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SEÇÃO CONCEITO

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Academic year: 2021

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INTRODUÇÃO

Embora atualmente os preceitos morais não sejam tão rígidos, ainda existe certa censura social. A miséria e ausência paterna também são elementos que levam à parturiente á angustia e ao nervosismo.

Isso não significa que a influência do estado puerperal não seja um elemento principal na caracterização do infanticídio, mas além dele a “causa honoris”, ou seja, desde que a conduta da parturiente seja decorrente de motivo de honra, temos como exemplo a Legislação Italiana. A “honoris causa” também influência na pratica do crime tendo caráter acessório na caracterização do infanticida.

A legislação Penal brasileira através dos estatutos repressivos de 1830, 1890 e 1940, têm conceituado o crime de infanticídio de formas diversas.

A conduta que se encerra no tipo vem contida no preceito primário do artigo 123. “Matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: pena – detenção de 2 (dois) á 6 (seis) anos” . Assim, o infanticídio em face da legislação Penal vigente, não constitui mais forma típica privilegiada de homicídio, mas delito autônomo com denominação jurídica própria.

Entretanto, o infanticídio não deixa de ser, doutrinariamente, forma de homicídio privilegiado, em que o legislador leva em consideração a situação particular da mulher que vem a matar o próprio filho em condições especiais.

O presente trabalho busca responder a indagações sobre o crime de infanticídio e esmiuçar questões como o concurso de pessoas, ou a co-autoria, verificando as possibilidades, bem como o posicionamento doutrinário e os artigos de Lei, além disso, o trabalho ora explanado tem por objetivo demonstrar o que ocorre com a parturiente no “estado puerperal”, bem como a perícia médico legal identificando os aspectos que a levam a cometer tal delito. Cabe a co-autoria? Essas e outras questões serão mais bem abordadas nas páginas seguintes.

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SEÇÃO 1

1.1 CONCEITO

O infanticídio é, inegavelmente e antes de tudo, um delito social, praticado, na quase-totalidade dos casos, por mães solteiras e mulheres abandonadas pelos maridos e pelos amásios.

Raríssimas vezes, para não dizer nenhuma, têm sido acusadas deste crime mulheres casadas e felizes, a qual via de regra, dá a luz cercadas do amparo do esposo e do apoio moral dos familiares.

Responde por infanticídio a progenitora que, após o nascimento do filho, não presta os cuidados indispensáveis à criança.

O infanticídio é considerado um delictum expectum quando praticado pela parturiente sob a influência do estado puerperal.

O estado puerperal existe sempre, mas nem sempre ocasiona perturbações emocionais na mulher que possam levar a morte do próprio filho. O processo de parto, com suas dores, a perda de sangue e o enorme esforço muscular, pode determinar facilmente uma momentânea conturbação da consciência.

Para que se caracterize o crime de infanticídio, mister se faz três elementos, que se trate de feto nascente ou de infante recém-nascido, que tenha havido vida extra-uterina, e que, a morte seja intencional.

O infanticídio ocorre durante ou logo após o parto, portanto o inicio do estado puerperal é equivalente ao inicio do parto, esse começa com a dilatação e tem seu fim com a expulsão da placenta.

O crime de infanticídio é cometido no lapso temporal entre o inicio do parto e o término do estado puerperal, esse término não é explicito no código Penal, portanto cabe ao juiz determiná-lo de acordo com as perícias médicas.

Analisando a definição de crime de infanticídio, de uma maneira mais ampla, percebe-se que percebe-se trata de um tipo especial de homicídio, com sujeito ativo a mãe, sujeito passivo o neonato o nascente, a condição especifica e, que possui uma pena mais amena devido a tal condição especial.

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Segundo o disposto no artigo 123 do código penal podemos definir o1 infanticídio como a ocisão da vida do ser nascente ou do neonato, realizada pela própria mãe, que se encontra sob a influência do estado puerperal.

Trata-se de uma espécie de homicídio doloso privilegiado, cujo privilégium é concedido em virtude da “influência do estado puerperal” sob o qual se encontra a parturiente.

Em vez de seguindo o critério de 1969, de adotar o sistema psicológico, fundado no motivo de honra (honoris causa), que é o temor da vergonha da maternidade ilegítima, optou o legislador pelo sistema fisiopsicologicos, apoiado no estado puerperal.

O infanticídio é definido, no código vigente, nos seguintes termos: “matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: pena – detenção, de dois a seis anos”.

Enquanto que 2Damásio demonstra os três tipos de conceituação legislativa do infanticídio: o psicológico revogado pelo Código Penal de 1969, o infanticídio é descrito tendo em vista o motivo de honra. Nos termos do critério fisiopsicológico, não é levado em consideração a honoris causa, isto é, o motivo de preservação da honra, mas sim a influência do estado puerperal. Sendo o critério de nossa legislação penal vigente. De acordo com o critério misto, também chamado composto, leva-se em consideração a um tempo, a influência do estado puerperal e o motivo de honra. Era o critério adotado no Anteprojeto de Código Penal de Nélson Hungria.

1.2 Evolução histórica do infanticídio

O infanticídio “lato sensu” entendido como o assassinato de crianças nos primeiros anos de vida, é praticado em todos os continentes e por pessoas com diferentes níveis de complexidade cultural desde a antiguidade. Existe ampla evidência histórica para documentar a impressionante propensão de alguns pais a matarem seu próprio filho sobre a pressão de condições estressantes. O relato bíblico no livro de Gênesis a respeito do sacrifício de Isaac, filho de Abraão é uma das primeiras referências históricas sobre o infanticídio.

1

Capez, Fernando, Curso de Direito Penal, Vol.2: parte especial, 3 ed. rev. e atual.- São Paulo: Saraiva, 2004, p.98

2

Jesus, Damásio E. de, Direito Penal, 2º vol. parte especial – 28. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2007, p.106

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No império Romano e entre algumas tribos bárbaras o infanticídio era uma prática aceita. Como a oferta de comida era pequena, uma das formas de se combater a fome era restringir o número de crianças. Ainda se a criança fosse malformada, ou mesmo se o pai tivesse algum outro motivo, a criança seria abandonada para morrer por falta de cuidados básicos.

Se uma criança não era aceita, era como se ela não tivesse nascido. Assim o infanticídio não era encarado como um assassinato.

No século IV o cristianismo torna-se religião oficial do império, e o infanticídio passa a ser encarado como um pecado. Mais e mais crianças são batizadas e os recém-nascidos passam a ter uma identidade na comunidade.

O infanticídio seletivo de recém-nascido do sexo feminino, oriundo do sexismo patriarcal, era bastante comum no mundo árabe pré-maometano (570-632 a. D). Com advento do Alcorão, o infanticídio seletivo feminino foi considerado prática criminosa. Contudo, ainda hoje, especialmente na china continental, esta modalidade de infanticídio é muito praticada.

Estes antecedentes históricos revelam alguns aspectos importantes no infanticídio, e transportam ao tempo atual algumas de suas causas latentes.

O desenvolvimento do ser humano no planeta traz como conseqüência, novos enfoques das instituições e institutos por ele criados. Para tanto a historia e testemunha fiel.

Podemos observar a diferença do enfoque da matéria através dos tempos, variando do total desvalor da vida daquele que está nascendo ou acabará de nascer ao rigorismo da punição máxima dos que ousavam transgredir a lei, reflexa direta da pena bíblica do olho por olho, dente por dente.

Convém recordar que o referido código cominava ao homicídio a pena, no máximo, a de morte; na média, a de galés perpétua, e, no mínimo, a prisão com trabalho por 20 anos.

Inexplicavelmente, o terceiro que matasse recém-nascido, nos primeiros dias de vida, mesmo que não fosse “honoris causae” sujeitava-se a uma pena abrandada, de três a doze anos de prisão, em relação ao homicídio. Essa orientação considerava, equivocadamente, a morte de um infante menos desvaliosa que a morte de um adulto.

O código Penal de 1890, por sua vez, deu ao infanticídio a seguinte tipificação:

Art.298: Matar recém-nascido, isto é, infante, nos sete primeiros dias do seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos quer recusando a vitima cuidados necessários à manutenção da vida e a impedir sua morte: pena de prisão celular por seis a vinte e quatro anos.

