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Análise dialógicodiscursiva da atividade dos cuidadores de idosos em instituições geriátricas do Recife

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO  CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO  PROGRAMA DE PÓS­GRADUAÇÃO EM LETRAS . LUDMILA MOTA DE FIGUEIREDO PORTO . ANÁLISE DIALÓGICO­DISCURSIVA DA ATIVIDADE DOS  CUIDADORES DE IDOSOS EM INSTITUIÇÕES  GERIÁTRICAS DO RECIFE . Recife  2010.

(2) LUDMILA MOTA DE FIGUEIREDO PORTO . ANÁLISE DIALÓGICO­DISCURSIVA DA ATIVIDADE DOS  CUIDADORES DE IDOSOS EM INSTITUIÇÕES  GERIÁTRICAS DO RECIFE . Dissertação  apresentada  ao  Programa  de  Pós­Graduação  em  Letras  da  Universidade  Federal  de  Pernambuco,  como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre  em Linguística.  Área  de  concentração:  Linguagem,  Trabalho  e  Sociedade.  Orientadora: Prof a . Dr a . Maria Cristina Hennes Sampaio. . Recife  2010.

(3) Porto, Ludmila Mota de Figueiredo  Análise  dialógico­discursiva  da  atividade  dos  cuidadores de idosos em instituições geriátricas do  Recife / Ludmila Mota de Figueiredo Porto. ­ Recife :  O Autor, 2010.  104 folhas: il.  Dissertação  (Mestrado)  –  Universidade  Federal  de Pernambuco. CAC. Linguística, 2010. . Inclui bibliografia.  1.  Linguística.  2.  Ergolinguística.  3.  Análise  do  discurso.  4.  Envelhecimento  5.  Linguagem  ­  trabalho. I.Título.  801 . CDU (2.ed.) . 410 . CDD (22.ed.) . UFPE  CAC2010­25.

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(5) Dedico  este  trabalho  ao  meu  pai,  Fernando,  por  ter me ensinado que nem sempre é possível fazer  o melhor,  mas é preciso ser  intenso, para viver e  cantar esta vida maravilhosa..

(6) AGRADECIMENTOS . À  Prof a .  Maria  Cristina  Hennes  Sampaio,  minha  orientadora,  pelas  portas  que  me  abriu  e  caminhos que me ajudou a percorrer; pela confiança que depositou em mim desde a época da  iniciação científica; pelo exemplo de competência e ética profissional;  À Prof a . Dóris Cunha, por ter me proporcionado um maravilhoso engrandecimento acadêmico  na disciplina de Teoria Dialógica e no Grupo de Estudos Bakhtinianos;  À  Prof a .  Judith  Hoffnagel,  por  questionar  tudo,  sempre,  fazendo  com  que  seus  alunos  repensem seus trabalhos, na disciplina de Metodologia, uma verdadeira terapia de grupo;  À Prof a . Kátia Magdala, pelas indicações bibliográficas na área da Saúde e pela força, desde a  iniciação científica.  Aos  meus  companheiros  de  Pós­Graduação,  em  especial;  Leo,  Carlinhos,  Cléber,  e  Aguinaldo,  pela  amizade  que  firmamos;  da  Literatura,  não  poderia  deixar  de  agradecer  a  Denise, minha parceira de traduções e a Cristhiano Aguiar, meu amigo escritor.  Às gestoras das instituições e aos cuidadores, sem a colaboração dos quais este trabalho não  teria sido possível;  A  Fernando e Angela –  meus pais – por terem  me proporcionado o maior bem, a educação;  por  acreditarem  na  minha  capacidade  e  pelo  incentivo  ao  longo  da  vida,  meus  eternos  cuidadores, meus amores;  Aos  meus  queridos  irmãos  ­  Duina,  Catarina  e  Fernando  ­  pelo  apoio  moral,  financeiro  e  jurídico, mas principalmente por sempre me incitarem a crescer;  Às  minhas  queridas  tias,  Lúcia  e  Danúzia,  pelo  apoio  no  desenvolvimento  da  dissertação,  quando estive em São Paulo;  À  vovó  Genilda,  exemplo  de  memória  viva  e,  principalmente,  de  subversão;  à  vovó  Ivete,  eterna professora;  À  Isabel  e  João  (Gordo),  pelas  risadas  nos  momentos  de  tensão,  pela  compreensão  e  acolhimento na fazenda, onde desenvolvi parte deste trabalho;  À Laura, responsável por tornar minha vida mais leve nos últimos anos, graças à dança e à sua  companhia;  À Iá, por toda a força que me deu nos últimos meses, por me ouvir nos momentos delicados  de redação do trabalho, pelo apoio estratégico que me ofereceu, por estar presente em minha  vida;  Aos  meus  amigos  de  longas  datas:  Silvia,  Cecília,  Thiago,  Ivna,  André,  Herlon,  Alice  e  Juliano, por me ensinarem que amizade é sinônimo de amor.  À Severina (in memoriam), uma mulher de caráter forte e coração de mãe;  À Bárbara, por ter me despertado para a pesquisa; pelas pontes construídas e pelos momentos  de estudo compartilhados..

