Avaliação da motilidade extrínseca ocular de pacientes
facectomizados sob anestesia retrobulbar +
Evaluation
Df ocular motility
Df cataract patients operated under
retrobuklbar anesthesia
Mauro GoldchllÚt (I)
Alan B. Scott (:I)
+ TrabaU.o realizado no "The Smitb-Kettlewell Eye
Researcb Institute" São Francisco, Califómia - EUA. Tese apresentada para obtenção do título de Mestrado pela Escola Paulista de Medicina, 1 992.
(1) Assistente volwltário da secção de estrabismo da Santa Casa de São Paulo. Responsável pela secção de estrabis mo da Faculdade de Medicina de Santo Amaro.
(I) Oiretor do "The Smi(h-Kelllewell Eye Researcb Institute" São Francisco, CalifónlÍa - EUA. End�reço para corresl,ondêncla: Dr. Mauro Goldcbmit Rua Francisco Leitão, 382. CEP: 054 14-020 -Pinheiros
São Paulo - SP
1 1 4
RESUMO
Diplopia binocular persistente foi relatada como complicação de cirurgia
ocular sob anestesia local. A literatura revela que os anestésicos utilizados
provocam efeitos tóxicos sobre a musculatura extraocular.
Realizou-se estudo clínico prospectivo de avaliação da motilidade ocular
pré e pós-operatória de pacientes facectomizados sob anestesia retrobulbar
com c1oridrato de bupivacaína. O estudo revelo u 7 pacientes com queixa de
diplopia binocular persistente que apresentaram padrão semelhante na evo
lução da função muscular durante o período pós-operatório. O músculo reto
inferior mostrou-se hipofuncionante até a
lasemana, recuperando totalmente
sua função entre a 6a e a 9a semanas; inversamente, o músculo reto superior
apresentou discreta hipofunção até a
lasemana, que se intensificou entre a 6a
e 9a sem anas.
Palavras-chave: Diplopia; Anestesia retrobulbar
INTRODUÇÃO
A técnica da anestesia retrobulbar
foi descrita por KNAPP em
1 8 84I,
que
illjetou cocaína no espaço retrobulbar
para cirurgia de enucleação do globo
ocular. Desde aquele tempo, esse méto
do adquiriu grande importância para a
ci rurg i a ocular, sendo reconhecido
como
umdos procedimentos mais co
muns para a obtenção de anestesia e
acinesia do globo ocular.
Após seu advento, muitas modifica
ções ocorreram em relação
à posição
do globo durante a inj eção, local de
entrada, posicionamento e tipo de agu
lha utilizada, aspiração prévia, veloci
dade e . volume de anestésico inj etado,
compressão do globo ocular após a in
jeção e, finalmente, os agentes anesté
sicos utilizados
2-5.
Todas essas modifi
cações tinham o objetivo de conseguir
maior eficácia e menor número de
complicações com esse procedimento.
Embora considerado
um_método se
guro e e ficaz, complicações podem
surgir após injeção retrobulbar e a he
morragia retrobulbar é considerada a
complicação mais comum, com inci
dência estimada em
1a
2% 2-4.
Em
1 9 85, RAININ &CARLSON
5descreveram diplopia e blefaroptose
como complicações pós-operatórias de
cirurgias o culares realizadas com anes
tesia local. Sugerem, para explicar es
ses achados, que o anestésico inj etado
possa produzir efeitos tóxicos sobre os
músculos extraoculares.
O
presente estudo tem a proposta de
analisar, prospectivamente, a função
pré e pós-operatória dos músculos
extraoculares de pacientes submetidos
à facectomia sob anestesia retrobulbar.
MATERIAIS E MÉTODOS
Avaliaram-se dados prospectivos da
motilidade extrínseca ocular de I I I
ARQ. BRAS. OITAL. 57(2), ABRIU1994
olhos de pacientes submetidos à facec tom ia com implante de lente intra-ocu lar sob anestesia retrobulbar com cloridrato de bupivacaína
0 ,75%,
entre janeiro e setembro de1 990.
Todos os pacientes foram operados peloDr.
Ed garA.
Rainin (Walnut Creek, Cali fórnia). Em nenhuma cirurgia realizou se a retopexia superior.A
imobilização do globo foi feita com fio de seda pas sado na episclera5
a7
mm do limbo superiormente.Os critérios para seleção dos pacien tes foram:
I .
ausência de antecedentes de desvio ocular, diplopia, uso de pris mas, exercícios ortópticos ou cirurgia para correção de estrabismo;2.
ausêllcia de alterações da motilidade extrín seca ocular, avaliada pré-operatoria mente através dos métodos de "cover test" ou Hirschberg (posição primária do olhar);
3.
ausência de alterações no estudo das versões (hiper ou hipo funções);4.
ausência de antecedentes de oftalmopatia tireoidea;5 .
seguimen to mínimo de6
a9
semanas.Na avaliação pós-operatória ana lisou-se:
I .
a motil idade extrínseca ocular através do estudo das versões;2.
presença de diplopiaRESULTADOS
Os resultados são apresentados no gráfico. O estudo estatístico (reste exa to de Fisher) revelou que a porcenta gem de hipofunção dos músculos reto inferior (RI) e reto superior (RS) foi significantemente maior no grupo de pacientes com diplopia pós-operatória. A evolução da hipofunção dos múscu los reto medial (RM) e reto lateral (RL) foi de pequena expressividade nos gru pos com e sem diplopia (Tabela).
DISCUSSÃO
Esse trabalho foi idealizado a partir da observação de pacientes com di plopia binocular persistente após cirur gia ocular sob anestesia local.
