A. apresenta dor e rigidez a nível do joelho direito com hipersensibilidade de todo o membro inferior direito e alterações da coloração da pele com o frio e o stress.

12. O A. desenvolveu uma depressão major com elevados índices de ansiedade e acentuada labilidade emocional.

13. O A. tem uma cicatriz na face interna da coxa direita com cerca de 30 (trinta) centímetros e da face externa da perna direita com cerca de 12 (doze) centímetros.

14. O A. apresenta rigidez do joelho direito com ligeiro flexo e uma flexão de cerca de 90 % (noventa por cento).

15. O A. tem uma acentuada atrofia do quadricípete direito e dos gémeos direitos.

16. O exame radiológico do joelho, tornozelo e pé direito mostra osteoporose e sinais de reabsorção óssea típicos de algodistrofia simpática reflexa.

17. Segundo a TNI foi atribuída ao A. uma incapacidade permanente global, de natureza motora e definitiva desde 2016, de 69% (sessenta e nove por cento) certificada, quer por atestado médico multiuso da ARS Lisboa e Vale do Tejo, ACES Médio Tejo, de 25.07.2016 (com referência a idêntico atestado de 10.01.2014), quer por relatórios clínicos de reputados ortopedistas do Centro Hospitalar o Médio Tejo.

18. Da incapacidade de 69% (ou 68,95%), atribuída ao Autor: - 14,93% dizem

(13)

respeito ao Capítulo III “Neurologia e Neurocirurgia”, número 5.2.6

“Perturbações esfincterianas e genitais”; - 11,94% dizem respeito ao Capítulo III

“Neurologia e Neurocirurgia”, número 7, “Nevralgias e radiculalgia”; e - 16,72%

dizem respeito ao Capítulo X, “Psiquiatria”, no grau IV “perturbações funcionais importantes, com acentuada modificação dos padrões de atividade diária”.

19. Nos termos das Condições Gerais da apólice se seguro subscrita, Artigo 8.º, n.º 7: “Ficam sempre excluídos da cobertura do presente contrato, os sinistros consequentes de (…) 7. Quaisquer outras doenças, quando não se prove por diagnóstico médico inequívoco e indiscutível que são consequência direta do acidente.”

20. A Ré Seguradora interpelada por diversas vezes, a última em 25.08.2016 (carta com as cópias dos Relatórios Médicos de 25.11.2015 e 28.05.2016 atrás indicados e juntos), reconhecendo é certo que o A. foi vítima de acidente e apresenta incapacidade dele derivada, mantém a intransigente posição que se transcreve: “Após apreciação efetuada pela nossa Assessoria Médica, concluímos que a Invalidez Permanente Parcial (IPP) apresentada configura segundo a Tabela Contratual, um grau de desvalorização inferior a 50%, pelo que não estão reunidas as condições para ativação das garantias da apólice”.

21. Na sequência da referida participação, foi aberto, pela ora Ré, um processo de sinistro para a cobertura de invalidez permanente, referente à apólice contratada.

22. Verificou-se que as lesões decorrentes do sinistro, e documentadas na informação clínica que o ora Autor remeteu à Ré, se cingiam, apenas, ao nível do joelho direito.

23. Na apreciação levada a cabo pela Assessoria Médica da ora Ré, que teve por base a Tabela de Desvalorização que se encontrava anexa às Condições Gerais contratadas, concluiu-se que a incapacidade alegada pelo ora Autor configurava um grau de desvalorização inferior a 50%.

24. Razão pela qual, a ora Ré informou o Autor da recusa do sinistro e do

(14)

consequente encerramento do processo sem o pagamento de qualquer indemnização, mediante comunicações enviadas em 22.01.2014, 21.03.2014, 28.01.2015 e 23.02.2016.

25. No caso dos presentes autos, o referido contrato de seguro foi aceite na cobertura de Morte ou Invalidez Permanente.

26. Em sede de conclusão do relatório pericial consta que a incapacidade proposta pela TNI é de 55,630% e a incapacidade conjugada pela tabela da apólice e do Anexo II do Decreto-Lei 352/2007 de 23 de outubro é de 35 pontos (20 pontos conforme consta no relatório final e 15 pontos conforme referido no Anexo II.

Factos considerados não provados:

- Aquando da adesão ao seguro o Autor (atenta a sua qualidade de tomador do seguro e pessoa segura) foi informado de que o seguro ao qual aderia tinha como coberturas: (i) A Morte; ou (ii) A Invalidez Total e Permanente.

- Nos termos das garantias do contrato de seguro, devidamente explicadas e entregues ao Autor, no caso de Invalidez Total e Permanente da Pessoa Segura ficariam “(…) garantidas apenas as desvalorizações iguais ou superiores a 50%, consideradas como sendo iguais a 100%, constantes da Tabela de Desvalorização (…)”.