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Parágrafo único: Se o crime for perpetrado pela mãe, para ocultar a desonra própria: pena de prisão celular por três a nove anos.

.

O legislador de 1890, inspirado pelo código do Império e pelo código Português, legislou equivocadamente, e destacou para figura delituosa “sui generis”, sem limitar o “privilégium” á hipótese da “causa honoris” do infanticídio a mesma pena que cominara para o homicídio, seis a vinte e quatro anos. Nesse caso, tornou-se injustificável a distinção dos dois tipos de crimes. Somente quando o infanticídio fosse praticado pela mãe por motivo de honra aquele diploma legal previa sensível abrandamento da pena, de três a nove anos.

No espaço temporal que mediou entre os códigos de 1890 até o de 1940, existiram no Brasil, vários projetos, os quais são enumerados a seguir:

O projeto Galdino Siqueira não considerava o infanticídio crime autônomo, más uma espécie de crime privilegiado, “se o crime tiver sido cometido contra recém-nascido, quando de seu nascimento ou logo após, e pela própria mãe, para ocultar desonra: pena- detenção por dois a oito anos.”

O projeto Sá Pereira, ao contrário, previa o infanticídio como crime autônomo, incluindo as elementares “durante o parto” e “sob influência do estado puerperal, a exemplo do que estabelecia o art.107, Código Suíço de 1916. Nos seguintes termos: Aquela que, durante o parto, ou ainda sob influência do estado puerperal, matar o filho recém-nascido, será punida com prisão de até três anos, ou com detenção de seis meses no mínimo”.

O projeto Alcântara, por sua vez, retornava ao critério do Código Criminal de 1830, fundamentando o privilégio na “causa honoris”, mas ampliava o “privilégium” para outras pessoas além da mãe.

Por fim, o Código Penal de 1940 consagrou a seguinte previsão:

Art.123 “Matar sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após, pena - detenção, de dois a seis anos.”.

Na Grécia Antiga, segundo Fustel de Coulanges,3 o pai era o chefe supremo da religião doméstica, cabendo ao mesmo a direção de todas as cerimônias do culto como bem entendesse, ou antes, como as vira pratica seu pai. Ninguém na família lhe contestava a supremacia sacerdotal. A própria cidade e os seus pontífices nada podiam alterar no seu culto. Como sacerdote do lar, o pai não conhecia hierarquicamente superior algum. Daí deriva todo

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um conjunto de direitos, dentre os quais o de se desfazer de qualquer recém-nascido que tivesse resultado de seu casamento ilegítimo.

Acrescenta Damásio de Jesus4 que “em Esparta, quando disforme, era permitida a morte do filho mediante lançamento nos sorvedouros dos Apotetas, junto ao monte Taigeto”.

Gustave Glotz noticia que em Atenas não havia um Ministério Público que sustentasse a causa da sociedade. Cabia à parte lesada, ou ao seu representante legal, intentar o processo. Mesmo um homicídio permaneceria impune, se um parente da vitima não se apresentasse como seu paladino. Se o próprio pai do recém-nascido fosse o assassino, não existia mais ninguém que tivesse o direito de levar o crime ao conhecimento dos magistrados e exigir justiça.

Vários eram os métodos utilizados na consumação do infanticídio, afogamento, sufocação, esmagamento de crânio, porém, o mais utilizado era a exposição, ou seja, o simples abandono.

Em Roma, o filho estava totalmente submisso á autoridade paterna, que podia vendê-lo e condená-lo a morte. Leciona Fustel de Coulanges que o pai era o juiz. Condenava o filho á morte, era apenas por virtude de seu direito de justiça.

Como o pai estava submetido apenas ao julgamento da Cidade, a mulher e o filho não podiam ter outro juiz a não ser ele.

Na idade média não se fazia diferença entre homicídio e infanticídio.

Na Inglaterra, o meio comum de infanticídio era a sufocação indireta da criança pelo corpo de sua mãe, quando ambas estavam deitas no mesmo leito. As acusadas desta modalidade de sufocação sempre atribuíam a um acidente, o que, se não as absolvia automaticamente, pelo menos atenuava a punição esperada. A pena imposta para a sufocação, no leito, era de um ano a pão e água e mais dois adicionalmente, sem carne e sem vinho.

Falava-se em penitência, pois a penitente não era recolhida a prisão.

O Código Carolino impunha a infanticida pena severíssima, como relata Nelson Hungria:

As mulheres que matam secreta, voluntária e perversamente os filhos, que delas receberam vida e membros, são enterradas vivas e empaladas, segundo o costume. Para que se evite desespero, sejam estas malfeitoras afogadas, quando no lugar do julgamento houver para isso comodidade de água. Onde, porém, tais crimes se dão

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Jesus, Damásio E. de, Direito Penal, 2º vol. parte especial – 28. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2007, p.98,99

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freqüentemente, permitimos, para maior terror dessas mulheres perversas, que se observe o dito costume de enterrar e empalar, ou que, antes da submersão, a malfeitora seja dilacerada com tenazes ardentes5.

As leis inglesas e francesas, a alemã exigia que a acusada confessasse o seu crime. O recurso habitual para obtenção de confissões era a tortura. Mas antecipando a tendência predominante nos séculos vindouros, o Código Carolino trazia, em suas notas explicativas, orientações para a realização de docimasias destinadas a verificar se a criança realmente havia nascido com vida.

1.3 Evolução do infanticídio no direito brasileiro

Dentre os vários aspectos de que veremos, a falta de cultura do índio brasileiro fez com que inexistisse qualquer forma de Direito Penal escrito. E, no que diz respeito ao infanticídio, o costume aceitava a sua pratica com total indiferença.

As ordenações do Reino no seu livro I – Titulo 153 – 4º exigiam que a polícia verificasse sempre que suspeitamente as mulheres prenhas não dessem conta do parto. Nenhuma referência específica, todavia, fazia-se ao infanticídio, conduta esta que fora compreendido na descrição genérica do assassinato, conforme se depreende do livro v – titulo 45, já que ao juiz cabia o direito de encarar como agravante a tenra idade da vitima. O código criminal do império, segundo a orientação reinante na época, passou a considerar o infanticídio como figura excepcional, apenando-a brandamente.

Esse ordenamento jurídico estabelecia dois tipos de infanticídio: um praticado por estranhos ou parentes da vitima, diverso da causa de honra, como cupidez de herança ou promessa de recompensa, e outro, o praticado pela mãe por motivo de honra. A pena em abstrato para o primeiro tipo era de doze anos e multa correspondente à metade do tempo; e o outro tipo, o praticado pela mãe por motivo de honra, sendo que para este tipo penal, previa-se a pena de prisão com trabalho um a três anos.

O legislador de 1830, usando tão só expressão “Matar alguém recém-nascido” se inclui entre aqueles que deixaram sem amparo legal o neonato.

Igual posição, quanto aos motivos e quanto aos agentes adotou o legislador de 1890 alterando, entretanto, o quantum da pena de seis a vinte e quatro anos para a primeira forma

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de infanticídio e de três a nove anos para a segunda circunstância essa em que nada mudou o contra-senso acima apontado, pois, para o homicídio, cominou em abstrato de seis a vinte e quatro anos.

Inovou, todavia, seguindo as legislações da época, como a chilena e a peruana, no que diz respeito ao período de tempo durante o qual a conduta podia ser considerada infanticida, determinando, assim, o legislador de 1890 que a morte da criança devia ser provocada nos primeiros sete dias de vida.

Galdino Siqueira deixou de considerar o infanticídio como figura autônoma, incluindo essa conduta na figura de homicídio, porém de forma atenuada, desde que praticado pela própria mãe para ocultar a sua desonra. Neste projeto adotou-se, também o critério da vida apnéica.

Virgilio de Sá Pereira, influenciado pelo código suíço de 1916, art.107, foi primeiro jurista pátrio a alterar em seu projeto de 1928 o critério puramente psicológico pelo psico-fisiologico, cominando pena de seis meses de detenção a três anos de prisão mãe infanticida.