(7) “ Por isso eu pergunto a vocês no mundo  Se é mais inteligente o livro ou a sabedoria?  O mundo é uma escola, a vida é um circo,  Amor, palavra que liberta, já dizia o profeta” Marisa Monte.

(8) RESUMO . O  acelerado  envelhecimento  da  população  brasileira,  nos  últimos  trinta  anos,  acarretou  a  necessidade  de  ampliação  dos  serviços  especializados  de  atendimento  ao  idoso.  Nesse  contexto,  a  atividade  do  cuidador  de  idosos  ganhou  importância  no  mundo  do  trabalho,  embora  ainda  seja  comum  a  ideia  de  que  esses  trabalhadores  carecem  da  qualificação  profissional  necessária.  Assim,  este  estudo  teve  o  objetivo  de  configurar  a  atividade  dos  cuidadores  de  idosos,  os  quais  trabalham  em  instituições  geriátricas  de  Recife/PE,  uma  das  capitais  com  maior  número  proporcional  de  idosos  no  Brasil.  Para  tanto,  realizaram­se  entrevistas narrativas com dez cuidadores de idosos, em três instituições geriátricas de Recife,  além de observações naturais desses cuidadores em atividade, incorporadas posteriormente à  análise. As entrevistas foram transcritas, descritas, interpretadas e analisadas qualitativamente,  à luz do método dialógico­discursivo, uma forma de conhecimento de natureza sócio­cultural  de  sujeitos  históricos,  através  da  linguagem,  que  é  considerada  uma  forma  de  trabalho  (SAMPAIO et al., 2006, a;b). O objeto de estudo – a atividade dos cuidadores de idosos ­ foi  abordado  a  partir  de  duas  perspectivas  teórico­metodológicas:  a  Teoria  Dialógica  da  Linguagem,  desenvolvida  pelo  filósofo  russo  Bakhtin  e  seu  Círculo,  e  uma  Teoria  do  Trabalho Humano, que se situa na confluência da Ergologia (SCHWARTZ, 1997; 2000b) e da  Ergonomia,  as  quais  dialogam  com  a  Linguística  (FAÏTA,  2002;  2005).  Assim,  a  atividade  dos  cuidadores  de  idosos  foi  configurada,  por  um  lado,  a  partir  das  práticas  linguageiras  desses  trabalhadores  no  âmbito  da  atividade  profissional;  por  outro,  das  ações  corporais  e  gestuais  incorporadas  na  atividade  desses  trabalhadores.  Constatou­se  que  esses  cuidadores  mobilizam  sentidos diversos, demonstrando uma compreensão  ativa do envelhecimento  e da  velhice humanos, evocando em suas falas o discurso do Outro (BAKHTIN, 2003) – a fim de  contestá­lo,  atribuindo­lhes  novos  sentidos;  no  que  concerne  ao  plano  da  atividade,  esses  trabalhadores mostraram uma competência (SCHWARTZ, 1998) baseada na herança histórica  do  seu  trabalho,  no  saber  prático  da  atividade,  independentemente  de  terem  freqüentado  cursos de capacitação para cuidadores de idosos. Dessa forma, embora os cuidadores possuam  uma riqueza nas formas de agir em situações singulares, eles ainda prescindem da utilização  de  um  saber  mais  formal,  fato  que  permite  afirmar  que  o  gênero  profissional  ‘cuidador  de  idosos’ ainda está em formação, pois ainda não foram suficientemente construídos os recursos  comuns  necessários  para  a  resolução  dos  problemas  surgidos  no  exercício  da  atividade,  por  isso  os  cuidadores  de  idosos  são  tachados  como  desqualificados.  No  entanto,  para  que  o  gênero ‘cuidador de idosos’ seja constituído, deve­se considerar o saber prático da atividade  desses  cuidadores  como  um  valioso  instrumental  para  reorientar  as  prescrições  do  saber  formal, a fim de aperfeiçoar a competência desses trabalhadores. . PALAVRAS­CHAVE:  Análise  dialógico­discursiva.  Atividade.  Cuidador  de  idosos.  Competência..

