Aviso: Vers˜ao provis´oria - pode ter incorre¸c˜oes e erros tipogr´aficos! 1. Distˆancias e reflex˜oes
Consideremos em Rn a estrutura de espa¸co afim usual, isto ´e a dada pela aplica¸c˜ao
Φ : Rn× Rn → Rn tal que
Φ((u1, ..., un), (v1, ..., vn)) = (v1− u1, ..., vn− un)
e suponhamos tamb´em que o espa¸co vectorial Rn est´a munido do pro-duto interno usual.
Dados dois pontos distintos P , Q de Rn, a distˆancia entre P e Q,
d(P, Q) define-se como
d(P, Q) = ||Q − P ||.
A fun¸c˜ao d assim definida no produto cartesiano do espa¸co afim Rn por ele pr´oprio goza das seguintes propriedades, sendo P ,Q, S pontos quaisquer do espa¸co afim Rne u um vector qualquer do espa¸co vectorial
Rn: 1) d(P, Q) = d(Q, P ). 2) d(P, Q) ≥ 0 e a igualdade d´a-se se e s´o se P = Q. 3) d(P, Q) = d(P + u, Q + u). 4) d(P, S) + d(S, Q) ≥ d(P, Q).
Estas quatro propriedades s˜ao consequˆencia imediata das defini¸c˜oes e propriedades de espa¸co afim e de norma de um vector.
Recordando que, dados dois pontos distintos P ,Q de Rn, o segmento
[P Q] de extremidades P e Q ´e o conjunto
[P Q] = {X ∈ Rn: X = P + λ(Q − P ), λ ∈ [0, 1]} temos:
(D.1) Proposi¸c˜ao. Sejam P ,Q dois pontos distintos de Rn. Um ponto S de Rn pertence a [P Q] se e s´o se
d(P, S) + d(S, Q) = d(P, Q).
Demonstra¸c˜ao. 1) Seja S ∈ [P Q]. Ent˜ao, por defini¸c˜ao, existe λ ∈ [0, 1] tal que S = P + λ(Q − P ) e por defini¸c˜ao de distˆancia de dois pontos temos
d(S, P ) = ||S − P || = ||λ(Q − P )|| = λ||Q − P || = λ d(P, Q).
Al´em disso de S = P + λ(Q − P ) temos
S = Q + (P − Q) + λ(Q − P ) = Q + (1 − λ)(P − Q), donde
d(S, Q) = ||(1 − λ)(P − Q)|| = (1 − λ)||P − Q|| = (1 − λ)d(P, Q). Logo, se S ∈ [P Q], d(P, S) + d(S, Q) = d(P, Q).
2) Sejam P , Q dois pontos distintos e S um ponto tal que d(P, S) + d(S, Q) = d(P, Q).
Ent˜ao temos ||(S − P )|| + ||(Q − S)|| = ||(Q − P )||. Como Q − P = (Q − S) + (S − P ),
pela desigualdade do triˆangulo, temos que existe µ ∈ R, µ ≥ 0 tal que, digamos,
S − P = µ(Q − S).
Como Q − S = (Q − P ) − (S − P ) temos (1 + µ)(S − P ) = µ(Q − P ) donde S − P = λ(Q − P ), com λ = 1+µµ . Uma vez que µ ≥ 0, temos λ ∈ [0, 1] e logo S ∈ [P Q].♦
(D.2) Proposi¸c˜ao. Sejam P e Q dois pontos distintos de Rn. O
conjunto
H := {X ∈ Rn : d(X, P ) = d(X, Q)} ´
e um hiperplano de Rn (ou seja um subespa¸co afim de dimens˜ao n − 1)
que passa pelo ponto m´edio de [P Q] e ´e perpendicular `a recta r definida por P e Q.
Demonstra¸c˜ao. Suponhamos que P = (p1, ..., pn) e Q = (q1, ..., qn).
Ent˜ao H := {X ∈ Rn: d(X, P ) = d(X, Q)} = = {X ∈ Rn: ||X − P || = ||X − Q||} = = {(x1, ..., xn) ∈ Rn :p(x1− p1)2+ ... + (xn− pn)2 =p(x1− q1)2+ ... + (xn− qn)2} = = {(x1, ..., xn) ∈ Rn : (x1− p1)2 + ... + (xn− pn)2 = (x1 − q1)2+ ... + (xn− qn)2}. Ora (x1 − p1)2 + ... + (xn− pn)2 = (x1 − q1)2 + ... + (xn− qn)2 ´e equivalente a 2(q1− p1)x1+ ... + 2(qn− pn)xn+ p21− q21+ ... + p2n− q2n= 0.
Como P 6= Q, (q1− p1, ..., qn− pn) 6= 0 e portanto temos que um ponto
X = (x1, ..., xn) pertence a H se e s´o se (x1, ..., xn) for solu¸c˜ao da
equa¸c˜ao linear 2(q1−p1)x1+...+2(qn−pn)xn+p21−q21+...+p2n−q2n= 0.
Logo H ´e um subespa¸co afim de dimens˜ao n − 1.
Como o subespa¸co vectorial V associado a H ´e definido pela equa¸c˜ao 2(q1− p1)x1+ ... + 2(qn− pn)xn= 0 e a recta definida por P e Q tem
(q1− p1, ..., qn− pn) temos W⊥ = V , ou seja r e H s˜ao perpendiculares.
♦
(D.3) Defini¸c˜ao. Sejam P e Q dois pontos distintos de Rn. Ao
hiper-plano H := {X ∈ Rn: d(X, P ) = d(X, Q)} d´a-se o nome de hiperplano
mediador (ou bissector) do segmento [P Q] (ou de P e Q). No caso de dimens˜ao 2 diz-se que H ´e a recta mediatriz de [P Q] (ou de P e Q). (D.4) Corol´ario. Sejam P0, ..., Pn n + 1 pontos independentes de Rn.
Se P, Q s˜ao pontos tais que d(P, Pi) = d(Q, Pi), para i = 0, ..., n ent˜ao
P = Q.
Demonstra¸c˜ao. Suponhamos que P 6= Q. Ent˜ao por (D.2), P0, ..., Pn∈
H onde H ´e o hiperplano mediador do segmento [P Q], donde P0, ..., Pn
n˜ao geram Rn como subespa¸co afim. ♦
Observa¸c˜ao Este corol´ario diz-nos em particular que em R2 um ponto fica ´unicamente determinado pelas suas distˆancias a trˆes pontos n˜ao colineares e que em R3 um ponto fica ´unicamente determinado pelas suas distˆancias a quatro pontos n˜ao complanares.
(D.5) Proposi¸c˜ao. Seja H um hiperplano de Rne P um ponto exterior a H. Ent˜ao existe um e um s´o ponto P0 tal que H = {X ∈ Rn : d(X, P ) = d(X, P0)}. ( Ao ponto P0d´a-se o nome de ponto sim´etrico de P em rela¸c˜ao a H.)
Demonstra¸c˜ao. Verifiquemos primeiro que se P0 existir ´e ´unico. Com efeito suponhamos que existiam P1, P2 tais que
H = {X ∈ Rn: d(X, P ) = d(X, P1)} = {X ∈ Rn: d(X, P ) = d(X, P2)}.
Ent˜ao, pela proposi¸c˜ao (D.3) P1, P2 ∈ r onde r ´e a ´unica recta
per-pendicular a H que passa por P . Por defini¸c˜ao de H, H passa pelos pontos m´edios M1, M2 dos segmentos [P P1] e [P P2]. Como r ∩ H ´e um
´
unico ponto, temos M1 = M2 e logo P1 = P2.
Suponhamos que H passa pelo ponto Q e est´a associado ao subespa¸co vectorial W ou seja que H = Q + W . Como Rn= W ⊕ W⊥, qualquer
vector u de Rn decomp˜oe-se de forma ´unica como u = w + v onde
w ∈ W e v ∈ W⊥. Logo um ponto P de Rn escreve-se de forma ´unica
como P = Q + w + v, com w ∈ W e v ∈ W⊥, tendo-se que P /∈ H se e s´o v 6= 0.
Suponhamos ent˜ao que P /∈ H, P = Q+w +v, e seja P0 = Q+w −v.
Como v 6= 0, P0 6= P . Dado T ∈ H, existe w1 ∈ W tal que T = Q + w1
e temos d(T, P )2 = ||T − P ||2 = ||w
1 − (w + v)||2 = ||w1 − w||2 −
2(w1 − w) · v + ||v||2 e an´alogamente d(T, P0)2 = ||w1 − (w − v)|| =
||w1 − w||2 + 2(w1 − w) · v + ||v||2. Como (w1 − w) · v = 0, temos
que est˜ao `a mesma distˆancia de P e P0. Pela proposi¸c˜ao anterior A ´e um hiperplano e logo H = A. ♦
(D.6) Observa¸c˜ao Deve-se notar que se P0 ´e o ponto sim´etrico do ponto P em rela¸c˜ao ao hiperplano H ent˜ao P ´e o ponto sim´etrico do ponto P0 em rela¸c˜ao ao hiperplano H.
(D.7) Defini¸c˜ao. Seja H um hiperplano de Rn. Chama-se reflex˜ao no
hiperplano H `a aplicac˜ao RH : Rn → Rn tal que RH(S) = ( S, S ∈ H S0, S /∈ H
onde para S /∈ H, S0 ´e o ponto sim´etrico de S em rela¸c˜ao a H.
(D.8) Proposi¸c˜ao. Seja H um hiperplano de Rn, a passar pelo ponto
Q e associado ao subespa¸co vectorial W . A reflex˜ao em H, RH, goza
das seguintes propriedades:
i) Se P = Q + w + v, com w ∈ W , v ∈ W⊥, RH(P ) = Q + w − v.
ii) RH ◦ RH = IdRn e em particular RH ´e bijectiva.
iii) Se P, S ∈ Rn, d(P, S) = d(RH(P ), RH(S)).
Demonstra¸c˜ao i) Dado um ponto P , P /∈ H, i) decorre da demonstra¸c˜ao da proposi¸c˜ao anterior. Se P ∈ H, ent˜ao i) decorre trivialmente de P = Q + w, w ∈ W . ii) ´e imediato usando i). Usando i) e as propriedades da norma, iii) tamb´em ´e imediato.♦
(D.9) Corol´ario. Seja H um hiperplano de Rnque passe por (0, ..., 0).
Considerando a estrutura de espa¸co vectorial de Rn, a aplica¸c˜ao RH ´e
uma transforma¸c˜ao linear.
Demonstra¸c˜ao Por i) da proposi¸c˜ao anterior ´e imediato que se Q ´e o ponto (0, ..., 0) ent˜ao a aplica¸c˜ao RH ´e uma transforma¸c˜ao linear.♦
(D.10) Corol´ario. Sejam H1, ..., Hm hiperplanos de Rn e RH1, ..., RHm
as reflex˜oes em H1, ...Hm respectivamente. Ent˜ao a fun¸c˜ao
f = RH1 ◦ ... ◦ RHm
verifica:
i) d(P, Q) = d(f (P ), f (Q)), ∀P, Q ∈ Rn.
ii) f ´e bijectiva.