Não se conformou com essa inovação de índole subjetiva, pois, em dispositivo seguinte, também concedia benignidade punitiva quando o delito fosse praticado pelo pai ou irmãos da parturiente, a fim de esconder a desonra desta, cumprindo notar que, embora descrito o tipo de forma autônoma, ficou vinculado ao quantum penal d figura do homicídio.

As penas, todavia, eram reduzidas pela metade e possibilitava-se ao juiz a conversão da pena de reclusão em detenção.

Alcântara Machado preferiu no seu projeto retornar ao critério puramente psicológico, estendendo o privilégio a outras pessoas tais como, ascendentes, descendentes ou colaterais da mãe, e cominou-lhes as mesmas penas, detenção ou reclusão de dois a seis meses.

1.4 O infanticídio na legislação brasileira

O Código penal brasileiro define o infanticídio em seu Art.123 “Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após”.

Com essa nova redação podem ser tirados dois conceitos básicos que devem ser detalhados para que se compreenda melhor o crime de infanticídio.

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Pode parecer obvio, ou até redundante, que matar pressupõe que haja vida anteriormente, mas, nos casos de infanticídio, isso é fundamental, pois significa que o recém-nascido deve ter vida antes da ocorrência do crime para que este caracterize como infanticídio. Para a medicina legal a prova de vida mais utilizada é a respiração.

Assim é considerado vivo aquele que possui respiração, embora se saiba que pode haver vida mesmo sem respiração nos recém nascidos, apnéia fisiológica, para averiguação da existência ou não de vida em tais casos utiliza-se de outros conceitos como prova de vida.

Desse primeiro conceito pode-se definir o objeto jurídico do infanticídio que, assim como no homicídio é a proteção da vida seja ela do neonato, aquele que acabou de nascer, ou, do nascente, a transição entre a vida endo-uterina e extra-uterina.

O segundo conceito que deve ser compreendido é a influência do estado puerperal é ele que caracteriza o infanticídio. Entende-se por estado puerperal as perturbações psíquicas decorrentes do parto.

Matar ou expor recém-natos, pelos mais variados motivos, entre eles honra, fervor religioso ou deficiência física, foi pratica freqüente desde a antiguidade. Na Grécia e Roma antigas, a criança era propriedade dos pais. Os recém-nascidos normais eram protegidos, porem6 os defeituosos podiam ser expostos para morrer de fome ou de sede, aqueles que pudessem servir de desonra para a família, teriam o mesmo destino.

A criança que nascia era levada ao pai, que ao levantá-la nos braços e exibi-la, concedia-lhe o direito a vida. Se colocasse deitada, decretava sua morte (jus vitae et nescis). O direito romano somente passou a considerar como crime a morte do filho pelo pai, por influência dos ideais cristãos, a partir de Justiniano. Os concílios preocuparam-se com os recém-nascidos e retiraram dos pais o direito de vida e morte.

O infanticídio passou a ser encarado como homicídio comum e, pai ou mãe que cometessem o delito estavam sujeitos a terríveis punições. Sendo as mães criminosas, enterradas viva, queimadas ou empaladas.

Um dos primeiros códigos de que temos noticia a ordenação criminal de Carlos V (constituído criminalis Carolina), dispunha que as mulheres que matassem seus filhos seriam enterradas vivas, queimadas ou empaladas, oferecendo como atenuação ao suplicio que as mesmas fossem afogadas, se não reincidentes. Em caso de reincidência, somente haveria a opção de afogamento se, antes, a ré fosse atenazada com ferros em brasa.

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A concepção de punir severamente mães infanticidas perdurou por toda a idade média, idéias humanistas surgidas no século XVIII trouxeram o abrandamento das penas desses criminosos. Desde então, passaram a ser visto com uma certa boa-vontade, contanto que ficasse provado terem agido por alguma causa moral, e não por perversidade ou egoísmo.

A tendência de considerar o infanticídio como uma forma especial de homicídio passou a ser aceita na maioria dos paises, levando-se em conta tanto os motivos de honra quantas condições psicológicas “sui generis” determinadas pelo parto ou pelo puerpério.

No Brasil, a lei imperial (código criminal de 1830) e a da Republica em seus primórdios (código de 1890) prenderam-se aos seus motivos de honra, como atenuante, quando o crime fosse praticado pela própria mãe.

Código criminal de 1830 artigo 198: “Se a própria mãe matar o filho recém nascido para ocultar sua desonra: pena de prisão com trabalho por 1 a 3 anos.

Código de 1890 artigo 298: “Matar recém-nascido, isto é, infante nos seus primeiros dias de vida, quer empregando meios diretos e ativos, quer recusando a vitima os cuidados necessários a manutenção da vida e a impedir sua morte: pena de prisão de 06 a 24 anos

Parágrafo único: “Se a própria mãe matar o filho para ocultar a sua desonra: pena prisão com trabalhos de 3 a 9anos”.

O código penal em vigor, de 1940, extinguiu a “honoris causa” e criou a figura do “estado puerperal”, que alem de ter estipulado para a caracterização do crime como infanticídio, que o mesmo fosse cometido “durante o parto ou logo após”.

Abolida a formula honorifica, restou ao legislador e ao perito uma dificuldade em virtude da letra da lei: conceituar e determinar a ocorrência do que seja estado puerperal.

Artigo 134 do código penal de 1940: “Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: pena – detenção, de 6 meses a 2 anos.

Este artigo constitui do ponto de vista médico legal, verdadeira espécie de infanticídio, porem não atende os requisitos do tipo legal, sendo enquadrado no capitulo de periclitação da vida e da saúde.

Projeto de reforma do código penal (1987), ainda em estudos, prevê no artigo 123: “Matar o próprio filho durante ou logo após o parto, sob a influência perturbadora deste, ou para ocultar desonra própria: pena – reclusão de 2 a 6 anos”.

Bem melhor que “Sob a influência do estado puerperal, nos parece a compreensão a expressão” Sob a influência perturbadora do parto; porém, tornar a falar em desonra capaz de levar ao assassinato do próprio filho, em tempos de costumes liberados, onde a gravidez fora

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do casamento não chega a causar uma convulsão social, podendo mesmo ser motivo para aplauso ou orgulho, talvez possa servir para encobri motivações menos nobres a perpetração do crime.

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SEÇÃO 2

2.1 Causa do crime pela honra

Algumas das definições de que falam alguns autores a honra é um complexo de condições ou conjunto de dotes morais (como a honestidade e a lealdade), intelectuais (como a inteligência e a cultura) e físicos (como a sanidade mental e a força física), que concorrem para determinar o valor social que cada indivíduo possui perante si e da sociedade e diante dos indivíduos que o circundam.

O conceito de honra leva consigo, dessa forma, a idéia de patrimônio moral, patrimônio este determinado de um lado pela estima própria e, de outro, pela consideração social que cada individuo possui.

Podemos verificar que os defensores do critério psicológico para adotar o motivo de honra sexual como razão de ser infanticídio, os defensores da corrente em questão, ao falarem em motivo de honra como circunstância que colocam o infanticídio em figura autônoma, limita-se a um aspecto de índole psicológico, chamado honra sexual.

E, seguindo a mesma linha de pensamento, entendem que o fim precípuo para a qual a vontade do agente se dirige ao praticar a ocisão de uma criança, durante o parto ou logo após o seu nascimento, reside única e exclusivamente na circunstância de se evitar que a gravidez ilegítima chegue ao conhecimento daqueles que consideravam a sua honra sexual incensurável.

Outros, justifica a conduta infanticida afirmando que o sujeito ativo age para salvaguardar a reputação que os outros dele possuem, compreendendo-se que tudo faça para manter integra essa consideração popular, mesmo quando a sua atitude provoque a destruição de uma vida pois, no seu entender, a condição do nascimento, fruto de um ato sexual ilegítimo, permite-lhe eliminar a prova candente da sua desonra. Atestam que a conduta infanticida deve merecer em relação ao homicídio tratamento menos rigoroso, tendo em vista o menor dano imediato produzido por esse delito, devido à menor porcentagem de pessoas expostas a uma repetição de um fato semelhante. A divulgação do primeiro infanticídio impede o agente de se acobertar, num segundo caso, sob o mesmo manto do motivo de honra.