(9) ABSTRACT . In thirty years, the Brazilian people have grown old very quickly, and from this fact, the need  for increasingly specialized services for caring for elderly people has arisen.  In this context,  the  activity  of  caregivers  has  gained  relevance  in  the  work  market,  despite  the  well­known  idea that these workers lack the necessary qualifications for their job. Therefore, this study is  aimed at configuring the activity of caregivers of the elderly who work in geriatric institutions  in Recife/PE, one of the capitals with the largest number of elderly people in Brazil. In order  to  do  so,  narrative  interviews  were  carried  out  individually  with  ten  caregivers,  in  three  different  geriatric  institutions,  as  well  as  naturalistic  observations  of  them  while  working,  which  were  incorporated  afterwards  into  the  analysis.  The  narrative  interviews  were  transcribed,  described,  interpreted  and  qualitatively  analyzed  through  a  dialogic­discursive  method, a means of knowing social and culturally historical subjects through language, which  is  considered as a  form of work (SAMPAIO et al. 2006 a;b). The object of this study – the  activity  of  the  caregivers  of  the  elderly  –  was  approached  from  two  theoretical  and  methodological  perspectives:  Bakhtin’s  Dialogical  Theory  of  Language,  and  Schwartz’s  Work Theory (1997; 2000b), which is based on the confluence of Ergology and Ergonomy in  dialogue with Linguistics (FAÏTA, 2002; 2005). Afterwards, the activity of the caregivers of  the elderly was studied, on one hand, through language practices of the workers in the scope  of  their  professional  activity;  and  on  the  other  hand,  through  corporal  actions  and  gestures  incorporated into their work. It was observed that the caregivers configured diverse meanings,  revealing an active comprehension of getting old and old age, and invoking in their speech a  discourse  of  the  Other   (BAKHTIN,  2003).  In  order  to  contest  it  and  by  bringing  new  meanings to it with relation to their job, these workers proved to be competent (SCHWARTZ,  1998)  concerning  their  practical  knowledge  of  the  job,  although  they  may  or  may  not  have  attended any previous qualification course for caregivers. In this way, despite these caregivers  having  a  rich  knowledge  on  how  to  act  in  singular  situations,  they  still  lack  a  more  formal  knowledge, a fact which permits us to deduce that the professional genre ‘the caregiver of the  elderly’ is still being formed, as a resource to solve problems that can emerge in the activity  are not constituted at all.  This can explain why these caregivers are classified as incompetent.  However,  in  order  to  establish  this  professional  genre,  their  practical  knowledge  must  be  taken into account as a valuable tool in redirecting the prescriptions of formal knowledge to  improve the competence of the caregiver of the elderly. . KEY­WORDS: Dialogic­discursive analysis. Activity. Caregivers of the elderly. Competence..

(10) SUMÁRIO . INTRODUÇÃO........................................................................................................... 9  CAPÍTULO 1 – O ENVELHECIMENTO E O CUIDADOR DE IDOSOS ........... 15  1.1 O envelhecimento no mundo e no Brasil............................................................ 15  1.2 As instituições geriátricas e o idoso institucionalizado ....................................... 16  1.3 O cuidador de idosos ......................................................................................... 18  CAPÍTULO 2 – TEORIA DIALÓGICA NO ÂMBITO DA ATIVIDADE ............ 23  2.1 Situando conceitos na área da Ergologia ............................................................ 23  2.2 Linguagem e Trabalho ....................................................................................... 31  2.3 O linguista na análise da atividade ..................................................................... 33  2.4 Gênero e estilo................................................................................................... 35  CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA.......................................................................... 37  3.1 O contexto da pesquisa ...................................................................................... 37  3.2 Caracterização do corpus discursivo .................................................................. 37  3.3 Instrumentos...................................................................................................... 39  3.3.1 A entrevista narrativa .................................................................................. 39  3.3.1.1 Procedimentos ............................................................................................. 40  3.3.2 As observações naturais .............................................................................. 41  3.4 Teoria e método dialógico­discursivo no âmbito da atividade ............................ 42  CAPÍTULO 4 – O ENVELHECIMENTO E A VELHICE RESSIGNIFICADOS 48  4.1 Envelhecimento e trabalho................................................................................. 48  4.2 O envelhecimento como híbrido biológico­social: outros sentidos ..................... 56  4.3 Envelhecimento, velhice e saúde........................................................................ 61  4.4 Envelhecimento e velhice como conquistas........................................................ 66  CAPÍTULO  5  –  CONFIGURANDO  A  ATIVIDADE  DOS  CUIDADORES  DE  IDOSOS NAS INSTITUIÇÕES GERIÁTRICAS DO RECIFE ............................. 72  5.1 A atividade dos cuidadores de idosos nas instituições geriátricas do Recife........ 72  5.2 Competência, usos de si e gestão na atividade dos cuidadores de idosos ............ 81  CONCLUSÕES......................................................................................................... 91  REFERÊNCIAS........................................................................................................ 94  ANEXO A................................................................................................................ 100  ANEXO B................................................................................................................ 102.

(11) 9 . INTRODUÇÃO . O  Brasil  sofreu  uma  rápida  mudança  no  seu  perfil  demográfico,  a  partir  da  segunda  metade do século XX: de país jovem, passou a ser considerado um país velho, uma vez que,  em 2002, 9,3% da população brasileira já atingira 60 anos de idade (IBGE, 2002). Segundo a  Organização  Mundial  de  Saúde  (2005),  estima­se  que  o  país  terá,  até  2025,  32  milhões  de  pessoas  idosas,  ocupando  o  sexto  lugar  entre  os  países  com  maior  número  de  idosos  do  mundo.  Sabe­se que o aumento da expectativa de  vida  não garante necessariamente ao  idoso  viver com saúde e qualidade. Assim, o impacto imediato do aumento da população idosa, no  Brasil, trouxe sérias repercussões para o sistema de saúde, particularmente no que se refere às  novas  demandas  de  assistência  social  a  esse  segmento.  Daí  a  premente  necessidade  de  investimento em ações preventivas de saúde, ampliação de Instituições de Longa Permanência  e  de  formação  de  profissionais  habilitados,  como  enfermeiros,  terapeutas  ocupacionais  e  cuidadores de idosos.  Diante  dessa  realidade,  a  questão  do  envelhecimento  ganhou  atenção  especial  em  estudos acadêmicos, fato que tem suscitado um produtivo diálogo interdisciplinar, envolvendo  a  área  da  Saúde  e  diversas  outras  áreas  do  conhecimento,  como  as  Ciências  Humanas  e  Sociais. Assim, baseado no aporte teórico da Sociolinguística, Dino Preti (1991) empreendeu  um estudo pioneiro no Brasil, envolvendo a relação entre linguagem e envelhecimento, o qual  tinha o objetivo de descrever os aspectos sociolingüísticos da comunicação entre idosos, como  a falta de organização sintática e as repetições, decorrentes da idade avançada.  Mas,  é  no  campo  de  investigação  das  teorias  do  discurso  e  da  enunciação  que  a  importância da relação entre linguagem e envelhecimento vem sendo evidenciada nos últimos  anos,  através  de  estudos  inter  e  multidisciplinares.  É  o  caso  da  Tese  de  Doutorado  desenvolvida  por  Sobrinho  (2006),  no  Programa  de  Pós­Graduação  em  Letras  da  Universidade  Federal  de  Alagoas  (UFAL),  a  qual  revela  as  contradições  existentes  nos  discursos  da  velhice  e  sobre  a  velhice,  engendradas  no  âmbito  das  relações  de  produção  da  sociedade capitalista. Já Sampaio et al. (2007), do Grupo de Pesquisa Linguagem, Sociedade, . Saúde  e  Trabalho  (Universidade  Federal  de  Pernambuco/CNPq),  realizaram  estudos.

