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ALFABETIZAÇÃO NO RECRIAVIDA: A CONSTRUÇÃO DO ENSINO/APRENDIZAGEM PARA ADULTOS

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Academic year: 2021

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ALFABETIZAÇÃO NO RECRIAVIDA: A CONSTRUÇÃO DO

ENSINO/APRENDIZAGEM PARA ADULTOS

Fernanda Aparecida Oliveira Rodrigues Silva - UFOP1 Cristiane Navais Alves - UFOP2 Luciana Aparecida Dutra de Souza - UFOP3

RESUMO: O Programa de Educação de Jovens e Adultos (PEJA) é um projeto de extensão da UFOP, composto por uma coordenadora e monitores graduandos do curso de Letras e História da Universidade. Atualmente, o PEJA tem três salas de aula localizadas no município de Mariana. Uma dessas salas funciona no Recriavida e é composta por dezoito alunas com idades entre 35 e 79 anos e com experiência escolar semelhante. A maioria das alunas teve um curto período de escolarização, outras, por fatores diversos, nunca freqüentaram a escola. Apesar de algumas diferenças e histórias de vida peculiares o grande objetivo de todas é aprender a ler e a escrever. As atividades trabalhadas em sala de aula são adaptadas ao cotidiano e a experiência de vida de cada alfabetizanda. Nosso objetivo é atender às expectativas e necessidades dessas alunas. PALAVRAS-CHAVE: alfabetização, ensino/aprendizagem, PEJA.

INTRODUÇÃO

O Programa de Alfabetização de Jovens e Adultos foi gestado na Casa Civil durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 1997, dirigido pela primeira dama Ruth Cardoso e envolvia algumas universidades, a ONG Alfabetização Solidária e um sistema de parceria de ONGs que contribuía com a verba necessária para o desenvolvimento das atividades relacionadas ao projeto. A Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) adotou o programa no ano de 1998 nas cidades de Juripiranga, Pedras de Fogo, Pilar e Itabaiana, no estado da Paraíba, onde iniciou suas atividades. Em 2003, o programa deslocou-se para municípios próximos à UFOP: Ouro Preto, Mariana, Santa Bárbara e Catas Altas, sendo que este último encerrou suas atividade antes dos demais. Atualmente essa parceria sofreu algumas transformações que serão tratadas no decorrer deste trabalho.

Em cada um dos municípios citados funcionavam aproximadamente doze a quatorze salas de aula, tanto nas cidades quanto em distritos pertencentes às mesmas. Estas salas eram compostas por jovens e adultos, em sua maioria idosos, que por fatores diversos, não freqüentaram a escola ou simplesmente não deram continuidade aos estudos no tempo estabelecido como “ideal de aprendizagem”. As aulas eram

1 Professora Mestre em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais

2 Graduanda em Letras pela Universidade Federal de Ouro Preto e bolsista voluntária PEJA/UFOP 3

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ministradas por alfabetizadores populares pertencentes à mesma região dos alunos. O projeto oferecia mensalmente uma orientação aos alfabetizadores com o objetivo de enriquecer e direcionar a formação dos mesmos. Os monitores, por sua vez, faziam um acompanhamento através de visitas mensais às salas de aula para verificar a adequação do espaço físico, as condições do mobiliário e o andamento das aulas.

Na UFOP, o Programa de Educação de Jovens e Adultos insere-se no bojo dos programas de extensão e é coordenado pelo Departamento de Educação. O projeto é formado por alguns professores da universidade e alunos graduandos dos cursos de Letras e História que trabalham como monitores do mesmo.

Em decorrência das mudanças na concepção de alfabetização na ONG e da experiência na área, a UFOP desfaz a parceria e lança a partir deste ano, um projeto independente em busca de continuar atendendo às necessidades da população no que toca a vertente do analfabetismo. Um dos fatores que impulsionou a continuidade desse trabalho foi o alto índice de pessoas com nenhuma ou baixa escolarização no Brasil. Muitas iniciativas com o propósito de mudar esta situação vêm sendo desenvolvidas, porém pode-se concluir através de pesquisas, que estamos apenas no início de um longo trabalho. O campo do analfabetismo precisa de muita atenção, principalmente do governo, e de um trabalho intenso e contínuo a fim de obter resultados favoráveis que contribuam para a diminuição deste índice.

