• Nenhum resultado encontrado

O dever de fundamentação das decisões judiciais e o Código de Processo Civil de 2015

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O dever de fundamentação das decisões judiciais e o Código de Processo Civil de 2015"

Copied!
47
0
0

Texto

(1)

GRANDE DO SUL

FABIANO SOARES DE SOUZA

O DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015

Santa Rosa (RS) 2017

(2)

FABIANO SOARES DE SOUZA

O DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso - TCC. UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: MSc. Francieli Formentini

Santa Rosa (RS) 2017

(3)

Dedico este trabalho à minha querida família pela mercê de seu apoio e confiança que me sustentaram por todo meu caminho.

(4)

AGRADECIMENTOS

À minha família, motivo primordial de meus esforços, fonte de incentivo e disposição para ombrear as batalhas da vida, entendedores da necessidade dos sacrifícios ora transpostos, principalmente no que diz respeito ao necessário dispêndio de tempo aos estudos, que resultou em indesejada e lastimosa redução no tempo de convívio familiar.

À minha orientadora Francieli Formentini, com quem tive o privilégio de conviver durante esta passagem pela academia, contando sempre com sua dedicação, disponibilidade, e me permito dizer, sua amizade, da qual pude e posso me orgulhar de ter sido merecedor.

(5)

“Nada é impossível de mudar. Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar.”

(6)

RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma abordagem histórica sobre a origem do dever de fundamentação das decisões judiciais, principalmente no Brasil, referindo de que forma o instituto foi implantado no ordenamento jurídico pátrio. Aborda inicialmente de que forma as Ordenações emanadas de Portugal tiveram sua vigência estendida à colônia. Na sequência relata de que forma o instituto se desenvolveu, desde a Constituição Imperial de 1824, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, que elevou a fundamentação das decisões judiciais à categoria dos deveres processuais constitucionalmente previstos. Faz também referência à paulatina evolução da abordagem do instituto na legislação infraconstitucional, com ênfase nos Códigos de Processo Civil sucessivamente editados nos anos de 1939 e 1973, atendo-se especificamente ao Novo Código de Processo Civil, promulgado por meio da Lei 13.105, de 16 de março de 2015, com vigência a partir de 15 de março de 2016. Estuda de que forma as alterações legislativas referentes ao dever de fundamentação trazidas pelo novo diploma legal estão sendo implementadas na prática judiciária, bem como, analisa as resistências observadas quanto a adoção do instituto pelos operadores do Direito no ordenamento jurídico pátrio. Finaliza concluindo pela dificuldade de superação dos óbices encontrados no sentido de adesão dos operadores do Direito às inovações legais.

Palavras-Chave: Fundamentação. Decisões Judiciais. Novo Código de Processo Civil. Estado Democrático de Direito.

(7)

ABSTRACT

The present end-of-graduation-course paper makes a historical approach on the origin of the duty to justify judicial decisions, especially in Brazil, referring to how the institute was implemented in the legal order of the country. It deals initially with the way in which the ordinances emanating from Portugal were extended to the colony. In the sequence it reports how the institute developed, from the Imperial Constitution of 1824, until the promulgation of the Federal Constitution of 1988, which raised the foundation of judicial decisions to the category of procedural duties constitutionally foreseen. It also refers to the gradual evolution of the institute's approach to infra-constitutional legislation, with emphasis on the Civil Procedure Codes successively published in the years 1939 and 1973, specifically referring to the New Code of Civil Procedure enacted through the Law 13,105 of 16 March 15, 2016. It studies how the legislative changes regarding the duty of justification brought by the new legal decree are being implemented in judicial practice, as well as, it analyzes the resistance observed regarding the adoption of the institute by legal operators in the country's legal order. It summarizes by concluding that it is difficult to overcome the obstacles encountered in the sense of adherence of the legal operators to legal innovations.

Keywords: Rationale. Judicial decisions. NCPC. Veredict. Jurisdiction. Contradictory. Democratic state.

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 ASPECTOS HISTÓRICOS DAS REGRAS PROCESSUAIS ... 10

1.1 Aspectos históricos do dever de fundamentação as decisões judiciais ... 11

1.2 Origem do dever de fundamentar as decisões judiciais no Brasil ... 13

1.3 Fundamentação das decisões judiciais: regra ou princípio jurídico? ... 18

1.4 Tipos de fundamentação ... 20

2 A FUNDAMENTAÇÃO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015... 24

2.1. Inovações do Art. 489, § 1º e 2º ... 26

2.2 Requisitos mínimos do dever de fundamentação ... 30

2.3 Como os Tribunais estão decidindo? Impressões iniciais da Prática Judi-ciária a partir do advento do Novo Código de Processo Civil ... 32

CONCLUSÃO ... 40

(9)

INTRODUÇÃO

Este trabalho se refere ao instituto processual conhecido como fundamentação das decisões judiciais, que em razão da divergência doutrinária quanto a nomenclatura mais adequada, será o termo predominantemente adotado no transcurso do presente estudo, não impedindo, entretanto, que o termo “motivação” também seja utilizado quando o autor consultado assim o fizer. Essa perquirição é pertinente em razão da importância do dever de fundamentar, haja visto que inclusive o legislador constituinte optou por expressamente discipliná-lo na Constituição Federal Brasileira.

No entanto, não se limitou o legislador pátrio a conceder dignidade constitucional à presente garantia processual, pois em reiteradas oportunidades tratou do tema na legislação infraconstitucional, mais especificamente nos códigos processuais nacionais, reputando uma ainda mais acentuada importância a partir do advento do Novo Código de Processo Civil, em vigência desde março de 2016.

Este trabalho foi amparado em pesquisa bibliográfica, além de consultas de sítios da rede mundial de computadores, bem como, à jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul visando reunir subsídios que possibilitem esclarecer a origem, a finalidade e a necessidade da observância do instituto, bem como de que maneira se pode observar sua aplicabilidade a partir da publicação da Lei 13.105/15.

No primeiro capítulo, por ocasião da abordagem inicial, foi realizado o estudo da origem histórica do dever de fundamentação, com ênfase já no período moderno,

(10)

pois de outra maneira a delimitação temporal do estudo ficaria por demais extensa. Desta maneira, o estudo, do ponto de vista histórico, começa a partir do tempo do Brasil Colônia, onde as Ordenações dos reis portugueses estendiam sua vigência também para as terras submissas ao trono lusitano, o que se manteve mesmo algum tempo após a Declaração da Independência, pois mesmo com desvinculação política da metrópole, não foi de imediato que o novo Estado pode dispor de ordenamento jurídico próprio. Prossegue abordando as modificações ocorridas por ocasião da edição dos primeiros diplomas legais destinados a disciplinar o processo judiciário no Brasil, mais especificamente os Códigos de Processo Civil editados nos anos de 1939 e 1973, até chegar à promulgação da Constituição Federal de 1988, onde o dever de motivar foi expressamente guindado ao status de mandamento constitucional.

No segundo capítulo, ao tratar de forma mais pormenorizada acerca das inovações trazidas pela Lei 13.105/15 de 16 de março de 2015, que deu vigência ao Novo Código de Processo Civil, é feita uma análise, primeiramente das exigências que o novo diploma implementou para que uma decisão judicial seja considerada fundamentada, e na sequência, são questionados, ainda que de modo incipiente, devido ao pouco tempo de vigência das modificações, alguns resultados práticos identificados na fundamentação das decisões emanadas pelo Poder Judiciário, especificamente no que concerne ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Em decorrência deste estudo é ratificada a importância do dever de fundamentar adequadamente as decisões judiciais até mesmo como garantia processual elementar do Estado de Direito, com a finalidade de evitar decisões arbitrárias que, por conseguinte, não são capazes de garantir um dos principais objetivos da jurisdição que é a pacificação social decorrente da aquiescência dos jurisdicionados por acreditarem que as demandas levadas à apreciação judicial foram corretamente analisadas e que a decisão final foi a mais justa possível.