(12) 10 . enunciativo­discursivos  com  uma  amostra  da  população  de  idosos  do  município  de  Sairé,  situado na região do agreste pernambucano, demonstrando o papel da memória, do habitus e  da  capacidade  funcional  dos  idosos  na  atribuição  de  novos  sentidos  sobre  o  ser  velho  e  a . velhice, para a promoção do envelhecimento saudável.  A  Análise  Dialógica  do  Discurso,  na  confluência  da  Análise  Ergológica  da  Linguagem,  na  atividade  profissional,  já  se  havia  mostrado  bastante  produtiva  tanto  para  a  área da Linguística quanto para a área da Saúde, em estudo anterior, quando Sampaio  et al.  (2005) empreenderam um projeto de pesquisa participante junto a uma equipe de profissionais  do  Hemope 1 ,  a  fim  de  obter  um  diagnóstico  sobre  as  causas  da  baixa  adesão  dos  acompanhantes  de  pacientes  às  ações  educativas  empreendidas  pela  Comissão  de  infecção  Hospitalar  da  instituição.  Nesse  estudo,  Sampaio  et  al.  (2005)  identificaram  que  a  falta  de  interação  prejudicava  a  compreensão  das  informações  sobre  prevenção  por  parte  dos  acompanhantes e que o estabelecimento de estratégias de promoção da interação entre equipe  e acompanhantes promovia a instauração do diálogo entre eles e dos acompanhantes entre si,  favorecendo  a  compreensão  das  informações,  a  negociação  e  a  cooperação  em  relação  às  práticas de prevenção.  Os  resultados  dos  estudos  acima  referidos, obtidos  no  domínio  da  Análise  Dialógica  do  Discurso  e  da  Análise  Ergológica  da  Linguagem,  na  atividade  profissional,  mostram­se,  assim, teórica e metodologicamente relevantes para os estudos que envolvem a relação entre  linguagem, trabalho e saúde. Nesta linha, optou­se pela realização de um estudo direcionado  para  a  atividade  exercida  por  cuidadores  de  idosos  em  Instituições  de  Longa  Permanência  situadas em  Recife, tendo em  vista que é uma das capitais brasileiras com  maior  número de  idosos, ficando atrás apenas do Rio de Janeiro e de Porto Alegre (IBGE, 2000). Ademais, a  ocupação  do  cuidador  de  idosos  tem  conquistado  um  espaço  cada  vez  maior  no  mundo  do  trabalho,  diante  da  necessidade  de  ampliação  de  serviços  especializados  de  atendimento  ao  idoso  institucionalizado,  em  decorrência  do  envelhecimento  acelerado  da  população  brasileira. Na  área  da  Saúde,  grande  parte  das  pesquisas  acadêmicas  sobre  os  cuidadores  de  idosos (CARNEIRO et al., 2009; SALIBA et al., 2007) são de caráter quantitativo ou estão  voltadas  para  o  estudo  do  perfil  desses  trabalhadores,  visando  a  oferecer  subsídios  para  a . 1 . O Hemope é um hospital para tratamento hematológico o qual faz parte da Fundação Hemope, uma instituição  vinculada à Secretaria de Saúde do Governo do Estado de Pernambuco..

