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2 NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA 2.1 O CONCEITO DE TRIBUTO.

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2 NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA

2.1 O CONCEITO DE TRIBUTO.

A Constituição da República prevê, dentre os princípios gerais da ordem econômica, a regra da livre iniciativa (art. 170, da CF). Os particulares são livres para exercer a atividade econômica, ressalvados os casos de exploração direta de atividade econômica pelo Estado, que só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo (art. 173 da CF).

Com a entrega da atividade econômica à iniciativa privada, restou ao Estado utilizar outros meios de obtenção de receita, para cumprir suas obrigações com os administrados. Vale-se, assim, da cobrança de valores acordados contratualmente (foro, laudêmios, aluguéis, preços públicos, juros), de sanções pecuniárias, de indenizações, de adjudicações (confiscos permitidos, apropriações de bens vacantes) e de tributos. Se o Estado, “tirante a sua condição de contratante ou donatário, não está nem arrecadando bens pecuniários vacantes, nem percebendo pecúnia ex contractu, tudo o mais que entra como receita, excluídas as ‘entradas’ de caixa, tais como cauções e fianças, ou é tributo ou é enriquecimento sem causa. A questão é de ontologia jurídica e não de técnica legislativa”.1 A princípio, ninguém é obrigado a entregar parte de seu patrimônio ao Estado, já que é garantido o direito à propriedade, que somente será tolhido nos casos previstos na própria Constituição. A atividade de tributação é uma exceção à garantia da propriedade privada e é considerado o principal meio do qual o Estado tem-se utilizado para obter recursos com vistas a realizar as funções que lhe competem. Analisa-se, a seguir, o conceito de tributo.

O direito positivo, como conjunto de normas prescritivas, não tem por objetivo estabelecer definições de seus institutos, mas emitir mensagens destinadas a regrar o comportamento dos homens. No Brasil, a Lei n.° 5.172, de 25 de outubro de 1966, o denominado Código Tributário Nacional - CTN2, fugiu a essa regra e trouxe, em seu 3º, o seguinte texto: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e

1 Sacha Calmon Navarro Coelho, Curso de direito tributário brasileiro, p. 381.

2 A Lei n. º 5.172/66 recebeu o reconhecimento de Código Tributário Nacional pelo Ato Complementar 36, de 13 de março de 1967 e surgiu no mundo jurídico como lei ordinária. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que exigiu a lei complementar tributária (art. 146 do Constituição Federal), o CTN foi recepcionado como lei complementar.

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cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Percebe-se, a partir da leitura do suporte físico acima, diversos elementos para a construção do conceito de tributo3, como se analisa a seguir.

a) Tributo é toda prestação pecuniária compulsória. A prestação pecuniária é conduta obrigatória, eliminando-se a vontade na formação da relação jurídica tributária.

Luciano Amaro afirma que há uma impropriedade no texto legal ao determinar que a prestação pecuniária é compulsória, já que as demais prestações jurídicas são também compulsórias (aluguel, preço, salário): “qualificar a prestação (do tributo) como compulsória nada particulariza bem especifica. O devedor de obrigação não tributária também é compelível a efetuar a prestação objeto de sua obrigação jurídica, porque o credor dessa prestação tem o direito de exigi-la, coercitivamente”.4

Entende-se, todavia, que o caráter compulsório da prestação pecuniária indica que o nascimento da obrigação tributária independe da vontade dos sujeitos da relação jurídica, como no caso do preço público ou do aluguel. É claro que em diversas situações o elemento vontade é necessário para configurar o nascimento da obrigação tributária, como no caso da venda de uma mercadoria, hipótese de incidência do ICMS.

No entanto, o sujeito passivo, em tal situação, não contrata a obrigação tributária que surge independentemente de sua vontade. O que o legislador pretende descrever é

“apenas o efeito de certos atos jurídicos, para a formação dos quais pressupõe a vontade das partes. Contudo, nenhuma referência de modo localizado e direto haverá com relação ao elemento vontade, de todo estranho ao critério material da hipótese tributária”.5

Outro aspecto ressaltado pelo texto é o objeto da relação jurídica, que deve ser obrigação de dar (objeto imediato) quantia em dinheiro (objeto mediato). A relação jurídica tributária é, portanto, obrigatória, e o seu objeto é uma prestação pecuniária.

3 Paulo de Barros Carvalho demonstra a ambigüidade do vocábulo, que comporta pelo menos seis significações quando utilizado nos textos do direito positivo, na doutrina e na jurisprudência: a) tributo como quantia em dinheiro; b) tributo como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo;

c) tributo como direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo; d) tributo como sinônimo de relação jurídica tributária; e) tributo como norma jurídica tributária e, f) tributo como norma, fato e relação jurídica. Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 19.

4 Luciano Amaro, Direito tributário brasileiro, p. 21.

5 Paulo de Barros Carvalho, Teoria da norma tributária, p. 97. Alfredo Augusto Becker, salienta que a não-voluntariedade do sujeito passivo para o acontecimento dos fatos que realizam a hipótese tributária não é especificidade da hipótese de incidência das regras jurídicas tributárias. Segundo o autor, muitas vezes a vontade é elemento integrante. Em outros casos, a não-voluntariedade também está presente na análise de hipótese de incidência de outras regras jurídicas não-tributárias. Teoria geral do direito tributário, p. 266 e 268.