Demonstra¸c˜ao A afirma¸c˜ao i) resulta imediatamente de (D.8), iii) e da defini¸c˜ao de composi¸c˜ao de fun¸c˜oes. As afirma¸c˜oes ii) e iii) resultam de uma reflex˜ao ser bijectiva, de a composi¸c˜ao de fun¸c˜oes bijectivas ser ainda bijectiva e de uma reflex˜ao ser a aplica¸c˜ao inversa de si pr´opria.
♦
(D.11) Defini¸c˜ao. Seja H um hiperplano associado ao espa¸co vectorial W . Um vector u 6= 0 diz-se um vector normal a H se u ∈ W⊥. Se u ∈ W⊥ e ||u|| = 1, u diz-se um vector unit´ario normal a H.
(D.12) Lema. Seja H um hiperplano de Rn que passa pelo ponto Q e
u um vector normal a H. Ent˜ao, para todo o X ∈ Rn,
RH(X) = X − 2
(X − Q) · u u · u u.
Demonstra¸c˜ao Seja X um ponto, X = Q + w + λu, com λ ∈ R, w ∈ W . De RH(X) = Q + w − λu, temos RH(X) = X − 2λu. Como w · u = 0
(w + λu) · u = λ(u · u), obtemos λ = (w+λu)·uu·u e o resultado. Observa¸c˜ao. Podemos enunciar (D.12) da seguinte forma:
Dado um hiperplano Q + W , a imagem de qualquer ponto X por meio de RH ´e o ponto X − 2z, onde z ´e a projec¸c˜ao ortogonal de X − Q
num vector normal a H.
O lema (D.12) d´a-nos uma forma pr´atica de calcular a express˜ao anal´ıtica da reflex˜ao num hiperplano.
Exemplo 1. Consideremos em R4 o hiperplano H definido (em rela¸c˜ao
ao referencial can´onico) pela equa¸c˜ao x − 2z + w = 3.
O subespa¸co W associado a H ´e definido pela equa¸c˜ao x − 2z + w = 0, donde, porque a base can´onica ´e ortonormada em rela¸c˜ao ao produto interno usual,
W = {(x, y, z, w) ∈ R4 : (x, y, z, w)·(1, 0, −2, 1) = 0} =< (1, 0, −2, 1) >⊥. Dado que
(W⊥)⊥= W, u := (1, 0, −2, 1) ´e um vector normal a H.
Temos tamb´em que o ponto Q := (3, 0, 0, 0) ∈ H, dado que as suas coordenadas s˜ao solu¸c˜ao de x − 2z + w = 3.
Temos ent˜ao, para qualquer X = (x, y, z, w) ∈ R4, X − Q = (x − 3, y, z, w). Como u · u = 6, usando (D.11), temos
RH(X) = (x, y, z, w) − 2
(x − 3, y, z, w) · (1, 0, −2, 1)
= (x, y, z, w) − 1 3(x − 3 − 2z + w)(1, 0, −2, 1) = = (x, y, z, w)−(x − 2z + w − 3 3 , 0, −2x + 4z − 2w + 6 3 , x − 2z + w − 3 3 ) = = (2x + 2z − w + 3 3 , y, 2x − z + 2w − 6 3 , −x + 2z + 2w + 3 3 ).
Logo RH ´e a aplica¸c˜ao definida por
RH(x, y, z, w) = ( 2x + 2z − w + 3 3 , y, 2x − z + 2w − 6 3 , −x + 2z + 2w + 3 3 ).
Exemplo 2. Consideremos, em R3, o plano
H := (1, 2, 0)+ < (1, 2, 0), (0, 1, 1) > . Temos
< (1, 2, 0), (0, 1, 1) >⊥= {(x, y, z) ∈ R3 : x+2y = 0 e y+z = 0} =< (−2, 1, −1) > . Logo u := (−2, 1, −1) ´e um vector normal ao plano H, tal que ||u||2 = 6.
Escolhendo agora um ponto Q pertencente a H podemos calcular a express˜ao anal´ıtica da reflex˜ao em H. Seja Q := (1, 2, 0). Ent˜ao, para qualquer X = (x, y, z) ∈ R3, X − Q = (x − 1, y − 2, z), donde RH(x, y, z) = (x, y, z) − 2 (x − 1, y − 2, z) · (−2, 1, −1) 6 (−2, 1, −1) = = (−x + 2y − 2z 3 , 2x + 2y + z 3 , −2x + y + 2z 3 ).
Portanto a reflex˜ao no plano H ´e a aplica¸c˜ao definida por RH(x, y, z) = ( −x + 2y − 2z 3 , 2x + 2y + z 3 , −2x + y + 2z 3 ).
Observa¸c˜ao. Da express˜ao de RH neste ´ultimo exemplo verificamos
que RH ´e uma aplica¸c˜ao linear, o que ´e justificado pelo facto de o ponto
(0, 0, 0) = (1, 2, 0) − (1, 2, 0) estar em H.
Exemplo 3 Consideremos em R2 os pontos P = (1, 1) e Q = (−1, 3).
Vamos determinar a express˜ao anal´ıtica da reflex˜ao na recta m medi-atriz de P e Q. O subespa¸co vectorial associado `a recta definida por P e Q ´e o subespa¸co < P − Q >=< (−1, 1) >, donde o vector (−1, 1) ´
e um vector normal a m. Por outro lado o ponto (0, 2) ´e o ponto m´edio do segmento [P Q]. Aplicando (D.12) obtemos ent˜ao, para todo o (x, y) ∈ R2
Rm(x, y) = (x, y) −
2
2((x, y − 2) · (−1, 1))(−1, 1) = (y − 2, x + 2). Observa¸c˜ao. Neste ´ultimo exemplo deve-se notar que n˜ao precis´amos de determinar a recta m. Em geral para determinar a express˜ao anal´ıtica da reflex˜ao no hiperplano H mediador de dois pontos P e Q, basta de-terminar o ponto m´edio de [P Q] e a dire¸c˜ao da recta l definida por P e Q. Com efeito para aplicar (D.12) basta-nos conhecer um ponto de
H e um vector normal a H, que neste caso s˜ao dados respectivamente pelo ponto m´edio de [P Q] e por um vector director da recta P Q.
Uma propriedade importante ´e o seguinte:
(D.14) Teorema Sejam P0, ..., Pk k + 1 pontos distintos de Rn, com
k ≥ 1, e Q0, Q1, ...Qk k + 1 pontos de Rn que satisfazem
d(Pi, Pj) = d(Qi, Qj), ∀i, j ∈ {0, 1, ..., k}.
Ent˜ao existe uma aplica¸c˜ao f : Rn→ Rn tal que:
(i) f ´e uma reflex˜ao num hiperplano ou uma composi¸c˜ao de k + 1 ou menos reflex˜oes em hiperplanos;
(ii) f (Pi) = Qi, ∀i ∈ {0, 1, ..., k}.
Demonstra¸c˜ao. Notemos primeiro que, se Pi = Qi, ∀i ∈ {0, 1, ..., k}, a
afirma¸c˜ao ´e trivial. Com efeito neste caso toma-se f = Id, observando-se que para qualquer hiperplano H RH ◦ RH = Id.
Vamos fazer a demonstra¸c˜ao por indu¸c˜ao no n´umero r = k + 1 de pontos Pi .
Se r = 2 e P0 = Q0, P1 = Q1, j´a vimos que f = Id satisfaz o
teorema. Suponhamos que P0 6= Q0 ou P1 6= Q1. Sem perda de
generalidade podemos supor que P0 6= Q0. Consideremos a reflex˜ao
RH, onde H ´e o hiperplano mediador de P0 e Q0. Temos RH(P0) = Q0.
Se RH(P1) = Q1, ent˜ao temos uma aplica¸c˜ao como quer´ıamos. Se
RH(P1) 6= Q1, seja G o hiperplano mediador de RH(P1) e Q1. Ent˜ao
Q0 ∈ G. Com efeito, por (D.10), iii) temos
d(P0, P1) = d(RH(P0), RH(P1)).
Assim temos, porque por hip´otese d(P0, P1) = d(Q0, Q1) e porque
RH(P0) = Q0,
d(Q0, Q1) = d(Q0, RH(P1)).
Logo RG◦RH(P0) = Q0e RG◦RH(P1) = Q1, donde a aplica¸c˜ao RG◦RH
´
e uma aplica¸c˜ao como pretend´ıamos.
Suponhamos agora o teorema demonstrado para r pontos e vamos demonstr´a-lo para r + 1 pontos. Sejam ent˜ao P0, ..., Pr r + 1 pontos
distintos de Rn e Q0, ...Qr r + 1 pontos de Rn que satisfazem
d(Pi, Pj) = d(Qi, Qj), ∀i, j ∈ {0, 1, ...r}.
Pela hip´otese de indu¸c˜ao, considerando os r pontos P0, ..., Pr−1 e os r
pontos Q0, ...Qr−1 existe uma aplica¸c˜ao g : Rn→ Rn satisfazendo:
(i) g ´e uma reflex˜ao ou uma composi¸c˜ao de r ou menos reflex˜oes; (ii) g(Pi) = Qi, ∀i ∈ {0, 1, ..., r − 1}.
Se g(Pr) = Qr, g ´e a aplica¸c˜ao pretendida. Se g(Pr) 6= Qr,
consid-eremos o hiperplano H mediador de g(Pr) e Qr. Ent˜ao Q1, ..., Qr−1 ∈
{0, 1, ..., r − 1}. Dado que g ´e uma composi¸c˜ao de reflex˜oes, por (D.10) temos
d(Pi, Pr) = d(g(Pi), g(Pr)), ∀i ∈ {0, 1, ..., r − 1}.
Ent˜ao, uma vez que pela hip´otese de indu¸c˜ao g(Pi) = Qi para i ∈
{0, 1, ..., r − 1}, obtemos
d(Qi, Qr) = d(Qi, g(Pr)), ∀i ∈ {0, 1, ..., r − 1}
e portanto Q1, ..., Qr−1 ∈ H.
Agora ´e imediato verificar que a aplica¸c˜ao f := RH ◦ g verifica i)
e ii) do enunciado do teorema relativamente aos pontos P0, ..., Pr e
Q0, ..., Qr. ♦
Exemplo 4. Consideremos em R2 os pontos A = (0, 0), B = (1, 1) e
os pontos C = (0, 2), D = (−1, 3). Dado que d(A, B) = √2 = d(C, D), pelo teorema (D.14) existe uma reflex˜ao ou composi¸c˜ao de reflex˜oes f tal que f (A) = C, f (B) = D.
Para construir uma tal aplica¸c˜ao f , podemos aplicar o processo usado para a demonstra¸c˜ao deste teorema.
Constroi-se em primeiro lugar a reflex˜ao Rmna recta m mediatriz de
A e C. Se Rm(B) = D, teremos f = Rm. Se Rm(B) 6= D constroi-se
a reflex˜ao na recta l mediatriz de Rm(B) e D e f ser´a a composi¸c˜ao
Rl◦ Rm.