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Juristas como Tommaso Pedio e Enrico Altavilla, este citando Carrara, declaram que a menor reprovação da conduta do agente infanticida não repousa nos critérios anteriormente comentados e, sim,na “necessidade” daquele de furtar-se ao perigo da desonra.

Gleispach, citado por Nelson Hungria, ao conceituar o infanticídio, enfatizou ainda mais essa colocação, dizendo que a infanticida, ao se ver repudiada e abandonada, “age no mais amplo sentido de necessidade”.

Autores pátrios como Olavo Oliveira e Ivair Nogueira Itagiba salientam, também, essa orientação. Afirma o primeiro, citando Michele Longo, que a infanticida não pode agir de outro modo, principalmente quando, acima das leis e dos códigos, “há a lei da necessidade, imposta pelo império dos fatais acontecimentos da vida”. O segundo, por sua vez, assevera merecer acolhida de par em par com o motivo de honra toda e qualquer causa idêntica premência, pois “a lei da necessidade no seu sentido amplo” é que motiva a atenuação da pena.

Ricardo Andreucci, citando Oetker, tem adotado essa posição observando a ocorrência de um verdadeiro estado de necessidade, visto existir um real conflito de bens entre a honra aparente do agente e a vida do ser nascente ou do recém-nascido, conflito esse que provoca uma disputa pela sobrevivência do primeiro desses bens, em detrimento da do outro.

Existem finalmente autores como Tissot, os quais, embora sem determinarem qualquer fundamento, conforme salienta Balestrini, têm ido mais longe ainda, preferindo descriminalizar o infanticídio por considerá-lo apenas um delito moral, conclusão essa a que também chegou Jeremias Benthan, o qual entende não merecer pena o infanticídio quando cometido pela mãe por motivo de honra.

A expressão latina significa causa de honra. Isto quer dizer que a agente mata em defesa da honra.

Este fundamento, que não esta escrito na lei penal, é em verdade, um dos pilares que sustentam a incriminação autônoma do infanticídio. Trata-se de um “motivo oculto”, como faz crer Nélson Hungria.

Deve notar-se, porém, que, com a omissão de referência à causa honoris, o código não inibe que se leve em conta, quando realmente exista, esse antecedente psicológico.

O motivo de honra pode contribuir, de par com a morbidez fisiológica do parto, para o estado de excitação e angustia que diminuem a responsabilidade da parturiente. Todas as causas, fisiológicas e psicológicas, devem ser averiguadas no seu conjunto interdependência, de

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modo que não fica excluída a consideração do motivo de ocultação da desonra, nos casos em que, realmente, tenha entrado como um coeficiente do anormal impulso criminoso. Von Liszt era mesmo de opinião que somente quando aliados o motivo de honra e a influência do estado puerperal se devia admitir o mais brando tratamento penal do infanticídio. Se é certo que não foi este o ponto de vista do nosso Código, não é menos certo que os peritos e juízes não devem abstrair, para a formação de seu juízo, não só o motivo de honra, como outras causa psicológicas de igual premência, quando ocorram8.

Nesse caso, a parturiente, vendo-se acuada em seu drama interno, não vislumbra outra solução possível, que não a de eliminar a causa primaria de todos o seu males. A respeito, o pensamento de Damásio de Jesus é no sentido de que:

A base do privilégio honoris causa é de natureza psicológica e restritiva. Dentro dos motivos que podem concorrer para a prática do fato criminoso, o único que tem força de transformá-lo em delictum exceptum é o de ocultar a desonra. A honra de que se cuida é a de natureza sexual, a boa fama e a reputação de que goza a agente pela sua conduta de desonra conhecida, não lhe cabe a alegação da preservação da honra. Por outro lado, se trata-se de outro motivo que não a defesa da honra, como por exemplo, o de extrema miséria, o excesso de prole, receio de um filho doentio, o fato constituirá homicídio9.

Percebe-se, claramente, que a honoris causa é fruto de conflito interno da agente, cuja conduta não se encaixa no padrão imposto pela sociedade, que passa a considerá-la imoral. Isto gera na mulher um estado de angustia, descrito como maestria por Miguel Longo:

A principio, consegue esconder a prova do pecado, e levam uma existência de sobressaltos e forçadas reservas; mas, pouco a pouco cresce o perigo da publicidade, e a infeliz começa a perder até a coragem de simular um sorriso. Seu animo é possuído de agitações convulsivas, desorientações, desequilíbrio de sentimentos e de idéias. As próprias caricias prodigalizadas por seus desvelados pais são causa do remorso, são novos abalos ao periclitante domínio da razão, ás dolorosas arritmias do coração e entrementes, de longe, apavorante como um espectro, vem se aproximando, minaz, de dia em dia, de hora em hora, o momento fatal em que a desgraçada já não pode esconder a própria vergonha à família, aos parentes, ao publico; e torna-se deprimida, aviltada sob o incubo medonho que não a abandona, de dia ou de noite, até mesmo nos poucos momentos de repouso que lhe são concedidos pela fadiga, pela exaustão, pela absorvente angustia. É um abismo de trevas...de tempestades, de imperscrutáveis Mistérios que secava naquela alma; a piedade, até a piedade lhe é negada, porque pedi-la é vergonha, merecê-la é desonra, esperá-la é a maior humilhação da dignidade e do decoro pessoal! E chega o dia fatal, e a hora se aproxima: à agitação sucede o desvairo,destino do

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Ribeiro, Gláucio Vasconcelos, Infanticídio – São Paulo: ed. Pillares, 2004

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náufrago à procura, na desesperada agonia, de uma tabua de salvação; enfim, a surpresa do parto tira à infeliz o ultimo raio de luz mental, o derradeiro baluarte de defesa, a esperança de um remédio imprevisto: ela, num momento reativo de conservação instintiva, é impelida, automaticamente, a suprimir a prova da vergonha, do erro infamante, da desonra...e o infanticídio se consuma! A lei escrita pedirá contas a essa mulher, como autora de um crime, mas a lei moral dirá aos seus juízes: acima e além dos códigos há a lei da necessidade, infelicitas facti o império inelutável das fatais contingências da vida10.

Esse trecho bem ilustra como a doutrina, defendida inicialmente por Beccaria, insurgiu-se contra as pavorosas pena prevista para o infanticídio, propondo o abrandamento das mesmas quando o crime fosse praticado in honoris causa.

Ivair Nogueira Itagiba, após sustentar que:

Na expressão estado puerperal se compreendem a causa honoris e a perturbação fisio-psíquica resultante do parto”, afirma: “È impossível abstrair-se de honoris causa. Em que pese a sua omissão na letra da lei, envolveria clamorosa injustiça a recusa do antecedente psicológico. Um motivo de honra é dos que, a morbidez fisiológica inerente ao parto, mais concorrem para o estado de excitação e desespero da parturiente.Imagine-se o que seja a premente necessidade da ocultação da desonra. Suponha-se o momento fatal do aviltamento. Compreenda-se o quanto de agitação e desequilíbrio a hora azada da desgraça cava na alma da mulher. Considera-se a terrível dor oral a lhe apavorar o coração. Observa-se a idéia fixa de desfazer o produto de amor ilegítimo, a varrumar-lhe o cérebro. Atenta-se no tremendo vendaval psicológico que a domina. Não se deslembre da agonia, da angustia, do desvario, do desatino que pesam sobre a sua consciência. A dignidade, a honra, o decoro pessoal irão por água abaixo. Dentro dessas agitações convulsivas e desorientações torturantes, há um remédio imprevisto: a eliminação do feto vivente ou neonato. Pratica então o ato que corresponde ao instante reativo de conservação instintiva. É a lei da necessidade que se acha acima de qualquer outra lei. Esta bem visto que nenhum juiz, cônscio de suas responsabilidades, inteirado do motivo de honra, será capaz de deixar de reconhecer e declarar o privilegium legal. Nenhum haverá que se recuse, em tal hipótese, de afirmar a irresponsabilidade ou responsabilidade diminuída, se comprovada. A honra objetiva individual, conforme for a espécie, pode superar o interesse social. Não serão somente as causas fisiológicas que hão de determinar o infanticídio. Tal qual mente as causas psicológicas têm de ser consideradas e atendidas.