Conhecendo da questão

O contrato de seguro em apreço, nos autos, titulado pela apólice n.º (…) é um contrato de seguro facultativo de acidentes pessoais, pelo que não está sujeito aos limites imperativos impostos aos contratos de seguro obrigatório, regendo- se pelo princípio da liberdade contratual, de modo que as partes são livres de no seu âmbito estipularem as cláusulas que lhes aprouverem desde que não colidam com as regras que regulam o direito dos seguros, sendo de notar que no âmbito da Lei do Contrato de Seguro o princípio geral é o da liberdade

(15)

contratual conforme resulta expressamente do seu artigo 11.º, referência que tem o relevo prático de prevenir interpretações extensivas de restrições a liberdade contratual (v. A. Menezes Cordeiro, in Direito dos Seguros, 2013, 460;

Pedro Romano Martinez in Lei do Contrato de Seguro Anotada, Almedina, 3ª edição, 62).

Conforme bem se salienta na sentença recorrida, “no contrato de seguro, uma das partes, o segurador, compensando segundo as leis da estatística, um conjunto de riscos por ele assumidos, obriga-se, mediante o pagamento de uma soma determinada, a, no caso de realização de um risco, indemnizar o segurado pelos prejuízos sofridos, ou tratando-se de um evento relativo à pessoa humana, entregar um capital ou uma renda ao segurado ou a terceiro, dentro dos limites contratualmente estabelecido (Moitinho de Almeida, in O Contrato de Seguro no Direito Português e Comparado).

Trata-se dum contrato de caráter aleatório constante de uma apólice como elemento documental necessário e suficiente para as respetivas existência e validade – requisito ad substantiam.

As cláusulas desse contrato são acordadas em pleno e puro domínio negocial, (ainda que dentro dos limites da lei), em cujo âmbito assume plena preponderância o princípio da liberdade contratual plasmado no n.º 1 do artigo 405.º do CC.

O seguro de acidentes pessoais (corporais) assume caráter meramente facultativo, em nada contendendo, antes sendo normalmente complementares, dos seguros por acidente de trabalho ou de viação, estes sim de caráter obrigatório.”

No âmbito da liberdade de modulação do acordo do contrato pelas partes contratantes foi estabelecido e consta da apólice que o contrato que fica garantido o risco de “Invalidez Total ou Permanente da Pessoa Segura – ficam garantidas apenas as desvalorizações iguais ou superiores a 50%, consideradas como sendo iguais a 100%, constantes da Tabela de Desvalorização anexa a

(16)

estas condições. O capital seguro só é devido se a invalidez permanente for clinicamente constatada e comprovada no decurso de dois anos a contar da data do acidente” (cfr. artigo 4.º, n.º 1, das Condições Gerais). “No caso de Invalidez Total e Permanente, é adotada a Tabela de Desvalorizações constante destas condições:

a) As lesões não enumeradas na Tabela de Desvalorizações, mesmo de importância menor, são indemnizadas na proporção da sua gravidade comparada com a dos casos enumerados, sem ter em conta a profissão exercida (artigo 4.º, 1.1, al. a) das Condições Gerais).

Na Tabela Anexa a que se faz referência no referido artigo 4.º, n.º 1, das Condições Gerais da Apólice, para além de se mencionar o que já havia sido feito constar na alínea a) do ponto 1.1 do art.º 4º das Condições Gerais é ainda estipulado que “Salvo convenção em contrário, na Proposta de Seguro, nas Condições Particulares da Apólice ou Certificado Individual, o grau de desvalorização de Invalidez Permanente Total ou Parcial, é sempre atribuído conforme Tabela de Desvalorização de Acidentes Pessoais, que faz parte integrante das Condições Gerais da Apólice, não sendo reconhecido pela Seguradora, para efeitos de indemnização, outro grau de desvalorização que tenha sido atribuído à pessoa segura, baseado noutra tabela, nomeadamente, na TNI – Tabela Nacional de Incapacidade de Acidentes de Trabalho” (cfr. alínea g) da Tabela Anexa).

Do cotejo das normas constantes da apólice resulta claro que o contrato de seguro celebrado entre as partes prevê expressamente que a incapacidade a atribuir ao lesado tem de ser definida de acordo com os critérios previstos na tabela de desvalorização anexa à apólice, e não noutra, afastando-se expressamente a aplicação da Tabela Nacional de Incapacidade de Acidentes de Trabalho (TNI), para esse efeito, reafirmando-se que na indemnização das lesões não se deve ter em conta a profissão exercida pela pessoa segura o que também descarta a avaliação pressupondo a existência de acidente de

(17)

trabalho.

Assim, perante o contrato de seguro celebrado entre as partes resulta que a avaliação da incapacidade é sempre definida tendo por base a Tabela de Desvalorização Anexa à Apólice e não a TNI que foi expressamente descartada no seguro de acidentes pessoais, pois é aquela Tabela de Desvalorização que assume o caráter decisivo para o pagamento das indemnizações acordadas por parte da seguradora.