Calculando (utilizando por exemplo (D.12), cf. o exemplo 3) obt´ em-se que
Rm(x, y) = (x, −y + 2),
donde Rm(B) = (1, 1) 6= D. Determinamos ent˜ao a reflex˜ao na recta l
mediatriz de Rm(B) e D. De novo, calculando obtemos
Rl(x, y) = (y − 2, x + 2), ∀(x, y) ∈ R2.
Ent˜ao teremos
Rl◦ Rm(x, y) = Rl(x, −y + 2) = (−y, x + 2), ∀(x, y) ∈ R2.
A aplica¸c˜ao f = Rl◦ Rm satisfaz assim i) de (D.14) e ´e tal que f (A) =
C, f (B) = D.
2. Isometrias
(I.1) Defini¸c˜ao. Uma aplica¸c˜ao f : Rn→ Rn diz-se uma isometria (ou mo¸c˜ao r´ıgida) se para quaisquer pontos P , Q de Rn se tem
d(P, Q) = d(f (P ), f (Q)).
Observa¸c˜ao. Muitos autores definem isometria como sendo uma aplica¸c˜ao bijectiva tal que para quaisquer pontos P , Q de Rn se tem d(P, Q) = d(f (P ), f (Q)). No entanto, como veremos adiante, o facto de uma
isometria ser bijectiva pode ser demonstrado usando apenas o facto de uma isometria manter a distˆancia entre pontos.
(I.2) Exemplos de isometrias:
Reflex˜ao num hiperplano. A reflex˜ao num hiperplano H ´e uma isome-tria (ver a proposi¸c˜ao (D.8)).
Pelo corol´ario (D.10) qualquer composi¸c˜ao de um n´umero finito de reflex˜oes em hiperplanos tamb´em ´e uma isometria.
Transla¸c˜oes. Seja v um vector de Rn. A aplica¸c˜ao T
v : Rn → Rn
definida por Tv(P ) = P +v, para todo o ponto P de Rn´e uma isometria
a que se d´a o nome de transla¸c˜ao por meio de v.
Se v = (v1, ..., vn), ent˜ao, para qualquer ponto X = (x1, ..., xn) ∈ Rn,
temos Tv(X) = X + v = (x1+ v1, ..., xn+ vn).
Invers˜ao. Seja P um ponto de Rn. Qualquer ponto X de Rn pode ser escrito de forma ´unica como X = P + v, onde v ´e um vector de Rn. A aplica¸c˜ao ρP : Rn → Rn definida por ρP(P + v) = P − v,
para todo o ponto X = P + v de Rn ´e uma isometria a que se d´a
o nome de invers˜ao de centro em P . Alguns autores chamam `a invers˜ao de centro P reflex˜ao em P (n˜ao confundir com a reflex˜ao num hiperplano!).
Uma invers˜ao (de centro em P ) em R2 chama-se uma meia-volta
(de centro em P ).
Exemplos. 1) Em R3 a transla¸c˜ao por meio do vector v = (3, −1,12) ´
e a aplica¸c˜ao Tv tal que
Tv((x, y, z)) = (x + 3, y − 1, z +
1
2), ∀(x, y, z) ∈ R
3.
2) Em R3 a invers˜ao de centro em P = (1, 2, 0) faz corresponder a cada ponto X = P + (X − P ) o ponto P − (X − P ) e logo a invers˜ao de centro em P ´e a aplica¸c˜ao ρP tal que
ρP((x, y, z)) = ρP(1 + (x − 1), 2 + (y − 2), 0 + z)) =
= (1−(x−1), 2−(y −2), −z)) = (−x+2, −y +4, −z), ∀(x, y, z) ∈ R3. (I.3) Proposi¸c˜ao. Se f e g s˜ao isometrias de Rn ent˜ao a composi¸c˜ao f ◦ g tamb´em ´e uma isometria.
Demonstra¸c˜ao. Sejam f e g duas isometrias. Dados dois pontos P , Q de Rn temos, porque g ´e isometria, d(P, Q) = d(g(P ), g(Q)) e, porque f ´e isometria,
donde
d(f ◦ g(P ), f ◦ g(Q)) = d(P, Q). Logo f ◦ g ´e uma isometria.♦
Com esta proposi¸c˜ao podemos obter: (I.4) Mais exemplos de isometrias
Reflex˜ao com deslize. Se H for um hiperplano de Rn associado ao subespa¸co vectorial W e v 6= 0 for um vector de W `a isometria Tv◦ RH
d´a-se o nome de reflex˜ao com deslize ou reflex˜ao deslizante em H por meio de v.
Exemplo. Em R2 ´e f´acil verificar que a reflex˜ao Rr na recta r :=
(0, 0)+ < (0, 1) > ´e a aplica¸c˜ao definida por
Rr((x, y)) = (−x, y), ∀(x, y) ∈ R2.
Ent˜ao a reflex˜ao com deslize em r por meio do vector v = (0,√2) ´e a aplica¸c˜ao definida por
Rr((x, y)) = (−x, y +
√
2), ∀(x, y) ∈ R2.
(I.5) Proposi¸c˜ao Se H = P + W ´e um hiperplano de Rn associado ao subespa¸co vectorial W e v ´e um vector de W ent˜ao Tv◦ RH = RH◦ Tv.
Demonstra¸c˜ao. Seja X ∈ Rn um ponto. Podemos escrever X = P +
w + u onde w ∈ W, u ∈ W⊥. Por (D.8, i) temos
Tv ◦ RH(X) = Tv(P + w − u) = P + v + w − u.
Por outro lado Tv(X) = P + v + w + u. Dado que v ∈ W , temos que
Tv(X) = P + (v + w) + u, onde v + w ∈ W, u ∈ W⊥, donde, mais uma
vez por (D.8, i),
RH ◦ Tv(X) = P + v + w − u.
Ent˜ao, para todo o ponto X ∈ Rn,
Tv ◦ RH(X) = RH ◦ Tv(X)
e logo
Tv◦ RH = RH ◦ Tv. ♦
(I.6) Defini¸c˜ao. Dada uma aplica¸c˜ao f : A → A de um conjunto A nele pr´oprio, um elemento a diz-se um ponto fixo de f se f (a) = a. Se a ´e um ponto fixo de f diz-se que f fixa a.
(I.7) Proposi¸c˜ao. Se uma isometria f fixa n + 1 pontos P0,..., Pn que
Demonstra¸c˜ao. Seja X ∈ Rn. Como f ´e isometria e f (P
i) = Pi, ∀i ∈
{0, .., n}, temos
d(X, Pi) = d(f (X), Pi), ∀i ∈ {0, .., n}.
Dado que os pontos P0, ..., Pn geram Rn como espa¸co afim, pela
proposi¸c˜ao (D.4) temos necess´ariamente f (X) = X. Logo f = Id. ♦ (I.8) Teorema. Qualquer isometria f de Rn pode ser escrita como composi¸c˜ao de n + 1 ou menos reflex˜oes.
Mais precisamente se f fixar p + 1 pontos que geram um subespa¸co de F de dimens˜ao p < n, f pode ser escrito como composi¸c˜ao de n − p reflex˜oes em hiperplanos H1,...,Hn−p tais que F ⊂ H1∩ ... ∩ Hn−p.
Demonstra¸c˜ao. Vamos ver que qualquer isometria de Rn se decomp˜oe como composi¸c˜ao de n + 1 ou menos reflex˜oes. Seja f uma isome-tria e sejam P0, ..., Pn n + 1 pontos que geram Rn como espa¸co afim.
Sendo, para cada i ∈ {0, ..., n}, Qi := f (Pi), temos, porque f ´e
isome-tria, d(Pi, Pj) = d(Qi, Qj), ∀i, j ∈ {0, ..., n}. Assim usando o teorema
(D.14), sabemos que existe uma isometria g, que ´e uma composi¸c˜ao de n+1 ou menos reflex˜oes tal que g(Pi) = Qi, ∀i ∈ {0, ..., n}. Por (D.10),
g−1 ´e tamb´em uma isometria. Ora g−1◦ f (Pi) = Pi, ∀i ∈ {0, ..., n},
donde por (I.7) g−1◦ f = Id. Daqui temos g ◦ g−1◦ f = g ◦ Id ou seja
f = g. Logo de facto f pode ser escrito como composi¸c˜ao de n + 1 ou menos reflex˜oes.
A segunda parte do teorema pode ser obtida analisando a demon-stra¸c˜ao de (D.14). ♦
Com este teorema podemos reduzir o estudo das propriedades das isometrias ao estudo das propriedades da composi¸c˜ao de reflex˜oes. Temos imediatamente:
(I.9) Corol´ario. Toda a isometria ´e bijectiva e a aplica¸c˜ao inversa de uma isometria ´e uma isometria.
Demonstra¸c˜ao Seja f uma isometria de Rn. Pelo teorema (I.8) existem
p hiperplanos H1, ..., Hp, com p ≤ n + 1 tais que
f = RH1 ◦ ... ◦ Hp.
Pela proposi¸c˜ao (D.10) temos que uma composi¸c˜ao de reflex˜oes ´e uma isometria bijectiva cuja aplica¸c˜ao inversa ´e tamb´em uma composi¸c˜ao de reflex˜oes e logo temos imediatamente o resultado.♦
(I.10) Observa¸c˜ao. Uma vez que IdRn ´e uma isometria temos como
consequˆencia de (I.3) e (I.9) que o conjunto de todas as isometrias de Rn algebrizado com a composi¸c˜ao de aplica¸c˜oes ´e um grupo. Costuma-se indicar este grupo por Iso(Rn).
De (I.8) tem-se que Iso(Rn) ´e gerado pelas reflex˜oes em hiperplanos
de Rn.
Este grupo n˜ao ´e comutativo.
(I.11) Proposi¸c˜ao. O subconjunto T de Iso(Rn) formado por todas
as transla¸c˜oes ´e um subgrupo de Iso(Rn).
Demonstra¸c˜ao. Dado um grupo G e um subconjunto A ⊂ G, para ver se A ´e um subgrupo temos de verificar que A 6= ∅, que A ´e fechado para a opera¸c˜ao do grupo e que A cont´em todos os inversos de elementos em A.
Neste caso temos T 6= ∅ pois por exemplo a aplica¸c˜ao Id, que ´e a transla¸c˜ao por meio do vector nulo, pertence a T . Dadas duas transla¸c˜oes Tv, Tw, temos, para qualquer X ∈ Rn,
Tv◦ Tw(X) = Tv(X + w) = X + w + v = Tv+w(X),
pelo que
Tv◦ Tw = Tv+w
e logo T ´e fechado para a composi¸c˜ao de aplica¸c˜oes.
Analogamente se verifica que Tv−1 = T−v, mostrando que a aplica¸c˜ao
inversa de uma transla¸c˜ao ´e ainda uma transla¸c˜ao. Logo T ´e um subgrupo de Iso(Rn).♦
(I.12) Lema. A imagem de um hiperplano por meio de uma isometria ´
e um hiperplano.
Demonstra¸c˜ao. Seja H um hiperplano de Rn. Pela proposi¸c˜ao (D.5), H pode ser descrito como o hiperplano mediador de dois pontos P , P0 ou seja
H = {X ∈ Rn : d(X, P ) = d(X, P0)}. Se f ´e uma isometria temos ent˜ao
f (H) ⊂ H0 = {Y ∈ Rn: d(Y, f (P )) = d(Y, f (P0))}.