O infanticídio é, inegavelmente e antes de tudo, um delito social, praticado, na quase totalidade dos casos por mães solteiras ou mulheres abandonadas pelo marido ou pelo amásio. Por isso mesmo, o conceito fisio-psicologico do infanticídio – sob a influência do estado puerperal-introduzido no nosso Código Penal para eliminar de todo o antigo conceito

10

(16)

psicológico – a causa da honra-vai aos poucos, perdendo sua significação primitiva e se confundindo com este, por força de reiteradas decisões judiciais.

“Infanticídio. Acusada que, logo após o parto, mata o fruto de relações ilegítimas. Hipótese de homicídio qualificado afastada. Reconhecimento do estado puerperal, presente a causa da honra”. A jurisprudência, vacilante, ora opta por uma ora por outra corrente, como se conclui na leitura dos seguintes acórdãos:

“Infanticídio. Ré denunciada como incursa nas penas do artigo 121 parágrafo 2°, incisos I e III do Código Penal, por ter eliminado a filha recém-nascida e pronunciada como incursa nas penas do infanticídio”.

No caso em comento a, a ré, solteira, esperava um filho de um homem que abandonou à própria sorte, tendo, inclusive, insistido para que ela abortasse, quando soube da gravidez. A recusa foi determinante porque a mesma queria criar a criança, mas vivendo com os pais, que tudo ignoravam, e precisando esconder de todos o seu estado, sua vida começou a ficar, como relata o acórdão, “realmente muito difícil”, até que no momento de dar a luz, “perdeu a cabeça” como acentuou em seu interrogatório, terminando por matar a criança. Na decisão comentada, a existência do estado puerperal, aliado a honoris causa, tipifica o infanticídio.

“A mulher mentalmente sã, mas abalada pela dor física do parto, fatigada, sacudida pela emoção, pode sofrer obnubilação da consciência, perturbação dos impulsos volitivos chegando Por isso a matar o próprio filho, quando a emoção do ato psicológico se associa a da vergonha, a do receio das sanções pela família ou pela sociedade”.

Consta no acórdão, que A.S foi denunciada como incursa no artigo 121, parágrafo 2°, III do Código Penal, homicídio qualificado por asfixia, porque, tendo dado a luz uma criança do sexo masculino, embrulhou-a em calça e, em seguida, atirou-a num córrego, resultando assim sua morte por asfixia. A ré disse que assim agiu, pois queria esconder o tal fato de seu pai. Mesmo reconhecendo a unânime, entenderam que o que impulsionou a ré foi à vergonha, ou medo de uma reação de seu pai, que ignorava o deslize praticado pela filha e, por isto, a desclassificação do homicídio para o infanticídio foi mantida em segundo grau.

“Infanticídio. Delito caracterizado. Acusada que, após dar à luz, estrangula o filho, matando-o. Fato motivado pelo estado puerperal e na defesa da honra. Pronuncia mantida”.

“A influência do estado puerperal é o efeito normal e corriqueiro de qualquer parto. Dada a sua grande freqüência, deverá ser admitida sem maior dificuldade. Presente a causa da honra, então, deve ser afastada qualquer duvida a respeito”.

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“A honoris causa foi, é e continuará a ser motivo de brando tratamento penal do infanticídio”11.

2.2 significado do estado puerperal

Existem elementos fundamentais a caracterização do infanticídio e o que diferenciam do homicídio comum são eles: O estado puerperal, o feto nascente ou recém-nascido e que a morte tenha ocorrido durante o parto ou logo após.

Para que possamos entender o que seja estado puerperal é necessário explicar, inicialmente o que é puerpério.

Com o final do parto, ou seja, após a expulsão do feto e da placenta (dequitação), tem inicio o puerpério, que se estende até a volta do organismo materno as condições pré-gravidicas.

Sua duração é de seis a oito semanas. Temos, pois, puerpério imediato (até dez dias após o parto), tardio (que vai até os quarenta e cinco dias) e o puerpério remoto (de quarenta e cinco dias em diante).

Trata-se, portanto, de um quadro fisiológico, comum a todas as mulheres, que dão a luz, com começo, meio e fim determinados, capaz em alguns casos, de causar alterações do psiquismo materno, de duração e gravidade variados, porém de fácil detecção, via diagnostico médico, clinico e, ou laboratorial (por exemplo: psicose puerperal; depressão pós parto).

O estado puerperal, requerido pelo Código Penal a configuração do infanticídio, é uma entidade, a nosso ver, no mínimo pouco palpável, para não dizer virtual.

As alterações psíquicas advindas desse quadro devem ser de tal monta, que permitam a abolição da capacidade de se conduzir ou se controlar diante do fato adverso. O nascimento de um filho não desejado ou espúrio, apesar da intensidade da perturbação, a mesma deverá ter caráter fugidio, pois não se limita ao momento do parto ou ao imediatamente após, desaparecendo, sem quaisquer seqüelas de ordem físico-psiquica, e em seguida a eliminação do fator gerador (filho acabado de nascer ou nascente).

11

(18)

A explicação para o surgimento desse quadro de perturbação mental baseia-se em dois critérios: O psicológico, qual seja, ocultar a desonra proveniente de uma gravidez ilegítima (impetus honoris) e o físico-psiquico (impetus doloris), gerado pelo desgaste físico causado pelo parto (dores, sangramento, medo, fadiga, esgotamento nervoso).

As vitimas dessa “loucuras” momentânea devem ser mulheres sem historia pregressa de doenças mentais (esquizofrenia; psicose maníaco-depressivo) ou mesmo quais quer desordens de cunho psíquico (neuroses, personalidades psicopáticas), em suma, perfeitamente normais, do ponto de vista psiquiátrico, pois o contrario caracteriza o homicídio, aplicando-se, então, conforme o caso, o artigo 26 do Código Penal e seu parágrafo.

O que se observa na pratica, é que essa insanidade causada pelo ato de parir não é observada nos partos assistidos, em mulheres que tiveram uma gestação assumida e desejada, mesmo que ilegítima, ora, tal fato seria de se esperar por se tratar de um fenômeno que, teoricamente, acomete pessoas normais, em termos de saúde mental.

O que se dá, na realidade, é a morte de recém-nascidos em situações suspeitas, ocorrendo na imensa maioria dos casos, em virtude de problemas, os mais diversos, tais como pobreza extrema, numero excessivo de filho, gravidez resultante de estupro ou mesmo ilegítima e, ou fortuita.

Diante do fato indesejado, a mulher quando não consegue abortar, no inicio, pratica, como ultimo recurso para sanar o problema, a morte do próprio filho.

Cremos ser desespero ou despreparo, para enfrentar a situação (este podendo ser encarado sob vários aspectos, desde o econômico até o moral), o que move essas mulheres.

Estabelecer o limite entre a premeditação (excludente do tipo) e a perturbação mental surgida no momento do parto, originada pelos fatores que tornam a gestação e o fruto desta indesejáveis, e que termina no ato criminoso, nos parece tarefa das mais árduas a todos os profissionais envolvidos no esclarecimento da questão.

A prova pericial, no que tange o estado puerperal, é de extrema dificuldade, uma vez que os exames da puérpera são realizados em épocas mais ou menos tardia em relação ao crime, fato este que, por si só, inviabiliza, ao perito, pronunciar-se com precisão sobre sua ocorrência e a influência do mesmo na consumação do delito pela mulher mentalmente sã, já que, como dissemos anteriormente, não ficam quaisquer vestígios, sendo o quadro efêmero.

O exame da mulher suspeita de ter praticado infanticídio deverá elucidar sobre a ocorrência de parto, e se recente ou não.

(19)

O parecer psiquiátrico se impõe, como exame subsidiário, a fim de pesquisar doenças ou distúrbios mentais preexistentes, agravados pela gestação, parto e puerpério.