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b) Em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir. Trata-se de frase redundante e desnecessária. Na primeira parte do artigo já foi mencionado que a prestação tributária é em dinheiro, daí a redundância contida na expressão “em moeda”. A locução “cujo valor nela se possa exprimir” revela uma impropriedade do texto e permitiria incluir no objeto da relação tributária qualquer prestação compulsória, pois toda obrigação tem caráter patrimonial e passível de ser representada em dinheiro. A expressão, segundo Paulo de Barros Carvalho, vem “ampliar sobremaneira o âmbito das prestações tributárias, de vez que quase todos os bens são suscetíveis de avaliação pecuniária, principalmente o trabalho humano, que ganharia a possibilidade jurídica de formar o conteúdo de relação de natureza fiscal”.6 Entende-se que a obrigação tributária deve ser sempre uma prestação pecuniária, afastando-se a frase tratada neste item.

c) Que não constitua sanção de ato ilícito. Os fatos eleitos pelo legislador capazes de instaurar a relação jurídica tributária são os mais diversos. Ora escolhe fatos praticados pelo próprio Estado, como nas taxas de polícia e serviço, em outras situações elege fatos praticados pelos particulares, que é o caso dos impostos (auferir renda, vender mercadoria, prestar serviço, ser proprietário de imóvel etc.). Porém, convém destacar que o tributo atua sobre condutas lícitas ou permitidas pelo direito. A obrigação tributária está no campo da licitude, ao contrário das multas, que pressupõem a ocorrência de condutas ilícitas. A hipótese de incidência do tributo deve descrever critérios para identificar um fato jurídico permitido pelo direito, o que não quer dizer que a prática de atividade ilícita não possa resultar em obrigação tributária.

Um sujeito que adquire rendas e bens por meio de atividade criminosa deverá ser tributado normalmente. Paulo de Barros Carvalho acentua que, para a norma tributária, é relevante apenas aquele efeito – auferir rendimento – associado que esteja a fato lícito ou ilícito. “O evento que origina o efeito é de todo prescindível, já que o fato hipoteticamente previsto a ele se não refere. Em linguagem técnica, poderíamos dizer que o fato originador do rendimento auferido não se submete ao critério material da hipótese”.7 Como adverte Luciano Amaro, “não se paga tributo porque se praticou uma ilicitude, embora se possa ter de pagá-lo com abstração do fato de ela ter sido praticada”.8

6 Ibidem, p. 103.

7 Paulo de Barros Carvalho, Teoria da norma tributária, p. 97.

8 Luciano Amaro, Direito tributário brasileiro, p. 25.

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Como destaca Geraldo Ataliba, é “notável a cláusula ‘que não constitua sanção de ato ilícito’ porque permite estremar o tributo das multas. Se não se fizesse a ressalva, o conceito ficaria ambíguo – e, pois, cientificamente inútil – por excessivamente compreensivo, a ponto de abranger entidade tão distinta como é a multa de direito público”. 9

d) Instituída em lei. A obrigação tributária é instituída por lei, como qualquer obrigação no direito brasileiro, em face do princípio da legalidade previsto no art. 5º, II da Constituição da Federal10. Desnecessário, portanto, atrelar ao conceito de tributo a exigência de lei para instituí-lo.

f) Cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. A cobrança do tributo não é realizada por meio de ato discricionário, em que o fiscal tem a liberdade de decidir, com base em critérios de conveniência e oportunidade, a cobrança da exação. Porém, como destaca Paulo de Barros, o administrador, em diversos atos do procedimento de arrecadação tributária, está autorizado, pela lei, “a integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso em concreto, operando com critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal”.11 Em outros casos, a lei dá competência ao contribuinte para constituir o fato jurídico e a obrigação tributária decorrente. “É graças a esse procedimento do administrado que se torna possível o recolhimento do tributo devido, sem qualquer interferência do Estado-administração. Deixando entre parênteses as qualificações jurídicas inerentes à autoria, poderíamos mesmo dizer que, em substância, nenhuma diferença existe, como atividade, entre o ato praticado por agente do Poder Público e aquele empreendido pelo particular”.12

O tributo diferencia-se da cobrança de valores acordados contratualmente (foro, laudêmios, aluguéis, preços públicos, juros), já que o nascimento da obrigação tributária independe da vontade do sujeito passivo, ou seja, a formação da relação jurídica tributária não decorre de acordo de vontade. O tributo, por ser cobrado sobre um fato lícito, não se confunde com as multas e difere das indenizações que pressupõem fato ilícito e lesivo ao patrimônio alheio. Por fim, nas adjudicações não há que se falar em prestação pecuniária em favor de outrem. Concluindo, “o que entrar em dinheiro na

9 Geraldo Ataliba, Hipótese de incidência tributaria, p. 31.

10Art. 5º, II da Constituição da República Federativa do Brasil: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. .

11 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 21.