Atualmente, o Brasil apresenta um número alarmante da população de analfabetos. Uma pesquisa divulgada pelo Ministério da Educação (MEC) mostrou que o país tem cerca de dezesseis milhões de pessoas incapazes de ler e escrever. E, se forem incluídas pessoas com menos de quatros séries de estudo, esse número sobe para trinta e três milhões. Outras pesquisas realizadas constataram também que a maioria dos casos concentra-se entre os mais pobres, mais idosos, negros ou pardos e em áreas menos desenvolvidas.

Na região dos Inconfidentes, na qual a Universidade atua há alguns anos pode-se constatar que ainda existem muitos casos de analfabetismo. Apesar de todo trabalho já realizado e dos resultados positivos, percebe-se que este problema ainda está longe de ser solucionado.

Ao iniciar essa nova etapa do trabalho, o projeto ganha autonomia em relação à formação dos alfabetizadores, ao material utilizado e ao espaço físico. Diferentemente do modelo anterior, cujo alfabetizador era considerado leigo e o material didático utilizado imposto, hoje as salas são um espaço considerado livre, os alfabetizadores são

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os próprios monitores e o material trabalhado em aulas é confeccionado pelos mesmos, atendendo às dificuldades específicas de cada aluno.

ALFABETIZAÇÃO NO RECRIAVIDA

Programa de Educação de Jovens e Adultos (PEJA) iniciou suas atividades no mês de agosto deste ano, com a abertura de três salas na cidade de Mariana: uma no bairro Passagem que funciona na Escola Estadual “Benjamim Guimarães”; uma no asilo “Lar Santa Maria” e outra no espaço do Recriavida,sendo esta última a nossa fonte de relatos e experiências presentes neste trabalho.

O Recriavida é um programa municipal desenvolvido pela Secretaria de Desenvolvimento Social que possui um grande espaço físico para realização de suas atividades e tem como objetivo atender as pessoas idosas do município. Em julho de 2002 esse programa foi lançado oficialmente com as seguintes diretrizes: as atividades são realizadas das segundas às sextas-feiras, no período de sete às dezoito horas; e o atendimento é voltado para as áreas de saúde e sócio-cultural. Para participar, o candidato passa por avaliação de geriatra e fisioterapeuta, para definir qual grau de participação adequado.

Apesar de toda autonomia do projeto, encontramos pela frente muitas dificuldades, pois os recursos financeiros de que necessitamos para o desenvolvimento das atividades não são suficientes. A sala de aula do Recriavida, por exemplo, possui um espaço físico muito bom: a sala é espaçosa, arejada e bem iluminada. Porém não dispõe de um mobiliário adequado para o trabalho que realizamos. Devido ao fato desse espaço não pertencer a um ambiente escolar, dispomos de quatro mesas plásticas, que acomodam quatro pessoas cada uma, e não oferecem conforto algum por serem pequenas e não possuírem firmeza. O quadro negro disponível é pequeno sendo impossível escrever nele atividades completas. Sendo assim, estas são transmitidas, individualmente, a cada alfabetizanda, o que demanda mais tempo.

O objetivo deste projeto é promover a alfabetização de pessoas jovens e adultas que não iniciaram ou não deram continuidade aos estudos. A nossa intenção é fazer com que estes cidadãos não apenas decifrem códigos, mas também saibam interpretá-los de forma crítica, expressando suas opiniões e fazendo a sua leitura de mundo. O aluno da EJA é alguém que, em termos de conhecimento, não vem totalmente “vazio” para a sala de aula, ele traz consigo uma carga de experiências acumulada durante toda uma vida.

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Essa carga tem um papel fundamental no processo de aprendizagem desse aluno, portanto deve ser totalmente aproveitada pelo alfabetizador. Um estudante de alfabetização pode não saber perfeitamente todos os cálculos matemáticos, mas sabe contar seu dinheiro, ou quanto vai dar sua conta no supermercado. Pode não saber grandes acontecimentos da História, mas consegue relatar a história da cidade em que nasceu, ou seja, o conhecimento prévio desse aluno é muito importante e em hipótese alguma pode ser descartado.