(11)

1. ASPECTOS HISTÓRICOS DAS REGRAS PROCESSUAIS

As constantes, e cada vez mais aceleradas, mutações na forma como se desenvolvem as relações sociais na atual sociedade globalizada levam ao aumento dos conflitos originados destas novas possibilidades de interação entre os indivíduos de cada espaço social. Este espaço de interação, cada vez mais amplo, demanda a intervenção do poder estatal, em maior ou menor escala, conforme a opção de cada Estado soberano, de forma a apaziguar os conflitos trazidos à sua apreciação, sempre em busca da pacificação social.

Conforme Dinamarco (2009, p. 131), simplesmente ignorar estas insatisfações pessoais decorrentes de pretensões resistidas importaria em possibilitar explosões de violência e inevitável contaminação do grupo social. Neste sentido, mesmo que a satisfação integral de um dos sujeitos em conflito implique em descontentamento do outro, a experiência demonstra que a parte vencida tende a sofrer menos com a solução desfavorável do conflito, do que com a indefinição da situação litigiosa.

De maneira geral, sob a égide do Estado Democrático de Direito, cabe ao Poder Judiciário este dever/poder de estabelecer a decisão final acerca do conflito trazido à sua apreciação por aquele que julgar violada sua esfera de direitos, seja no âmbito patrimonial, obrigacional, trabalhista, entre outros.

Porém, o exercício do poder jurisdicional não pode ser levado a termo de forma absoluta, sem sofrer qualquer tipo de controle. É devida, portanto, a submissão ao ordenamento jurídico em geral, mas principalmente à Lei Maior, de maneira a limitar e disciplinar os poderes de quem julga, de maneira a evitar eventuais decisões arbitrárias, que ao reverso da pacificação tão desejada, ensejariam justamente o contrário, ou seja, uma maior inquietação social.

(12)

1.1 Aspectos históricos do dever de fundamentação das decisões judiciais

Em decorrência, do acima exposto, se verifica a existência de vários instrumentos normativos aptos a possibilitar o efetivo controle, interno ou externo, da atividade jurisdicional. Dentre eles, segundo Bueno (2012, p. 169), a publicidade dos atos processuais e a motivação das decisões judiciais guardam íntima relação, sendo aqueles que resguardam ao público em geral, mais diretamente às partes, a garantia de que as decisões tomadas no âmbito do processo obedeceram estritamente aos critérios legalmente estabelecidos.

De fato, é inquestionável que as partes, destinatárias diretas do provimento jurisdicional, quando participam ativamente no trâmite do processo, a rigor, conformam-se com a decisão judicial devidamente fundamentada, independentemente de o resultado ser-lhes ou não favorável. (Cordeiro e Gomes, 2016, p.3).

Nesse sentido, é inquestionável a inadmissibilidade do provimento jurisdicional desprovido de fundamentação. Todavia, a decisão deve ter certo nível de objetividade, de forma a transmitir a ideia de que se tornou justificável dentro da lógica do sistema. Logo, o dever de motivação implica no dever de mostrar as razões que permitem justificar a decisão em termos jurídicos, ou seja, no dever de argumentar.

Ocorre que a fundamentação das decisões judiciais nem sempre gozou deste caráter de imprescindibilidade. Neste sentido,segundo Freitas (2010, p. 363):

A origem do dever de motivação das decisões judiciais remonta à segunda metade do século XVIII, quando o surgimento dos pensamentos revolucionários iluministas tomou conta do continente europeu. Desde então, diversos países passaram a incorporar em seus ordenamentos o dever expresso de motivação das decisões judiciais. Em um primeiro momento, a ideia expressava uma solução puramente técnica de controle das decisões judiciais, quando então era possível verificar o raciocínio lógico da decisão do magistrado, para melhor fundamentar a impugnação da decisão proferida. O caráter público empregado ao processo, fez com que o cidadão

(13)

tivesse acesso ao julgamento das controvérsias, no sentido de fiscalizar a legalidade da sentença proferida, através de uma participação democrática no controle externo das decisões judiciais.

Nesta mesma senda, é importante ressaltar que o autor fala da origem do dever de motivar no Estado como conhecemos hoje, notadamente nas cercanias históricas dos momentos antecedentes à Revolução Francesa, que, como sabido, influenciou sobremaneira as modificações na organização administrativa de grande parte das nações do Ocidente. De outra forma, até mesmo nos governos autoritários anteriores ao surgimento do Estado Moderno, o dever de motivar já era expressamente referido. No entanto, em geral, este dever geralmente deixava de vincular o soberano monárquico, mister de sua pretensa infalibilidade e incorruptibilidade.

Assim, é possível dizer que somente com a afirmação do Estado Moderno é que o dever de motivar as decisões judiciais se desenvolveu, até mesmo como princípio basilar de observância das garantias que as novas formas de governo tinham como bandeira.

Nesse sentido, De Lucca (2016, p. 91) ressalta que:

Após a Revolução Francesa, a função de controle da atividade judicial foi potencializada à luz da concepção liberal que permeou aquele momento histórico. Os juízes, ao exercerem um poder decorrente do próprio povo e aplicar um direito produzido pelo povo e para o povo, deveriam dar uma satisfação de sua atividade pela exposição das razões que os levaram a decidir de determinada maneira.

Portanto, a consolidação da fundamentação das decisões judiciais, se confunde com a própria afirmação do Estado de Direito.

(14)

1.2. Origem do dever de fundamentar as decisões judiciais no Brasil

Na intenção de identificar a origem deste instituto no ordenamento pátrio, retrocedemos ao período colonial onde a Ordenações vigentes em Portugal cumpriam o papel de legislar também para as colônias d’além-mar.

Assim, desde as Ordenações Manuelinas (1521), cuja terminologia, nos dias atuais, soa por demais pitoresca para transcrever, já era estabelecida a obrigatoriedade da motivação das decisões judiciais, estabelecendo, porém, que, mister de sua infalibilidade, ao príncipe era reservada a prerrogativa de julgar conforme suas convicções pessoais, descurando inclusive das alegações e provas em contrário feitas pelas partes.

Já nas Ordenações Filipinas (1603, p. 667), o regramento da matéria é praticamente repetido na íntegra, modificando-se apenas a forma da linguagem, bem mais próxima dos dias atuais, possibilitando assim a transcrição:

Todo Julgador, quando o feito for concluso sobre a definitiva, verá e examinará com boa diligência todo o processo, assi o libello, como a contestação, artigos, depoimentos, a elles feitos, inquirições, e as razões allegadas de huma e outra parte; e assi dê a sentença difinitiva, segundo o que achar allegado e provado de huma parte e da outra, ainda que lhe a consciência dicte outra cousa, e elle saiba a verdade ser em contrario do que no feito fôr provado; porque sómente porque somente ao Priucípe que não reconhece Superior, he outorgado per Direito, que julgue segundo sua consciência, não curando de allegações ou provas em contrario, feitas pelas partes, por quanto he sobre a lei, e o Direito não presume, que se haja de corromper por affeição [sic].

Claro está que neste período histórico a vontade do soberano subjugava o Direito, pois o príncipe, como já dito, era considerado infalível e incorruptível, sendo a exposição dos motivos das decisões obrigatoriamente observada pelo demais julgadores.

