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Tipos arquitetônicos e vitalidade urbana: um estudo sobre as possíveis relações entre a arquitetura e o uso dos espaços públicos

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Academic year: 2021

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Tipos arquitetônicos e vitalidade urbana: um estudo sobre as possíveis

relações entre a arquitetura e o uso dos espaços públicos

Building types and urban vitality: a study on the relations between architecture and the use of public spaces

1 Renato T. de SABOYA

Arquiteto e Urbanista. Professor do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo (PósArq) da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC; rtsaboya@gmail.com.

2 Julio Celso Borello VARGAS

Arquiteto e Urbanista; Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; jcelso@arqs.com.

RESUMO

O trabalho investiga a relação entre tipologias arquitetônicas e vitalidade urbana. Mais especificamente, está interessado em descobrir se diferentes tipologias produzem resultados diferentes em termos de vitalidade, entendida como vida microeconômica, movimento de pedestres e grupos em interação. As hipóteses são de que tipologias rarefeitas possuem efeitos negativos sobre a vitalidade, enquanto que tipologias mais contínuas e permeáveis teriam efeitos positivos. Para testar essas hipóteses e ao mesmo tempo controlar para que os efeitos da acessibilidade proporcionada pela configuração do tecido urbano não influenciem ou distorçam os resultados, uma metodologia foi proposta baseada na divisão da amostra a ser levantada em três “faixas” de acessibilidade, de forma que dentro de cada faixa houvesse níveis de acessibilidade quase constantes. O artigo explica essa metodologia e suas adaptações para as particularidades de Florianópolis e Porto Alegre, e apresenta e discute os resultados obtidos até o momento.

PALAVRAS-CHAVE: tipologias edilícias, vitalidade urbana, movimento de pedestres, sintaxe espacial.

ABSTRACT

This paper investigates the relationship between building typologies and urban vitality. More specifically, it examines if different typologies render different results regarding urban vitality, described here as microeconomic activities, pedestrian movement and interacting groups. The general hypotheses are that detached typologies have a negative effect on vitality, whereas more continuous and permeable typologies have positive effects. In order to test these hypotheses without allowing the accessibility afforded by the grid configuration to distort or otherwise greatly influence the results, a new methodology was proposed based on a categorization of the sample in ranges of accessibility, in such a way as to maintain accessibility values near constant within each range. The paper explains this methodology and its adaptations to the idiosyncrasies of Florianópolis and Porto Alegre, and presents and discusses the preliminary results.

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1 INTRODUÇÃO

Há uma crescente desconfiança entre profissionais e pesquisadores em Arquitetura e

Urbanismo com relação à possibilidade de impactos negativos da tipologia arquitetônica que é atualmente reproduzida massivamente em nossas cidades, alavancada pelas regras constantes nos zoneamentos de uso e ocupação do solo, como ressonância das lógicas do mercado imobiliário. Tal tipologia é caracterizada por torres verticais isoladas nos lotes, com baixa permeabilidade em relação à rua no nível térreo, grandes afastamentos laterais e frontais e alta ocorrência de fachadas cegas voltadas para os espaços públicos (Figura 1a). Tais impactos supostamente promovem a) novas formas de segregação socioespacial; b) estilos de vida mais motorizados e menos sustentáveis; c) crescente rarefação e expansão urbana acompanhadas do aumento das distâncias internas das cidades e dos custos de infraestrutura; d) a diluição do movimento de pedestres e da vida microeconômica local; e e) problemas de segurança pública. Por outro lado, existe uma corrente que sustenta que tipologias mais contínuas e permeáveis teriam o efeito oposto (Figura 1b), incentivando a vitalidade microeconômica local, a

apropriação dos espaços públicos, a disposição de trocar o automóvel por meios de locomoção não motorizados e até mesmo uma maior interação social.

Entre esses dois extremos, há uma tipologia mista constituída por uma base mais contínua e uma torre mais isolada (Figura 1c). Seus efeitos também seriam intermediários, a depender, entretanto, do modo como a base é tratada na sua relação com o espaço público: bases ocupadas por garagens e caracterizadas por pouca permeabilidade tenderiam a aproximar o desempenho dessa tipologia ao da tipologia isolada; bases ocupadas por atividades comerciais e com alta permeabilidade aproximariam seu desempenho ao da tipologia contínua.

Figura 1: a) tipologia isolada; b) tipologia contínua; c) tipologia base-torre

Esses e outros aspectos da dinâmica da cidade que de alguma maneira são influenciados pelos padrões físico-funcionais da estrutura urbana podem ser agrupados sob o conceito de

vitalidade urbana, entendida neste trabalho como (NETTO et al, 2012): vida microeconômica, representada pela presença de atividades não-residenciais nos edifícios; socialidade,

representada pela co-presença nos espaços públicos, movimento de pedestres e interação em grupos; e segurança, caracterizada pela baixa ocorrência de crimes, pela sensação de estar seguro em um espaço público e pela baixa frequência de comportamentos anti-sociais (brigas,

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vandalismos, agressões verbais, etc.). Este estudo concentra-se nos dois primeiros

componentes da vitalidade (para um estudo do aspecto da segurança e sua relação com as tipologias edilícias, ver Vivan e Saboya (2012)).

Entende-se que esses padrões de vitalidade estão associados (influenciam e são influenciados) por outros padrões urbanos, tais como a configuração do sistema viário, a tipologia edilícia, as densidades populacionais e construtivas, assim como muitos outros. Tais padrões interagem dentro do que poderia ser chamado de "temporalidades” da produção da cidade, em um processo permanente de convergência e divergência, de forma que estados específicos em um padrão podem desencadear ou influenciar, ainda que de forma complexa e sujeita a

descontinuidades e assincronias, certos estados específicos em outros padrões.