12 Paulo de Barros Carvalho, Fundamentos jurídicos da incidência, p. 248.

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burra estatal, sob a forma de prestação pecuniária – o que excluir as entradas-de-caixa (fianças e cauções) e as apropriações – que não sejam indenização, multa ou contrato (aluguel, juro, foro, laudêmio, preço) só pode ser tributo. O que caracteriza o tributo é sua essência jurídica”.13

Percebe-se que a redação do artigo 3º merece uma interpretação mais apurada, a fim de se obter um conceito de tributo satisfatório. Paulo de Barros Carvalho, em sua obra, Teoria da norma tributária, afirma que no tributo “há uma relação jurídica que se estabelece entre o Estado (por via de regra), como sujeito ativo, e alguma pessoa (física ou jurídica), como sujeito passivo e mediante a qual pode o sujeito ativo exigir do sujeito passivo o cumprimento de dever jurídico específico, qual seja o de pagar certa importância em dinheiro”.14 Associam-se ao conceito de tributo os seguintes elementos:

a) prestação pecuniária; b) compulsória (o surgimento da obrigação não decorrente da vontade das partes); c) tem por hipótese de incidência um fato lícito; d) devido ao Estado ou a pessoas por este indicadas.

2.2 TRIBUTO COMO NORMA JURÍDICA

No capítulo anterior foi mencionado que o direito é um sistema comunicacional que busca regular a vida em sociedade. Entende-se por direito o conjunto de normas jurídicas em um determinado espaço e tempo. Trata-se de um sistema, já que seus elementos guardam um fundamento comum (são agrupados com base no mesmo critério). É comunicacional, porque é dirigido ao homem com vistas à regulação da vida em sociedade.

As normas jurídicas são mensagens que buscam orientar os seus receptores a condutas selecionadas. Se um comportamento deve ser evitado e castigado, o Estado o proíbe atrelando a tal comportamento determinada sanção, como no caso da norma penal. Pode, todavia, obrigar os administrados a determinada conduta, com vistas a obter receitas. Atua o Estado sobre os direitos de liberdade e propriedade do cidadão, e, valendo-se de seu poder soberano, impõe aos membros da sociedade determinadas obrigações pecuniárias.

A obrigação pecuniária pressupõe um vínculo entre dois sujeitos (ativo e

13 Sacha Calmon Navarro Coelho, Teoria geral do tributo e da exoneração tributária, p. 108.

14 Paulo de Barros Carvalho, Teoria da norma tributária, p. 91.

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passivo) e um objeto. O objeto da relação obrigacional possui duas faces: a) sob o ângulo do sujeito ativo, representa o direito subjetivo de exigir o objeto (crédito); b) sob a perspectiva do sujeito passivo, é o dever de prestar o objeto (débito). O vínculo obrigacional retira parcela da liberdade do sujeito passivo, obrigando-o ao cumprimento de prestação, e acomete o seu patrimônio, já que o objeto da obrigação é um valor em dinheiro.

Pois bem, a relação obrigacional estabelecida entre o sujeito ativo e passivo decorre invariavelmente da incidência de uma norma jurídica.15 Ou seja, para que o Estado obtenha a receita desejada é necessária a prévia existência de uma norma que indique notas para caracterizar um evento (hipótese de incidência) com vistas a atrelar conseqüências jurídicas (critério para identificação da relação jurídica), surgindo o vínculo obrigacional.16 Se o surgimento da relação jurídica (conseqüente) está ligado a uma hipótese, nada mais correto do que afirmar que tributo é norma jurídica.

Tributo, portanto, é a norma jurídica cuja hipótese descreve uma conduta lícita e o conseqüente da norma prescreve uma prestação pecuniária obrigatória do sujeito passivo em face do sujeito ativo.17 Essa definição toma como base o plano estático do direito, ou tributo como norma jurídica geral e abstrata. Essa noção de tributo foi assim tratada por Paulo de Barros na obra Teoria da norma tributária: “tributo, em sua configuração estática, é a endonorma que apresenta como hipótese um conjunto de critérios para a identificação de fatos da realidade física, que não acordos de vontade considerados em si mesmos, e, como conseqüência, um conjunto de critérios que nos permite identificar uma relação jurídica que se instaura ente o Estado (via de regra), na qualidade de sujeito ativo e alguma pessoa física ou jurídica”.18 Numa perspectiva dinâmica, pode-se conceber o tributo como a norma jurídica individual e concreta, ou seja, o tributo se identificaria com o lançamento tributário, ato jurídico que documenta a incidência da norma jurídica geral e abstrata.

15 Para Paulo de Barros: “a relação jurídica é definida como o vínculo abstrato, segundo o qual, por forca da imputação normativa, uma pessoa, chamada de sujeito ativo, tem o direito subjetivo de exigir de outra, denominada sujeito passivo, o cumprimento de certa prestação. (...) O vínculo, apenas e tão-somente por virtude da imputação normativa (...)”. Curso de direito tributário, p. 281.

16 Convém salientar que o fenômeno da incidência exige a presença do homem para demonstrar a ocorrência da subsunção (o reconhecimento de que um fato está contido na hipótese de norma jurídica) e da implicação (relação entre a proposição-tese e a proposição conseqüente). A relação jurídica nasce com o ato de aplicação do direito, constituindo o evento em linguagem jurídica competente.

17 O conseqüente de toda norma jurídica estabelece uma relação entre sujeitos, que pode se apresentar como obrigatória, permitida ou proibida, segundo o modal intraproposicional. Na norma jurídica tributária, o modal intraproposicional designado pelo conseguinte é o obrigatório.