A respeito da formação, a turma do Recriavida é composta por dezoito alunas, com idades entre 35 e 79 anos, com situação escolar semelhante e que já freqüentam o espaço para várias outras atividades. A maioria dessas alunas teve um curto período de escolarização, lêem e escrevem com dificuldade. Quatro alunas nunca freqüentaram a escola, por esse motivo estão iniciando, somente agora, o processo de alfabetização. Apesar de haver algumas diferenças e histórias de vida peculiares, o grande objetivo dessas alunas é aprender a ler e escrever, ou seja, ir ao supermercado fazer compras sem depender de outras pessoas, entrar no ônibus correto, decifrar uma bula de remédio, músicas e várias outras situações do dia a dia.

As aulas são realizadas três dias da semana (as segundas, quartas e sextas-feiras) no período de quatorze às dezesseis horas e ministradas pelos monitores: Cristiane Navais Alves, Daniel Alves Duarte Pedroso Junior, Luciana Aparecida Dutra de Souza e Raphael Ribeiro Machado, todos graduandos da universidade.

Os temas das atividades abordadas em salas de aula são voltados para o cotidiano das alunas, sabendo que o aluno de EJA é alguém que em termos de conhecimento não chega à escola totalmente “vazio”, ele traz consigo uma carga de experiências acumulada durante toda uma vida. Por isso, segundo Miguel Arroyo, a EJA tem que ser “uma modalidade de educação para sujeitos concretos, em contextos concretos, com histórias concretas, com configurações concretas”.

O material pedagógico utilizado nessas três salas de alfabetização é composto por um livro didático, ainda em construção pelos monitores do projeto, e de jogos educativos (bingo, memória e dominó), confeccionados através de embalagens recicláveis.

Apesar de muitas dificuldades enfrentadas pelas alunas, como por exemplo, a distância, os problemas relacionados à saúde, as tarefas domésticas e aos compromissos pessoais, elas estão sempre animadas e dispostas a superar os próprios limites para atingir seus objetivos.

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RELATOS DE EXPERIÊNCIA

No Recriavida a turma divide-se em alunas que estão na fase de alfabetização e de pós-alfabetização, ou seja, algumas estão no início do processo de aprendizagem (fase de reconhecimento de letras e sílabas isoladas) e outras já se encontram em uma fase mais avançada (já reconhecem palavras, frases e pequenos textos). Entre as alunas que se enquadram na primeira fase podemos citar: Lurdes, Tereza, Marta e Maria José4.

Essas alunas compartilham do mesmo espaço físico que as demais, porém desenvolvem atividades diferentes. Por encontrarem-se em fase inicial de aprendizagem, ou seja, em uma situação que exige maior atenção, existe um monitor disponível exclusivamente para elas. As atividades propostas para essas alunas são exercícios para coordenação motora, fixação, assimilação através de ilustrações, reconhecimento visual, fala e escrita.

O primeiro caso a ser relatado neste trabalho e o que mais nos surpreendeu é o de Lurdes que começou a freqüentar as aulas quando já estávamos ministrando a quinta aula. Lurdes é dona de casa residente no Bairro São Cristóvão em Mariana, e aos 67 anos é a primeira vez que ela tem contato com uma sala de aula, ainda que não-formal.

Numa pequena conversa a sós com Lurdes, antes de iniciarmos a aula perguntamos a ela o que esperava do curso e ela respondeu: ‘Minha vontade é aprender a escrever o meu nome’. Ela não reconhecia letras nem números, mas tinha noção de quantidade.

Demos a ela um caderno e um lápis, pontilhamos a data do dia em seu caderno para que ela percebesse o desenho das letras e dos números através do contorno dos mesmos. Com isso percebemos que Lurdes não sabia como manejar o lápis nem por onde começar a contornar as letras. Foi percebendo estas dificuldades que vimos a necessidade de dar a ela atividades para melhorar sua coordenação motora e consequentemente a escrita.