Neste estudo, trabalhamos com uma classificação em quatro temporalidades distintas (NETTO et al, 2012): a) temporalidade 1, representada pela configuração dos espaços públicos

(incluindo as vias de circulação), de caráter altamente durável e estável; b) temporalidade 2, associada aos padrões de densidade construtiva e de tipologia edilícia, menos estáveis que a temporalidade 1, mas ainda assim com certo grau de resistência a mudanças; c) temporalidade 3, representada pelos padrões de distribuição de usos e atividades e d) temporalidade 4, relativa a fenômenos de mudança potencialmente imediata, como os movimentos de pedestres.

Breve revisão de literatura

Jacobs (2000) enfatiza a importância dos "olhos da rua", que se refere à possibilidade de que os espaços públicos sejam policiados pelas pessoas no interior dos edifícios, o que pressupõe: a) certa proximidade entre estes e as calçadas; b) permeabilidade visual (especialmente janelas) entre eles: "Os edifícios de uma rua preparada para receber estranhos e garantir a segurança tanto deles quanto dos moradores devem estar voltados para a rua. Eles não podem estar com os fundos ou um lado morto para a rua e deixá-la cega." (JACOBS, 2000, p. 35-36). Além disso, Jacobs ressalta também o fato de que as pessoas gostam de observar o movimento nas ruas, o que também seria possibilitado por esses dois fatores.

Essa necessidade de interação entre o espaço da rua e o interior das edificações é tratado por diversos outros autores. Alexander et al (1977), por exemplo, defendem a necessidade de edifícios baixos com no máximo quatro pavimentos, de forma a possibilitar uma sensação de conexão com o que acontece na rua. Segundo eles, essa altura ainda permite que alguém na janela consiga enxergar detalhes do que se passa no térreo, ou mesmo interagir com as pessoas que lá se encontram. Edifícios mais altos começam a inviabilizar essa possibilidade de interação, não apenas pela distância visual entre janela e calçada mas também pela espécie de barreira constituída pela distância que os corredores, elevadores e escadas impõem ao ato de descer ao nível do térreo, que acaba ficando mais difícil e menos provável de acontecer de forma casual:

"habitações em altura distanciam as pessoas do nível térreo, assim como da sociedade cotidiana e casual que ocorre nas ruas, calçadas, jardins e varandas frontais. Elas deixam as pessoas sozinhas nos apartamentos. A decisão de sair para ir a alguma atividade pública torna-se formal e desajeitada" (ALEXANDER et al, 1977, p. 116). Santos e Vogel (1985), em uma etnografia do bairro Catumbi, também destacam a importância da proximidade e permeabilidade entre os domínios privados das residências e o público, alcançadas pelas janelas e portas que se abrem diretamente para a rua e, ainda que

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implicitamente, pela ausência de grandes afastamentos frontais que poderiam colocar em risco a viabilidade da interação entre esses dois espaços. Havendo essa proximidade e

permeabilidade era possível, por exemplo, que as mães participassem da brincadeira das crianças, ainda que apenas com a função de controle e supervisão; que as conversas entre vizinhos acontecessem de forma natural, através da interação espontânea entre quem passa e quem está na janela observando a rua; e que os frequentadores de um bar pudessem ser vistos por quem passava na rua, ao mesmo tempo em que controlavam o movimento de pessoas. Nesse contexto, alguns aspectos tipológicos mostravam-se importantes:

"Alguns detalhes arquitetônicos podem tornar impossíveis certas formas de uso das janelas - as grades, a altura excessiva com relação à calçada, por exemplo. A distância entre a casa e a rua aumenta em virtude desse tipo de problema. As ocasiões de contato face a face se reduzem, ao mesmo tempo em que se acentua a distinção do fora com relação ao dentro, do público com relação ao privado". (SANTOS; VOGEL, 1985, p. 54)

Mais recentemente, Hanson e Zako (2007), notaram que apenas a configuração da malha não era suficiente para prever com precisão aspectos de vitalidade associados à ocorrência de comportamentos antissociais em conjuntos residenciais de diferentes tipos. Para explicá-los, foi necessário recorrer às características tipológicas, especialmente à presença de "olhos da rua". Mehta (2009), por sua vez, realizou um estudo cujo objetivo era entender as relações entre a forma física do ambientes urbanos e o comportamento das pessoas nos passeios, e examinar como estes eram utilizados em termos de interação social e presença de pedestres. A partir do levantamento das características físicas dos trechos de quarteirão analisados, o autor

identificou como os principais fatores explicativos de altos índices de vitalidade os seguintes aspectos:

 Espaços para sentar junto a lojas e demais tipos de comércios;

 Largura das calçadas: calçadas mais largas são mais interessantes para caminhadas e fornecem o espaço necessário à instalação de bancos;

 Articulação das fachadas: fachadas com reentrâncias e pequenas esquinas criam áreas intermediárias entre o fluxo de pedestres e as vitrines, permitindo às pessoas parar junto a elas para olhar os produtos;

Outra linha possível de causalidade entre a tipologia arquitetônica e a vitalidade dos espaços públicos diz respeito à adequação física propriamente dita do casco arquitetônico para abrigar atividades que não apenas a residencial, em especial usos comerciais e alguns tipos de serviços como restaurantes, bares, lanchonetes, etc. Essas atividades potencializam a interação entre o interior e o exterior das edificações; entretanto, dependem de algumas características destas últimas para poderem efetivar esse potencial: recuos frontais reduzidos ou inexistentes, alta proporção de fachada em relação à testada do lote e alta permeabilidade para o espaço público.