A avaliação de que o estado puerperal possa ter influenciado na produção do delito é, para o perito, de extrema dificuldade, tendo em vista que a perícia, nesses casos, é realizada bastante tempo após o fato, não restando, por isso, qualquer vestígio que possa ser detectado.

A confirmação de que o crime se deu sob a influência do estado puerperal é, pois, quase que impossível, a não ser que o exame seja realizado imediatamente após a consumação do ato, o que é uma hipótese remota.

Fernando Capez12 em sua doutrina

Define o estado puerperal como perturbações que acometem as mulheres, de ordem física e psicológica decorrentes do parto. Ocorrendo Por vezes que a ação física deste pode vir a acarretar transtornos de ordem mental na mulher, produzindo sentimentos de angustia, ódio, desespero, vindo a ela a eliminar a vida de seu próprio filho.

A caracterização do infanticídio requer, além da confirmação de que o sujeito passivo tenha vida, quando da sua execução, que o crime tenha ocorrido durante ou logo após o parto, sendo que este ultimo período pode suscitar duvidas, já que não existe, por parte do Código Penal, definição exata do “logo após”.

Haverá, consoante disposição legal, o estado puerperal, durante o parto ou logo após. O recém-nascido, a termo ou não, apresenta, logo após o parto, sangue e liquido amniótico, que lhe cobrem o corpo, podendo aquele ser de origem materna ou conseguinte as lesões produzidas por atos violentos, recebendo esta fase a denominação de estado sanguinolento, indicando não ter o mesmo recebido, ainda quaisquer cuidados.

O delito de infanticídio, segundo as legislações penais pátria e estrangeira, pode fundar-se em um dos fundar-seguintes critérios:

a) critério psicofisiologico - a atenuação da pena leva em consideração o desequilibro fisiopsiquico da mulher parturiente.

b) critério psicológico – a minoração da pena tem em vista pessoal motivo de honra, como a gravidez extramatrimonial, que gera angustia e desespero na genitora, levando a ocultar o ser nascente. É o chamado infanticídio honoris causa. O critério adotado pelo nosso código penal é o psicofisiologico que tem como característica o estado puerperal.

Para Damásio Evangelista de Jesus13

12

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O estado puerperal é um conjunto das perturbações psicológicas e físicas sofrida pela mulher em face do fenômeno do parto, para ele não é suficiente que a mulher realize a conduta durante o período do estado puerperal é necessário que haja uma relação de causalidade entre a morte do nascente ou neonato e o estado puerperal. Essa relação causal não é meramente objetivas, más também subjetivas.

Nosso ilustre doutrinador Fernando Capez14

Define o estado puerperal como perturbações, que acometem as mulheres, de ordem física e psicológica decorrentes do parto. Ocorre, por vezes, que ação física deste pode vir a acarretar transtornos de ordem mental na mulher, produzindo sentimentos de angustia, ódio, desespero, vindo ela a eliminar a vida de seu próprio filho.

Enfim, não podemos deixar de citar a posição doutrinaria de Luiz Régis Prado15

Que para o qual o estado puerperal, por sua vez, é um conjunto de sintomas fisiológicos que tem inicio com o parto e findam algum tempo após. Embora exista normalmente, o estado puerperal, nem sempre ocasiona perturbações emocionais capazes de culminar na morte dada ao filho pela própria mãe. É, possível que o fenômeno do parto com suas dores, com a perda de sangue e o esforço muscular que o acompanham produza na parturiente um estado de perturbação de consciência.

De conformidade com a orientação adotada pela legislação penal brasileira, é esse estado puerperal que fundamenta o infanticídio enquanto homicídio privilegiado.

Faz-se necessário que a mãe pratique o crime sob a influência do estado puerperal, sob a pena de incorrer no delito de homicídio. E isso porque o critério fisiopsiquico não se pretende afirmar que “o puerpério acarrete sempre uma perturbação psíquica, é preciso que fique averiguado ter esta realmente sobrevindo em conseqüência daquele, de modo a diminuir a capacidade de entendimento ou de auto inibição da parturiente”.

Conclui-se, portanto, que não basta que a conduta tenha lugar durante o parto ou logo após, é preciso, demais disso, a existência de um vinculo causal entre a morte da criança dada naquele lapso temporal e o estado puerperal.

Encontram-se divergências nas doutrinas estudadas em relação ao tempo de duração do estado puerperal.

13

Jesus, Damásio E. de, Direito Penal, 2º vol. parte especial – 28. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2007, p.107

14

Capez, Fernando, Curso de Direito Penal, Vol.2: parte especial, 3 ed. rev. e atual.- São Paulo: Saraiva, 2004, p.102

15

Prado, Luiz Régis, Curso de Direito Penal Brasileiro -7ª, ed. rev. e atual. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008,p.93

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2.3 Diferença entre infanticídio e homicídio.

Sob a influência do estado puerperal, a mãe que matar o seu filho durante ou logo após o parto, terá cometido o crime de infanticídio, nos termos do código penal vigente.

A “honoris causa” identificará o fato como sendo um homicídio, baseando-se em uma interpretação restritiva e legalista, porém admissível juridicamente, muito embora não isenta de criticas humanísticas.

O exame do caso concreto dependerá sempre da verificação da existência da cláusula sob a influência do estado puerperal e dependendo do pensamento do órgão judicial, às vezes do acontecimento da honoris causa. Porém o art.123, ao aplicador da lei, eis que, ainda ai, a matéria é controvertida.

Podemos verificar em algumas doutrinas que a lei presume uma pertubação psíquica especial, não patológica, em decorrência do estado puerperal. Perturbação emotiva que comumente deriva do estado fisiológico determinado pelo parto. E, como toda parturiente sofre tais distúrbios psíquicos, a presunção legal é iuris tantum, relativa, suscetível de prova em contrário, como tem entendido a jurisprudência dos nossos tribunais.

Como podemos verificar no acórdão a seguir:

Capitulação de crime. Eliminação de recém-nascido logo após o parto. Acusada que não delinqüiu sob a influência do estado puerperal. “Caso de homicídio e não infanticídio”.

Embora eliminado o recém-nascido logo após o parto, não se configura na hipótese o crime de infanticídio previsto pelo artigo. 123 do Código Penal, uma vez que acusada o fez fria e premeditamente.

“Se não se verificar que a mãe tirou a vida do filho nascente ou recém-nascido sob a influência do estado puerperal, à morte praticada se enquadrará na figura típica do homicídio”. (RT 491/191).

Verifica-se que é de difícil identificação e decisão por parte do magistrado, devido a sutilezas para o correto enquadramento do fato a norma.

Podemos lembrar as palavras de Julio Fabbrini Mirabete16:

16

Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de Direito Penal, Parte Especial 24º ed. rev. e atual. - São Paulo: Ed atlas, 2006

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Assevera que se a mãe matar culposamente o filho, ainda que sob a influência do estado puerperal, responderá por homicídio culposo, porque o estado puerperal não equivale à incapacidade psíquica, e a puérpera responderá pelo ato culposo, qualquer que seja ele, pois o artigo 13, parágrafo 2º, a, da lei penal a coloca como garantidora do nascente ou neonato.

Quanto ao momento consumativo, outra dificuldade. O infanticídio se consuma durante o parto ou logo após, compreendendo a fase da transição da vida uterina para extra-uterina, enquanto a mãe estiver sob a influência do estado puerperal.

A princípio assassinato do feto, quanto o de qualquer ser humano, é homicídio; sendo que antes do parto é caracterizado como aborto. Em muitos casos, o crime de infanticídio ocorre de forma que muitos não tomam conhecimento. Sendo que o momento de sua consumação é racional e inteligível pela doutrina, porém no que tange ao caso concreto é de difícil afirmação.

Vejamos as possibilidades diante de um recém-nascido, ou feto, morto, que são elas cinco possibilidades: infanticídio, homicídio doloso, homicídio culposo, aborto voluntário, e aborto involuntário.

A configuração do crime de infanticídio existe a necessidade de que o autor do crime seja a própria mãe da criança, que o crime seja cometido durante ou logo após o parto, e que esteja a mãe sob influência do estado puerperal. Caso uma ou mais destas características não seja observada, não se pode dizer que se trata de um crime de infanticídio.