(13) 11 . elaboração de cartilhas ou manuais que os oriente, a fim de minimizar a falta de qualificação  especializada desses profissionais. Nesse sentido, nos últimos anos, a Prefeitura de Campinas  – SP e a de Florianópolis ­ SC, por exemplo, preocuparam­se com o lançamento de manuais  técnicos para cuidadores de idosos. Em 2008, o Ministério da Saúde publicou o Guia Prático  do  Cuidador  de  Idosos,  para  ser  utilizado  em  todo  o  Brasil.  Ressalta­se  que  não  existe  qualquer  material  que  esteja  voltado  especificamente  para  os  cuidadores  de  idosos  que  trabalham  em  instituições  geriátricas,  embora,  de  maneira  geral,  o  conteúdo  desses  manuais  possa também lhes ser útil.  No entanto, apesar dos esforços para a qualificação desses trabalhadores, é comum  a  ideia  de  que  os  cuidadores  de  idosos,  em  sua  maioria,  permanecem  desqualificados  para  o  exercício  de  seu  trabalho,  como  pode  ser  comprovado  pelo  teor  do  Projeto  de  Lei  N o  2372/2001 (ANEXO A), em trâmite no Congresso Nacional.  Considerando  que  a  qualificação  dos  cuidadores  passa  pela  apreensão  enunciativo­  discursiva de um  novo gênero profissional, o qual  se  supõe estar em processo de  formação,  algumas  questões  podem  ser  problematizadas  no  âmbito  dessa  esfera  de  atividade:  De  que  forma  os  cuidadores  de  idosos,  os  quais  trabalham  em  instituições  geriátricas  do  Recife,  ressignificam as concepções de envelhecimento e velhice humanos, através da linguagem e de  suas ações? De que maneira as atividades que configuram o trabalho dos cuidadores de idosos  são expressas por eles e dialogam com o discurso do Outro? A competência dos cuidadores de  idosos baseia­se principalmente em que ingredientes? Como os cuidadores fazem uso de si e  se posicionam diante das dimensões gestionárias de seu trabalho?  Parte­se  da  hipótese  de  que  o  gênero  profissional  ‘cuidador  de  idosos’  ainda  se  encontra em formação, ou seja, que no meio profissional dos cuidadores de idosos, ainda não  foram reunidos os recursos comuns  necessários para a resolução dos problemas surgidos no  exercício da atividade, por isso a dificuldade de regulamentá­la.  Cabe salientar que o objeto de estudo ­ a atividade dos cuidadores de idosos ­ tem uma  dupla  face,  uma  discursiva  e  outra  social,  uma  vez  que  se  trata,  de  um  lado,  das  práticas  linguageiras desses profissionais, ou seja, de uma ação (trabalho) que é executada, através da  linguagem,  no  âmbito  da  atividade  profissional  –  e,  de  outro,  de  ações  corporais  e  gestuais  incorporadas  na  atividade  desses  trabalhadores.    Em  vista  disso,  o  objeto  será  abordado  a  partir  de  duas  perspectivas  teórico­metodológicas:  a  Teoria  Dialógica  da  Linguagem,  desenvolvida pelo  filósofo russo Bakhtin e seu Círculo, e uma Teoria do Trabalho Humano,.

(14) 12 . que  se  situa  na  confluência  da  Ergologia 2  (SCHWARTZ,  1997;  2000b)  e  da  Ergonomia 3  as  quais  dialogam  com  diversos  aportes  disciplinares,  entre  eles,  a  Linguística  (FAÏTA,  2002;  2005), tendo como ponto de confluência teórica o conceito de atividade.  As  práticas  linguageiras  (discursos)  da  atividade  profissional  compreenderão  principalmente  duas  dimensões  de  análise:  de  uma  linguagem  no  trabalho  (a  enunciação,  o  discurso na atividade, ou seja, em situação de trabalho) e de uma linguagem sobre o trabalho  (quando a linguagem é usada para descrever sua própria atividade), através da qual o sujeito  entrevistado  é  estimulado  a  acessar  a  memória  da  atividade,  no  momento  da  narrativa,  ao  mesmo tempo em que contrasta essa memória com sua forma própria de exercer atividade. A  terceira  dimensão  de  análise,  a  linguagem  como  trabalho,  isto  é,  quando  o  trabalhador  fala  para  o  outro,  seu  colega  de  trabalho,  ou  fala  para  si  mesmo,  para  orientar­se  na  própria  atividade (TEIGER, 1995 apud NOUROUDINE, 2002), será abordada quando for oportuno,  uma vez que complementa as outras duas.  Tendo  em  vista  que  a  atividade  do  cuidador  de  idosos  faz  parte  da  área  da  Saúde,  considerou­se  importante  situar,  no  primeiro  capítulo  deste  estudo,  o  contexto  em  que  se  tornou relevante essa atividade no Brasil: o acelerado envelhecimento da população brasileira  nos últimos trinta anos. Mais adiante, apresenta­se o processo de institucionalização do idoso,  suas  causas  e  consequências;  os  estudos  etnográficos  sobre  o  trabalho  dos  auxiliares  de  enfermagem  em  clínicas  de  repouso  americanas,  além  dos  estudos  sobre  os  cursos  de  formação para cuidadores de idosos em instituições geriátricas do Rio de Janeiro.  O segundo capítulo deste trabalho é dedicado à delimitação da abordagem utilizada na  análise de dados, mais precisamente, à confluência entre a Ergologia e Linguística, a qual se  dá com base na Teoria Dialógica bakhtiniana. Para tanto, faz­se um percurso desde os estudos  sobre  o  trabalho,  empreendidos  na  perspectiva  da  Ergonomia,  que  separava  o  trabalho  prescrito do trabalho real, passando pelo surgimento da Ergologia, segundo a qual o trabalho  prescrito  é  constantemente  renormatizado  pelo  trabalho  real.  Para  abordar  a  complexidade  dessa relação, a Ergologia dialoga com outras disciplinas, entre elas, a Linguística, em que a  linguagem  é  vista  como  reveladora  dos  problemas  imediatos  das  situações  de  trabalho  2 . A Ergologia é uma abordagem científica criada pelo filósofo Yves Schwartz (1997;1998;1999;2000a; 2000b;  2004)  a  qual  se  volta  para  a  compreensão  do  trabalho  humano  (atividade)  em  situação,  observando  as  problemáticas  que  envolvem  a  relação  entre  o  trabalho  prescrito  (patrimônio  cultural  acumulado  sobre  o  trabalho, transmitido entre as gerações) e o trabalho real (patrimônio vivo das atividades do trabalho).  3  A  Ergonomia  surgiu  como  disciplina  em  meados  do  século  XX,  com  o  objetivo  de  estudar  a  execução  de  tarefas pelo trabalhador, considerando a dicotomia entre o trabalho prescrito e o trabalho real..