Delimitação do problema e hipóteses de pesquisa

Assim, busca-se entender as interrelações (efeitos mútuos) entre aspectos morfológicos, usos e atividades e vitalidade dos espaços públicos. O foco é na morfologia "arq-urbana" ─ entendida como o mix agregado de densidade e tipologias arquitetônicas ─ e seus impactos específicos sobre a vitalidade.

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A partir desses pressupostos, e das hipóteses de que há efeitos negativos decorrentes da rarefação dos tecidos, em oposição às influências positivas que a compactação exerce sobre a vitalidade, conceitualiza-se um catálogo mínimo de 2 tipos de interesse para o presente estudo: os rarefeitos e os compactos. Esta denominação, após o estudo empírico realizado no Rio de Janeiro no ano de 2011 e relatado no artigo de Netto et al (2012), evoluiu para ISOLADO E IMPERMEÁVEL (tipo A) e CONTÍNUO E PERMEÁVEL (tipo B), tendo em vista que os aspectos espaciais preponderantes são de ordem "posicional" (relação com o lote, com o espaço público – a rua – e com os vizinhos) e de "porosidade". Há ainda um terceiro tipo, conforme

comentado acima, com características híbridas entre os dois primeiros, denominado BASE-TORRE (tipo C) (ver Figura 1).

Na manipulação e descrição das variáveis relativas aos tipos arquitetônicos, esta pesquisa vai se desenvolver em duas direções. Uma primeira, "de baixo para cima", tratará de:

1) Buscar relações entre as características geométricas desagregadas (permeabilidade do edifício, relações edifício/edifício, edifício/lote e edifício/espaço público) e os perfis de resposta identificados com a vitalidade (correlações pareadas, regressões múltiplas, componentes principais);

2) Buscar interrelações entre essas próprias características (agregações/ clusters/ agrupamentos/ afinidades).

Ambos os procedimentos buscarão fazer emergir os tipos pré-determinados, numa abordagem exploratória das hipóteses do estudo. Além disso, o primeiro deles procurará identificar se certas características desagregadas dos tipos são mais relevantes que outras na sua relação com a vitalidade urbana.

A segunda direção de abordagem dos tipos arquitetônicos pode ser entendida como sendo "de cima para baixo", na qual, a partir dos mesmos pressupostos e construtos conceituais, a pesquisa de campo vai "pré-enquadrar" qualitativamente os edifícios nas categorias tipológicas A ou B, buscando, através de uma abordagem confirmatória:

1) Relações entre esses "proto-tipos" e os perfis de resposta (movimento de pedestres, grupos em interação, etc.) identificados com a vitalidade;

2) Relações entre os "proto-tipos" e as emergências tipológicas do estudo exploratório (medidas desagregadas).

O objetivo geral da pesquisa, portanto, pode ser descrito da seguinte forma:

 Investigar a relação entre as características tipológicas das edificações, os padrões tipológicos de conjuntos urbanos emergentes e a vitalidade dos espaços públicos diretamente conectados a eles.

Interessa-nos investigar até que ponto as características tipológicas das edificações podem influenciar nos níveis de vitalidade dos espaços públicos. Nesse sentido, as hipóteses a serem testadas são:

 Tipo "ISOLADO E IMPERMEÁVEL" está negativamente correlacionado à vitalidade, e tipo "CONTÍNUO E PERMEÁVEL" está positivamente correlacionado à vitalidade dos espaços urbanos;

 Com relação às características tipológicas desagregadas:

 Recuos frontais estão negativamente correlacionados com a vitalidade dos espaços urbanos.

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 A continuidade das fachadas, promovendo uma definição do espaço público e oferecendo maior oportunidade de contato deste com os espaços privados, está positivamente correlacionada com a vitalidade.

 Permeabilidade entre público e privado ao nível térreo, ou seja, a possibilidade de entrar e sair da edificação diretamente a partir do espaço público, está positivamente correlacionada com a vitalidade.

 Os "olhos da rua", entendidos como permeabilidade visual entre o interior da edificação e os espaços públicos, estão positivamente correlacionados com a vitalidade.

Para testar essas hipóteses é necessário superar as duas principais limitações apresentadas em outros estudos envolvendo tipos arquitetônicos e vitalidade urbana: a) carência de

comprovação empírica, limitando-se a construir conceitos e postulados que permanecem no nível do discurso; ou b) experimentação sem separar os efeitos topológicos dos efeitos tipológicos. Isso gerou a necessidade de construção de uma nova metodologia que pudesse testar adequadamente as relações de interesse para a pesquisa, descrita a seguir.

2 METODOLOGIA

O principal desafio enfrentado pela pesquisa é isolar os efeitos que as tipologias edilícias podem exercer sobre a vitalidade urbana, sem permitir que os resultados sejam

excessivamente distorcidos ou influenciados por outras variáveis. Esta tentativa de

“individualizar” cada padrão urbano em sua relação com os efeitos sociais não é simples. É preciso ter clareza sobre o poder das interrelações entre os componentes da estrutura urbana, interagindo sob a forma de “temporalidades” e, provavelmente, deixando pouco espaço para a existência de impactos realmente exclusivos de cada um dos elementos do sistema.