Logo f (H) est´a contido no hiperplano H0. Como f−1 ´e uma isome-tria, temos tamb´em f−1(H0) ⊂ H e logo H0 = f ◦f−1(H0) ⊂ f (H) ⊂ H0 donde f (H) = H0 e H = f−1(H0). ♦
(I.13) Proposi¸c˜ao. A imagem de um subespa¸co afim F de Rn de dimens˜ao p por meio de uma isometria f ´e um subespa¸co afim de dimens˜ao p.
Demonstra¸c˜ao. Seja F um subespa¸co afim de dimens˜ao p. Ent˜ao F ´e intersec¸c˜ao de n − p hiperplanos H1∩ ... ∩ Hn−p .
Dada uma isometria f temos ent˜ao f (F ) = f (H1∩ ... ∩ Hn−p). Como
f ´e injectiva f (H1∩ ... ∩ Hn−p) = f (H1) ∩ ... ∩ f (Hn−p). Dado que, pelo
temos que f (F ) ´e a intersec¸c˜ao (n˜ao vazia) de n − p hiperplanos e logo f (F ) ´e um subespa¸co afim de dimens˜ao d maior ou igual a p.
Como f−1 ´e tamb´em uma isometria tamb´em F = f−1(f (F )) ´e um subespa¸co afim de dimens˜ao d0maior ou igual a d. Visto que a dimens˜ao de F ´e p temos ent˜ao d = p. ♦
(I.14) Proposi¸c˜ao. Toda a isometria de Rn fica ´unicamente
determi-nada pelas imagens de n + 1 pontos n˜ao contidos num mesmo hiper-plano.
Demonstra¸c˜ao. Temos de mostrar que se f , g s˜ao isometrias de Rntais
que f (Pi) = g(Pi), i = 0, ..., n, sendo P0,...,Pn n + 1 pontos que geram
Rn como espa¸co afim, ent˜ao f = g. Dado que, por (I.9), g ´e bijectiva, para ver que f = g basta mostrar que g−1◦ f = IdRn.
Uma vez que f (Pi) = g(Pi), temos g−1◦ f (Pi) = Pi, ∀i ∈ {0, ..., n}.
Como g−1 ´e uma isometria, g−1 ◦ f tamb´em o ´e , donde, por (I.7), g−1◦ f = IdRn .♦
Como casos particulares desta proposi¸c˜ao temos:
(I.15) Proposi¸c˜ao. Toda a isometria de R2 fica ´unicamente determi-nada pelas imagens de trˆes pontos n˜ao colineares.
(I.16) Proposi¸c˜ao. Toda a isometria de R3 fica ´unicamente
determi-nada pelas imagens de quatro pontos n˜ao complanares.
(I.17) Proposi¸c˜ao. Sejam P0,..., Pn n + 1 pontos que geram Rn como
espa¸co afim e Q0, ..., Qn outro conjunto de n + 1 pontos tais que
d(Pi, Pj) = d(Qi, Qj), ∀i, j ∈ {0, ..., n}. Ent˜ao existe uma ´unica
isome-tria f : Rn→ Rn tal que f (P
i) = Qi, ∀i ∈ {0, ..., n}.
Demonstra¸c˜ao. A existˆencia da isometria ´e o teorema (D.14), enquanto que a unicidade decorre da proposi¸c˜ao (I.14).♦
(I.18) Proposi¸c˜ao. Seja f uma isometria de Rn, F um subespa¸co afim de Rne sejam P0, ...Pd d+1 pontos que geram F como subespa¸co afim.
Ent˜ao f (F ) ´e o subespa¸co afim gerado por f (P0), ..., f (Pd).
Demonstra¸c˜ao. Sejam P0, ...Pd d + 1 pontos que geram F como
sube-spa¸co afim e seja F0 ⊂ f (F ) o subespa¸co afim gerado por f (P0), ..., f (Pd).
Suponhamos que F0 6= f (F ). Ent˜ao tamb´em f−1(F0) 6= f−1◦ f (F ) = F . Como f−1 ◦ f (P
i) = Pi, ∀i ∈ {0, ..., d}, conclu´ımos que os pontos
P0, ...Pdn˜ao geram F como subespa¸co afim, o que contradiz a hip´otese.
(I.19) Proposi¸c˜ao. Seja f uma isometria de Rn que fixa os pontos
P0, ..., Pd ∈ Rn. Ent˜ao f fixa todos os pontos do subespa¸co afim F
gerado por P0, ..., Pd( ou seja f|F = IdF).
Demonstra¸c˜ao. Pela proposi¸c˜ao (I.18) f (F ) ´e o subespa¸co afim gerado por f (P0) = P0, ..., f (Pd) = Pd, ou seja F e logo para qualquer ponto
P ∈ F , f (P ) ´e um ponto de F tal que d(P, Pi) = d(f (P ), Pi), para
i ∈ {0, ..., d}. Se f (P ) 6= P , ter´ıamos que F ⊂ H onde H ´e o hiperplano mediador de P e f (P ), o que ´e absurdo, dado que P /∈ H. Logo f (P ) = P e portanto f|F = IdF. ♦
(I.20) Corol´ario. Se uma isometria f de Rn fixar n pontos P
0, ...Pn−1
que geram um hiperplano H, ent˜ao f ou ´e a identidade ou ´e a reflex˜ao no hiperplano H.
Demonstra¸c˜ao Suponhamos que f fixa n pontos P0, ...Pn−1 que geram
um hiperplano H e que f 6= Id. Por (I.19) todos os pontos do hiper-plano H definido por P0, ...Pn−1s˜ao pontos fixos de f . Seja S um ponto
tal que S /∈ H. Se S n˜ao pertence a H, como P0, ...Pn−1, S geram Rn
e f n˜ao ´e a aplica¸c˜ao identidade, temos de ter f (S) 6= S. Como f ´e isometria, e f (P0) = P0,..., f (Pn−1) = Pn−1, temos
d(f (S), P0) = d(S, P0), ..., d(f (S), Pn−1) = d(S, Pn−1)
donde o hiperplano H definido por P0, ...Pn−1 ´e o hiperplano mediador
do segmento [Sf (S)] e portanto f (S) ´e o ponto sim´etrico de S em rela¸c˜ao a H.
Logo necess´ariamente f ´e a reflex˜ao no hiperplano H definido por P0, ...Pn−1. ♦
(I.21) Proposi¸c˜ao. (i) Seja g : Rn → Rn uma isometria tal que
g(0Rn) = 0
Rn. Ent˜ao g ´e uma aplica¸c˜ao linear ortogonal.
(ii) Rec´ıprocamente qualquer aplica¸c˜ao linear ortogonal g ´e uma isometria.
Demonstra¸c˜ao. i) Seja g : Rn → Rn uma isometria tal que g(0 Rn) =
0Rn. Dado que g(0) = 0, e dado que cada ponto X se escreve de uma
´
unica forma como X = 0 + v, podemos considerar g como a aplica¸c˜ao de espa¸cos vectoriais (g : Rn → Rn) que a um vector v = X − 0
faz corresponder o vector g(v) := g(X) − 0. Para ver que g ´e linear ortogonal basta-nos ver que g(u) · g(v) = u · v, para todos os vectores u, v de Rn (ver as notas sobre aplica¸c˜oes ortogonais).
Observemos que, sendo X = 0 + u, Y = 0 + v, se tem ||u|| = d(X, 0), ||v|| = d(Y, 0), ||v − u|| = d(X, Y ). Dado que g ´e isometria e g(0) = 0, temos ent˜ao
||u|| = d(X, 0) = d(g(X), 0) = ||g(u)||, ||v|| = d(Y, 0) = d(g(Y ), 0) = ||g(v)||,
||v − u|| = d(X, Y ) = d(g(X), g(Y )) = ||g(v) − g(u)||. Ent˜ao temos
(∗) ||v − u||2− ||v||2− ||u||2 = ||g(v) − g(u)||2− ||g(v)||2− ||g(u)||2. Dado que para quaisquer vectores w1, w2 ∈ Rn se tem
−2w1· w2 = ||w1− w2||2− ||w1||2− ||w2||2,
da igualdade (*) obtemos u · v = g(u) · g(v), donde g de facto ´e uma aplica¸c˜ao ortogonal.
ii) Se g : Rn → Rn´e uma aplica¸c˜ao qualquer, ent˜ao podemos considerar
g como a aplica¸c˜ao que a cada ponto X = 0 + v faz corresponder g(X) = 0 + g(v). Neste caso, como g ´e ortogonal, g ´e linear e preserva as normas dos vectores
Dados dois pontos P = 0 + u, Q = 0 + w, temos ent˜ao
d(P, Q) = ||w − v|| = ||g(w − v)|| = ||g(w) − g(v)|| = d(g(P ), g(Q)), pelo que g ´e uma isometria.♦
Observa¸c˜ao. Outra forma de demonstrar que uma isometria g tal que g(0Rn) = 0
Rn ´e uma aplica¸c˜ao linear ortogonal seria mostrar que g se
escreve como composic˜ao de reflex˜oes em hiperplanos contendo 0Rn e
usar o facto de uma reflex˜ao num hiperplano que passe por 0 ser uma aplica¸c˜ao ortogonal (ver (D.9)) e o facto de a composi¸c˜ao de aplica¸c˜oes ortogonais ser uma aplica¸c˜ao ortogonal.
(I.22) Corol´ario-Defini¸c˜ao. Toda a isometria f : Rn → Rn pode ser
escrita, de forma ´unica, como f = Tv ◦ φ, onde Tv ´e uma transla¸c˜ao
e φ uma aplica¸c˜ao linear ortogonal. A φ d´a-se o nome de aplica¸c˜ao ortogonal associada a f.
Demonstra¸c˜ao. Vejamos primeiro existe no m´aximo uma decomposi¸c˜ao de f nas condi¸c˜oes pretendidas.
Suponhamos que se pode escrever f = Tv ◦ φ = Tu ◦ ψ, com φ, ψ
aplica¸c˜oes ortogonais. Ent˜ao temos f (0) = Tv(φ(0)) = Tu(ψ(0)). Dado
que φ, ψ s˜ao aplica¸c˜oes lineares, φ(0) = ψ(0) = 0 e logo conclu´ımos que u = v. Mas ent˜ao de Tv◦ φ = Tu◦ ψ temos tamb´em φ = ψ.
Portanto existe no m´aximo uma decomposi¸c˜ao de f como no enun-ciado. Para mostrar a existˆencia, consideremos o ponto f (0) e o vector w = 0−f (0). Ent˜ao a isometria Tw◦f ´e tal que Tw◦f (0) = Tw(P ) = 0,
donde por (I.21) a isometria φ := Tw ◦ f ´e uma aplica¸c˜ao ortogonal.
Dado que T−w◦ φ = f , obtemos uma decomposi¸c˜ao como pretendido.
(I.23) Defini¸c˜ao. Seja f uma isometria de Rne φ a aplica¸c˜ao ortogonal associada a f . Diz-se que f ´e uma isometria directa se det φ = 1 e que f ´e uma isometria inversa se det φ = −1.