18 Paulo de Barros Carvalho, Teoria da norma tributária, p. 98.

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Em sentido amplo, as normas jurídicas tributárias são aquelas relacionadas direta ou indiretamente com a criação, arrecadação e fiscalização de tributos. Entram nessa classe as normas que estabelecem a competência tributária, isenções, as que instituem os tributos e as que estabelecem prerrogativas e deveres da administração tributária, dentre outras. A norma jurídica tributária em sentido estrito é aquela que cria, em abstrato, a obrigação tributária. A hipótese descreve critérios para a identificação de fato lícito, e o conseqüente estabelece critérios para constituir a relação entre o sujeito ativo e passivo e o quanto a ser pago. Paulo de Barros Carvalho em sua obra Fundamentos jurídicos da incidência tributária, divide as normas tributárias em três grupos: a) normas que estabelecem princípios gerais; b) normas que estipulam a incidência do tributo; e c) normas que fixam outras providências administrativas para a operatividade do tributo (normas de lançamento, recolhimento, fiscalização e deveres instrumentais). As regras- matrizes de incidência dos tributos encontram-se em menor número, e, em princípio, há somente uma para cada figura tributária, acompanhada por numerosas normas operativas ou funcionais. “Ora, firmados nessa base empírica, nada mais congruente do que designar ‘norma tributária em sentido estrito’ àquela que assinala o núcleo da percussão jurídica do tributo, isto é, a ‘norma padrão’ ou ‘regra-matriz de incidência’, e

‘normas tributárias em sentido amplo” a todos as demais. 19 Analisa-se, a seguir, o conceito de regra-matriz de incidência tributária.

2.3 A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA

As normas jurídicas são as menores unidades possíveis de comunicação do sistema do direito positivo; são, portanto, mensagens que estabelecem um mínimo deôntico, reclamando um esquema formal de implicação: deve ser que a proposição-tese (descrição de notas que um evento necessita para formar o fato jurídico) implique a proposição-conseqüente (prescrição de uma conduta). Sabe-se que todas as normas jurídicas possuem idêntica estrutura sintática (homogeneidade sintática), ocorrendo variações apenas no âmbito semântico. Se tributo é norma jurídica, sua estrutura deve obter idêntico esquema formal de implicação.

A hipótese da norma jurídica tributária deverá indicar uma classe com notas para

19 Ver as obras já citadas: Teoria da norma tributária, Curso de direito tributário e Fundamentos jurídicos de incidência tributária de Paulo de Barros Carvalho.

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caracterizar evento de possível ocorrência no mundo fenomênico. Pretende-se, assim, estudar a norma tributária no plano estático do direito. A hipótese da norma tributária vai arrolar critérios para identificar ou constituir um fato lícito com conteúdo econômico e é destinada a sujeitos indeterminados, regulando uma classe de pessoas não individualizadas. De outro lado, o fim imediato da norma é regrar o comportamento humano, obrigando o sujeito passivo a uma prestação pecuniária. Trata-se, portanto, de norma de conduta geral e abstrata.

Ressalta-se que a hipótese e o conseqüente estão relacionados por um dever-ser neutro informando que uma vez ocorrida a hipótese, deve ser a conseqüência. Outro operador lógico se impõe, agora intraproposicional, que estabelece o dever do sujeito passivo de pagar determinada quantia em dinheiro ao sujeito ativo; portanto, um modal deôntico que designa a conduta como obrigatória.

A hipótese da norma tributária deve descrever qual o comportamento passível de sofrer tributação. Os aspectos mínimos da descrição de um evento são três: a) o acontecimento (núcleo do evento); b) o tempo; e c) o local. Esses três aspectos constituem a hipótese da norma jurídica tributária, os quais Paulo de Barros Carvalho designa como: a) critério material; b) critério temporal; e, c) critério espacial.

O conseqüente da norma tributária deve estabelecer uma relação entre dois sujeitos (ativo e passivo) cujo objeto é a obrigação de dar certa quantia em dinheiro. São dois os aspectos mínimos para identificar tal relação: a) os sujeitos do vínculo relacional e o objeto (valor da prestação). Paulo de Barros Carvalho os nomeia de: a) critério pessoal e b) critério quantitativo.

Assim, a norma jurídica tributária, como unidade mínima e irredutível de manifestação do deôntico, deve conter cinco critérios para a sua caracterização: critério material (o que), temporal (quando) e espacial (onde) na hipótese; critério pessoal (quem) e quantitativo (quanto) no conseqüente. Percebe-se que nenhum outro elemento se faz necessário para informar ao receptor de uma mensagem que ele está obrigado a uma prestação pecuniária, confirmando o caráter de unidade da norma jurídica. De outro lado, a ausência de qualquer um destes aspectos priva a mensagem de sentido.

A este esquema formal de estrutura da norma jurídica tributária Paulo de Barros Carvalho denomina de regra-matriz de incidência tributária. Em suas palavras: a

“esquematização formal da regra-matriz de incidência tem-se mostrado um utilíssimo instrumento científico, de extraordinária fertilidade e riqueza para a identificação e conhecimento aprofundado da unidade irredutível que define a fenomenologia básica da

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imposição tributária”.20 A regra-matriz de incidência, ou norma tributária em sentido estrito, é uma norma geral e abstrata que delineia o núcleo do tributo, fixando a percussão tributária. A sua hipótese descreve uma classe com notas para caracterizar um evento que, por meio da operação lógica da subsunção (inclusão de um elemento em uma classe), torna-se possível à constituição do fato jurídico e a instauração da relação jurídica tributária. O legislador expede conceitos selecionadores de propriedades para a identificação do evento tributário, que poderão ser reconhecidos quando ocorrerem no plano concreto. Contudo, como afirma Marcelo Fortes Cerqueira, não se deve confundir o antecedente da norma tributária com o evento jurídico tributário nele descrito. “Trata- se de realidades distintas: uma alojada no campo das especulações legislativas; outra no mundo se sensível. A primeira no plano normativa; a segunda, no campo das concreções fáticas”.21