Começando pelo “tempo 1”, um enorme corpo de pesquisa advoga pela primazia das redes de circulação como fator de influência sobre a vitalidade urbana, especialmente a configuração e a localização do espaço em relação aos outros espaços do sistema (HILLIER et al, 1993; PENN et al, 1998). Nesse sentido, o argumento é que lugares mais centrais e/ou acessíveis tendem a apresentar maior atividade pedestre e maior concentração de atividades comerciais, independentemente da tipologia edilícia. Assim, áreas com tipologias semelhantes podem apresentar graus de vitalidade diferentes como resultado da diferença de sua posição na malha (mais ou menos acessível em relação ao resto do sistema urbano), o que dificulta a obtenção de conclusões válidas sobre a influência exclusiva das tipologias sobre a vitalidade.

De qualquer maneira, esta linha dos estudos urbanos enfeixada na Sintaxe Espacial, apesar de reificar a acessibilidade configuracional, não ignora os demais componentes da estrutura urbana, pois, apesar das altas correlações encontradas entre medidas topológicas e atividade pedestre, ainda deixa muito a explicar relativamente às atividades e fluxos. Inúmeros trabalhos da área procuram articular componentes da morfologia e dos usos do solo em modelos para explicação de movimento, utilizando tradicionalmente técnicas como regressões múltiplas (HILLIER; IIDA, 2005; PENN et al, 1998; DESYLLAS, 1997) e, mais recentemente, redes neurais artificiais (KIM et al, 2005) e análises multivariadas (PORTA et al, 2005).

Como ponto de partida, porém, admitiremos que existem e são conhecidos os parâmetros típicos de relação individual entre medidas configuracionais e atividade pedestre, lançando aqui a proposta de “isolar” os efeitos da acessibilidade dos de outros componentes urbanos,

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trabalhando com uma metodologia experimental bastante simples de controle desse fator, qual seja a sua fixação em níveis conhecidos.

Assim, assumiremos que a variação no movimento estará aproximadamente livre dos efeitos da acessibilidade proporcionada pela configuração da malha viária e poderemos, portanto, comparar as variações nos volumes de movimento com variações nas características morfológicas e examinar se relações podem ser encontradas ao controlar os efeitos da configuração topológica.

Desta maneira, a influência da morfologia urbana pode ser detectada isoladamente e em suas interações, mas também, e fundamentalmente, em termos do impacto que a mudança de um para outro nível de acessibilidade acarreta sobre eles. Em outras palavras, escolhendo mais de um nível de acessibilidade (digamos, acessibilidade baixa, média e alta), poderemos verificar se o comportamento das variáveis tipológicas são semelhantes em todas as faixas, ou se existem diferenças significativas.

Figura 4 – Esquema explicativo do processo de isolamento dos efeitos da acessibilidade proporcionada pela configuração do sistema viário em faixas de acessibilidade quase constante.

Entretanto, tal abordagem introduz sua própria série de problemas. Em primeiro lugar, a acessibilidade proporcionada pela malha não se expressa apenas em uma escala, mas em várias escalas simultaneamente. A configuração viária responde de forma diferente se

considerarmos a acessibilidade global e os vários níveis (ou raios) de acessibilidade local. Outra dificuldade é a de definir, previamente, qual medida sintática usar. Os estudos de Sintaxe Espacial têm desenvolvido novos métodos para descrever a influência da malha nos padrões de movimento e apropriação dos espaços urbanos, contando atualmente com várias opções de descrição das unidades espaciais (linhas axiais e segmentos de quarteirão), descrição da distância entre essas unidades (topológica, angular e métrica) e tipo de análise propriamente dita (integração ou escolha) (HILLIER, 2009).

Resumidamente, enquanto Integração (RRA) se refere à medida que revela a diferença espacial de proximidade dos lugares, ou seja, aquela relativa ao movimento “de-para”, Escolha (Choice) trata da centralidade dos componentes do sistema, revelando uma hierarquia relativa ao movimento “através”.

Nenhuma delas pode ser considerada mais ou menos adequada que a outra em "prever" fluxos de pedestres (HILLIER; IIDA, 2005), portanto não há critérios consensuados sobre qual

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combinação utilizar. Mais detalhes sobre as reflexões em torno dessas alternativas podem ser obtidos em Netto et al (2012).

Estudo de caso 1: Rio de Janeiro - RJ

O primeiro estudo de caso foi realizado no Rio de Janeiro e seus resultados preliminares estão relatados em Netto et al (2012). Lá, a alternativa adotada para representar a acessibilidade proporcionada pela malha foi a combinação linhas axiais + medida de Integração + raio global (representado pela medida radius-radius - ver Hillier, 2007, p. 120-121). A seguir serão descritas as alternativas adotadas em Florianópolis e Porto Alegre.

Estudo de caso 2: Florianópolis - SC (porção insular)

Uma preocupação recorrente entre os pesquisadores envolvidos neste projeto de pesquisa foi, desde o princípio, a possibilidade de confrontar os resultados entre as cidades e, na medida do possível, realizar comparações diretas. Para isso, um dos objetivos foi o de padronizar, tanto quanto possível, os procedimentos. Entretanto, a alternativa adotada no primeiro estudo de caso para representar a acessibilidade da malha possuía fortes indícios de ser inapropriada para Florianópolis, pelo fato de agrupar em uma mesma classe vias com papéis extremamente diferentes no que diz respeito aos fluxos de passagem. Isso gerou uma certa desconfiança quanto à combinação e suscitou a realização de um pequeno estudo piloto envolvendo medições de tráfego de veículos disponíveis para Florianópolis e a análise da sua correlação com diversas medidas sintáticas. Ao todo, foram analisados 25 pontos. Os resultados das correlações podem ser vistos na Tabela 1 abaixo.