ARQ. BRAS. OFfAL. 57(2), ABRIUl994
Avaliação da motilidade extrínseca ocular de pacientesfacectomizados sob
anestesia retrobulbar
TABELA
Pacientes submetidos à facectomia sob anestesia retrobulbar com cloridrato de bupivacalna 0,75% segundo a presença de diplopia e hipofunção dos músculos retos inferior (RI), superior (RS), medial (RM) e lat
era
l (RL) nosmomentos pós'operatórios (PO): POl (11 dia), P02 (1 ' semana) e P03 (6' a 9' semana).
D I P LOPIA A U S �N C I A P R E S E N ÇA POl R I R S RM RL 3 3 2 2 1 8 3 8 7 2 1 1
Os resultados revelaram
7
pacientes com diplopia binocular persistente após a facectomia, onde todos apresentaranl estrabismo vertical. A característica mais interessante encontrada foi a evo lução da hipofunção observada nos músculos retos verticais durante O pe ríodo pós-operatório. Em5
pacientes, até aI
a
semana o músculo RI apresen tou algum grau de hipofunção, enquan to esta foi observada no músculo RS em apenas2
pacientes. Inversamente, entre a6a
e9a
semana, observou-se to tal recuperação da função do músculoRI, enquanto o músculo RS passou a apresentar alguma limitação na sua
HIPOFUNÇÃO MUSCULAR P 0 2 R I R S R M R L 5 3 4 5 5 2 1 1 P 0 3 R I R S R M R L o O O O O 6 O O
função em
6
pacientes (aos2
inicial mente hipofuncionantes somaram-se novos4
pacientes). Esse quadro foi de nominado "inversão de hipofunção" (Gráfico). ApenasI
paciente apresen tou diplopia sem alterações detectáveis no estudo das versões.As possí veis etiologias para o apare cimento de diplopia binocular persis tente após facectomia sob anestesia retrobulbar podem ser divididas em
2
grupos:1.
Causas não relacionadas com a
cirurgia
A catarata pode funcionar como
N° de pacientes com hipofunção
7 -
-
- -f!!
- -
---
-6 5 4
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P01 - - Reto Inferior P02Reto Superior • • • • Reto Medial e Lateral
P03
Gráfico - Pacientes portadores de diplopia binocular persistente, após injeção retrobulbar de cloridrato de bupivacalna, segundo a presença de hipofunção muscular nos diversos momentos pós-operatórios (PO):
POl (1°
dia),P02 (li
semana) eP03
(6" a 9" semana).oclusor, causando deprivação sensorial com conseqüente interrupção do meca nismo de fusão seguido de manifesta ção de eventual desvio latente.
A
diplo pia binocularestará
presente em todo paciente que não conseguir compensar esse desvio. Exemplos são: descom pensação de paresia do411
nervo 6.9,oftalmopatia tireoidea 10. 1 1 , exotropia de
longa duração 7 e miastenia gravis 1 1 .
2.
Causas relacionadas com a
cirurgia
Alguns trabalhos apontam o trauma mecânico causado pela retopexia supe rior que resultaria em hematoma no corpo muscular que evolui para lesão isquêmica e resultando em paresia muscular como responsável pelo qua dro de diplopia após facectomia •. 1 1 .
Esse estudo não responsabiliza a reto pexia superior como causa da diplopia uma vez que ela não foi realizada em nenhum caso.
Outros autores postulam que a pas sagem da agulha durante a injeção retrobulbar resultaria em processo in flamatório com conseqüente cicatriza ção e adesões músculo-esclerais que podem clinicamente levar a uma condi ção restritiva '.1 1 .
A
miotoxicidade pode ser uma pos sível explicação para os resultados ob tidos através de injeção direta no mús culoRI
ou que esse, por razões desco nhecidas, tenha sido mais afetado. Ini cialmente haveria um processo infla matório responsável pela limitação no abaixamento do globo ocular. Após a resolução da inflamação surgiria a si tuação restritiva com deficiência na1 1 6
Avaliação lÚl motililÚlde extrínseca ocular de pacientesfacectomizados sob
anestesia retrobulbar
elevação. HOYT 6 forneceu importante
contribuição a essa hipótese afirmando que
75%
dos pacientes com estrabismo vertical após facectomia com anestesia retrobulbar apresentam aparente pare sia do músculo reto superior enquanto50%
desses pacientes possuem "con tratura" do músculoRI. ONG-TONE
12relatou
2
casos semelhantes onde o tes te de ducção passiva foi positivo para elevação configurando o quadro res tritivo.A
diplopia binocular persistente é, portanto, um quadro que pode surgir após facectomia com anestesia local. Sua etiologia ainda não está detenni nada e também a razão pela qual alguns pacientes são mais suscetíveis de apre sentar diplopia e hipofunções muscula res. O que sim podemos afrrmar é que o músculo reto inferior é o responsável por esse quadro pós-operatório.SUMMARY
Persistent binocular diplopia was related as a complication of ocular surgery under local anesthesia. The Iiterature shows that the anesthetic Ilsed callsed toxic ejJects on extraocular mllsclllatllre.
A
prospective evalllation of pre and postoperative oClllar motility of cataract patients operated Ilnder retrobulbar anesthesia with0. 75%
bupivacaine hydrochl07"ide was accomplished.The
study showed that7
patients complaining of persistent binocular diplopia presented similar behavior pattem on the musclejimction during the postoperative period.
The
inforior rectus muscleshowed weakliness lmti! the first week totally recovering it function between the sixth and ninth weeks;
contrariwise. the superior rectus muscle showed a discreet wealcness until the first week. that intensified between the sixth and ninth weeks.
RBFBRÊNClAS nmLIOGRÁFICAS
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