Primeiramente Lurdes percorreu, com o dedo indicador, caminhos pontilhados em uma folha branca, sob o auxílio do monitor que dava as coordenadas – ‘sobe, desce, sobe de novo, vira, volta,... ’ - e em seguida contornou-os utilizando o lápis. Lurdes ficou nervosa e apreensiva, mas obteve um bom desempenho nessa atividade.

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Por motivos de doença ela se manteve um bom tempo ausente das aulas. Mas quando retornou, retomamos com ela as atividades voltadas para coordenação motora e também iniciamos outras como: alfabeto ilustrativo, dinâmica dos nomes e alfabeto móvel. Com essas atividades buscamos o reconhecimento e fixação das letras, palavras e números.

Hoje, Lurdes consegue desenvolver com sucesso as atividades concebidas a ela e já diagnosticamos um grande avanço, ou melhor, o maior avanço dentre todos os casos que encontramos no Recriavida, pois ela que não conseguia segurar no lápis nem reconhecer nenhuma letra, agora já identifica a maioria delas, as esboça corretamente com o auxílio do alfabeto de letra bastão, consegue copiar palavras sem perder a seqüência, reconhece e escreve seu primeiro nome em letra bastão, sem falar na evolução da sua caligrafia. Mesmo com todas as dificuldades, Lurdes não perde nenhuma aula e além das atividades que são trabalhadas em sala, ela sempre pede exercícios extras para praticar em casa, o que nos mostra sua grande vontade de aprender. Casos como esse motivam tanto os monitores quanto as próprias alunas, fazendo de cada aula um momento de conhecimento e superação.

Um caso similar ao de Lurdes é o de Maria José que tem 62 anos, também é dona de casa e residente do bairro Santo Antônio. Maria nunca freqüentou a escola. Segundo ela, seu pai dizia que isso era uma bobagem e que ela tinha que ajudar com a

lida na roça. Maria percebe o dano que a falta do estudo causou à sua vida e por isso

passou a freqüentar as aulas de alfabetização no Recriavida.

No primeiro dia de aula fomos surpreendidas ao pedir que ela copiasse, do pequeno quadro negro, a data do dia para darmos início a aula. Com isso detectamos que Maria José, apesar de reconhecer algumas letras (A, I, e O) não conseguia transcrever no caderno o que via no quadro. Percebendo isso, pontilhamos aquela data em seu caderno para que ela pudesse esboçar as letras e perceber o contorno delas, tudo isso com o auxilio do monitor que dá atenção especial às alunas alfa, as orientando como traçar as letras.

Sua vontade de aprender é tanta que ela não costuma faltar a uma aula sequer e também pede atividades extras para praticar em casa, consciente de que o contato com a escrita deve ser gradual para chegar ao seu objetivo. Assim, em poucas aulas ela já reconhecia seu nome, a maioria das letras do alfabeto, obteve um avanço considerável na caligrafia e já copiava corretamente as letras, ainda que vagarosamente.

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Também por motivos de doença, Maria se manteve ausente das aulas por algum tempo e por isso não teve maiores avanços no processo de alfabetização. Apesar de aproximadamente três semanas longe do contato com a escrita ela não regrediu e voltou às aulas com a mesma força de vontade de antes.

Dona Maria tem facilidade em captar informações, por isso julgamos que seu desenvolvimento será compatível com as nossas expectativas, uma vez que esperamos que ao final dessa etapa já escreva seu primeiro nome em letra bastão e forme palavras simples sem auxílio algum.

Vale ressaltar também o caso de Marta de 79 anos, mãe de doze filhos e moradora do bairro Rosário. Ao conversarmos com Marta ela nos disse que freqüentou a escola por um curto período – menos de um ano – porque precisava colaborar com as tarefas domésticas. E nos contou ainda que o pouco que sabe aprendeu ouvindo uma vizinha, que era professora, alfabetizar os filhos. Apesar de passarem muitos anos desse fato, ela relata com clareza a formação de sílabas ensinada pela professora ( B com A, BA; B com E, BE; e assim por diante).

Além de possuir uma ótima memória que a permite captar e armazenar informações rapidamente, Marta, como todas as outras, tem muita vontade de aprender e é muito participativa.