Tabela 1: correlações estudo empírico - medidas sintáticas e movimento de veículos

Como fica claro, as medidas de Escolha apresentam desempenho visivelmente superior às medidas de integração quando se trata de explicar fluxos de veículos em Florianópolis. Tal resultado é bastante diferente do que a literatura tem mostrado para outros contextos, nos quais as medidas de Integração e Escolha têm dado resultados aproximadamente equivalentes em termos de correlação com movimento de pedestres e veículos (ver, por exemplo, PENN et al, 1998; HILLIER; IIDA, 2005). Em Florianópolis, essas medidas possuem correlação

praticamente nula entre si (r2=0,05 entre Integração RR e Escolha RR), o que provavelmente pode ser explicado pelo fato de a cidade possuir uma malha caracterizada por fortes

descontinuidades (com consequente concentração de fluxos de passagem em algumas poucas vias) e núcleos históricos espalhados por um território pontuado por morros e lagoas.

Entretanto, um aprofundamento dessa explicação foge aos objetivos deste trabalho; basta-nos considerar que a medida de Escolha com raio 55 foi a que obteve maior correlação com o movimento de veículos com alto nível de significância e, portanto, foi a medida adotada neste estudo para definir as faixas de acessibilidade promovidas pela configuração do sistema viário1. Por fim, os valores de Escolha R55 foram divididos em 20 faixas, por Natural Breaks, e as faixas 4 (baixa acessibilidade), 11 (média acessibilidade) e 16 (alta acessibilidade) foram selecionadas

Escolha Escolha R55 Integ. N Integ. R3 Integ. R55 Correlações com fluxo de

automóveis (r2) 0,46 0,56 0,01 0,18 0,02

P-values p < 0,001

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para compor a amostra. Além disso, com vistas a proporcionar maior representatividade, outro componente das “temporalidades” urbanas foi acrescentado como fator ao desenho

experimental: as três classes de acessibilidade foram ainda subdivididas em três classes de densidade populacional (conforme censo populacional do IBGE 2010), resultando em nove grupos (ou “setups”) representando as possíveis combinações entre as duas variáveis e seus níveis.

É certo que poderiam ser controlados mais fatores, configurando um experimento rigorosamente planejado em busca da ortogonalidade dos dados. Outros aspectos que diferenciam o espaço da cidade e podem enviesar os dados para além da acessibilidade e da densidade (padrões de renda, idade do assentamento, etc.) poderiam ser incluídos como variáveis de processo. Também fatores de sazonalidade temporal e de variação climática poderiam entrar no planejamento do experimento, como exemplificado em um trabalho recente de Fernandes e Miranda-Moreno (TRB 2011).

De qualquer maneira, em cada um dos nove "setups" foram sorteados de 13 a 35trechos, de acordo com a disponibilidade e viabilidade do levantamento por questões operacionais (Figura 2).

Figura 2: a) Faixas de acessibilidade proporcionada pelo sistema viário, representada pela medida de Escolha (Raio 55), com faixas 4, 11 e 16 destacadas; b) Pontos sorteados para a amostra.

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Estudo de Caso 3: Porto Alegre – RS

Para a cidade de Porto Alegre, uma variação na metodologia de seleção de áreas de estudo foi levada a cabo, sem, no entanto, violar as premissas fundamentais do desenho experimental: garantir que haja segmentos em quantidade estatisticamente representativa com as nove combinações entre os três níveis de acessibilidade e densidade (alto, baixo e médio).

O foco foi a busca por espaços significativos do ponto de vista da hipótese central da pesquisa, ou seja, lugares da cidade com morfologia construída claramente identificada com os tipos catalogados, em articulação com os demais padrões urbanos (acessibilidade, usos e

movimento) em condição de variabilidade que permita seu “isolamento” em relação a eles. Também um fator até então tratado como “ruído” foi incluído neste estudo – os chamados “atratores”, aqui restritos a estações de transporte. Estes são elementos sabidamente deformadores dos padrões de movimento, aceitemos ou não a hipótese “multiplicadora” (HILLIER et al, 1993) de que sua implantação é fruto de uma demanda que, na raiz, é consequência do efeito da acessibilidade viária disparadora dos processos convergentes de adensamento e alocação das atividades residenciais, dos empregos e demais facilities que implicam transporte coletivo.

Neste sentido, exploraramos um pouco mais a noção de acessibilidade. Este conceito é

bastante amplo e, obviamente, não se restringe às medidas sintáticas/topológicas. A hierarquia viária, a distância do centro ou dos centros, a presença de oportunidades em determinada área, a oferta e as características do transporte e os próprios tempos de viagem são alguns indicadores deste importante índice (BHAT et al, 2000). Neste caso, fixamos duas dessas

dimensões: a presença de paradas de ônibus (cujas características serão apresentadas adiante) e o padrão de acessibilidade topológica representado pela medida de Integração RR.

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Esta medida apresenta um histograma com dois picos e um “vale”, apresentando-se espacialmente de forma claramente concêntrica, em anéis, como normalmente ocorre em função do “efeito borda” típico do cálculo básico da relativa assimetria. Existem em Porto Alegre grandes áreas com valores de Integração R55 média e alta, ou seja, a malha já está fortemente entramada no miolo urbanizado da cidade (o centro “geométrico”, não correspondente ao centro histórico, localizado a oeste, na ponta da península), deixando algumas poucas franjas periféricas segregadas (Figura 3). Essas faixas de baixa integração formam “halos” parciais, enquanto as altas conseguem dar a volta no core de integração, em um fenômeno claramente correspondente com o sistema geomorfológico da cidade.