A regra-matriz, como norma geral e abstrata é incapaz de, isoladamente, regular o comportamento do homem. Assim, para que a hipótese constitua o fato jurídico e o conseqüente estabeleça a relação jurídica é necessária a presença de norma individual e concreta que documente a incidência tributária. O antecedente da norma individual e concreta é constituído por um enunciado factual que faz referência a um acontecimento no mundo fenomênico (fato jurídico); já o conseqüente estabelece a relação jurídica tributária, obrigando o sujeito passivo a entregar quantia em dinheiro ao sujeito ativo (enunciado relacional).

O caminho percorrido pelo intérprete a partir das normas gerais e abstratas até atingir as normas individuais e concretas, modalizando deonticamente as condutas, chama-se processo de positivação do direito. Sem as normas individuais e concretas não há a regulação efetiva dos comportamentos interpessoais.

Percebe-se que duas operações lógicas são necessárias para que o comportamento previsto na norma jurídica seja regulado. Num primeiro momento, o intérprete vai colher as informações do fato concreto e encaixá-lo na hipótese da norma:

fenômeno de subsunção. Constituído o fato jurídico, a operação lógica seguinte é a da causalidade jurídica, com a implicação da proposição-tese no efeito previsto na proposição-conseqüente.22 Observa-se que tanto a constituição do fato (fenômeno de

20 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 343.

21 Marcelo Fortes Cerqueira, Repetição do indébito tributário, p. 130.

22 Como adverte Paulo de Barros Carvalho, não existe cronologia entre a verificação empírica do fato e o surgimento da relação jurídica. Instaura-se o vínculo abstrato, com a união dos sujeitos da relação,

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subsunção) como a incidência da norma (fenômeno da causalidade jurídica) demandam a presença do homem, construindo em linguagem própria a realidade jurídica. Cumpre enfatizar que a realidade jurídica independe da existência do fato social, já que se configuram camadas de linguagem completamente distintas. Assim, considera-se constituído o fato jurídico quando o agente competente relatar em linguagem própria um acontecimento que se encaixe na hipótese de uma norma jurídica. Pouco importa para o direito se aquele fato realmente ocorreu no mundo fenomênico. Para refutar esse fato, será necessário introduzir novos signos lingüísticos, também manifestados em linguagem competente, desconstituindo o fato anteriormente narrado.

Um exemplo pode ilustrar a questão: o Município “M” notifica o sujeito “S” do lançamento do IPTU de determinado imóvel. Sabe-se que tal ato pressupõe a existência de uma norma geral e abstrata: hipótese: deve ser que ser proprietário de imóvel, na zona urbana do município “M”, no 1° dia do ano; conseqüente: implica o pagamento do IPTU pelo proprietário ao Município “M”, na alíquota de “X”% sobre o valor venal do imóvel. São esses os aspectos mínimos para a constituição do fato jurídico (núcleo do evento, tempo e espaço) e da relação jurídica (sujeitos e objeto). Trata-se de norma abstrata porque arrola critérios para a identificação ou constituição do fato jurídico (evento de possível ocorrência no tempo e no espaço); é geral, já que o destinatário da norma é indeterminado, regulando-se uma classe de pessoas não individualizadas (proprietários de imóvel).

Verificado no cadastro do município que o sujeito “S’ consta como proprietário de um imóvel naquelas condições (coordenadas de tempo e espaço) ocorre a implicação da hipótese no conseqüente tributário (causalidade jurídica) com a expedição da norma individual e concreta de lançamento tributário; antecedente: dado que o sujeito “S” é proprietário de imóvel na zona urbana do Município “M” no 1° dia do ano de 2005;

conseqüente: implica o pagamento pelo sujeito “S” ao Município “M” de R$ 1.000,00 a título de IPTU. É norma concreta porque o antecedente descreve determinado fato jurídico, ou seja, relata um acontecimento em linguagem jurídica. Trata-se de norma individual, visto que o conseqüente regula o comportamento de pessoas determinadas (proprietário “S” e Município “M”).

Percebe-se que foi possível constituir a relação jurídica independentemente de qualquer menção ao fato de o sujeito “S” ser efetivamente o proprietário do imóvel em

exatamente no mesmo instante em que aparece a linguagem competente que relata o evento descrito pelo legislador. Curso de direito tributário, p. 244.

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questão. Caso realmente não seja, deverá apresentar impugnação administrativa ao ato de lançamento ou a propor ação anulatória buscando desconstituir a norma individual e concreta. Para tanto, é necessário recorrer às provas admitidas em direito (linguagem jurídica) para obter nova norma individual e concreta (decisão administrativa ou judicial) que modifique a norma anterior. É o que afirma Eurico de Santi: “o ato-norma de lançamento só poderá ser alterado de acordo com os modos de produção dessas normas jurídicas que alteram outras normas, as quais incidem conforme disposição do ordenamento jurídico”.23

A construção da regra-matriz é obra do intérprete que agrupa significações (S2) em estrutura lógica de juízo hipotético condicional (S3) a partir de um conjunto de enunciados prescritivos (S1). O intérprete da regra-matriz de incidência é qualquer pessoa que, em contato com o plano da literalidade textual, é capaz de construir o sentido da mensagem legislada. Sabe-se, entretanto, que a norma jurídica enquanto produto de significação intrasubjetiva não modifica a realidade jurídica. Somente com a constituição da linguagem jurídica realizada por sujeito competente é que o comportamento humano será efetivamente regulado.