(15) 13 . (FEITOSA,  1998),  assumindo  um  lugar  privilegiado  para  a  compreensão  das  ações  dos  profissionais  e dos sentidos que eles produzem e  mobilizam  na esfera da atividade (FAÏTA,  2002).  Considerou­se  relevante  dedicar  o  terceiro  capítulo  exclusivamente  à  metodologia  adotada  neste  estudo,  a  qual  situa  o  contexto  em  que  foi  desenvolvida  a  pesquisa,  a  caracterização  do  corpus  discursivo  analisado  e  os  instrumentos  utilizados  na  coleta  dos  dados, com seus respectivos procedimentos de pesquisa. Mas, é o último tópico que  merece  destaque nesse capítulo, uma vez que explicita de que forma a teoria dialógica bakhtiniana é  utilizada também como um método de análise qualitativa de dados. A questão metodológica,  na  teoria  bakhtiniana,  é  abordada  a  partir  do  ensaio  Metodologia  das  ciências  humanas  (BAKHTIN, 2003, p. 393­410), em que Bakhtin propõe que o objeto de estudo das ciências  humanas seja o homem, um ser que se encontra em constante interação e, por isso, só pode ser  estudado sob o ponto de vista dialógico. Além de perpassar os sujeitos, o princípio dialógico  perpassa  a  relação  do texto  com  outros  textos,  sem  a  qual  não  é  possível  chegar  ao  sentido  concreto do enunciado  O  método  dialógico­discursivo  é  utilizado,  no  quarto  capítulo,  para  analisar  de  que  forma as concepções de envelhecimento e velhice aparecem nos discursos dos cuidadores de  idosos  entrevistados,  com  base  nas  seguintes  categorias:  alteridade,  ser­evento,  ato . responsável  e  responsivo,  memória ,  significação  e  tema,  compreensão  ativa ,  acento  apreciativo e entonação expressiva. Essas concepções foram eleitas para análise, porque sua  compreensão é esperada dos cuidadores de  idosos, como uma exigência para o exercício de  sua atividade.  É necessário salientar que essas categorias não foram estabelecidas previamente, mas  após a observação das aberturas que os dados ofereciam para  a construção dos sentidos dos  discursos.  Assim,  se  essas  categorias  são  utilizadas  na  análise,  é  porque  os  cuidadores  de  idosos  mostram­se  posicionar  diante  do  discurso  do  Outro;  tomam  atos  responsáveis  e  responsivos,  mediante  a  compreensão  ativa  dos  discursos  e  ações  alheias;  empregam  entonações  expressivas  a  determinadas  palavras;  atualizam  a  significação  de  palavras  no  discurso,  constituindo  os  temas  de  seus  enunciados;  deslocam­se  discursivamente  de  uma  memória retrospectiva para uma memória prospectiva, atribuindo novos sentidos às palavras,  no inacabável diálogo que se instaura, ao longo do tempo, entre sujeitos e discursos..

(16) 14 . O último capítulo deste estudo é dedicado à configuração da atividade dos cuidadores  de  idosos  nas  instituições  geriátricas  do  Recife,  através,  sobretudo,  dos  conceitos  da  Ergologia.  Ao  contrário  do  capítulo  quatro,  esse  centra­se  mais  na  análise  do  conteúdo  das  falas dos cuidadores, embora se estabeleçam diálogos com o discurso contido no Guia Prático  do Cuidador, ou na literatura sobre cuidadores de idosos, quando pertinente, para dar respaldo  à análise.  Enfim,  sem a  pretensão  de  esgotar o  conhecimento  sobre  a  atividade  do  cuidador  de  idosos  nas  instituições  geriátricas  do  Recife,  este  estudo  constitui­se,  antes,  como  uma  tentativa de iniciar um diálogo com esses trabalhadores, para lhes dar direito à palavra..