Porto Alegre é uma cidade com densidades baixas predominando em quantidade, ou seja, é uma cidade “nova”, com as densidades mais altas concentradas apenas no centro histórico e no chamado “centro expandido”, com alguns outros hotspots que, em escala microscópica, correspondem a conjuntos residenciais bastante concentrados ou aglomerados subnormais. Uma checagem preliminar do “grau de convergência” entre os padrões Acessibilidade (dada pela Integração RR) e Densidade foi buscada através da correlação simples entre as variáveis, cujo R2 resultante foi de 0,2382, com significância a 95%.

Figura 4: Distribuição da densidade populacional em Porto Alegre - RS

A estratégia para a estratificação das densidades foi, portanto, diferenciada, tendo em vista a dificuldade em trabalhar com áreas com valores efetivamente baixos em uma escala absoluta, comparável a padrões gerais de cidades ou standards da teoria, da literatura ou da prática da

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produção urbana (dada a inconsistência de suas tramas viárias, morfologia construída e sistemas de atividade, relegados a periferias residenciais, áreas industriais ou semi-rurais). Ela baseou-se em um método que considera a média geral da cidade como valor central e trata as faixas “alta” e “baixa” a partir do número de desvios-padrão acima e abaixo deste centro. Portanto, tendo a média da cidade como 160hab/hA, a área tratada como “média” é igual a este valor, a área “alta” apresenta densidades com 0,25 a 0,75 desvios-padrão a mais e a área “baixa” 0,25 a 0,75 desvios-padrão a menos (Figura 4).

Dentro de cada entorno (considerado como um raio de 550 metros a partir de uma estação de transporte selecionada) existem trechos viários representativos de todas as 20 faixas

determinadas como intervalo de estratificação da medida de Escolha R24, levando às nove combinações de densidade e acessibilidade preconizadas pelo desenho experimental, conforme a Tabela 2 e as imagens abaixo:

Tabela 2: Síntese das características dos pontos de interesse.

Figura 5: Entorno da Região “José do Patrocínio”

JOSÉ DO PATROCÍNIO AMERICANO BENJAMIN

Valor de Integração 0,749002 0,774008 0,780418

Faixa de Integração Alta Alta Alta

Valor de Densidade 280,94 hab/hA 161,33 hab/hA 120,04 hab/hA

Faixa de Densidade Alta Média Baixa

Linhas axiais 45 45 36

Linhas Choice24 faixa BAIXA 8 7 4

Linhas Choice24 faixa MÉDIA 18 23 20

Linhas Choice24 faixa ALTA 10 13 9

Trechos de rua 95 116 116

Nomes de rua 35 37 29

Links de rede 190 232 232

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Esta medida - Escolha com raio médio da cidade – traz, à semelhança com Florianópolis, bastante similitude com a estrutura viária funcional, apontando para uma forte correlação entre as vias mais bem ranqueadas e aquelas pertencentes ao sistema arterial e/ou com maior fluxo de veículos. Este dado precisa de checagem, por meio de contagens volumétricas que não são públicas e disponíveis como na capital catarinense.

Uma análise apurada de cada uma das áreas indica aspectos relevantes de suas constituições, padrões e temporalidades. A região “José do Patrocínio” é parte do bairro Cidade Baixa, próximo ao Centro Histórico, bastante antigo e consolidado do ponto de vista dos estoques construídos (Figura 5). A convergência entre os padrões precisa ser checada, pois a hierarquia de acessibilidade está bastante presente mas o espalhamento das atividades comerciais (ao menos nos térreos) é quase total. Isso leva à necessidade de análise mais acurada do ponto de vista das escalas configuracionais. Essa área tem predominância de tipos “B” (contínuo e permeável) e pequenos focos de renovação tipológica, seguindo o padrão inexorável do mercado imobiliário, o tipo “A” (isolado e impermeável).

A área do entorno do Colégio Americano estrutura-se a partir do eixo da Avenida Protásio Alves, continuação da Avenida Osvaldo Aranha, importante eixo radial de penetração no centro histórico. Apresenta clareza em sua hierarquia, e bastante mistura tipológica. Está em processo de consolidação do novo padrão, com presença expressiva de novos edifícios (erguidos a partir do Plano Diretor do ano 2000).

Figura 6: Entorno da Região “Americana”

Por fim, a área da Av. Benjamin Constant tem em seu centro um eixo estrutural – uma radial com intenso movimento veicular e usos comerciais – e tecidos diversos nos lados leste e oeste. O casco construído no primeiro setor é predominantemente residencial, enquanto o segundo apresenta um antigo sistema fabril atualmente estagnado. É uma área que “aguarda” a conclusão de um conjunto de investimentos públicos – macrodrenagem e linha 2 do metrô, especialmente - para realizar todo o seu potencial de valorização imobiliária, tendo em vista sua proximidade do centro e de áreas nobres e sua excelente localização às margens do Rio Guaíba.

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Figura 7: Entorno da Região “Benjamin”

Portanto, temos áreas em três estágios do ponto de vista da disseminação dos “produtos industrializados” do mercado imobiliário, mesclados a diferentes tipos “tradicionais” mais ou menos representativos dos esquemas contínuos e permeáveis de construir.

RESULTADOS PRELIMINARES E DISCUSSÃO

No estágio em que a pesquisa se encontra, apenas os resultados preliminares de Florianópolis estão disponíveis. Eles serão apresentados a seguir.

Florianópolis

Os resultados alcançados até o momento envolvem os resultados do levantamento de 82 trechos de logradouros (Tabela 3), de um total previsto de aproximadamente 200 trechos. Por conta disso, algumas medidas não possuem significância estatística, conforme será comentado mais adiante. Entretanto, algumas correlações já possuem significância ao nível de 95% ou até mais alto, especialmente para a faixa 16.