O intérprete, para construir a regra-matriz de incidência tributária, deve partir da leitura do texto constitucional, que estabelece a pré-configuração ou a síntese de alguns elementos da norma padrão. Por óbvio, não se têm ainda os contornos nítidos da hipótese de incidência, reservados à lei ordinária, mas indicativos de possíveis sujeitos passivos, comportamentos tributáveis, base de cálculo e traços enformadores pertinentes às alíquotas. 24

Discorrendo sobre a estrutura da regra-matriz, Paulo de Barros Carvalho esclarece que a forma da norma reúne aquilo que há de constante, de homogêneo, de permanente, de imutável (homogeneidade sintática). Já o conteúdo será algo contingente e acidental, variável e heterogêneo (heterogeneidade semântica). Considerada sem sua inteireza existencial, a regra-matriz é a união indissolúvel entre forma e conteúdo,

“apenas o homem, como agente de conhecimento e portador exclusivo da capacidade de abstrair (separar o inseparável), é que tem a virtude de promover esses cortes meramente abstratos na tessitura do objeto, animado pelo escopo de conhecer-lhe

23 Eurico Marcos Diniz de Santi, Lançamento tributário. p. 252.

24 Aires Barreto, Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais, p. 35.

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melhor a consistência e aprofundar-se em sua exploração cognoscitiva”.25 Analisam-se, a seguir, os critérios da regra-matriz de incidência tributária.

2.3.1 Critério material

O critério material é o núcleo da hipótese de incidência e indica o comportamento capaz de ensejar o nascimento da obrigação tributária. Ressalta-se que o aspecto material não descreve por completo o evento capaz de caracterizar o fato jurídico.26 Deve o intérprete, nesse instante, abstrair por meio de um processo lógico o aspecto temporal e espacial do evento e buscar as expressões que designam apenas a ação ou o estado da mensagem normativa.

Sabe-se que as normas jurídicas têm por objetivo prescrever condutas intersubjetivas. Como afirma Eurico de Santi, a conduta é a resposta de um organismo vivo a um estímulo. Tratando-se do direito, o estímulo capaz de motivar condutas é a linguagem prescritiva. O verbo é a palavra mais importante para nomear condutas. O verbo designa ação, estado ou qualidade de existência de pessoa, animal ou coisa.27 “No direito, é o verbo, associado a seu complemento, que ‘descreve’ e prescreve materialmente as condutas inter-humanas, formando na hipótese tributária, mediante a abstração de seus condicionantes espaço-temporais, o critério material”.28 O critério material se manifesta lingüisticamente por meio de um verbo que exprime uma ação ou estado acompanhado de um complemento.

Assim, prestar serviços, ser proprietário de imóvel, auferir renda, industrializar mercadorias, são todos comportamentos passíveis de originar uma obrigação pecuniária. Cumpre advertir que o verbo não pode ser impessoal ou sem sujeito, porque comprometeria a operatividade da ordem normativa, impossibilitando ou dificultando a

25 Paulo de Barros Carvalho, Base de cálculo como fato jurídico e a taxa de classificação de produtos vegetais, in Revista dialética de direito tributário n.37, p. 120.

26 Aires Barreto sustenta que o critério material da hipótese de incidência descreve o fato tributável, ou seja, os contornos, o perímetro, o desenho daquele evento que, uma vez consumado, é capaz de ensejar o nascimento da obrigação tributária. Entende o autor que a hipótese de incidência é una e indecomponível, tornando-se impreciso falar-se em seus elementos. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais, p. 46-47. De outro lado, Paulo de Barros comenta o equívoco cometido nessa interpretação:

“impressionados com a impossibilidade física de separar o inseparável, confundiram o núcleo da hipótese normativa com a própria hipótese, definindo a parte pelo todo, esquecidos de que lidavam com entidades lógicas, dentro das quais é admissível abstrair em repetidas e elevadas graduações”. Curso de direito tributário, p. 250.

27 Eurico de Santi, Lançamento tributário, p. 128.

28 Ibidem, p. 128.

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comunicação. É necessário verbo pessoal e de predicação incompleta, demandando a presença de um complemento.29

Percebe-se que para ser acessível ao conhecimento humano, o evento deve mencionar os critérios espaciais e temporais, aspectos imprescindíveis para a constituição de um fato jurídico. Em nada adiantaria a norma tributária prever na hipótese a ação – ser proprietário de imóvel, sem nenhuma referência ao momento e ao local em que o comportamento considera-se ocorrido. Todo e qualquer fato ocorre em algum momento e em dado instante, tornando-se impossível conhecer o comportamento regulado sem as condicionantes de tempo e espaço. Veja-se, a propósito, o que diz Becker: “os fatos que realizam a hipótese de incidência, necessariamente, acontecem num determinado tempo e lugar, de modo que a realização da hipótese de incidência sempre está condicionada às coordenadas de tempo e às de lugar”. E adiante arremata:

“qualquer um dos elementos adjetivos é tão essencial como o núcleo para a realização da hipótese de incidência”. 30 Analisam-se, a seguir, os demais critérios da hipótese de incidência.