É importante ressaltar que neste período histórico, também Portugal adotava procedimentos judiciais peculiares à época, ou seja o período em que o absolutismo

(15)

se afirmava na Europa em decorrência da recente, e nem sempre linear, superação dos costumes e práticas da Idade Média, justificando assim a não vinculação do soberano às obrigações que obrigavam os demais cidadãos, inclusive quanto a aplicação da justiça.

E assim com a Declaração da Independência e o consequente desligamento administrativo da colônia em relação à Portugal, foi outorgada, em 25 de março de 1824 a primeira Constituição Brasileira. Este documento, apesar de não prever expressamente a obrigatoriedade de aplicação do princípio em comento, ocasionou a publicação, em 31 de março do mesmo ano, de portaria relativa ao assunto, conforme segue:

N. 78. – JUSTIÇA.- Em 31 de MARÇO de 1824

Determina que os Juizes fundamentem as sentenças que proferirem

Desejando S. M. o Imperador que os subditos deste Imperio comecem desde já a gozar de todas as vantagens prometidas na sabia Constituição, ha pouco jurada, e sendo uma das principaes a extirpação dos abusos inveterados no fôro, cuja marcha deve ser precisa, clara e palpavel a todos os litigantes: Manda o mesmo A. S., pela Secretaria de Estado dos Negocios da Justiça, que os Juizes de mór alçada, de qualquer qualidade, natureza e graduação, declarem nas sentenças, que proferirem, circunstanciada e especificadamente, as razões, e fundamentos da mesmas, e ainda nos aggravos chamados de petição, não só por ser isto, expressamente determinado no § 7º da Ord. do Liv. 3º, Tit. 66, como por ser conforme ao liberal systema ora abraçado; afim de conhecerem as partes as razões, em que fundaram os julgadores as suas decisões; alcançando por este modo ou o seu socego, ou novas bases para ulteriores recursos, a que se acreditarem com direito. E assim o Manda, pela referida Secretaria de Estado, participar ao Conde Regedor da Casa da Supplicação, ou quem seu cargo servir, para que expeça a esse respeito as convenientes ordens.

Palacio do Rio de Janeiro em 31 de Março de 1824. – Clemente

Ferreira França. (BRASIL, 1824, p.57).

Este documento ainda fazia referência às Ordenações Filipinas, sendo, portanto, moldado pelas regras lusitanas, mas demonstrava a preocupação em evitar abusos praticados pelos magistrados e implementar as garantias consagradas pelo sistema liberal que, em tese, havia sido adotado no Brasil.

(16)

Neste ponto, é pertinente destacar que já estavam se disseminando também fora da Europa, as concepções decorrentes da Revolução Francesa, de maneira que também no Brasil, as preocupações com o arbítrio judicial fossem evidenciadas legalmente.

Conforme Lira (2005, p. 20-21), somente em 1850, com a edição do regulamento 737, é que houve a efetiva desvinculação em relação ao ordenamento lusitano, ao menos no que diz respeito à obrigatoriedade de motivação. Este regulamento tratava especificamente das questões comerciais, sendo estendido às questões cíveis pelo Decreto nº 763 de 1890.

Devido às características do ordenamento jurídico pátrio, especificamente quanto à descentralização da competência legislativa, somente após a Constituição de 1937, que determinou o restabelecimento da unidade legislativa em matéria processual, é que foi possível o advento do Código de Processo Civil de 1939, onde o dever de motivar também foi expressamente referido, como transcrito abaixo:

Art. 280. A sentença, que deverá ser clara e precisa, conterá: I – o relatório;

II – os fundamentos de fato e de direito; III – a decisão.

Parágrafo único. O relatório mencionará o nome das partes, o pedido, a defesa e o resumo dos respectivos fundamentos.

(BRASIL, 1939).

Na sequência, com a Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973 entrou em vigência novo CPC, que em diversas passagens faz referência à fundamentação das decisões judiciais, in verbis:

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formam o convencimento.

Art. 165. As sentenças e acórdãos serão proferidos com observância do disposto no art. 458; as demais decisões serão fundamentadas, ainda que de modo conciso.

(17)

I – [...]

II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito. (BRASIL, 1973).

Como visto, nos artigos transcritos acima, o dever de motivar ou de fundamentar, é recorrentemente mencionado, sendo mesmo considerado essencial requisito à validade da sentença, podendo ser cumprido de forma sucinta, porém não olvidado, naquelas decisões que não configurassem acórdãos ou sentenças.

Continuando este processo evolutivo, a promulgação da Constituição Federal de 1988 finalmente conferiu caráter constitucional à obrigatoriedade da motivação das decisões judiciais, conforme já referido, cabendo ao constituinte originário a tarefa de evidenciar a necessidade de salvaguardar a observância do princípio da fundamentação, em estreita correlação com o princípio da publicidade dos atos jurisdicionais.

Neste sentido, o trecho a seguir destaca mais uma vez a importância do instituto:

A garantia da proteção judicial efetiva impõe que tais decisões possam ser submetidas a um processo de controle, permitindo, inclusive, a eventual impugnação. Daí a necessidade de que as decisões judiciais sejam devidamente motivadas (CF, art. 93, IX). E motivar significa dar as razões pelas quais determinada decisão a de ser adotada, expor as suas justificações e motivos fático-jurídicos determinantes. A racionalidade e, dessa forma, a legitimidade da decisão perante os jurisdicionados decorrem da adequada fundamentação por meio das razões apropriadas. (MENDES, 2012, p.465).

No entanto, mesmo com as reiteradas manifestações legislativas acerca da imprescindibilidade da observância do instituto em evidência, ocorreram, e ocorrem, vários e variados casos em que a fundamentação das decisões é negligenciada.

(18)

Embora situações peculiares associadas ao excesso de processos possam ensejar práticas contrárias a essa orientação decorrente da Lei Maior, não se afigura compatível com o modelo constitucional o indeferimento de pedidos de liminares de habeas corpus ou mandado de segurança com a simples invocação de seu descabimento.

Porém, diante da busca constante da evolução e modernização do processo civil pátrio, o NCPC, em vigência desde 16 de março de 2016, reforça e especifica a necessidade de fundamentação das decisões judiciais em vários de seus artigos, corroborando de maneira inequívoca a preocupação do legislador em assegurar aos cidadãos esta garantia fundamental do Estado Democrático de Direito.

Dentre eles, o mandamento legal que inovou de maneira mais substancial foi o art. 489, conforme podemos observar a seguir:

Art. 489 - São elementos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja

ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

§ 2o No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e

os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

(19)

§ 3o A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé. (BRASIL, 2015).

Como visto, o legislador ordinário optou por ressaltar de forma mais veemente a importância do princípio da fundamentação, estabelecendo claramente quais os elementos essenciais da sentença, além de declarar as situações em que as decisões judiciais não serão consideradas fundamentadas.

Neste ponto é importante ressaltar que o dever de fundamentar não se restringe apenas às sentenças, como referem Gramstrup e Thamay (2017):

Segundo estabelece o art. 203 do CPC/2015, os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. Tendo presente que, por natureza, esses sãos os atos processuais praticados pelo juiz, deve-se destacar o importante dever de motivação destas decisões, para que a atuação do Poder Judiciário seja efetivamente democrática.

Entretanto, como em casos de mudanças significativas, diga-se de passagem, em qualquer área do convívio social, a resistência ao novo é fato recorrente, cumpre perquirir como se dará a adesão, voluntária ou não, bem como a fiscalização da implementação dos dispositivos legais inovadores referentes a fundamentação das decisões judiciais.

Neste sentido é que a pesquisa em curso buscará identificar quais os resultados práticos da inovação legislativa - se é que se atingirá tal desiderato - bem como, visualizar de que maneira será garantida a fiel observância dos preceitos modificados.