Tabela 3: Quantidades preliminares da amostra levantadas até o momento. Total por faixa aces. BD MD AD Faixa 4 32 6 17 9 Faixa 11 17 5 4 8 Faixa 16 33 11 6 16 Total por Densidade 82 22 27 33

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Para efeito de simplificação, os resultados a serem apresentados e discutidos serão restritos à variável “Movimento de Pedestres”, considerado o principal componente do conceito de Vitalidade.

Como primeira aproximação à discussão dos resultados, vejamos os histogramas de

movimento de pedestres (Figura 8). O histograma para todas as faixas (Figura 8a) mostra que a distribuição é distorcida na direção dos menores valores, com pouca quantidade de valores altos. Esse padrão mantém-se nas faixas 4 e 11 (Figura 8b e c), sendo que na faixa 16 (Figura 8d) a distribuição manteve-se mais próxima de uma curva normal, com uma distribuição menos distorcida que as demais. Isso indica que a estratégia de dividir a acessibilidade por faixas foi relativamente bem-sucedida para a faixa 16, conseguindo “captar” uma variação relativamente bem distribuída dentro da faixa.

Figura 8: Histogramas Movimento de pedestres para a) todas as faixas de acessibilidade; b) faixa 4; c) faixa 11; d) faixa 16.

As correlações entre Movimento de Pedestres e as medidas configuracionais estão apresentadas na Tabela 4 abaixo.

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Tabela 4: Correlações entre Movimento de pedestres e variáveis configuracionais

Nessa tabela, os valores de correlação negativos estão destacados em vermelho, na primeira linha de cada faixa; os valores mais altos de correlação (r2) estão destacados em cores mais quentes, na segunda linha; e os p-values estão apontados na terceira linha, sendo que aqueles que não atendem ao nível de 95% de significância estatística (ou seja, p>0,05) estão destacados em vermelho.

Chamam a atenção:

 A baixíssima correlação das medidas de integração com o movimento de pedestres. Apesar de Integração R55 e R3 não apresentarem resultados significativos, a Integração Rn apresenta correlações negativas para as faixas 4 e 11, ambas com alto nível de significância (p < 0,05). Tal resultado é de difícil explicação uma vez que em toda a literatura integração e movimento de pedestres apresentam correlação positiva; portanto, essa relação contraintuitiva merece ser melhor estudada. De qualquer forma, é um indício a mais a corroborar a escolha feita pela medida da Escolha para definir as faixas de acessibilidade.

 As médias-altas correlações de Escolha com raio global, todas com bons níveis de significância estatística. Especialmente a faixa 11, que apresenta r2=0,46. Esperava-se que as correlações do movimento de pedestres com as medidas de Escolha fossem menores que com a Integração, já que a Escolha deve manter-se mais constante dentro de cada faixa. Tal resultado certamente está relacionado à atuação da acessibilidade da malha em vários níveis, ou raios, conforme comentado anteriormente. Da mesma maneira, tal resultado reforça a escolha da medida na metodologia.

Com relação às correlações entre movimento de pedestres e variáveis tipológicas, os resultados estão descritos na Tabela 5 e na Figura 8 abaixo.

Int. Rn Int R55 Int. R3 Esc. Esc. R3 Esc. R55

Faixa Mov. Ped. - r -0,55 -0,26 -0,17 0,42 0,06 -0,18 Mov. Ped. - r2 0,30 0,07 0,03 0,18 0,00 0,03 p-value 0,0011 0,1470 0,3850 0,0160 0,7600 0,3290 Faixa Mov. Ped. - r -0,55 -0,26 -0,35 0,68 -0,14 0,37 Mov. Ped. - r2 0,31 0,07 0,12 0,46 0,02 0,13 p-value 0,0220 0,3000 0,1700 0,0030 0,5990 0,1490 Faixa Mov. Ped. - r 0,20 0,27 0,31 -0,55 0,37 -0,58 Mov. Ped. - r2 0,04 0,07 0,10 0,31 0,14 0,34 p-value 0,2568 0,1340 0,0810 <0,001 0,0330 0,0004

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Tabela 5: Correlações entre Movimento de pedestres e variáveis tipológicas

Figura 9: Gráficos de dispersão para a Faixa 16 (notar que o último gráfico não possui significância estatística).

Fica claro que o caráter preliminar dos resultados, especialmente o pequeno número de trechos da amostra já levantados, conferidos e sistematizados, prejudica o nível de significância estatística da maioria das correlações analisadas. Entretanto, a tabela sugere uma importante diferença no comportamento das variáveis em cada faixa, com níveis de correlação que são diferentes em cada uma delas.

Chamam a atenção, especialmente:

Núm. Pavtos

Dens.

Portas Dens. Jan. Perm. Tot. Front.Afast. Cont. fach. Const.Dens. Dens. Pop. UsosDiv.