2.3.2 Critério espacial

Para completar a descrição do evento tributário, o critério material está delimitado por condicionantes espaciais e temporais. O aspecto da hipótese de incidência responsável pela indicação do local em que deve ocorrer o comportamento descrito no critério material recebe o nome de critério espacial.

O critério espacial nem sempre se manifesta de forma expressa. Por vezes, a indicação é implícita no texto, podendo coincidir, por opção do legislador, com o âmbito de validade territorial da lei, como ocorre no caso do imposto sobre produtos industrializados – IPI, tributo de competência da União.

O legislador, em certas situações, elege como critério espacial determinado local para a constituição do fato, a fim de irradiar os efeitos que lhe são próprios. É o exemplo do imposto sobre a importação - II, que elege como critério territorial a repartição alfandegária responsável pelo desembaraço aduaneiro. Já no caso do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, o legislador menciona regiões do

29 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 252.

30 Alfredo Augusto Becker, Teoria geral do direito tributário, p. 333 e 334.

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território municipal, de forma que o imposto só alcança os imóveis localizados na zona urbana do município.

Segundo Paulo de Barros, os “elementos indicadores da condição de espaço, nos supostos das normas tributárias, hão de guardar uma dessas três formas compositivas, diretriz que nos conduz a classificar o gênero tributo na conformidade do grau de elaboração do critério espacial da respectiva hipótese tributária:

a) hipótese cujo critério espacial faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico;

b) hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido;

c) hipótese de critério espacial bem genérico, onde tudo e qualquer fato, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares”.31

2.3.3 Critério temporal

Para completar a descrição mínima do evento tributário é necessário precisar o exato instante em que se considera ocorrido o critério material, instaurando o vínculo relacional. Esse aspecto da hipótese recebe o nome de critério temporal, responsável pela indicação do momento preciso da ocorrência do fato jurídico.

Como ensina Geraldo Ataliba, sempre há o aspecto temporal da hipótese de incidência disposto pelo legislador, ainda que nem sempre explicitamente. No entanto, há um limite constitucional na fixação do aspecto temporal, que não poderá ser anterior à consumação (completo acontecimento) do fato.32

O critério temporal é formado pelo grupo de indicações contidas na hipótese tributária, que fornece elementos para conhecer, com exatidão, o instante em que acontece o fato descrito no núcleo do suposto da regra, permitindo aos sujeitos da relação saberem o momento em que nascem seus direitos e obrigações. O marco de tempo assinala o surgimento de um direito subjetivo ao sujeito ativo e um dever jurídico

31 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 255.

32 Geraldo Ataliba, Hipótese de incidência tributária, p. 85. Para o presente trabalho, o termo “fato”

mencionado por Ataliba deve ser entendido como critério material.

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ao sujeito passivo.33 Cita-se, como exemplo, o critério temporal do ICMS, que é o momento da saída de mercadorias do estabelecimento comercial, industrial ou produtor.

Antes da saída física da mercadoria, não ocorreu o fato jurídico tributário, portanto, não há relação jurídica nem obrigação tributária.

2.3.4 Critério pessoal34

Uma vez ocorrido o fato jurídico descrito na hipótese da regra-matriz, segundo os critérios acima indicados, instaura-se o conseqüente da norma ou prescritor normativo. O conseqüente da regra-matriz é parte da unidade normativa que determina a regulação da conduta, estabelecendo quem são os sujeitos da relação jurídica e quais são os direitos e deveres de cada um.

O prescritor normativo informa critérios para a identificação do vínculo jurídico que nasce, permitindo saber quem é o sujeito titular do direito subjetivo; a quem cabe o dever de cumprir a prestação; e o seu objeto, qual seja, o comportamento desejado pelo direito.35 No conseqüente, os critérios que identificam os elementos do vínculo obrigacional são dois: a) critério pessoal, composto pelo sujeito ativo e sujeito passivo;

e b) critério quantitativo, indicador que exprime o valor pecuniário da prestação, por meio da conjugação da alíquota e da base de cálculo.

O critério pessoal é o elemento da norma jurídica que permite identificar os sujeitos da relação intersubjetiva que se instaura, dividindo-se em: sujeito ativo e sujeito passivo.

O sujeito ativo é o titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária e tanto poderá ser o ente político, titular da competência tributária, como outro sujeito detentor de capacidade tributária.

O sujeito passivo é a pessoa de quem se exige o cumprimento da prestação pecuniária. Luís César Souza de Queiroz, que utiliza a expressão critério pessoal passivo, afirma que este aspecto da norma informa os sinais necessários para identificar o sujeito passivo, que está obrigado (modal deôntico intraproposicional obrigatório) a

33 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 258.

34 Alguns autores sustentam a existência de critério pessoal na hipótese de incidência. Ver Aires Barreto., Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais, p. 47, Luís Cesar Souza de Queiroz, Sujeição passiva tributária, p. 180, Sacha Calmon Navarro Coelho, Teoria geral do tributo e da exoneração tributária, p. 113, e Geraldo Ataliba, Hipótese de incidência tributária, p. 70.