1.3 Fundamentação das decisões judiciais: regra ou princípio jurídico?

Em primeira análise pode parecer irrelevante esta diferenciação quanto à natureza normativa da fundamentação das decisões judiciais. Entretanto, quando se

(20)

leva em conta as consequências da adoção de um ou de outro entendimento se observa que é essencial a definição de qual seja a classe normativa que abarca o instituto.

Cabe, neste sentido, ressaltar que no caso de alocar o dever de fundamentação entre os princípios, apesar do senso comum que estes ostentem um maior “status” do que as regras, estaríamos incorrendo na temeridade de possibilitar situações em que princípios antagônicos necessitariam ser ponderados.

Pode-se exemplificar a questão apresentando o caso de uma demanda por demais complexa, que obviamente ocasionaria uma certa demora para ser analisada. Neste caso, o princípio da fundamentação das decisões judiciais deveria ser ponderado em relação ao princípio da celeridade processual, sendo mesmo cabível a adoção do entendimento que a fundamentação poderia ser de alguma maneira “suavizada” em benefício da rapidez do provimento judicial.

Em contrapartida, as regras, decorrentes que são da atividade legislativa, e já tendo passado pelo crivo do controle de validade e aplicabilidade, não contemplam possibilidade de ponderação, o que gera a obrigatoriedade da aplicação de seus mandamentos, sem que sejam sopesados em face de mandamentos divergentes explicitados por outra regra.

Os que militam em sentido diverso desta concepção poderiam argumentar que também as regras podem sofrer ponderação. No entanto, conforme refere De Lucca (2016), embora este tipo de norma não goze de absolutividade, sua ponderação somente pode ser admitida em situações excepcionais, em condições detalhadamente estabelecidas, onde há que se respeitar em primeiro lugar a segurança jurídica.

Desta forma, pode-se afirmar que o dever de fundamentação é uma regra, que como já dito alhures, tem caráter constitucional e insere-se entre as garantias fundamentais do Estado Democrático de Direito, notadamente em razão de que impõe ao Estado a obrigatoriedade de explicitar os motivos que o levaram a imiscuir-se na esfera de direitos do cidadão, pois, de outro modo, o arbítrio estatal imiscuir-seria inevitável.

(21)

1.4 Tipos de fundamentação

No entanto, mesmo que se reconheça o caráter absoluto da regra em análise, para melhor entender as inovações trazidas pelo NCPC em relação ao dever de fundamentar todas as decisões judiciais é necessário um introito explicativo quanto aos tipos de fundamentação. Conforme De Lucca (2016), quanto à profundidade analítica, a fundamentação das decisões judiciais são classificada como suficientes ou exaurientes.

Na fundamentação suficiente o julgador não está obrigado a analisar todos os argumentos aduzidos pelas partes, seja na petição inicial, seja na contestação, ou mesmo em outra manifestação do autor ou do réu, pois somente em relação aos argumentos aptos a embasar a decisão judicial é que há necessidade de ser demonstrado o correto enfrentamento por parte do juiz.

Corroborando este entendimento, Dinamarco (2009) diz que a motivação deve abarcar os pontos relevantes e essenciais, desde que a sentença demonstre que o julgador tomou a decisão porque assumiu determinados fundamentos coerentes com esta, não sendo exigível que o juiz se manifeste acerca de todos os pontos suscitados pelas partes, posto que de pouca ou nenhuma relevância.

Ocorre, porém, que este entendimento deixa ao juiz a prerrogativa de decidir quais sejam os pontos relevantes e essenciais ao julgamento da lide, cabendo a ele, desta maneira, apenas escolher os argumentos que se prestem a beneficiar a parte vencedora.

Cabe ressaltar que, no caso do ordenamento jurídico pátrio este tipo de fundamentação se ampara na praxe reiterada dos tribunais, pois não há instrumento normativo que expressamente permita fundamentar apenas suficientemente as decisões judiciais.

(22)

Neste sentido, observa o autor:

Tradicionalmente, assentou-se na jurisprudência pátria a concepção de que, na fundamentação das decisões judiciais, o juiz não estaria obrigado a se manifestar sobre todas as alegações deduzidas pelas partes, desde que apresentasse fundamento suficiente para a sua conclusão.(MOTIN,2016).

Fica claro então que, conforme este entendimento, para haver fundamentação suficiente bastaria o enfrentamento de um único ou de alguns argumentos, pois os outros pontos levantados pelas partes não seriam necessariamente levados em conta para o desfecho da lide em razão de que aqueles fundamentos já analisados foram suficientes para embasar a decisão do julgador.

Entretanto, há forte crítica à adoção deste tipo de fundamentação:

É injustificável, portanto, o entendimento jurisprudencial que se consolidou no Brasil no sentido de que o juiz não está obrigado a se manifestar sobre todas as alegações das partes. Um entendimento que, embora pautado pela racionalização da pesada carga de trabalho dos magistrados, permite a livre escolha dos fundamentos que justificam a decisão, independentemente do acerto dos demais. Em suma, a parte deve ser chamada para participar do processo, mas, depois de se manifestar, o juiz pode simplesmente ignorá-la para julgar de acordo com as razões da outra parte. (DE LUCCA, 2016, p. 207).

Pelo exposto, comprova-se que a adoção deste entendimento não tem previsão legal, assentado que está, exclusivamente, na jurisprudência pátria, ou seja, decorrente da prática reiterada dos tribunais que negligenciavam, ou negligenciam, a correta aplicação do mandamento constitucional.

Em antagonismo à fundamentação suficiente ocorre a necessidade de fundamentar de forma exauriente as decisões judiciais, que, em meio a muita polêmica e resistência, foi a forma adotada pelo NCPC/2015.

(23)

Neste sentido, Castro (2016, p. 213), afirma e exemplifica:

Por mais absurdos e descabidos que sejam os argumentos, devem os juízes manifestarem expressamente sobre todos, justificando a decisão, mesmo que de forma sucinta. Não pode o juiz deferir, por exemplo, indenização por dano moral em razão de publicação de nota ofensiva nas redes sociais e dizer que “a mesma sorte não socorre o pedido de retratação”, sem dizer os motivos, exigindo que a parte imagine suas justificativas.

Como visto, mesmo que alguns argumentos trazidos pelas partes possam ser claramente desprovidos de suporte fático ou jurídico, não é dado ao julgador simplesmente ignorá-los na fase de fundamentação do ato decisório. É necessário, portanto, que o juiz refira expressamente seu juízo de valor frente a cada argumento carreado pelas partes, declinando os motivos pelos quais tomou esta ou aquela decisão, acolhendo um argumento em detrimento de outro.

De acordo com De Lucca (2016), em alguns casos específicos, pode se admitir que extraordinariamente sejam deixados sem análise argumentos da parte vencedora, ou seja, do demandante que teve seus pedidos deferidos por ocasião da prolação da sentença, especificamente nas situações em que aqueles argumentos já analisados se mostraram suficientes para embasar a tese vencedora.

Vale ressaltar que no que diz respeito aos argumentos aduzidos pela parte sucumbente, tal exceção não pode ser admitida, pois, de modo contrário, estaria sonegando a apreciação de argumento que, em tese, seria capaz de modificar sua decisão em caso de ser apreciado.

Neste compasso, De Lucca (2016) reitera que as únicas alegações que podem ser eventualmente desconhecidas pelo julgador são as aduzidas pelo vencedor, nunca as do sucumbente. Neste sentido, exemplifica citando caso em que o autor baseia seu pedido em três causas de pedir distintas, mas já a primeira analisada restou capaz de justificar o pedido, possibilitando assim que as demais não sejam necessariamente avaliadas. Entretanto, no caso exemplificado, não

(24)

poderá julgar procedente o pedido do autor, sem apreciar , e afastar, todas as teses de defesa lançadas pelo réu sucumbente.