Observa¸c˜ao. Nalguns contextos, especialmente em F´ısica, d´a-se o nome de mo¸c˜oes r´ıgidas ou isometrias apenas `as isometrias directas. (I.24) Exemplo 1. Seja v um vector de Rn e f := T
v a transla¸c˜ao por
meio de v. Ent˜ao a decomposi¸c˜ao de f como em (I.22) ´e f = Tv◦ Id.
Assim a aplica¸c˜ao ortogonal associada a uma transla¸c˜ao ´e a aplica¸c˜ao identidade e uma transla¸c˜ao ´e uma isometria directa.
Exemplo 2. Consideremos a a aplica¸c˜ao f : R2 → R2tal que f (x, y) =
(6 + y, 3 + x), que ´e uma isometria. A decomposi¸c˜ao de f como em (I.22) ´e f = T(6,3) ◦ g, onde g : R2 → R2 ´e a aplica¸c˜ao tal que
g((x, y)) = (y, x).
Dado que a matriz A de g em rela¸c˜ao `a base can´onica ´e A = 0 1 1 0
, temos |A| = −1 e logo f ´e uma isometria inversa.
(I.25) Proposi¸c˜ao. Sejam f, g duas isometrias de Rne φ, ψ as aplica¸c˜oes
ortogonais associadas a f e g respectivamente. Ent˜ao: i) dado um vector v = Q − 0, tem-se φ(v) = f (Q) − f (0); ii) dado um vector v = Q − P , tem-se φ(v) = f (Q) − f (P ); iii) a aplica¸c˜ao ortogonal associada a f ◦ g ´e φ ◦ ψ;
iv) a aplica¸c˜ao ortogonal associada a f−1 ´e φ−1.
Demonstra¸c˜ao. Pela demostra¸c˜ao de (I.22) temos φ = T0−f (0) ◦ f ,
donde, vendo φ como aplica¸c˜ao de espa¸co afim, tem-se para um ponto Q,
φ(Q) = T0−f (0)◦ f (Q) = f (Q) + ((0 − f (0)) = 0 + (f (Q) − f (0))
e logo vendo φ como aplica¸c˜ao de espa¸co vectorial, tem-se para v = Q − 0, φ(v) = (f (Q) − f (0)). Assim temos i) demonstrado.
Quanto a ii) notemos que dado um vector v = Q−P , podemos escrever v = (Q − 0) − (P − 0), donde porque φ ´e linear se tem
φ(v) = φ((Q − 0) − (P − 0)) = φ(Q − 0) − φ(P − 0).
Por i) temos φ(Q − 0) = f (Q) − f (0) e φ(P − 0) = f (P ) − f (0) donde se obt´em φ(v) = (f (Q) − f (0)) − (f (P ) − f (0)) = f (Q) − f (P ). iii) Consideremos a aplica¸c˜ao ortogonal τ associada a f ◦ g. Por i), dado um vector v = Q − 0 temos
τ (v) = f ◦g(Q)−f ◦g(0) = f (g(Q))−f (g(0)) = φ(g(Q)−g(0)) = φ(ψ(v)) = φ◦ψ(v) e logo, como v ´e um vector arbitr´ario, tem-se τ = φ ◦ ψ.
iv) Consideremos a aplica¸c˜ao ortogonal τ associada a f−1. Como f−1◦ f = Id e a aplica¸c˜ao ortogonal associada `a identidade ´e a pr´opria identidade, de iii) obtemos τ ◦ φ = Id, e logo τ = φ−1.♦
Dado que por (I.25, iii) a aplica¸c˜ao ortogonal associada a uma com-posi¸c˜ao de isometrias ´e a composic˜ao das aplica¸c˜oes ortogonais asso-ciadas a cada uma das isometrias temos imediatamente o seguinte: (I.26) Corol´ario. A composi¸c˜ao de isometrias directas ´e uma isometria directa.
A composi¸c˜ao de um n´umero par de isometrias inversas ´e uma isometria directa.
A composi¸c˜ao de um n´umero ´ımpar de isometrias inversas ´e uma isome-tria inversa.
A isometria inversa de uma isometria directa ´e uma isometria directa. A isometria inversa de uma isometria inversa ´e uma isometria inversa. (I.27) Corol´ario. O conjunto de todas as isometrias directas ´e um subgrupo de Iso(Rn).
(I.28) Forma normal de uma reflex˜ao. Seja H = P + W um hiperplano de Rn. J´a vimos que dado um ponto X = P +w+u, com w ∈
W, u ∈ W⊥, se tem RH(X) = P + w − u. Por ii) de (I.25) temos ent˜ao
que a aplica¸c˜ao ortogonal φ associada a RH ´e a aplica¸c˜ao que a cada
vector v = w + u = X − P associa o vector RH(X) − RH(P ) = w − u.
Se B = (e1, ..., en) for uma base de Rn tal que < e1, ..., en−1 >= W e
< en >= W⊥, ent˜ao M (φ; B) = 1 0 ... ... ... 0 0 1 ... ... ... 0 0 0 1 ... ... 0 0 ... ... ... ... 0 ... ... ... ... ... ... 0 ... ... ... 1 0 0 ... ... ... ... −1
Conclu´ımos assim que detφ = −1 e logo uma reflex˜ao num hiper-plano ´e uma isometria inversa.
Visto que uma transla¸c˜ao ´e uma isometria directa, conclu´ımos que tamb´em qualquer reflex˜ao com deslize ´e uma isometria inversa.
(I.29) Forma normal de uma aplica¸c˜ao ortogonal. ´
E poss´ıvel demonstrar que se φ : Rn → Rn´e uma aplica¸c˜ao ortogonal,
ent˜ao existe uma base B = (e1, ...., en) em rela¸c˜ao `a qual a matriz de
M (φ; B) = Idp −Ids B1 B2 . . . Bt onde Idk ´e a matriz identidade k × k, e Bi =
cos θi sin θi − sin θi cos θi onde θi ∈ [0, 2π[, θ 6= π.
Os n´umeros p e s podem ser 0 e p ´e exactamente a multiplicidade geom´etrica de 1 como valor pr´oprio de φ, s ´e exactamente a multipli-cidade geom´etrica de −1 como valor pr´oprio de φ.
(I.30) ˆAngulos geom´etricos e isometrias.
Em Rn uma semi-recta com origem num ponto P a passar por um ponto Q ´e o conjunto
{P + λ−→P Q : λ ∈ R, λ ≥ 0}.
Dados trˆes pontos n˜ao colineares P, Q, R o ˆangulo geom´etrico de v´ertice P definido por Q e R, ∠(QP R), ´e a uni˜ao da semi-recta com origem em P a passar por Q com a semi-recta com origem em P a passar por R. A medida de ∠(QP R), m(∠(QP R)) ´e definida com sendo o ˆangulo dos vectores ∠(−→P Q,−→P R).
Tem-se (verificar!):
Proposi¸c˜ao. Uma isometria de Rn conserva as medidas dos ˆangulos
geom´etricos.
3. Estudo das isometrias de R2
Considerando em R2 a estrutura de espa¸co afim usual com a distˆancia entre pontos definida pela norma dada pelo produto interno usual, va-mos estudar as isometrias de R2. Em primeiro lugar vamos ”traduzir” algumas das proposi¸c˜oes j´a estudadas para o caso particular de R2. Temos:
(J.1) Proposi¸c˜ao.(ver (D.4)) Em R2 um ponto fica ´unicamente deter-minado pelas suas distˆancias a trˆes pontos n˜ao colineares.
(J.2) Proposi¸c˜ao.(ver (D.5)) Em R2, para todo o ponto P exterior a
uma recta r, existe um e um s´o ponto P0 tal que r ´e a mediatriz do segmento [P P0].
(J.3) Proposi¸c˜ao. (ver (I.14)) Toda a isometria de R2 fica ´unicamente
determinada pelas imagens de trˆes pontos n˜ao colineares.
(J.4) Proposi¸c˜ao. (ver (I.17)) Sejam P0, P1, P2 trˆes pontos n˜ao
co-lineares de R2 e Q
0, Q1, Q2 outro conjunto de trˆes pontos tais que
d(Pi, Pj) = d(Qi, Qj), ∀i, j ∈ {0, 1, 2}. Ent˜ao existe uma e uma s´o
isometria g : R2 → R2 tal que g(P
i) = Qi, ∀i ∈ {0, 1, 2}.
(J.5) Proposi¸c˜ao. (ver (I.7) e (I.20) ) Se uma isometria f de R2 tem
trˆes pontos fixos n˜ao colineares ´e a identidade. Se tiver dois pontos fixos P ,Q ou ´e a identidade ou ´e a reflex˜ao na recta r definida por P , Q.
(J.6) Teorema. (ver (I.8)) Toda a isometria f de R2 pode ser escrita
como composi¸c˜ao de trˆes ou menos reflex˜oes.
(J.7) Corol´ario. O grupo das isometrias de R2 ´e gerado pelo conjunto
das reflex˜oes.
(J.8) Exemplos de isometrias de R2
Transla¸c˜oes. (Ver (I.2)) Seja v um vector de R2. A transla¸c˜ao por meio de v ´e a aplica¸c˜ao Tv : R2 → R2 definida por Tv(P ) = P + v, para
todo o ponto P de R2 e ´e uma isometria directa.
Se v = (a, b), tem-se Tv((x, y)) = (x + a, y + b), ∀(x, y) ∈ R2. Em
particular se v 6= (0, 0), Tv n˜ao tem pontos fixos.
Reflex˜ao numa recta. A reflex˜ao numa recta l definida em (D.7) ´e uma isometria inversa.
Por defini¸c˜ao de reflex˜ao, os pontos fixos de Rl s˜ao exactamente os
pontos da recta l.
Reflex˜ao com deslize. (ver (I.4)) Se l := P + U e v ∈ U, v 6= 0 ent˜ao a reflex˜ao com deslize ao longo da recta r por meio de v ´e a isometria Tv◦ Rl (que ´e igual a Rr◦ Tv por (I.5)).
A aplica¸c˜ao ortogonal associada a Tv ◦ Rl ´e a aplica¸c˜ao ortogonal
associada a Rl e portanto uma reflex˜ao com deslize ´e uma isometria
inversa.
Uma reflex˜ao com deslize n˜ao tem pontos fixos. O ´ultimo exemplo ´e:
Rota¸c˜ao de centro C e ˆangulo θ. Consideremos a aplica¸c˜ao or-togonal φ : R2 → R2, cuja matriz em rela¸c˜ao `a base can´onica ´e
A = cos θ − sin θ sin θ cos θ
, com θ ∈ [0, 2π[, ou seja a rota¸c˜ao de centro em (0, 0) e ˆangulo θ.
Dado um ponto C definimos agora uma aplica¸c˜ao ρ(C, θ) : R2 → R2
por
ρ(C, θ)(P ) = C + φ(v), ∀P = C + v, com v um vector de R2.
Verifica-se f´acilmente que ρ(C, θ) ´e uma isometria (verificar!), a que se d´a o nome de rota¸c˜ao de centro em C e ˆangulo θ.