35 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 278.

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entregar certa quantia em dinheiro ao sujeito ativo.36 O sujeito passivo, no sistema tributário brasileiro, é aquela pessoa que provoca a materialidade da hipótese de incidência de um tributo. Não pode a lei atribuir a “sujeição passiva a quem não tenha sido nitidamente referido no desígnio constitucional; a quem não seja o destinatário da carga tributária, segundo a referência constitucional (peculiaridade do nosso sistema de Constituição minuciosa e exaustiva, de discriminação tributária rígida)”.37

2.3.5 Critério quantitativo

O critério quantitativo é o aspecto da norma responsável pela quantificação do objeto da obrigação tributária. É “o grupo de notícias informativas que o intérprete obtém da leitura atenta dos textos legais, e que lhe faz possível precisar, com segurança, a exata quantia devida a título de tributo”.38 O critério quantitativo é composto pela base de cálculo e pela alíquota. A base de cálculo é a grandeza que dimensiona a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico.

A expressão base de cálculo significa “fundamento para cálculo”, “origem para cálculo” ou “apoio para cálculo”. Equivale a “critério para medir” ou “padrão para avaliar”. É a descrição legal de um padrão ou unidade de referência que permite a quantificacão da grandeza financeira da hipótese de incidência. Enfim, um critério abstrato para medir os fatos tributários, que, conjugado à alíquota, permite auferir o valor a ser pago a título de tributo.39

Paulo de Barros Carvalho salienta três funções distintas da base de cálculo: a) medir as proporções reais do fato (função mensuradora); b) compor a específica determinação da dívida (função objetiva); c) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente da norma (função comparativa).

Na primeira função, a base de cálculo servirá de suporte mensurador do acontecimento previsto na hipótese, captando aspectos inerente à conduta ou ao objeto da conduta que se aloja no miolo da conjuntura do mundo físico. Para atender tal objetivo, qualquer predicado factual pode ser útil, desde que idôneo para anunciar a grandeza efetiva do evento. O espaço do legislado é vasto, deparando apenas com o obstáculo lógico de não

36 Luís Cesar Souza de Queiroz, Sujeição passiva tributária, p. 179.

37 Geraldo Ataliba e Cleber Giardino, Revista de direito tributário, n.° 34, p. 216, .

38 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 321.

39 Aires Barreto, Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais, p. 53.

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ultrapassar as fronteiras do ato, indo em busca de propriedades estranhas à sua contextura. Na segunda função, a base de cálculo comparece como fator integrante de uma operação aritmética de multiplicação, que aliada à alíquota comporá a específica determinação da dívida tributária. A terceira função é verificar se a grandeza foi adequadamente mensurada em relação à materialidade do evento. A base de cálculo aparece na sua função comparativa, confirmando, infirmando ou afirmando o verdadeiro critério material da hipótese tributária. Confirma, quando houver sintonia entre a grandeza selecionada e o núcleo do evento. Infirma, quando for manifestamente incompatível a base de cálculo com o acontecimento que o legislador elege como tributável. Por fim, afirma, na eventualidade de ser obscura a formulação legal, hipótese que prevalece como critério material a ação tipo que está sendo avaliada.40

Tanto a hipótese tributária como a base de cálculo são qualificadoras normativas do fato. A hipótese preocupa-se prioritariamente em qualificar o comportamento, enquanto a base de cálculo tem por objetivo quantificar a materialidade descrita na hipótese, selecionado algum aspecto que possa ser dimensionado; elege, portanto, a grandeza quantificadora ajustada para medir a intensidade do acontecimento factual. Em outras palavras, a base de cálculo se projeta sobre a mesma porção factual, recortada no suporte fáctico pela hipótese tributária, dimensionando, mensurando, quantificando o fato que sofreu a incidência. 41 A base de cálculo seleciona, conceitualmente, aspectos do “real”: como os conceitos são seletores de propriedades, compreende-se que nem tudo desse “real” será acolhido pela base de cálculo.42

A alíquota é um componente aritmético que, congregado à base de cálculo, dá o exato valor da obrigação pecuniária. É um critério legal para a obtenção da dívida tributária. Aires Barreto diferencia a alíquota nos dois planos do direito: a) no plano estático, a alíquota é indicador da proporção a ser tomada da base de cálculo. Esgota- se a alíquota, neste plano, em ser mero indicador, porque só passível de conjugação com um dado abstrato: a base de cálculo. Sem a ocorrência do fato jurídico, não se presta a alíquota à obtenção do quantum devido a título de tributo; b) no plano dinâmico, a alíquota é o fator que deve ser conjugado à base de calculada para determinar o objeto

40 Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, p. 324-328.

41 Paulo de Barros Carvalho, Base de cálculo como fato jurídico e a taxa de classificação de produtos vegetais, in Revista dialética de direito tributário n.37, p. 126.

42 Ibidem, p. 125.

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da relação jurídica tributária. Neste plano, a alíquota atua como um dos termos de multiplicação cujo produto é, concretamente, o valor da dívida.43

É determinando a alíquota que o legislador poderá tornar efetivo o princípio da igualdade tributária, seletividade e progressividade; é também a alíquota que permite verificar os limites da razoabilidade da tributação, ou seja, observar-se se a autoridade tributante não exerce suas atividades de forma confiscatória.

43 Aires Barreto, Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais, p. 58-59.

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