(25)

2 A FUNDAMENTAÇÃO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015

A Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015, ao dar vigência ao Novo Código de Processo Civil brasileiro, publicizou a intenção do legislador pátrio em estabelecer claramente as situações em que as decisões judiciais, sejam interlocutórias, sentenças ou acórdãos1, não serão consideradas fundamentadas.

No entanto, como sabido, as mudanças, em qualquer área da vida social que se abordar, não se verificam na prática sem muitas resistências e polêmicas, principalmente pelo desconforto de modificar comportamentos de há muito arraigados e consolidados no subconsciente coletivo.

Sendo assim, não causa surpresa a celeuma instaurada em razão das inovações trazidas pelo NCPC, notadamente quanto à regra que expressa o tipo de fundamentação das decisões judiciais adotada pelo ordenamento jurídico nacional. Pode-se identificar a referida polêmica por meio da seguinte passagem:

Essa nova regra prevista no inciso IV do § 1º do art. 489 vem sendo objeto de inúmeros e calorosos debates pelos operadores do Direito, sobretudo por contrapor-se, em princípio, à concepção de motivação até então aceita pela jurisprudência, que reputava suficiente uma fundamentação não exauriente das teses suscitadas pelas partes. E, dentre as severas críticas à regra, destacam-se argumentos quanto à criação de encargo desproporcional ao Judiciário, impondo-lhe um “engessamento burocrático”, capaz de comprometer a celeridade processual e a efetividade da prestação jurisdicional. (MOTTIN, 2016).

Pelo exposto, verifica-se que o principal ponto de discordância se refere ao alegado assoberbamento dos encargos atribuídos ao já sobrecarregado Poder

1 Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.

§ 1o Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução.

§ 2o Decisão interlocutória é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1o. [...]

(26)

Judiciário, comprometendo ainda mais a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.

Porém, parece evidente a opção do legislador em adotar a fundamentação exauriente das teses levantadas pelas partes, tornando inadmissível a prática, até então aceita pela jurisprudência, de fundamentar a decisão judicial apenas de forma suficiente, descurando de algum, ou de alguns, argumentos suscitados pelos litigantes.

Dentre os que exaltam a necessidade da fundamentação exauriente, Streck (2016, p. 685) é incisivo ao dizer:

Trata-se do direito fundamental que a parte tem de ver todos os seus argumentos examinados e rebatidos (ou aceitos) pelo órgão julgador. Ou seja, não basta tomar conhecimento dos argumentos e delineá-los no relatório. A parte tem direito a que sejam considerados os argumentos de modo sério e detido, valendo, aqui, outra vez invocar o princípio da Erwägungspflicht (dever de examinar o que foi argumentado). Com isso, cai por terra, definitivamente, a decisão

slogan muito utilizada em embargos de declaração e em outros

recursos para rebater a alegação de que não foram examinados todos os argumentos, como: “ O juiz não está obrigado a examinar todas as alegações das partes, se apreciando apenas um dos fundamentos indicados já tem motivo suficiente para decidir a controvérsia, em prejuízo dos demais”. Ora, há milhares de decisões desse jaez que, agora, seriam inquinadas de nulidade, em face do comando do dispositivo.

Porém, os críticos da inovação normativa em tela, concentrados principalmente na classe dos magistrados, argumentam, como já referido, que a exigência legal de enfrentamento de todas as teses suscitada pelas partes causará uma demora ainda maior na prestação jurisdicional, já considerada morosa na maioria dos casos levados à apreciação judicial.

Neste ponto destaca-se a notícia veiculada no site da Associação dos Magistrados Brasileiros:

Representantes da AMB e da Anamatra estiveram nesta quarta-feira (4) com o secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Caetano, para tratar do pedido de vetos ao novo Código de Processo Civil (CPC),

(27)

feito pelas duas entidades em conjunto com a Ajufe. Para os magistrados, pelo menos três pontos aprovados pelo Congresso Nacional vão afetar a gestão do acervo de processos, a independência pessoal e funcional dos juízes e a produção de decisões judiciais em todas as esferas do país. [...]O terceiro e último ponto prevê a argumentação detalhada na decisão, por parte dos juízes, de todos os argumentos deduzidos no processo pelas partes, sob pena de nulidade da sentença. E ainda, quando se limitar a invocar na decisão precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos. (AMB, 2015).

Este pedido de veto ao ponto concernente a fundamentação ressalta a inconformidade da classe dos juízes com a modificação legislativa, que, no entanto, não surtiu o efeito desejado, pois a Lei 13.105/15, depois de cumprida a vacatio

legis, passou a vigorar sem as almejadas modificações.

Desta forma, cumpre agora estudar os efeitos das modificações processuais na praxe forense, já que a obrigatoriedade da norma independe da aquiescência dos destinatários para efetivamente vincular a todos.

2.1 As inovações do art. 489, §§ 1º e 2º

As modificações processuais não se restringiram somente à adoção expressa da análise exauriente das alegações das partes. Também foram implementadas outras mudanças a serem observadas por ocasião da motivação das decisões judiciais, como as que se passa a analisar, notadamente as constantes do § 1º, do artigo 489 do NCPC.

Para tanto, é necessário reiterar que o caput do referido parágrafo introduz as situações em que as decisões judiciais não serão consideradas fundamentadas.

Conforme Bahia e Pedron (2016), este § 1º determina o dever de que o julgador, se observara fielmente o contraditório, sua decisão não incorrerá em nenhum dos problemas elencados, pois a maior parte dos mesmos se refere justamente à violação do dever de consideração das teses trazidas pelas partes

(28)

(seja para assentir ou não). Assim, o que faz o § 1.º é tentar modificar as práticas que admitem o "livre convencimento" e, particularmente, permitem que o magistrado não é obrigado a responder a todos os argumentos deduzidos pela parte.

Neste sentido, o inciso I estabelece que não se considera fundamentada a decisão que simplesmente indicar, reproduzir ou parafrasear ato normativo, sem pormenorizar de que maneira se verifica a relação entre a norma legal aplicada e a questão decidida.

Conforme afirma De Lucca (2016), o objetivo deste inciso é bastante singelo, mas de grande importância, pois trata-se do desdobramento do dever de concretude, obrigando o juiz a apresentar razões jurídicas efetivamente pertinentes ao caso concreto.

No mesmo rumo, o inciso II disciplina que carece de motivação adequada a sentença que fizer uso de conceito jurídico indeterminado, sem explicar de que modo ele se adequa ao caso.

De acordo com esse dispositivo, quando o magistrado analisar o ordenamento e se deparar com conceitos indeterminados, entendidos como aqueles que contêm conteúdos semânticos vagos/abertos [...], ou gerais [...]), deve determinar, efetivamente, seu conteúdo ao caso sub judice, indicando as razões concretas que justificam sua aplicação. (BAHIA E PEDRON, 2016).

Já o inciso III, ressalta que não basta invocar os motivos que seriam pertinentes à justificação de qualquer outra decisão, que, segundo Alves (2017), é o que ocorre, quando o juiz, por exemplo, defere uma liminar, afirmando tão somente que estão presentes os pressupostos legais. Ao julgador cabe justificar o seu posicionamento, de maneira clara e precisa, não podendo, simplesmente, proferir uma decisão “padrão”, ou “estereotipada”.