No caso do infanticídio, podemos analisar quatro hipóteses. Podendo ter ocorrido um aborto, pode ou não ser voluntário. Para a validação das hipóteses elecandas é necessário que seja realizada uma perícia médica, sem forem desconsiderados ambos, tem-se um homicídio.

Sendo que é preciso verificar quem foi o autor, podendo ser tanto a mãe da criança, quanto qualquer outra pessoa, e pode ser este homicídio: simples, qualificado ou culposo.

Se conforme a análise for verificado que trata-se da mãe, é comum que se confunda o caso com infanticídio. O estado puerperal, sempre presente em qualquer gravidez, não leva a distúrbios de ordem psíquica em cem por cento dos casos. Pode ser perfeitamente possível que uma mãe venha a matar a sua criança, durante ou logo após o parto, sem que a razão do crime advenha das complicações motivadas pelo estado puerperal.

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Assim diz Nélson Hungria:17

As expressões durante o parto e sob a influência do estado puerperal não se equivalem, pois, do contrario, o texto legal seria redundante. Não basta o fato, puro e simples de ter sido o infanticídio praticado pela mãe durante o parto: é necessário que haja um vinculo causal entre o estado puerperal e a ocisão da criança. É bem certo que tal relação pode deixar de existir, isto é, nem sempre o estado puerperal acarreta a perturbação psíquica que justifica, na espécie, o priveligium legal. Pode ser inexistente a desnormalização do psiquismo da parturiente, e apresentar-se, não um crime cometido num estado particular de responsabilidade atenuada, mas sim um crime friamente calculado e perversamente executado.

.

A dificuldade persiste para a constatação se houve ou não de um “crime friamente calculado e perversamente executado”. A jurisprudência, quase sempre reconhece a existência de distúrbios psíquicos resultantes de complicações do estado puerperal. Chegando a dispensar qualquer perícia médica para determinação deste:

A jurisprudência tem entendido não mais ser dispensável a perícia médica para comprovar o estado puerperal (cf. RT.598/338e 421/91: JTACrimSP 83/384 etc.) Isto porque a influência o estado puerperal é efeito normal e corriqueiro de qualquer parto, e dada a sua grande freqüência, a influência deve ser admitida sem maior dificuldade. (TJSP, Rec. Crim. 103.663, RT 417/111).

Ocorre com freqüência casos de mães que tenham matado seus filhos, serem julgadas por infanticídio, e não por homicídio independente da verificação do vínculo causal citado por Nelson Hungria, ainda são freqüentes os casos em que sejam julgadas por homicídio, mas a jurisprudência predominantemente não coloca dificuldades no reconhecimento do infanticídio.

Casos de homicídio culposo também são muito freqüentes. Não é fato desconhecido que muitas mães não têm conhecimento de que é preciso ligar ou laquear o cordão umbilical do recém-nascido, após a feitura da incisão. Conseqüentemente, em muitos partos realizados em casa, sem qualquer assistência, a mãe acaba por cortar o cordão umbilical, mas não o laqueia, o que resulta na morte da criança por hemorragia. A possibilidade de homicídio simples ou

17

Hungria, Nelson, Comentários ao Código Penal, 6º ed ver. atual. Heleno Claudio Fragoso. – Rio de Janeiro: Forense, 1981.

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qualificado, por um outro lado, aparece quando o recém-nascido é morto por terceiro, havendo dolo configurado, ou a própria mãe o mata, não sendo constatado vinculo causal entre a morte da criança e o estado puerperal em que se encontra a mãe, e sendo antes descartada a possibilidade de homicídio culposo. Essa constatação é, no entanto complicadíssima, e por isso diversa tribunais optam por desconsiderar o homicídio simples ou qualificado, e enquadra os casos como infanticídio. De fato, até mesmo os peritos consideram a caracterização do infanticídio como algo de bastante complexidade, sendo chamado de crucis peritorum, a cruz dos peritos. 18

2.4 Diferença entre infanticídio e aborto

Vejamos a seguir, quais são as principais características de diferenciação de que trata o tema infanticídio e aborto, no infanticídio o feto é morto enquanto nasce ou logo após o nascimento. O aborto, ao contrário, somente se tipificara se o feto é morto não à expulsão. Ademais o entendimento é que se qualquer ato praticado pela mãe ou terceiro, anterior ao parto, caracteriza-se como crime de aborto.

A distinção de infanticídio e aborto se faz necessário a visão dos doutrinadores, visto que o Código Penal não o define de forma esclarecedora.

Para Mirabete19,

Aborto é a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção. É a morte do ovo (até três semanas de gestação), embrião (de três semanas a três meses) ou feto (após três meses), não implicando necessariamente sua expulsão. O produto da concepção pode ser dissolvido, reabsorvido, pelo organismo da mulher ou até mumificado, ou pode a gestante morrer antes da expulsão. Não deixará de haver, no caso, o aborto.

Já para Heleno Fragoso20 a definição do aborto:

O aborto consiste na interrupção da gravidez com a morte do feto. Pressupõe, portanto, a gravidez, isto é, o estado de gestação, que, para os efeitos legais, inicia-se com a implantação do ovo na cavidade uterina. Do ponto de vista médico, a gestação se inicia com a fecundação, ou seja,

18

França, Genival Veloso de Medicina Legal, ed. 8ª, p.297

19

Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de Direito Penal, Parte Especial 24º ed. rev. e atual. - São Paulo: Ed atlas, 2006

20

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quando ovo se forma na trompa, pela união dos gametas masculino e feminino. Inicia-se então a marcha do óvulo fecundado para o útero, com duração média de três a seis dias, dando-se a implantação no endométrio. Daí por diante é possível o aborto.

Parece claro o entendimento dos autores, na obra de Gláucio Vasconcelos Ribeiro21, podemos identificar algumas questões ora esplanadas de outros autores.

Para, Ivanir Nogueira Itagiba,

A ocisão do feto, antes de iniciado o parto, é aborto; começado o parto, se o feto era biologicamente vivo, o crime é infanticídio. No aborto, há criminosa expulsão do feto; no infanticídio é espontânea. Terminada a vida intra-uterina, sem que haja a extra-uterina, neste estado de transição positiva-se o infanticídio.

Pode-se perceber que as hipóteses legais de infanticídio e aborto estão bem próximas estão bem próximas e, no mundo dos fatos, duvidas quanto a correta aplicação da lei ao caso concreto atormentaram e, certamente, ainda atormentarão àqueles jungidos à difícil missão de Julgar.

Ivanir Nogueira Itagiba traz um exemplo dessa dificuldade:

Imagine-se um feto imaturo vivo, sem possibilidade de viver por sua própria imaturidade, expulso espontaneamente, com morte inevitável, apressada por ato violento da mãe”.

Não se trata de aborto, eis que a expulsão se deu naturalmente; portanto, ausentes estão as noções de dolo ou culpa. De infanticídio também não será o crime, porque o sujeito passivo deste delito não pode ser o feto abortado, sendo por isso que a sua sobrevivência excepcional foge de equiparação à vida extra-uterina. Quid iuris?

Segundo Itagiba, o fato é atípico.

Temos ainda outras questões que são abordados por de que trata na mesma obra, Paulo Sérgio Leite Fernandes:

Trata-se de cesariana praticada em gestante, com o fim especifico de destruir o produto da concepção. É sabido que o infanticídio somente se tipifica quando a mulher mata o filho durante o parto ou logo após, sob a influência do estado puerperal. Pois bem, a cesariana pode ser praticada antes do término da gravidez, para matar o feto em condições de viver após parto normal. O feto pode ser vital, apesar de não ter maturidade.

21

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Supondo-se que o referido exemplo se concretize (cesariana praticada em gestante, com o fim especifico de destruir o produto de concepção), não haveria infanticídio, em virtude da ausência de dois requisitos: a) morte do feto durante o parto ou logo após; b) estado puerperal. Por outro lado não será caso de homicídio, porque o feto, se morto nas entranhas da mãe, ainda não teria vida extra-uterina.

Neste caso, como se aplicar o Direito?