(17) 15 . CAPÍTULO 1 – O ENVELHECIMENTO E O CUIDADOR DE IDOSOS . 1.1 O envelhecimento no mundo e no Brasil . O  cenário  demográfico  mundial  vem  se  caracterizando,  principalmente  nos  últimos  anos, pelo crescimento da população idosa, decorrente do aumento da expectativa de vida do  homem. O Japão, o Canadá e os países europeus enfrentaram o fenômeno do envelhecimento  gradativamente,  ao  longo  de todo o  século  XX,  fato  que  lhes  permitiu  encarar  as  demandas  provenientes da faixa etária mais avançada com maior preparo social, econômico e estrutural.  O Brasil, assim como outros países em desenvolvimento, sofreu um acelerado envelhecimento  populacional,  sobretudo  nos  últimos  trinta  e  cinco  anos:  de  país  jovem,  passou  a  ser  considerado um país  envelhecido, uma  vez que atualmente os  idosos representam 11,1% de  sua população (IBGE, 2006). A tendência é que o Brasil assuma o sexto lugar entre os países  com maior número de velhos do mundo até 2025, chegando a 32 milhões de idosos, segundo  a Organização Mundial de Saúde (2005).  Na sociedade brasileira, diferentemente daquelas que valorizam os anciãos, como é o  caso de algumas sociedades africanas, para as quais a morte de um velho  é como a extinção  de  uma  biblioteca  (ASSEMBLEIA  MUNDIAL...,  2002), o  idoso  é  visto  como  um  fardo,  já  que “uma sociedade que valoriza a produtividade e a riqueza material acima de outros valores  é  compreensivelmente  orientada  para  a  juventude”  (AGICH,  2008,  p.  112).  Sob  essa  perspectiva,  a  juventude  trabalha,  produz  e  pode  acumular  o  capital,  enquanto  que  a  senilidade representa um custo para o Governo e para a sociedade. O contraste entre as formas  de encarar a velhice não se restringe, no entanto, ao binômio  Ocidente x Oriente: não existe  apenas  uma  velhice,  como  se  os  idosos  compusessem  um  classe  homogênea  e,  por  isso,  chegar aos 60 anos de idade não é atingir o marco inicial dessa (única) velhice: os idosos são  pessoas, que carregam crenças, valores, condições sócio­econômicas, histórias de vida etc., o  que  faz  da  velhice  uma  questão  complexa  e  um  desafio  à  generalização  fácil  (CORTELLETTI; CASARA; HERÉDIA, 2004; AGICH, 2008)..

(18) 16 . Diante  do  acelerado  crescimento  da  população  idosa  brasileira,  é  premente  a  necessidade  de  ampliação  de  serviços  especializados  de  atendimento  a  esse  contingente  populacional,  entre  os  quais  se  destaca  o  trabalho  exercido  pelo  cuidador  de  idosos  em  Instituições  de  Longa  Permanência  (doravante  ILPs),  isto  é,  o  cuidador  formal,  que  é  remunerado para dar assistência aos idosos residentes nessas ILPs. Para estudar a atividade do  cuidador de idosos, faz­se necessário, primeiramente, contextualizar seu ambiente de trabalho  – as instituições geriátricas – e o público­alvo de seu trabalho, os idosos institucionalizados. . 1.2 As instituições geriátricas e o idoso institucionalizado . Segundo  Cortelletti,  Casara  e  Herédia  (2004),  os  asilos,  ou  abrigos,  ou  instituições  geriátricas,  ou  instituições  de  longa  permanência  são  espaços  destinados  a  abrigar  pessoas  idosas  em  tempo  integral  e  de  forma  permanente,  oferecendo­lhes  cuidados  com  a  saúde  e  algumas  atividades  de  ocupação  e  lazer.  Embora  as  autoras  não  façam  distinção  entre  essas  denominações, neste trabalho, dar­se­á preferência ao uso dos termos instituições geriátricas, . instituições  de  longa  permanência   ou  a  sigla  ILPs,  pois  a  palavra  asilo  possui  uma  carga  semântica negativa e os abrigos nem sempre estão destinados às pessoas idosas.  Responsáveis  por  assumir  os  cuidados  com  a  população  idosa  que,  por  quaisquer  motivos,  não  podem  contar  com  a  família  na  velhice,  as  instituições  de  longa  permanência  geralmente mantêm sua estrutura a partir de três principais fontes: a aposentadoria dos idosos,  doações  particulares  e  ajuda  de  órgãos  públicos.  Sua  estrutura  tem  caráter  híbrido,  entre  a  informalidade e a formalidade:  Essas  instituições  caracterizam­se,  de  um  lado,  como  uma  comunidade  que  reside  sob  o  mesmo  teto  e  utiliza  os  mesmos  espaços  físicos  e,  por  outro,  como  uma  organização  formal,  estruturada  funcionalmente,  com  hierarquias  definidas  pela  divisão do trabalho interno (CORTELLETTI; CASARA; HERÉDIA, 2004, p. 18). . Com respeito à divisão do trabalho nas instituições de longa permanência, é comum a  presença de gestores, zeladores, cozinheiros, técnicos em enfermagem, cuidadores de idosos,  terapeutas  ocupacionais,  assistentes  sociais  e  nutricionistas.  Fisioterapeutas,  médicos,  dentistas  e  estagiários  de  diversas  áreas  também  compõem  o  quadro  funcional,  ainda  que.