Neste sentido afirmam Bahia e Pedron (2016) que o que se busca evitar com este mandamento legal é a utilização de fundamentos genéricos que não se prestam a formar o substrato legal para a justificação da decisão específica

(29)

daquele caso concreto, ocasionando assim que as partes gastem tempo e recursos, próprios e do Judiciário, para expor suas razões e fazer suas provas, mas ao final, obtenham uma decisão cujos fundamentos sejam apenas a reprodução automática de outras tantas, e, portanto, não se está provendo jurisdição de fato, mas apenas dando uma falsa impressão de acesso à justiça.

Desta maneira, estes três incisos tem a intenção de reforçar o dever de concretude das decisões judiciais, impondo que as razões de decidir apresentadas sejam concretas, e não lacônicas e abstratas.

Na sequência, o inciso IV, como já referido anteriormente, diz claramente que a decisão que não enfrentar todos os argumentos deduzidos pelas partes capazes, em tese, de infirmar a conclusão adotada pelo julgador, não será considerada fundamentada.

Portanto, este inciso esclarece, de acordo com Alves (2017), que o juiz tem o dever de enfrentar as alegações das partes e confrontá-las com o caso concreto e a legislação, principalmente aquelas que levariam a uma conclusão diversa da adotada. Portanto, a fundamentação incompleta, atualmente, não pode ser admitida. Que é o que se verificaria no caso do julgador se limitar a avaliar somente as provas e teses que justificam a decisão, simplesmente ignorando as demais como se pudesse selecionar as provas que quisesse considerar.

Quando se analisa o inciso V, é possível verificar que também não se considerará motivada a decisão que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos.

Note-se que o inciso V é muito parecido com o inciso I. Enquanto este exige concretude na evocação de enunciados normativos, aquele exige concretude na invocação de precedentes judiciais. De nada adianta abarrotar uma decisão (o mesmo vale para o advogado em suas petições) com um extenso rol de supostos precedentes judiciais sem demonstrar que as razões jurídicas apresentadas naquele caso valem igualmente para o caso em julgamento. (DE LUCCA, 2016, p. 341).

(30)

Da mesma forma, se o juiz optar por não seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento

,

de acordo com o inciso VI, não haverá uma decisão adequadamente fundamentada.

Quanto a este dispositivo, importante referir entendimento de Adede e Castro (2016, p.213):

[…] com a devida vênia ao legislador, entendemos que deva ser o contrário, ou seja, age mal o juiz quando usa enunciado de súmula ou precedente quando não é aplicável ao caso concreto. Somos um país continental, com realidades regionais absolutamente diversas, de forma que nem mesmo a lei, cheia de conceitos, parágrafos, incisos, tem condição de referir e prever tudo. Porque a súmula, que nada mais é do que um princípio geral, deve ser aplicada como se fora a verdade absoluta e insofismável? [...] as súmulas e os precedentes jurisprudenciais são extremamente importantes e devem ser respeitados, mas cada situação processual é una, especial e contém elementos regionais ou locais que podem determinar a sua não aplicação, ao menos in totum. Se por um lado a ideia é reduzir o número de processos ao utilizar ao máximo as súmulas e prece-dentes, não se pode transformar o juiz de primeiro grau em uma espécie de despachante de luxo, apenas um caminho burocrático até o templo dos tribunais. Mas, pelo texto legal, só pode o juiz negar

aplicação às súmulas e precedentes se justificar que não se aplicam ao caso concreto ou que foi superada por outra. (grifo nosso).

Verifica-se, pelo exposto, que o autor referenciado adere ao entendimento de que não seria o mais adequado vincular o julgador ao precedente invocado pela parte, entretanto reconhece que o mandamento legal não deixa margem para juízo de discricionariedade, obrigando o julgador a explicar por qual razão deixou de considerar o precedente invocado.

Pelo que se compreende do dispositivo legal, se o juiz considerar que o processo apresenta crise jurídica apta a ser resolvida pelo enunciado de súmula ou precedente com eficácia vinculante, e que não esteja superado o entendimento consagrado, e ainda assim decidir pela não aplicação por não concordar com tal entendimento, a decisão será nula por falta de fundamentação. (ALVES, 2017).

(31)

O § 2º, em caso de ponderação entre normas, condiciona a validade da decisão à completa justificação dos critérios utilizados para que uma prevaleça sobre a outra.

Sobre o tema, De Lucca (2016, p. 242) ressalta que:

[...] o legislador teve a cautela de se referir a ponderação “entre normas”, ao invés de ponderação “entre princípios”, com o objetivo de englobar também a ponderação entre regras e princípios. Trata-se de hipótese excepcionalíssima, aceita nas raríssimas ocasiões em que, concomitantemente, a aplicação da regra deixa de atender a finalidade pretendida pelo legislador e a prevalência do princípio não gera absolutamente nenhuma insegurança jurídica.

Ratifica-se, desta forma a importância já referida em alocar o dever de fundamentação entre as regras jurídicas, devido à excepcionalidade da ponderação entre normas dessa natureza, originando uma maior segurança em relação a completa observância do preceito legal.

2.2. Requisitos mínimos da fundamentação

Para que seja considerada adequadamente motivada a decisão deve observar alguns requisitos mínimos. Os requisitos da clareza e da coerência na exposição dos fundamentos jurídicos, são acompanhados, com mais ênfase a partir do NCPC, pelo requisito da completude, mais minuciosamente tratado no já citado Art. 489.

Quanto ao requisito da clareza, a compreensão da determinação judicial por parte do destinatário é de suma importância. Mas não basta apenas entender a ordem, é necessário também compreender por qual razão a decisão tomada foi aquela e não outra. Desta forma, a ementa abaixo transcrita apresenta um caso prático em que este requisito foi negligenciado.

Ementa: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR

DANOS MORAIS. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO INICIAL. FUNDAMENTAÇÃO CONFUSA. AUSÊNCIA DE

(32)

COERÊNCIA. DECISÃO CONTRADITÓRIA. SENTENÇA ANULADA. 1. A sentença ora atacada apresenta redação confusa e sem coerência, impossibilitando ao Jurisdicionado compreender as razões pelas quais teve seu pedido julgado improcedente. Inicialmente afirma-se que o problema discutido nos autos decorre de negligência da instituição financeira, porém, na sequência, inverte-se o discurso e passa-se a discorrer sobre negligência do consumidor em razão do mesmo fato e, logo em seguida, volta-se a reconhecer culpa da instituição financeira, mas, julga-se improcedente o pedido inicial (?!). 2. O artigo 93, inciso IX da Constituição Federal dispõe que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. 3. No caso dos autos, a decisão recorrida não expõe com clareza os motivos pelos quais o pedido inicial foi julgado improcedente, já que apresenta fundamentação tanto para acolher quanto para rejeitar o pedido inicial, sem, ao final, explicar o motivo pelo qual optou-se pela improcedência. 4. Deste modo, a sentença deve ser anulada, retornando os autos à origem para que nova decisão seja proferida, com maior clareza e coerência. RECURSO PREJUDICADO, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de votos, CONHECER e JULGAR PREJUDICADO o recurso, anulando a sentença, de ofício, e determinando a baixa dos autos à origem para que outra decisão seja proferida, nos exatos termos deste voto. (TJPR - 2ª Turma Recursal - 0002251-55.2013.8.16.0182/0 - Curitiba - Rel.: GIANI MARIA MORESCHI - - J. 01.12.2014). (PARANÁ, 2014).

Pela ementa colacionada é possível verificar que até mesmo antes do advento do NCPC, não se admitia uma sentença que não declinasse claramente os fundamentos que embasaram o ato decisório.

Da mesma maneira, não pode jamais ser olvidado o requisito da coerência, garantindo que os fundamentos sejam declinados de maneira a demonstrar a correlação entre eles e a decisão adotada tomada.