Como havia divergência entre as partes no grau de incapacidade de que é portador o autor, decorrente da diversa aplicação das tabelas, foi requerido exame pericial ao autor, no qual se procedeu à respetiva avaliação, tendo por referência a TNI, bem como a Tabela Anexa à Apólice e a Tabela Nacional de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, no que respeita às sequelas do foro psiquiátrico de que é portador o autor por as mesmas não estarem contempladas na Tabela Anexa à Apólice e a seguradora ter dado anuência a que tais sequelas pudessem ser valoradas com base nesta Tabela em que a afetação da atividade física e psíquica da pessoa é aferida sem correlação direta à atividade profissional que desempenha.

Resultou assim provado, de acordo com o relatório pericial, que a incapacidade do autor, tendo por base TNI é de 55,630% e a sua incapacidade tendo por base a Tabela Anexa à Apólice conjugada com a Tabela de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil (Anexo II do Decreto-Lei 352/2007, de 23/10) é de 35% (20% no que respeita à sequela referente ao membro inferior e 15% referente à sequela de foro psiquiátrico).

Como a aplicação da TNI está expressamente excluída no âmbito do contrato se seguro celebrado entre as partes, o grau de incapacidade de que o autor é portador, a ter em conta, é de 35%, encontrado com recurso à Tabela de desvalorização Anexa às condições gerais da Apólice e da Tabela de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, esta, apenas, tida em consideração para as sequelas do foro psiquiátrico.

(18)

Em face da exclusão expressa da aplicação da TNI para efeitos do apuramento do grau de desvalorização, que não foi tida em consideração na 1ª instância, não podemos acompanhar a posição assumida na sentença recorrida que fixou o grau de desvalorização tendo simplesmente por base aquela Tabela, por em seu entender garantir “a exigível segurança jurídica”, desconsiderando a valoração efetuada com recurso à Tabela Anexa à Apólice, à qual o contrato livremente celebrado impõe que seja tida em consideração.

Assim, tendo-se por referência uma incapacidade de 35% de que o autor é portador, tal grau de desvalorização, não se mostra idóneo a despoletar o acionamento da apólice em causa nos autos. Pois, tendo as partes estipulado que a apólice garantiria o pagamento de uma indemnização de € 10.000,00 de capital e 5 anos de renda mensal de € 250,00 cada, em caso de morte ou invalidez permanente, igual ou superior a 50%, de acordo com a Tabela de Incapacidades de Acidentes Pessoais anexa às condições gerais da Apólice, não se encontram reunidos os requisitos de acionamento da apólice com vista ao pagamento das requeridas quantias indemnizatórias.

Nestes termos, relevam as conclusões da apelante sendo de julgar procedente o recurso e de revogar a sentença recorrida.

DECISÃO

Pelo exposto, decide-se julgar procedente o recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida, absolvendo-se a ré do pedido.

Não são devidas custas de parte, atendendo a que o recorrido beneficia de proteção jurídica [artigos 10.º, n.º 1, 13.º, n.ºs 1 a 3 e 16.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 34/2004, de 29/07].

Évora, 11 de março de 2021 Maria da Conceição Ferreira

Rui Manuel Duarte Amorim Machado e Moura Maria Eduarda de Mira Branquinho Canas Mendes

(19)

Fonte: http://www.dgsi.pt

Referências

Documentos relacionados

Os estabelecimentos de ensino descontarão em folha de pagamento, em favor do SINTAE/RS, o valor equivalente a 6,0% (seis por cento) da remuneração de cada trabalhador

Com relação ao CEETEPS, o tema desta dissertação é interessante por se inserir no Programa de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), sob a tutela da Coordenação de

A EMBARQ Brasil descontará de todos os empregados engenheiros beneficiados pelas cláusulas do presente acordo, o valor correspondente a 2,5% (dois

O modelo experimental de análise de viscosidade do óleo hidráulico testado em laboratório trouxe uma proposição da correlação causal entre a unidade primária de

Chartreuse de Villeneuve-Lez-Avignon Fort Saint-André à Villeneuve-Lez- Avignon Forteresse de Salses Midi-Pyrénées : Château de Castelnau-Bretenoux Château de Gramont

Atua como hidratante e umectante para pele e cabelo além de ser um agente de ação antiaging para peles maduras, para aquelas que já perderam a força e a elasticidade.. É o

Ainda que assim não fosse, não se colhe do elenco dos factos provados o receio de extravio ou dissipação da cortiça; tal como exarado na sentença recorrida, «os sobreiros de onde

Registros de ocorrência de acidentes com la- gartas urticantes, obtidos junto à Secretaria Estadual da Saúde do Estado do Paraná (2010), mostram que o número de casos na cidade