A rota¸c˜ao ρ(C, π) tem um nome especial: meia-volta de centro em C. Para todo o vector v ∈ R2, temos ρ(C, π)(C + v) = (C − v).
Note-se que uma rota¸c˜ao ρ(C, θ) 6= Id tem um ´unico ponto fixo: o ponto C. Com efeito se P = C + v, v 6= 0, fosse um ponto fixo de ρ(C, θ), ter´ıamos P = C + v = C + φ(v) = ρ(C, θ)(P ) pelo que φ(v) = v. Portanto v seria um vector pr´oprio de φ associado ao valor pr´oprio 1 contra a defini¸c˜ao de φ. ´Obviamente a aplica¸c˜ao ortogonal associada a ρ(C, θ) ´e φ e ρ(C, θ) ´e uma isometria directa.
Se ρ(C, α) e ρ(C, β) forem duas rota¸c˜oes de centro em C ent˜ao ρ(C, α) ◦ ρ(C, β) ´e a rota¸c˜ao de centro em C e ˆangulo γ onde γ ∈ [0, 2π[ ´
e congruente com α + β , (mod 2π). Com efeito temos por defini¸c˜ao ρ(C, α)◦ρ(C, β)(C+v) = ρ(C, α)(C+φ(v)) = C+ψ(φ(v)) = C+ψ◦φ(v), onde ψ, φ s˜ao as aplica¸c˜oes ortogonais tais que
M (ψ; b.c.) = cos α − sin α sin α cos α e M (φ; b.c.) = cos β − sin β sin β cos β Como M (ψ ◦ φ; b.c.) = M (ψ; b.c.) M (φ; b.c.) temos
M (ψ◦φ; b.c.) = cos α cos β − sin α sin β − cos α sin β − sin α cos βα cos α sin β + sin α cos β cos α cos β − sin α sin β
Das igualdades trigonom´etricas obtemos ent˜ao M (ψ ◦ φ; b.c.) = cos(α + β) − sin(α + β) sin(α + β) cos(α + β)
donde temos ρ(C, α)◦ρ(C, β) = ρ(C, γ), onde (
γ = α + β se α + β < 2π γ = α + β − 2π se α + β ≥ 2π Em particular, dado que Id ´e a rota¸c˜ao de ˆangulo 0 e centro em C, a
isometria inversa da rota¸c˜ao de centro em C e ˆangulo θ ´e a rota¸c˜ao de centro em C e ˆangulo 2π − θ.
(J.9) Proposi¸c˜ao. Se uma isometria f de R2 tiver um ´unico ponto fixo C, ent˜ao f ´e uma rota¸c˜ao de centro C.
Demonstra¸c˜ao. Suponhamos que f tem um ´unico ponto fixo C e seja φ a aplica¸c˜ao ortogonal associada a f (ver (I.22)). Por defini¸c˜ao de φ e porque f (C) = C temos para todo o Q = C + w, f (Q) = C + φ(w). Necess´ariamente φ 6= Id donde, pela defini¸c˜ao de rota¸c˜ao e pela classifica¸c˜ao das aplica¸c˜oes ortogonais de R2, basta-nos mostrar que 1 n˜ao ´e valor pr´oprio de φ. Ora se w fosse um vector pr´oprio associado ao valor pr´oprio 1, ter´ıamos f (C + w) = C + w, donde o ponto C + w seria um ponto fixo de f distinto de C, contradizendo a hip´otese de f ter um ´unico ponto fixo.
Logo se f tem um ´unico ponto fixo C, f ´e uma rota¸c˜ao de centro em C.♦
(J.10) Corol´ario. Se l e m s˜ao duas rectas distintas de R2concorrentes
num ponto P , ent˜ao Rl◦ Rm ´e uma rota¸c˜ao de centro em P .
Demonstra¸c˜ao. Suponhamos que C ´e ponto fixo de Rl◦ Rm. Ent˜ao
temos Rl◦ Rm(C) = C e logo porque Rl◦ Rl = Id temos Rm(C) =
Rl(C). Se Rl(C) 6= C temos ent˜ao tamb´em Rm(C) 6= C, pelo que
por defini¸c˜ao de reflex˜ao, ter´ıamos que as rectas distintas m, l seriam ambas as mediatrizes do segmento de extremos C e Rl(C) = Rm(C), o
que ´e absurdo.
Se Rl(C) = C temos ent˜ao tamb´em Rm(C) = C pelo que por
defini¸c˜ao de reflex˜ao C ∈ l e C ∈ m, ou seja C = P . Como P ´e ponto fixo de Rl◦ Rm temos ent˜ao que Rl◦ Rm tem o ´unico ponto fixo
P e portanto pela proposi¸c˜ao anterior ´e uma rota¸c˜ao de centro em P .♦ (J.11) Proposi¸c˜ao. Seja f 6= Id uma rota¸c˜ao de R2 de centro em P e seja m uma recta a passar por P . Ent˜ao:
i) existe uma recta l a passar por P e tal que f = Rl◦ Rm;
ii) existe uma recta l0 a passar por P e tal que f = Rm◦ Rl0.
Demonstra¸c˜ao i) Seja S um ponto de m, S 6= P . Como f tem P como ´unico ponto fixo, temos f (S) 6= S. Seja l a mediatriz do seg-mento [Sf (S)]. Como f ´e isometria e f (P ) = P temos que d(P, S) = d(P, f (S)), donde P ∈ l, por defini¸c˜ao de l. Se Rl for a reflex˜ao em
l, por defini¸c˜ao de reflex˜ao temos que Rl(S) = f (S), Rl(f (S)) = S e
Rl(P ) = P .
Consideremos a isometria h := Rl◦ f . Ent˜ao h(P ) = Rl(f (P )) = P
e h(S) = Rl(f (S)) = S, donde h fixa os pontos distintos P e S e
portanto por (J.5) ou h = Id ou h ´e a reflex˜ao na recta definida por P e S, ou seja a recta m.
Como Rl◦ Rl = Id temos de h = Rl◦ f ,
Se h fosse a aplica¸c˜ao identidade ter´ıamos f = Rl, contradizendo o
facto de f ter um ´unico ponto fixo. Logo h = Rm e f = Rl◦ Rm. Assim
prov´amos a parte i) da proposi¸c˜ao.
Para provar ii) consideremos a isometria f−1. Como f−1 ´e tamb´em uma rota¸c˜ao de centro em P podemos aplicar a parte i) da proposi¸c˜ao a f−1 e `a recta m. Assim obtemos que existe uma recta l0 a passar por P e tal que f−1 = Rl0 ◦ Rm. Ent˜ao temos
f = (f−1)−1 = (Rl0 ◦ Rm)−1 = R−1m ◦ R−1
l0 .
Dado que a isometria inversa de uma reflex˜ao ´e a pr´opria reflex˜ao temos ent˜ao f = Rm◦ Rl0. ♦
(J.12) Proposi¸c˜ao. i) A composi¸c˜ao Rm ◦ Rl de duas reflex˜oes em
rectas paralelas l e m ´e uma transla¸c˜ao por meio de um vector 2v ortogonal `a direc¸c˜ao das rectas e tal que se P ∈ l, p + v ∈ m.
ii) Dada uma transla¸c˜ao Tv e uma recta l = P + < u > cuja direc¸c˜ao
´
e ortogonal a v existem rectas m e m0 tais que tal que Tv = Rm ◦
Rl = Rl ◦ Rm0 (onde se l = P + < u >, m = P + 1
2v+ < u > e
m0 = P − 12v+ < u >).
Demonstra¸c˜ao. i) Sejam l, m duas rectas paralelas. Se l = m, Rm◦Rl =
Id e logo Rm ◦ Rl ´e a transla¸c˜ao pelo vector nulo (que ´e ortogonal a
qualquer vector de R2.)
Suponhamos que l 6= m e seja r uma recta perpendicular a l e m. Sejam P e Q respectivamente os pontos de intersec¸c˜ao de r com l e m. Ent˜ao consideremos o vector v = Q − P (que ´e ortogonal ao subespa¸co
vectorial associado a l e m). Temos
Rm◦ Rl(P ) = Rm(P ) = Rm(Q − v) = Q + v = P + 2v = T2v(P ),
Rm◦Rl(Q) = Rm◦Rl(P +v) = Rm(P −v) = Rm(Q−2v) = Q+2v = T2v(Q).
Consideremos um ponto S, S ∈ l, S 6= P , digamos S = P + u. Ent˜ao
Rm◦Rl(S) = Rm(S) = Rm(P +u) = Rm(Q+u−v) = Q+u+v = S+2v = T2v(S).
Como as imagens dos trˆes pontos n˜ao colineares P, Q, S por meio de T2v e por meio de Rm ◦ Rl s˜ao as mesmas e uma isometria de R2 fica
unicamente determinada pelas imagens de trˆes pontos n˜ao colineares, (por (J.3)), conclu´ımos que
T2v = Rm◦ Rl.
ii) Para demonstrar ii) basta efectuar os c´alculos. Com efeito, seja l = P + < u >, m = P + 12v+ < u > com u · v = 0. Para qualquer ponto X escrito como X = P + λu + w, com w ∈< u >⊥, temos (ver (D.8)) Rl(X) = Rl(P + λu + w) = P + λu − w = P + 1 2v − 1 2v + λu − w. Temos ent˜ao Rm◦ Rl(X) = Rm(Rl(X)) = Rm(P + 1 2v + λu − 1 2v − w) Dado que v ∈< u >⊥ e P +12v ∈ m Rm(P + 1 2v+λu− 1 2v−w) = P + 1 2v+λu+ 1 2v+w = P +λu+w+v = X+v Logo de facto Rm◦ Rl = Tv.
An´alogamente se verifica que Rl◦ Rm0 = Tv ♦
Exemplo Seja v = (4, 2) e P = (0, 1). Para decompormos a transla¸c˜ao Tv como Tv = Rl◦ Rm onde m ´e uma recta a passar por P podemos
usar a proposi¸c˜ao anterior.
Dado que < v >⊥=< (−1, 2) >, basta-nos escolher m = P + < (−1, 2) >, l = P +1
2v+ < (−1, 2) >= (2, 2)+ < (−1, 2) > . Se quisessemos decompor Tv como Tv = Rm◦ R0l escolher´ıamos
l0 = P − 1
2v+ < (−1, 2) >= (−2, 0)+ < (−1, 2) > .
(J.13) Proposi¸c˜ao. Seja v um vector de R2, v 6= 0 e l := P + U uma recta de R2. Ent˜ao Tv◦ Rl´e uma reflex˜ao com deslize ao longo da recta
m paralela a l que passa por P + 12v, se v /∈ U⊥, e ´e uma reflex˜ao em
m se v ∈ U⊥.
Demonstra¸c˜ao. Suponhamos que v ∈ U⊥. Ent˜ao por (J.12) podemos escrever Tv = Rm◦ Rl onde m = P + 12v + U e logo temos
Tv◦ Rl= Rm◦ Rl◦ Rl= Rm.
Suponhamos que v /∈ U⊥. Ent˜ao uma decomposi¸c˜ao de v = u + w
com u ∈ U , w ∈ U⊥ ´e tal que u 6= 0. Podemos escrever Tv = Tu◦ Tw e
logo
Tv◦ Rl= Tu◦ (Tw ◦ Rl).