Assim, os fundamentos necessitam ser coerentes, pois indicam que o julgador decidiu com os versados nos autos, e que o resultado poderia ser diferente se outros fundamentos, que não os dos autos, fossem aplicados. (MAZZEI, 2015).

A coerência da motivação pressupõe, antes de tudo, harmonia entre o dispositivo da decisão e as razões que lhe embasaram. O dispositivo deve ser uma decorrência lógica das premissas indicadas na motivação. (DE LUCCA, 2016, p. 218).

(33)

O último requisito abordado, mas nem por isso menos importante, antes o contrário, traz a exigência de completude da fundamentação. Este requisito estabelece que devem ser apresentadas clara e coerentemente as razões que fundamentam a decisão, mas principalmente as razões da rejeição das provas e alegações apresentadas pela parte sucumbente.

A completude pressupõe uma fundamentação completa, sem lacunas ou omissões, impondo ao magistrado que analise todas as questões (ponto prejudicial, questão prejudicial e causa prejudicial, preliminares) de fato e de direito relevantes, antecedentes ao julgamento, que se encerra na parte dispositiva da decisão. (SILVA JÚNIOR, 2016).

A doutrina já apontava a diferença de concepção quanto às decisões de primeiro grau e subsequentes, distinguindo decisões fundamentadas (com argumentação suficiente) das decisões completas (que enfrentam todos os

argumentos suscitados pelas partes). (PESSOA ALVES, 2016, grifo nosso).

Assim é que se pode verificar que a motivação completa deverá levar em conta todas as alegações aduzidas pela parte vencida, bem como também não pode negligenciar a exposição das razões que embasam o pedido eventualmente acolhido.

2.3 Como os Tribunais estão decidindo? Impressões iniciais da Prática Judiciária a partir do advento do Novo Código de Processo Civil

Como já referido anteriormente, mudanças sempre causam desconforto e resistência daqueles que eventualmente tenham ameaçada sua permanência naquela zona de conforto gerada pela repetição de procedimentos, que embora não sejam os mais corretos, pelo uso contínuo e permanente, parecem ser os mais adequados aos olhos da maioria.

Nesta senda, o tema deste trabalho, foi abordado também por ocasião do Seminário – O poder Judiciário e O Novo Código de Processo Civil, promovido pela

(34)

Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, onde foram emitidos 62 enunciados, entre os quais, alguns fazem especificamente referência ao dever de fundamentar, como podemos ver analisando alguns deles:

9) É ônus da parte, para os fins do disposto no art. 489, § 1o, V e VI, do CPC/2015, identificar os fundamentos determinantes ou demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento, sempre que invocar jurisprudência, precedente ou enunciado de súmula.

10) A fundamentação sucinta não se confunde com a ausência de fundamentação e não acarreta a nulidade da decisão se forem enfrentadas todas as questões cuja resolução, em tese, influencie a decisão da causa.

11) Os precedentes a que se referem os incisos V e VI do § 1o do art. 489 do CPC/2015 são apenas os mencionados no art. 927 e no inciso IV do art. 332.

12) Não ofende a norma extraível do inciso IV do § 1o do art. 489 do CPC/2015 a decisão que deixar de apreciar questões cujo exame tenha ficado prejudicado em razão da análise anterior de questão subordinante.

13) O art. 489, § 1o, IV, do CPC/2015 não obriga o juiz a enfrentar os fundamentos jurídicos invocados pela parte, quando já tenham sido enfrentados na formação dos precedentes obrigatórios. (ENFAM, 2015).

Do exposto, se reitera que a classe dos magistrados foi a que mais demonstrou preocupação com as consequências das inovações apresentadas, em razão do que, logo após a publicação da Lei 13.105/15, envidou esforços em uniformizar a interpretação de alguns de seus dispositivos, especificamente aqueles que se referem à adequada fundamentação das decisões judiciais.

Para possibilitar uma análise de qual foi a resposta do Poder Judiciário às novas exigências da fundamentação, é necessário delimitar a abrangência territorial da pesquisa, tendo em vista que as dimensões continentais do Brasil dificultam em muito uma análise tendo como base todos os Tribunais do país.

Desta forma, será realizada uma análise de julgados do TJRS que tenham como objeto controvérsia sobre a correta fundamentação de decisões judiciais, e que representam o posicionamento que vem sendo adotado pelas Câmaras Cíveis, bem como, pelas Turmas Recursais.

(35)

Inicialmente é possível verificar que em abril de 2016, mês imediatamente posterior à entrada em vigência da Lei 13.105/15, a Turma Recursal da Fazenda Pública do TJRS, que, embora formada por juízes convocados das Comarcas, emite decisões no 2º Grau de jurisdição, prolatou Acórdão fazendo menção expressa a deficiência da fundamentação de acordo com o art. 489 da citada lei, decidindo que:

Ementa: RECURSO INOMINADO. PRIMEIRA TURMA RECURSAL

DA FAZENDA PÚBLICA. DMAE ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.

GRAU MÁXIMO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.

TRANSCRIÇÃO INTEGRAL DE CÓPIA DO PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Trata-se de ação indenizatória, na qual postula a parte autora o percebimento de adicional de insalubridade em grau máximo, julgada improcedente na origem. PREJUDICIAL DE MÉRITO - A jurisdição, como ato de Estado, é inerte e exige provocação específica. Inteligência dos arts. 2º e 262, ambos do CPC (condensado no art.2º do CPC/2015, em vigor). A sentença, como ato de inteligência judicial, deve expressar o que efetivamente o magistrado julgador sentiu a respeito dos fatos deduzidos no processo, por isso, por preceito Constitucional, deve ser motivada e devidamente fundamentada, consoante art.489 do CPC/15. Com efeito, a reprodução integral, total, absoluta, sem qualquer acréscimo, considerações e investigação judicial na sentença, de sentença de caso diverso, mesmo que possa ser semelhante ao caso concreto, não configura prestação jurisdicional válida, até porque não se sabe o que o magistrado pensa sobre o assunto em pauta ou sobre o objeto do litígio, já que se limitou à cópia de sentença de processo diverso. A transcrição de partes de peças processuais, com identificação da origem, é conduta normal e corriqueira na atividade processual, onde vários atuantes da cena judiciária (partes, promotores, defensores e juízes) se pronunciam sobre os mesmos fatos. Agora, é inadmissível advogar como

fundamentada e motivada sentença judiciária, onde o julgador não expressa sua intelecção sobre o objeto litigioso, limitando-se a copiar e transcrever integralmente peça processual de outro magistrado em julgamento de outra demanda. A transcrição integral de sentença de outro processo, mesmo que o caso seja análogo, sem acréscimo ou complemento, não configura motivação ou fundamentação sentencial para os efeitos dos art. do CPC/15. Não tenho a menor dúvida, concessa

venia, de propor a desconstituição da respeitável sentença, justamente porque não vislumbrei do processado qualquer manifestação do magistrado julgador a respeito dos fatos, pois se limitou a copiar integralmente sentença de outro processo. A ausência de acréscimos, de outras razões, de comentários, de idéias próprias fulmina de morte o julgado singular que se limitou a transcrever totalmente o parecer do MP. RECURSO INOMINADO PROVIDO PARA DESCONSTITUIR A SENTENÇA, VENCIDA A

RELATORA QUE NEGAVA PROVIMENTO AO RECURSO

INOMINADO (Recurso Cível Nº 71005275136, Turma Recursal da Fazenda Pública, Turmas Recursais, Relator: Thais Coutinho de

(36)

Oliveira, Redator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 28/04/2016). (Rio Grande do Sul, 2016).(Grifo nosso).