Diferentemente dos outros casos citados, Marta iniciou sabendo escrever seu primeiro nome e reconhecia quase todas as letras e algumas sílabas, porém não conseguia formar palavras e ainda possuía uma grande dificuldade em transcrever algumas letras bastão como: “S”, “J”, “T”, “E”, “G”, “R” e “Z”. Observando essa dificuldade trabalhamos com Marta, primeiramente, atividades como contornar letras pontilhadas. Ela também apresentava muita dificuldade na leitura, pois lia somente algumas sílabas isoladas.

Após quase quatro meses de trabalho podemos notar que Marta já forma algumas palavras simples como “PATO”, “CASA”, “MAPA”, “COPO”, “MESA” entre outras. Além disso, ela consegue ler palavras e frases simples.

Por último temos o caso de Tereza de 74 anos, moradora do bairro Cabanas, dona de casa e mãe de oito filhos. Ela é uma senhora animada, bem disposta e mostra-se muito interessada.

Tereza também teve um curto período de escolarização, pois seu pai dizia que não poderia aprender a escrever para não enviar cartas aos rapazes. Quando começou a participar das aulas no Recriavida ela escrevia o nome e algumas palavras simples,

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porém apresentava dificuldade em transcrever algumas letras. Dessa forma fizemos com ela o mesmo processo realizado com as outras. O exercício de contornar letras pontilhadas foi essencial para que Tereza melhorasse sua coordenação motora. Hoje, ela resolve exercícios sobre formação de palavras, lê pequenos trechos vagarosamente e, além de tudo, consegue interpretar textos pequenos.

As demais alunas compõem o grupo de pós-alfabetização e têm uma trajetória escolar bem parecida: a maioria delas possui, no máximo, três anos de escolarização. Os motivos da desistência são praticamente os mesmos: inconsciência dos pais, falta de oportunidade, as tarefas domésticas, os trabalhos no campo, etc.

Essas alunas apresentam uma maior dificuldade em relação à escrita do que à leitura. Percebemos logo no início que elas conseguiam ler mesmo que lentamente uma palavra, frases e alguns textos, mas quando pedíamos para que escrevessem uma palavra notamos que a maioria delas não conseguia. Devido à falta de prática na escrita, elas costumam escrever as palavras tal como falam, como por exemplo, a palavra “abóbora” que é representada por elas como “abobra”, ou seja, é como se elas quisessem representar sua maneira de falar através da escrita. Outro fato observado foi que todas escreviam faltando letras, principalmente consoantes5.

Apesar de histórias escolares semelhantes, após uma breve conversa no primeiro dia de aula, notamos que os objetivos de nossas alunas eram diferentes. Algumas fazem parte do coral do Recriavida e se apresentam em vários locais da cidade e fora dela. Assim, o principal interesse dessas alunas é ler e escrever corretamente as músicas que costumam cantar.

Uma das alunas nos declarou que seu maior desejo é estudar e conhecer os números, ou seja, aprender a fazer contas (somar, subtrair, dividir, multiplicar) no papel, pois, mentalmente ela não apresenta muita dificuldade nas operações de soma e subtração. Mesmo sendo este o seu foco, ela é freqüente e participa bastante das aulas de interpretação de textos. Além de desenvolver todas as atividades dadas no período das aulas, leva exercícios de matemática para fazer em casa. Ao corrigir seu caderno notamos que nas operações mais simples ela já não apresenta dificuldade, podendo assim, avançar para uma nova etapa.

Outra está muito motivada com as aulas, pois quer muito aprender a ler e, principalmente, escrever corretamente os hinos da sua Igreja. Sugerimos a ela que

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os para as aulas, assim como fizemos com as alunas que participam do coral. As demais não têm um objetivo específico, apenas querem aperfeiçoar a leitura e a escrita.