Dado que w ∈ U⊥, pela primeira parte da demonstra¸c˜ao Tw◦ Rl ´e a
reflex˜ao na recta
m = P + 1
2w + U = P + 1
2(u + w) + U.
Dado que u 6= 0, u ∈ U , por defini¸c˜ao de reflex˜ao com deslize temos que
Tu◦ (Tw◦ Rl) = Tu ◦ Rm
´
e uma reflex˜ao com deslize. ♦
A proposi¸c˜ao ( J.13) pode ser tamb´em demonstrada da seguinte forma:
Demonstra¸c˜ao alternativa de ( J.13). Se v pertence ao subespa¸co vec-torial U , ent˜ao, por defini¸c˜ao, Tv ◦ Rl ´e uma reflex˜ao com deslize (ao
longo da recta l por meio de v).
Suponhamos ent˜ao que v /∈ U e consideremos a decomposi¸c˜ao v = u + w, com u ∈ U , w ∈ U⊥. Notemos que w 6= 0, pois v /∈ U e que u = 0 se e s´o v ∈ U⊥. Se m for a recta m := P + 12v + U , podemos considerar a isometria g := Tu ◦ Rm. Se u = 0, g ´e a reflex˜ao Rm
e se u 6= 0 g ´e a reflex˜ao com deslize ao longo de m por meio de u. Para demonstrar a proposi¸c˜ao basta-nos ent˜ao mostrar que Tv◦ Rl = g
e para isso, por (J.3), basta-nos ver que as imagens de trˆes pontos n˜ao colineares por meio de g e por meio de Tv ◦ Rl s˜ao as mesmas.
Consideremos P , outro ponto S ∈ l, digamos S = P + u1 e o ponto
Q := P + 12v. Notemos que, como v /∈ U , P, Q, S n˜ao s˜ao colineares. Al´em disso, observemos que Q ∈ m, que P = Q − 12(u + w) e que S = Q − 12(u + w) + u1 = Q + (u1− 12(u + w)).
Uma vez que P, S ∈ l, temos Tv◦ Rl(P ) = P + v, Tv◦ Rl(S) = S + v.
Como Q = P + 12(u + w), e u · w = 0, Rl(Q) = P +12(u − w), donde Tv ◦ Rl(Q) = P + 1 2(u − w) + v = P + u + 1 2v = Q + u. Por outro lado
Tu◦Rm(P ) = Tu◦Rm(Q− 1 2(u+w)) = Tu(Q− 1 2(u−w)) = Q+ 1 2(u+w) = P +v,
Tu◦ Rm(Q) = Tu(Q) = Q + u, Tu◦Rm(S) = Tu◦Rm(Q+u1− 1 2(u+w)) = Tu(Q+u1− 1 2u+ 1 2w) = Q+u1+ 1 2u+ 1 2w = S+v. Logo Tv◦ Rl= Tu◦ Rm. ♦
(J.14) Teorema de classifica¸c˜ao das isometrias de R2. Toda a
isometria de R2 ´e ou a identidade, ou uma reflex˜ao ou uma rota¸c˜ao ou
uma reflex˜ao com deslize ou uma transla¸c˜ao.
Demonstra¸c˜ao. Seja f uma isometria de R2. Se a isometria f tem mais do que um ponto fixo por (J.5) f ´e ou a identidade, ou uma reflex˜ao.
Se f tiver um ´unico ponto fixo C por (J.9) f ´e uma rota¸c˜ao.
Suponhamos agora que f n˜ao tem pontos fixos e seja S um ponto, l a mediatriz de [Sf (S)]. Ent˜ao Rl◦ f (S) = S. Observemos que, como
f n˜ao tem pontos fixos, f 6= Rl e portanto Rl◦ f 6= Id. Como Rl◦ f
tem pelo menos o ponto fixo S ou Rl◦ f ´e uma reflex˜ao numa recta m
que passa por S, ou Rl◦ f ´e uma rota¸c˜ao de centro S, ρ(S, θ).
Se Rl ◦ f = Rm, ent˜ao necess´ariamente m e l s˜ao rectas paralelas.
Com efeito em R2 duas rectas n˜ao paralelas intersectam-se num ponto
T e logo se m e l n˜ao fossem paralelas de (J.10) ter´ıamos que f = Rl◦Rm
era uma rota¸c˜ao de centro em T , donde T era um ponto fixo de f . Logo m e l s˜ao paralelas e portanto por (J.12), f ´e uma transla¸c˜ao.
Se Rl◦ f = ρ(S, θ), por (J.11), se n ´e a recta paralela a l a passar por
S, existe uma recta t a passar por S tal que ρ(S, θ) = Rn◦ Rt. Ent˜ao
temos f = Rl◦ Rn◦ Rt. Como l e n s˜ao paralelas e l 6= n, por (J.12)
Rl◦ Rn ´e uma transla¸c˜ao Tv por meio de um vector v 6= 0 ortogonal ´a
direc¸c˜ao de n (e l). Observemos que n e t n˜ao s˜ao paralelas, pois tˆem um ponto em comum e s˜ao distintas. Logo v n˜ao ´e ortogonal `a direc¸c˜ao de t, e portanto, por (J.13), temos que f = (Rl◦ Rn) ◦ Rt = Tv ◦ Rt ´e
uma reflex˜ao com deslize.♦
Observa¸c˜ao. Existem muitas outras formas de demonstrar este teo-rema.
(J.15) Observa¸c˜ao. Como consequˆencia deste teorema e dos factos estudados anteriormente obtemos as seguinte chaves para classificar as isometrias f 6= Id de R2:
Isometria ´e directa sem pontos fixos ⇒ Transla¸c˜ao Isometria ´e directa com pontos fixos ⇒ Rota¸c˜ao Isometria ´e inversa com pontos fixos ⇒ Reflex˜ao
(J.16) Exemplos. 1) Consideremos a isometria f : R2 → R2 tal que f (x, y) = (3 5x + 4 5y + 2, 4 5x − 3 5y + 1).
A isometria f escreve-se como f = Tv ◦ φ onde v = (2, 1) e φ ´e a
aplica¸c˜ao ortogonal tal que φ(x, y) = (3 5x + 4 5y, 4 5x − 3 5y), ∀(x, y) ∈ R 2 . Vamos determinar os pontos fixos de φ. Temos que
φ(x, y) = (x, y) ⇔ ( 3 5x + 4 5y = x 4 5x − 3 5y = y ⇔ ( 2 5x − 4 5y = 0 4 5x − 8 5y = 0 .
Este sistema ´e poss´ıvel e indeterminado, donde φ ´e a reflex˜ao na recta s definida pela equa¸c˜ao 25x −45y = 0, ou seja a recta (0, 0)+ < (1,12) >. Dado que f = T(2,1) ◦ φ e (2, 1) ∈ < (1,12) >, f ´e a reflex˜ao com
deslize ao longo de s por meio do vector (2, 1).
2) Consideremos a isometria f : R2 → R2 tal que
f ((x, y)) = (−y + 3, −x + 1). Temos que f ((x, y)) = (x, y) ⇔ ( −y + 3 = x −x + 1 = y ⇔ ( x + y = 3 x + y = 1
Como este sistema ´e imposs´ıvel, f n˜ao tem pontos fixos. Dado que a express˜ao anal´ıtica de f n˜ao ´e da forma f (x, y) = (x + c, y + d) com c, d constantes f n˜ao ´e uma transla¸c˜ao e portanto f ´e uma reflex˜ao com deslize, donde ´e poss´ıvel escrever f = Tw◦ Rl, com w um vector
director de l.
Para determinarmos w podemos notar que, uma vez que por (I.5) Tw◦ Rl = Rl◦ Tw, temos que f ◦ f = T2w. Ora
f ◦ f ((x, y)) = f ((−y + 3, −x + 1)) =
= (−(−x + 1) + 3, −(−y + 3) + 1) = (x + 2, y − 2) = T(2,−2)((x, y)).
Conclu´ımos ent˜ao que w = 12(2, −2) = (1, −1). De f = Tw◦ Rl ⇔ T−w◦ f = Rl temos ent˜ao que
Rl((x, y)) = (−y + 2, −x + 2). Ent˜ao Rl((x, y)) = (x, y) ⇔ ( −y + 2 = x −x + 2 = y ⇔ ( x + y = 2 x + y = 2
pelo que a recta l ´e a recta definida pela equa¸c˜ao x + y = 2, ou seja a recta
(2, 0)+ < (−1, 1) > .
Logo f ´e a reflex˜ao com deslize ao longo da recta (2, 0)+ < (−1, 1) > por meio do vector (1, −1).
Observa¸c˜ao. Poder´ıamos ter determinado w e l da seguinte forma. A isometria f escreve-se como f = Tv◦ φ onde v = (3, 1) e φ ´e a aplica¸c˜ao
ortogonal tal que φ(x, y) = (−y, −x). Temos que
φ(x, y) = (x, y) ⇔ ( −y = x −x = y ⇔ ( x + y = 0 x + y = 0
Ent˜ao φ fixa todos os pontos da recta r definida pela equa¸c˜ao x+y = 0 ou seja da recta (0, 0)+ < (1, −1) >, pelo que φ ´e a reflex˜ao em r.
Dado que f = T(3,1) ◦ φ e (3, 1) /∈ < (1, −1) >⊥, por (J.13), f ´e
uma reflex˜ao com deslize ao longo da recta l := (0, 0) + 1 2(3, 1)+ < (1, −1) >= ( 3 2, 1 2)+ < (1, −1) > . Para determinar w, basta observar que se Q in l, Rl(Q) = Q, donde
f (Q) = Tw◦ Rl(Q) = Tw(Q).
Dado que f ((32,12)) = (52,−12 ), obtemos w = f (Q) − Q = (1, −1). Logo f ´e a reflex˜ao com deslize ao longo da recta
(3 2,
1
2)+ < (−1, 1) > (= (2, 0)+ < (−1, 1) >) por meio do vector (1, −1).
3) Seja f a rota¸c˜ao de centro em P = (0, 2) e ˆangulo 32π. Dado que a rota¸c˜ao φ de centro em (0, 0) e ˆangulo φ ´e definida pela matriz
M (φ; b.c.) = cos 3 2π − sin 3 2π sin32π cos32π = 0 1 −1 0
temos φ((a, b)) = (b, −a), ∀(a, b) ∈ R2, donde para qualquer ponto X = (x, y) ∈ R2 se tem
ρ(P,3
2π)(X) = (0, 2)+φ((x, y−2)) = (0, 2)+(y−2, −x) = (y−2, −x+2). Consideremos a recta m = (3, 2)+ < (1, 0) >. Dado que m passa por P , pela proposi¸c˜ao (J.11) existe uma recta l a passar por P e tal que Rl◦ Rm = ρ(P,32π). Para determinarmos a recta l, podemos utilizar
que l ´e a mediatriz do segmento de extremidades S e ρ(P,32π)(S), onde S ∈ l.