Verifica-se, portanto, que o TJRS, ao menos no que diz respeito a Turma Recursal da Fazenda Pública, emitiu acórdão no sentido de desconstituir sentença, inclusive subjugando o voto da relatora, devido ao fato de que o juízo de 1º grau se limitou a transcrever integralmente a sentença de outro magistrado em outro processo, não logrando êxito em demonstrar que analisou adequadamente as peculiaridades da lide levada a sua apreciação.

Continuando a pesquisa jurisprudencial, observou-se a ocorrência quase que diária de acórdãos prolatados, seja por Turmas Recursais, seja pelas Câmaras Cíveis do TJRS, fazendo referência expressa ao art. 489 do NCPC, no mais das vezes, reformando ou anulando decisões que não atendem as novas exigências em relação à fundamentação das decisões judiciais.

Para corroborar esta afirmação é pertinente a análise da seguinte ementa:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. EMBARGOS À

EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. DECISÃO SEM FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. A sentença proferida, ao fundamentar o parcial acolhimento dos embargos, limitou-se a dizer que o "cálculo apresentado pelo Município de Palmares mostra-se de acordo com os parâmetros determinados no título judicial em execução", além do que há "clareza e objetividade na forma de calcular os valores em execução". A sentença, portanto, acolheu o cálculo do Município sem, contudo, esclarecer no que consiste, efetivamente, o alegado excesso. Inexiste o devido cotejo entre os valores. Situação em que a menção a respeito da existência de

clareza e objetividade nos cálculos apresentados pelo Município revela-se absolutamente genérica para fins de fundamentação.

Segundo o parecer da Procuradoria de Justiça, ao acolher "a impugnação do Município, sem indicação do equívoco dos valores apontados pela apelante", a sentença carece de "fundamentação adequada", exatamente como argumenta o apelante. Violação do previsto no art. 93, inc. IX, da CF/88, bem como dos art. 11 e § 1º do art. 489 do CPC. Precedentes do TJ/RS. PRELIMINAR DE

NULIDADE ACOLHIDA. APELO PROVIDO. SENTENÇA

DESCONSTITUÍDA. (Apelação Cível Nº 70073472565, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires

Ohlweiler, Julgado em 06/06/2017). (Rio Grande do Sul, 2017a).

(37)

Como visto, a sentença foi desconstituída, tendo a preliminar de nulidade acolhida em sede de apelação pois os desembargadores da 3ª Câmara Cível do TJRS, em consonância com o parecer do Ministério Público, consideraram, com base no § 1º do art. 489 do CPC, que é nula a sentença por falta de fundamentação adequada.

Quanto a inadequação da fundamentação da referida sentença, embora não esteja especificado no acórdão qual inciso do § 1º do art. 489 tenha sido violado, se faz pertinente uma vez mais dizer que, conforme o inciso II do § em comento, não se considerará fundamentada a decisão que empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso.

Parece claro, desta forma, que o julgador de 2º Grau aquiesceu com a tese do apelante no sentido de que a simples menção à clareza e objetividade dos cálculos apresentados pelo município, de forma genérica, não tem o condão de servir como adequada fundamentação da decisão judicial.

Analisando o próximo exemplo, referente à agravo de instrumento julgado em 16 de fevereiro de 2017, se observa que também as decisões interlocutórias foram submetidas ao crivo da aplicação do art. 489:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.

Tratando-se de decisão interlocutória, o juiz pode declinar

sucintamente os fundamentos fáticos e jurídicos que formaram seu convencimento. Embora aceitável a fundamentação concisa, não se pode permitir ausência total de fundamentação. Aplicação dos artigos 93, inciso IX da Constituição Federal e Artigo 489, IV, do Código de Processo Civil. DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME.

(Agravo de Instrumento Nº 70071706154, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ergio Roque Menine, Julgado em 16/02/2017). (Rio Grande do Sul, 2017b).

O relator, neste caso, considerou violado o inciso IV, onde se consubstancia a inadequação da fundamentação em razão de não terem sido enfrentados todos os

(38)

argumentos trazidos ao processo que, em tese, teriam condições de embasar uma decisão em sentido diverso da que foi adotada, afirmando que não há que se confundir fundamentação concisa com falta de fundamentação.

A ementa abaixo colacionada tem a intenção de ressaltar que mesmo em caso de não verificação de irregularidade na fundamentação o Tribunal analisou o caso trazido à sua apreciação de acordo com as inovações do NCPC.

Ementa: AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

EXECUÇÃO FISCAL. SUBSTITUIÇÃO DE PENHORA. RECUSA DO EXEQUENTE. FUNDAMENTAÇÃO PER RELACIONEM. I - FUNDAMENTAÇÃO PER RELACIONEM. 1. O STF e o STJ firmaram entendimento no sentido de que a chamada fundamentação per relacionem, assim entendida a que faz remissão ou transcreve decisão anterior, precedente, parecer etc., cumpre o requisito constitucional (CF, art. 93, IX). 2. Por isso, a fim de que seja preservada a constitucionalidade do inciso I do § 1º do art. 489, e do § 3º do art. 1.021, ambos do CPC/2015, impõe-se compreendê-los com parcimônia e razoabilidade. Importa é que a decisão esteja fundamentada, e que a fundamentação responda aos "argumentos capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador" (art. 489, § 1º IV). Não importa que o julgador faça remissão, transcreva decisão anterior, precedente, parecer etc., e sim que, em teor, traduza resposta suficiente às questões a respeito das quais é necessário pronunciamento. II - JULGAMENTO DO RECURSO Transcrição da decisão monocrática que julgou o agravo de instrumento, o qual esgotou o exame da matéria e responde suficientemente aos argumentos capazes de influir no resultado. III - DISPOSITIVO Recurso desprovido. (Agravo Nº 70072861800, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 07/06/2017). (Rio Grande do Sul, 2017c).

Se observa, portanto, que, seja para corroborar, retificar ou anular decisão judicial, o art. 489 da Lei 13.105/15 está sendo considerado.

Tais decisões, embora tratar-se de pequena amostra, representam as posições adotadas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul quanto à aplicação do artigo 489 do Código de Processo Civil, já possibilitando a verificação de que, quando arguidas, e devidamente comprovadas, as incompatibilidades processuais no que diz respeito ao novo modo de fundamentar, normalmente ocasionaram o

Referências

Documentos relacionados

experimentally infected animais. Potenzialità dei fenomeno killer dei llevite. Rev Ibero Amer Micol, v. Phospholipase activity in Candida a/bícans. Plate method for

Por isso João Batista teve de dizer aos seus contemporâneos judeus: " E não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus

A partir das entrevistas, buscaram-se elementos para compor a historiografia do adolescente. Assim, oito adolescentes eram do sexo feminino e quatro do masculino. A forma

J.M.C.F., Presidente da CONED – Conselho Estadual de Políticas Sobre Drogas, solicita parecer do CREMESP sobre a revisão que está sendo feita no manual de orientação

Durante a navegação ou depois de abrir o mapa através do sensor de superfície Mostrar o mapa, poderá deixar mostrar uma lista dos destinos especiais, das preferências e

O Custo Direto é resultado da soma de todos os custos unitários dos serviços necessários para a construção da edificação, obtidos pela aplicação dos consumos dos insumos sobre

Tabela 4 Estimativas de correlação classificatória de Sperman entre os parâmetros considerados na seleção orientada com base no comportamento dos híbridos, quanto

Atenção: Se não houver filhos do casamento, ainda que por nascer, o viúvo ou viúva só tem direito à pensão se tiver casado com o beneficiário pelo menos um ano antes da data do seu