Faixa Mov. Ped. - r 0,06 0,24 0,16 0,19 0,32 0,23 -0,05 0,03 0,54 Mov. Ped. - r2 0,00 0,06 0,03 0,04 0,10 0,05 0,00 0,00 0,29 p-value0,7330 0,1790 0,3867 0,2920 0,0750 0,2160 0,7860 0,8627 0,0013 Faixa Mov. Ped. - r 0,26 -0,12 0,19 0,17 0,60 -0,42 -0,21 0,29 0,39 Mov. Ped. - r2 0,07 0,01 0,04 0,03 0,36 0,17 0,04 0,08 0,15 p-value0,3070 0,5960 0,4710 0,5040 0,0100 0,0870 0,4180 0,2590 0,1190 Faixa Mov. Ped. - r -0,22 0,40 0,03 0,13 -0,06 0,22 -0,12 0,79 0,55 Mov. Ped. - r2 0,05 0,16 0,00 0,02 0,00 0,05 0,02 0,62 0,30 p-value0,2110 0,0230 0,7654 0,4820 0,7390 0,2180 0,4840 <0,001 0,0004

11

4

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 A relativamente alta correlação entre afastamentos frontais e movimento de pedestres na faixa 11. Apesar desta faixa ser a mais prejudicada em termos da relação entre trechos levantados e total de trechos na faixa, este resultado apresentou significância estatística. Entretanto, deve ser notado que a correlação acontece no sentido inverso do previsto na hipótese: em Florianópolis, maiores afastamentos frontais

correspondem a maiores fluxos de pedestres.

 A importância da densidade populacional como variável explicativa dos movimentos de pedestres. Tal relação não é surpresa: a tendência é que áreas mais densas “injetem” mais pessoas no espaço público. Por outro lado, vários estudos sintáticos minimizam sua importância na relação com padrões de fluxos (ver, por exemplo, HILLIER et al, 1993; PENN et al, 1998). No gráfico da Figura 9a é possível ver claramente os dois “patamares” de densidade (sua variação não acontece numa escala tão desagregada quanto os trechos) e o aumento correspondente dos valores de movimento de pedestres.

 A importância da diversidade de usos, com correlações médias tanto na faixa 4 quanto na faixa 16 (Figura 9b). Aparentemente, Jacobs (2000) estava correta ao defender diversidade de usos como uma componente importante da vitalidade urbana. É preciso cautela, entretanto, para analisar a relação de usos e fluxos de pedestres, uma vez que são variáveis com fortes relações de influência nos dois sentidos (pedestres atraem comércio, que por sua vez atraem mais pedestres – ver HILLIER et al, 1993). Portanto, não é possível afirmar com segurança que diversidade de usos é a variável

independente e movimento de pedestres é a variável dependente.

CONCLUSÕES

Este trabalho procurou mostrar uma nova abordagem que vem sendo aplicada por um grupo de pesquisadores para estudar as relações entre tipologias edilícias e vitalidade urbana. Acreditamos que essas relações ainda não estão adequadamente entendidas, uma vez que as teorias construídas sobre o tema não foram postas à prova de forma sistemática e rigorosa sob o ponto de vista empírico. A metodologia proposta busca superar essas limitações e, através, de um método simples, sugere uma maneira de isolar as variáveis de interesse.

Apesar de os resultados serem ainda muito preliminares, eles abrem uma linha de investigação para problematizar as relações entre essas variáveis de uma forma que parece especialmente promissora: ao invés de assumir que a) sempre há convergência entre esses padrões; e b) essa convergência funciona de maneira semelhante quaisquer que sejam as intensidades das variáveis, os resultados sugerem que há mais sutilezas e complexidade nessas relações do que se supunha inicialmente.

Uma análise mais cuidadosa dessas relações mostra que, efetivamente, não há razão para assumirmos que as variáveis se relacionam de maneira semelhante em todos níveis de intensidade, como é o caso, por exemplo, das faixas de densidade. É perfeitamente plausível imaginar que a relação da vitalidade com a tipologia funciona de maneira diferente em áreas de baixa acessibilidade e em áreas de alta acessibilidade. Nesta última, por exemplo, é possível que a alta acessibilidade torne quase irrelevante a influência da permeabilidade dos edifícios na quantidade de pessoas passando pela rua, enquanto que em uma faixa de menor

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Nesse sentido, nossas hipóteses iniciais poderiam ser desdobradas para endereçar questões com maior nível de complexidade, tais como a exemplificada acima. Cada faixa de

acessibilidade poderia ter suas próprias hipóteses para explicar as relações entre tipologia e vitalidade. Isso deverá estar contemplado na continuidade da pesquisa, que também deverá buscar melhorar os níveis de significância das correlações encontradas através da

complementação da amostra. Também devem estar incluídos na continuidade da pesquisa:

 Identificar os principais outliers das correlações e aprofundar sua análise;

 Entender a relação dos afastamentos frontais com o movimento de pedestres, cujos resultados preliminares apontam o inverso do previsto na hipótese;

 Investigar a correlação negativa entre Integração e Movimento de Pedestres, caso ela se mantenha após a complementação da amostra;

 Aprofundar a comparação entre os resultados obtidos nas três cidades estudadas, verificando quais relações parecem ser mais gerais, e quais são mais restritas a casos específicos.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao alunos e professores da graduação e pós-graduação envolvidos no levantamento de campo em Florianópolis: Alina Santiago, Ana Paula Fogaça, Beatriz Menegon, Camila Zabot, Débora Bohrer, Eduarda Garcia, Gabriel Pedrotti, Larissa Souza, Lucas Souza, Marcelo Monteiro, Márcia Escoterganha, Mariana Vivan, Nathália Braga, Renato Niero, Vanessa Casarin e Virgínia de Luca. Agradecemos também ao CNPq (Edital Ciência Sociais), pelo auxílio financeiro que viabilizou a execução deste trabalho.

REFERÊNCIAS

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1 Não há, obviamente, nenhuma garantia de que o movimento de pedestres tenha o mesmo comportamento que o

movimento de veículos. Entretanto, a literatura tem mostrado que este é o caso e, por esse motivo, o estudo piloto foi considerado a maneira mais confiável de estabelecer, previamente, qual medida deveria ser adotada para tentar neutralizar a acessibilidade gerada pela grelha.

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