Tomando S = (3, 2), temos ρ(P,32π)(S) = (0, −1). Ent˜ao l passa pelo ponto P e dado que ´e perpendicular `a recta definida por S e ρ(P,32π)(S) est´a associada ao subespa¸co vectorial
< (3, 2) − (0, −1) >⊥=< (3, 3) >⊥=< (1, −1) >, ou seja
l = (0, 2)+ < (1, −1) > . Observa¸c˜ao. Neste ´ultimo exemplo temos
∠((1, 0), (1, −1)) = arc cos||(1, 0)|| ||(1, −1)||(1, 0) · (1, −1) = arc cos √ 2 2 = π 4. Como det 1 1 0 −1
= −1 ent˜ao o ˆangulo orientado das duas rectas ´ e ∠or(l, m) = π − π 4 = 3π 4 e 2∠or(l, m) = 3π 2 ´
e o ˆangulo da rota¸c˜ao.
Podemos estudar mais algumas propriedades da composi¸c˜ao de isome-trias:
(J.17) Proposi¸c˜ao. A composi¸c˜ao de duas rota¸c˜oes ρ(C, α) e ρ(D, β) ´
e uma transla¸c˜ao se α + β ≡ 0, (mod 2π) e ´e uma rota¸c˜ao se α + β 6≡ 0, (mod 2π).
Demonstra¸c˜ao. Em primeiro lugar notemos que ρ(C, α)◦ρ(D, β) ´e uma isometria directa (ver (I.26)). Logo f := ρ(C, α) ◦ ρ(D, β) ´e ou uma transla¸c˜ao ou uma rota¸c˜ao. Dado que as aplica¸c˜oes ortogonais associ-adas a ρ(C, α) e ρ(D, β) s˜ao as rota¸c˜oes de centro em (0, 0) e ˆangulos α e β respectivamente, a aplica¸c˜ao ortogonal associada a ρ(C, α)◦ρ(D, β) ´
e a rota¸c˜ao de ˆangulo γ onde γ ∈ [0, 2π[ ´e tal que γ ≡ α + β, (mod 2π). Se α + β 6≡ 0, (mod 2π), temos γ 6= 0 e logo f , sendo uma isometria directa, ´e uma rota¸c˜ao de ˆangulo γ. Se α + β ≡ 0, (mod 2π), ent˜ao a
aplica¸c˜ao ortogonal associada a f ´e a aplica¸c˜ao identidade e portanto necess´ariamente f ´e uma transla¸c˜ao.♦
(J.18) Corol´ario A composi¸c˜ao de duas rota¸c˜oes ρ(C, α) e ρ(D, β) com centros em pontos distintos ´e uma transla¸c˜ao n˜ao trivial se α + β ≡ 0, (mod 2π).
Demonstra¸c˜ao. Pela proposi¸c˜ao anterior ρ(C, α)◦ρ(D, β) ´e uma transla¸c˜ao. Dado que ρ(C, α) ◦ ρ(D, β)(D) = ρ(C, α)(D) 6= D (porque C 6= D e o ´
unico ponto fixo de ρ(C, α) ´e C), necess´ariamente a transla¸c˜ao ´e n˜ao trivial. ♦
(J.19) Corol´ario Um subgrupo G de Isom (R2) que contenha duas
rota¸c˜oes ρ(C, α) e ρ(D, β) com centros em pontos distintos cont´em necess´ariamente uma transla¸c˜ao n˜ao trivial.
Demonstra¸c˜ao. Dado que G ´e subgrupo, G cont´em em particular ρ(C, α) ◦ ρ(D, β), ρ(C, α)−1◦ ρ(D, β)−1 e ρ(C, α) ◦ ρ(D, β) ◦ ρ(C, α)−1◦
ρ(D, β)−1.
Se α + β ≡ 0, (mod 2π), o corol´ario anterior diz-nos que ρ(C, α) ◦ ρ(D, β) ´e uma transla¸c˜ao n˜ao trivial.
Se α+β 6≡ 0 ent˜ao ρ(C, α)◦ρ(D, β) e ρ(C, α)−1◦ρ(D, β)−1s˜ao ambas
rota¸c˜oes de ˆangulos respectivamente γ e 2π − γ, onde γ ∈ [0, 2π[ ´e tal que γ ≡ α +β, (mod 2π), donde ρ(C, α)◦ρ(D, β)◦ρ(C, α)−1◦ρ(D, β)−1
´
e uma transla¸c˜ao (por (J.17)) e al´em disso ´e n˜ao trivial. Com efeito se esta transla¸c˜ao fosse trivial ter´ıamos
ρ(C, α) ◦ ρ(D, β) ◦ ρ(C, α)−1◦ ρ(D, β)−1 = Id e portanto ρ(C, α) ◦ ρ(D, β) = ρ(D, β) ◦ ρ(C, α). Em particular ter´ıamos ρ(C, α) ◦ ρ(D, β)(D) = ρ(D, β) ◦ ρ(C, α)(D) ⇐⇒ ⇐⇒ ρ(C, α)(D) = ρ(D, β)(ρ(C, α)(D)),
pelo que (ρ(C, α)(D)) seria um ponto fixo de ρ(D, β). Como C 6= D, (ρ(C, α)(D)) 6= D e portanto (ρ(C, α)(D)) n˜ao pode ser um ponto fixo de ρ(D, β). ♦
(J.20) Para conclu´ır vamos apenas enumerar v´arias propriedades das isometrias de R2 que decorrem f´acilmente dos factos anteriormente
es-tudados:
1) Se f ´e uma isometria tal que a aplica¸c˜ao ortogonal associada ´e a identidade, f ´e uma transla¸c˜ao.
2) Se f ´e uma isometria cuja aplica¸c˜ao ortogonal associada ´e uma rota¸c˜ao de ˆangulo θ e centro em (0, 0) ent˜ao f ´e uma rota¸c˜ao de centro nalgum ponto D e ˆangulo θ.
3) O centro C de uma rota¸c˜ao f pertence `a mediatriz de [Xf (X)], para qualquer ponto X ∈ R2, X 6= C.
4)Qualquer transla¸c˜ao Tv pode ser escrita como Tv = ρC ◦ ρD onde
ρC, ρD s˜ao meias-voltas de centros em pontos C, D tais que C − D = 1
2v. Al´em disso um dos dois pontos C ou D pode ser escolhido
ar-bitr´ariamente.
4. Alguns subgrupos do grupo das isometrias de R2
Subgrupo gerado por uma transla¸c˜ao n˜ao trivial. Consideremos uma transla¸c˜ao Tv por meio de um vector v 6= 0. Temos que Tv−1 = T−v
e o conjunto
Tv = {Tvm : m ∈ Z}
(em que Tm
v , para m < 0 ´e T −m
−v ) ´e um subgrupo que cont´em Tv e ´e o
menor subgrupo que cont´em Tv, ou seja ´e o subgrupo gerado por Tv.
Notemos que Tv ´e um conjunto infinito numer´avel.
Subgrupo gerado por uma reflex˜ao. Dada uma reflex˜ao Rl, como
R−1l = Rl, temos que o conjunto {Id, Rl} ´e um subgrupo.
Subgrupo gerado por uma rota¸c˜ao. Consideremos uma rota¸c˜ao ρ de centro em C e ˆangulo θ. Temos que ρn = ρ(C, nθ) e ρ−1 =
ρ(C, 2π − θ). Se o subgrupo c´ıclico gerado por ρ ´e finito, ent˜ao existem m1, m2 ∈ Z tais que ρm1 = ρm2 e logo existe n ∈ Z tal que ρn = Id.
Como ρn= ρ(C, nθ), temos nθ = 2kπ, para algum k ∈ Z e logo θ ´e um
m´ultiplo racional de 2π. Reciprocamente, se θ ´e um m´ultiplo racional de 2π, o subgrupo c´ıclico gerado por ρ ´e finito.
Subgrupo gerado por uma reflex˜ao com deslize. Seja G = Tv◦
Rm = Rm ◦ Tv uma reflex˜ao com deslize ao longo de uma recta m
por meio do vector v. Temos G−1 = T−v ◦ Rm = Rm ◦ T−v e G2 =
(Tv◦ Rm) ◦ (Rm◦ Tv) = T2v e logo o subgrupo gerado por G ´e infinito
porque cont´em o subgrupo gerado por T2v.
Subgrupos finitos. Suponhamos que G ´e um subgrupo finito do grupo das isometrias de R2. G n˜ao pode conter nenhuma transla¸c˜ao, nem
nenhuma reflex˜ao com deslize porque qualquer destas isometrias gera um subgrupo infinito. Pela mesma raz˜ao G s´o pode conter rota¸c˜oes de ˆ
angulo θ em que θ seja um m´ultiplo racional de 2π.
Suponhamos que G cont´em rota¸c˜oes. Se G 6= {Id}, ent˜ao G cont´em uma rota¸c˜ao n˜ao trivial, ρC,α. Suponhamos que ρD,β ´e outra rota¸c˜ao
em G tal que D 6= C. Ent˜ao G sendo um subgrupo cont´em ρ−1C,α◦ ρ−1D,β◦ ρC,α◦ ρD,β, que ´e uma transla¸c˜ao n˜ao trivial. Como G ´e finito, isto ´e
imposs´ıvel e portanto toda a rota¸c˜ao de G tem centro C. Seja ent˜ao φ, com 0 < φ o menor ˆangulo tal que ρC,φ ∈ G e seja ρC,ψ outra rota¸c˜ao de
G, com ψ > φ. Vˆe-se f´acilmente que ψ tem de ser um m´ultiplo inteiro de φ e logo todas as rota¸c˜oes de G pertencem ao subgrupo c´ıclico gerado por ρC,φ.
Em particular um subgrupo finito que s´o contenha rota¸c˜oes ´e um grupo c´ıclico de ordem n gerado por uma rota¸c˜ao.
Suponhamos agora que o subgrupo finito G cont´em pelo menos uma reflex˜ao R e sejam ρ, ..., ρn as rota¸c˜oes distintas de G.
Como ρ ◦ R, ρ2◦ R, ..., ρn◦ R s˜ao isometrias inversas, e G n˜ao cont´em
reflex˜oes com deslizes por ser finito, conclu´ımos que as n isometrias ρ ◦ R, ρ2◦ R, ..., ρn◦ R s˜ao reflex˜oes. Portanto G cont´em pelo menos n
reflex˜oes.
Sejam R1, ...Rm as reflex˜oes de G, em que m ≥ n. Dado que
R1◦ R1, R2◦ R1, ..., Rm◦ R1 s˜ao isometrias directas em G, temos que
necess´ariamente
{R1◦ R1, R2◦ R1, ..., Rm◦ R1} = {ρ, ..., ρn}
pelo que m = n.
Logo G = {ρ, ..., ρn, ρ ◦ R, ρ2◦ R, ..., ρn◦ R} e G ´e exactamente o
grupo gerado por uma rota¸c˜ao e uma reflex˜ao, que se chama um grupo diedral.
Acab´amos de dar uma demonstra¸c˜ao informal do:
Teorema de Leonardo Todo o subgrupo finito do grupo das isome-trias de R2 ´e um grupo c´ıclico ou um grupo diedral.
Observa¸c˜ao O nome Leonardo vem de Leonardo da Vinci, que estudou simetrias em rela¸c˜ao com problemas de arquitectura.