DESENVOLVIMENTO DE ALGUMAS ATIVIDADES

Os temas das atividades direcionadas as alfabetizandas são voltados para o cotidiano de cada uma, estimulando o interesse e a fixação dos exercícios. Entre os assuntos trabalhados em sala de aula, alguns surtiram um resultado muito bom. Em uma dessas aulas fizemos a simulação de um supermercado com intuito de auxiliar na matemática. Levamos para sala algumas embalagens vazias de produtos consumidos diariamente como sabão em pó, detergente, desinfetante, leite, esponja de aço, suco, chocolate, entre outros. Distribuímos a cada aluna uma quantia de cinqüenta reais em notas sem valor e pedimos para que simulassem uma pequena compra. Consideramos essa atividade positiva, pois percebemos onde se encontravam as dificuldades de cada uma, podendo assim sanar suas dúvidas.

Trabalhamos também com interpretação de textos sobre temas atuais. O primeiro deles foi sobre as olimpíadas de 2016 que será no Brasil. Entregamos a cada alfabetizanda uma folha com uma pequena reportagem sobre o assunto e algumas perguntas referentes ao mesmo. Após um bom tempo dedicado a leitura deste, iniciamos sua interpretação. Notamos que elas estavam informadas e não apresentaram muitas dificuldades ao responder oralmente às questões propostas.

O segundo tema apresentado foi sobre a vida de Aleijadinho, escultor de importantes obras da região. Elas mostraram um grande interesse pelo assunto e ficaram surpresas ao saber que sua obra principal são “Os doze profetas” da cidade de Congonhas do Campo. Atividades como esta além de ajudarem na leitura, proporcionam um enriquecimento cultural.

Outro assunto de grande importância trabalhado em sala foi sobre a Gripe Suína (Gripe A, transmitida pelo vírus H1N1). Entregamos para as alunas um folheto explicativo contendo as informações sobre o vírus: como ele é transmitido, quais são os principais sintomas e as formas preventivas do mesmo. Além de fazerem a leitura do folheto conversamos um pouco sobre o tema e notamos que algumas alunas não continham informações suficientes sobre a doença. Dessa forma percebemos que temas como estes são necessários tanto para o exercício de aquisição da leitura e da escrita quanto para a vida.

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A última atividade a ser relatada é sobre o tema carta cujo propósito é ensinar a composição de seus elementos. Primeiramente explicamos para as alunas passo a passo para a construção de uma carta, depois entregamos a elas uma folha em branco para que construíssem uma para um destinatário de sua preferência. Ao terminar a atividade notamos que apesar de haver alguns erros gráficos, elas haviam, de fato, escrito um texto, já que as idéias estavam articuladas e coerentes. Esse exercício foi satisfatório para muitas alunas, pois perceberam ser capazes de produzir tal feito, mas a alegria maior, com certeza, era a nossa, de ver que o trabalho que vem sendo desenvolvido está surtindo resultados favoráveis, ou seja, permite com que elas transitem no social.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caminhando para quatro meses de dedicação a este trabalho, concluímos que iniciativas como estas contribuem, e muito para a formação de cidadãos mais críticos e atuantes na sociedade. Uma vez que sujeitos da EJA já vem para sala de aula com toda uma bagagem a ser explorada e respeitada.

Percebendo a grande importância que o nosso trabalho tem na vida dessas pessoas, nos empenhamos para fazer com que seus objetivos sejam alcançados mesmo diante de todas as dificuldades.

Ao depararmos com realidades tão distintas notamos que algumas dessas pessoas buscam, não somente um aperfeiçoamento da leitura e da escrita, mas persistem na vontade de dar continuidade aos estudos, ainda que em meio a muitos empecilhos.

É recompensador ver o avanço que cada um dos alfabetizandos desenvolve, gradativamente, ao longo do processo de ensino/aprendizagem. Isso nos dá mais certeza de que iniciativas como estas não podem ser desconsideradas, mas sim reconhecidas e abraçadas com seriedade.

Outro fator relevante é o acréscimo que esse trabalho proporciona à nossa formação como futuros docentes, pois ainda que no meio não formal, temos contato direto com a sala de aula e com o processo de aquisição da leitura e da escrita.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SILVA, Fernanda A. O. R. O Contributo do Material e Imaterial na Formação de

Educador de Jovens e Adultos: o relato da Universidade Federal de Ouro Preto.

Congresso Internacional de Alfabetização. São Paulo, capital, 2005;

Disponível em noticias.terra.com.br. Acessado em out. de 2009.

FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 2001.

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