Segundo Paulo Sérgio Leite Fernandes, a solução seria imputar à mãe e ao co-autor o delito de aborto. Entrementes, se o feto é extraído vivo e morto após a extração, o caso mudará de figura penal, passando a enquadra-se na hipótese de homicídio.

Como se vê, a relação do infanticídio com o aborto é envolta em delicadíssimos aspectos, que tendem a multiplicar-se com a evolução da ciência e da Medicina, originando-se novas e difíceis questões.

O legislador penal distingue ambos os crimes:

“A distinção é que, no aborto, há a inviabilidade da continuidade da gestação, por provocação. O infanticídio, por deu turno, se caracteriza pela já iniciação do parto e, em qualquer de suas faces (dilatação, expulsão do feto e expulsão da placenta) a morte do sujeito passivo”.(RJ nº16)

Damásio E. De Jesus distingue o crime de infanticídio e aborto da seguinte maneira:

Nos termos do artigo 123 do Código Penal, que define o infanticídio, o fato para assim ser qualificado, deve ser praticado durante ou logo após o parto. Dessa maneira, há infanticídio quando a conduta é executada pela mãe durante esse lapso temporal. Antes de iniciado o parto existe aborto e não infanticídio. É necessário precisar em que momento tem início o parto, uma vez em que o fato se classifica como um outro crime de acordo com a ocasião da pratica delituosa: Antes do inicio do parto existe aborto; a partir de seu inicio infanticídio. O parto se inicia com a dilatação, em que se apresentam as circunstâncias caracterizadoras das dores e da dilatação do colo do útero.

Após, vem a fase de expulsão, em que o nascente é impelido para a parte externa do útero. Por ultimo, há a expulsão da placenta, com a expulsão desta, o parto esta terminado. A morte do sujeito passivo, em qualquer das fases do parto, constitui delito de infanticídio.

Não se verificando que a mãe tirou a vida do filho recém-nascido sob a influência do estado puerperal, à morte praticada se adequará a figura típica do homicídio (RT.491/292, 488/323 e 327). Para o doutrinador Renato N. Fabbrini, o simples fato de demorar o recém-nascido para morrer não desnatura, por si só, o delito de infanticídio, (JTACRSP 33/229). Quando a mãe expõe ou abandona o recém nascido para ocultar desonra própria, estando ou

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não sob a influência do estado puerperal, ocorre o crime de exposição ou abandono de recém-nascido, qualificado quando resultar lesão corporal de natureza grave ou morte (artigo. 134 e seus parágrafos).

Outras considerações a respeito do tema se fazem necessárias no sentido de explicar alguns termos técnicos:22

Natimorto: feto morto durante o período perinatal que de acordo com a CID-10, inicia-se a partir da 22.ª inicia-semana de gestação, quando o peso fetal é de 500g, podendo ter como causa: a anorexia anteparto, prematuridade, anomalias congênitas e doenças hemolítica congênita.

Feto nascente: apresenta todas as características do infante nascido, menos a faculdade de ter respirado. Em outras legislações chamado de feticídio.

O Infante Nascido: é aquele que acabou de nascer, respirou, mas não recebeu nenhum cuidado especial, tendo todo o características habituais, além disso o estado sanguinolento ajuda a detectar logo “após o parto”, sendo o aspecto de maior significância no diagnostico do infante nascido.

Recem-nascido: O estado do recém-nascido é caracterizado pelos vestígios comprobatórios da vida intra-uterina. Tem o recém-nascido um estágio que vai desde primeiros cuidados após o parto até aproximadamente o 7º dia de nascimento.

22

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SEÇÃO 3

3.1 Bem jurídico protegido e sujeitos do delito

O bem jurídico tutelado é o direito a vida, contudo a vida humana extra uterina, assim como no delito de homicídio.

Preocupa-se o estado em preservar a vida do individuo desde o começo de seu nascimento.

A autora do infanticídio só pode ser a mãe. O artigo 122 é expresso em prever que o fato deve ser cometido pela mãe contra o próprio filho. Cuida-se de um crime próprio uma vez que não pode ser cometido por qualquer autor. O tipo penal exige qualidade especial do sujeito ativo. Entretanto cujo nosso ilustre doutrinador Damásio E. de Jesus23 isso não impede que terceiro responda por infanticídio diante do concurso de agentes.

Segundo Luiz Régis Prado, o mesmo sustenta que o concurso de pessoas é inadmissível, notadamente porque o estado puerperal que provocaria uma atenuação da culpabilidade é circunstância pessoal, insuscetível de extensão aos co-autores ou participes. O terceiro que realiza atos de execução ou auxilia, induz ou instiga a mãe a perpetrá-los responderia pelo crime de homicídio.

Sujeito ativo: A mãe, que mata o próprio filho durante o parto ou logo após, sob a influência do estado puerperal. Trata-se, portanto, de crime próprio.

Sujeito passivo: É, o ser humano nascente, na etapa da transição da vida uterina para a extra-uterina ou recém-nascido.

Haverá o delito de infanticídio se for constatado que o feto nascente esta vivo, basta que tenha apresentado o mínimo de atividade funcional. A prova mais utilizada para se constatar sinal de vida em um ser nascente ou neonato é a prova da respiração, sendo conhecido o conceito de Gasper “Viver é respirar”, não é possível a existência de vida apnéica extra-uterina (sem respiração). Não obstante isso, a prova da vida humana extra-extra-uterina faz comumente através das chamadas docimasias respiratória dentre elas a pulmonar-hidrostática (hidrostática de Galeno), podendo se constatar por essa via a existência de respiração anterior e a gastrointestinal (ou de Breslau). Pela primeira colocam-se os pulmões em um recipiente com água a temperatura entre 15°c e 20°c se os pulmões flutuam, comprovam se a respiração.

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Jesus, Damásio E. de, Direito Penal, 2º vol. parte especial – 28. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva 2007, p.110

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A prova da vida autônoma funda-se na diferença de peso especifico entre os pulmões que respiram e aqueles que nunca fizeram.

De acordo com a doutrina de Luiz Régis Prado24, docimasias pulmonar hidrostática não é prova absoluta, pois é possível que os pulmões flutuam por outras causas que não o ar inspirado.

A docimasias gastrointestinal consiste em colocar o estômago e o intestino devidamente unido, no recipiente com água: caso flutuem é possível concluir que a criança respirou. E isso porque, com a respiração, ingere-se certa quantidade de ar, que penetra naqueles órgãos e os deixa mais leve que a água.

As docimasias não respiratórias atestam a existência de atividades vitais não relacionadas, direta ou indiretamente com a respiração, como alimentar (pesquisa microscopia, macroscópica, ou química de vestígios de absorção de alimentos ou outras substâncias pelo neonato). Importante notar que a prova pericial é imprescindível.

Com base nesses dados é possível afirmar que a morte do ser nascente pela mãe sem que se longre constatar que ele se encontrava biologicamente vivo quando da pratica do ato, constituirá crime impossível, pela absoluta impropriedade do objeto.

Se a mãe matar um adulto sob ai influência do estado puerperal, respondera pelo delito de homicídio.

Se a mãe matar outra criança sob a influência do estado puerperal, haverá infanticídio putativo.

A existência humana, independentemente da qualidade do homem, de seus atributos ou condições, deve ser respeitados por todos , máxime diante de sua dupla importância valorativa, visto de um lado surgir o interesse singular e supremo que cada ser humano possui pela conservação de sua existência e, de outro, despontar o interesse dos povos politicamente organizados em salvaguardar a condição moral e material que a vida humana representa.

O Estado, portanto, impõe como imperativo jurídico que ela seja respeitada de forma absoluta e, sem entrarmos em maior consideração, já que a lei a respeito é clara e taxativa, protege-a, como é sabido, desde a concepção até o instante de sua extinção.

Assim sendo, todo ser humano, como alerta Eusébio Gomes, tem direito a vida em qualquer situação e por mais precária que seja, devendo o Estado protegê-la e garanti-la contra todo e qualquer abuso.

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Prado, Luiz Régis, Curso de Direito Penal Brasileiro -7ª ed. rev. e atual. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008,p.94,95

Referências

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