(19) 17 . itinerante, das instituições geriátricas. Tantos profissionais, que se revezam em plantões de até  12  horas  diárias,  têm  a  missão  de  suprir  os  cuidados  com  uma  média  de  trinta  idosos  residentes, de faixas etárias diversas, com problemas de saúde e histórias de vida singulares.  Ainda, no que condiz à infra­estrutura das ILPs brasileiras, Souza e Minayo (2004) chamam a  atenção para o fato de que, em sua maioria, essas instituições carregam o estigma do espaço  designado  ao  depósito  de  pessoas  que  sofrem  com  o  desafeto  da  família  e  padecem  da  condição financeira necessária para suprir os cuidados advindos da velhice.  É  comum  se  pensar  de  maneira  negativa  na  institucionalização  do  idoso,  sobretudo  quando as experiências de muitos idosos nas ILPs envolvem a perda da autonomia, confusão  mental  com  respeito  ao  tempo  e  à  realidade,  perda  da  identidade,  sensação  de  solidão  e  isolamento  (LAIRD,  1979).  Os  índices  apontados  em  determinados  estudos  também  preocupam: já foi constatado que até 75% dos moradores de clínicas de repouso nos Estados  Unidos possuem deficiência mental em algum grau (LARSEN; LO; WILLIAMS, 1986 apud  AGICH, 2008, p. 122). Ocorre que os idosos que passam a morar nessas instituições precisam  se adaptar à nova realidade e às regras da nova moradia:  O  processo  de  internação  numa  instituição  asilar  representa  muito  mais  do  que  simplesmente mudança de um ambiente físico para outro. Representa para o idoso a  necessidade  de  estabelecer  relações  com  todos  os  aspectos  de  seu  novo  ambiente,  ajustar­se ao novo lar  mais do que o lar  a ele, considerar­se abandonado, ansioso e  com medo da ideia de passar os últimos anos da vida num lugar estranho, em meio a  desconhecidos. [...] A bagagem trazida é a sua história de vida, da qual é obrigado a  abrir mão no momento da institucionalização, em detrimento à sua inserção na nova  condição  de  vida.  A  troca  de  meio  provoca  a  passagem  de  um  mundo  amplo  e  público para um mundo restrito e privado, fazendo com que os idosos se recolham a  um  estado  de  mutismo,  perdendo  sua  vez  ao  diálogo  [...]  (CORTELLETTI;  CASARA; HERÉDIA, 2004, p. 19­20). . Não  raro,  a  opção  pela  institucionalização  do  idoso,  muitas  vezes  um  alívio  para  a  família,  é  vista  por  ele  como  pior  do  que  a  própria  morte  (COHEN,  1988).  Os  principais  motivos  pelos  quais  ela  ocorre,  referidos  pela  literatura  pertinente  na  área  (VIEIRA,  2003;  CORTELLETTI;  CASARA;  HERÉDIA,  2004),  são  os  seguintes:  falta  de  condição  financeira, dependência de outrem para a realização das atividades de vida diária e a ausência  de suporte familiar, para dar conta dos cuidados diários necessários nessa fase da vida. Nesse  sentido,  questões  como  o  afeto  da  família,  o  cuidado  e  o  acompanhamento  necessários  são  frequentemente associadas à ideia de que o idoso institucionalizado sofre de abandono, mas é  preciso  ressaltar  que,  na  verdade,  o  fator  ‘condição  financeira’  possui  o  maior  peso  nessa  situação. Como bem explica Silva Sobrinho (2007, p. 108), “o discurso da velhice pobre vai  fazer eco para o abandono da classe trabalhadora”, uma vez que:.

(20) 18 . Quando se define o ‘velho’ somente a partir da categoria de idade, silencia­se que a  grande maioria é composta de trabalhadores. É por essa ida ao silenciado, aquilo que  é calado, recalcado, que podemos compreender porque a velhice é ‘ruim’, é ‘viver  apulso’,  é  a  ‘’pior  idade’,  e  o  velho  é  uma  ‘coisa’  ‘descartável’,  ‘que  passou’  (SILVA SOBRINHO, 2007, p. 108­109). . Se, na sociedade capitalista, o idoso já é visto como um ser improdutivo e inútil, por  não servir à ideologia produtivista, quando passa à condição de institucionalizado, ele assume,  de  todas  as  formas,  o  papel  de  descartável,  justificando,  portanto,  seu  isolamento  da  sociedade, e sua única alternativa é a espera da morte.  Por outro lado, a estrutura familiar diminuiu consideravelmente em relação à primeira  metade do século XX, fato que reorganizou também os espaços físicos das residências, a cada  dia,  menores  (MINAYO;  COIMBRA  Jr.,  2004).  Sem  espaço  para  abrigar  uma  pessoa  que  requer atenção e cuidados advindos do avanço da idade e sem tempo para cuidar, devido ao  ritmo  de  vida  e  às  exigências  do  mercado  de  trabalho,  as  famílias  têm  optado  pela  institucionalização como uma forma de se ‘esvair’ da obrigação com o idoso e de repassá­la  às instituições que o assumam. Nessas ILPs, cabe ao cuidador o contato direto com os idosos,  daí a importância de seu trabalho. . 1.3 O cuidador de idosos . Nos Estados Unidos, foram empreendidos estudos etnográficos importantes a respeito  da  vida  cotidiana  em  clínicos  de  repouso,  a  partir  da  perspectiva  dos  auxiliares  de  enfermagem, os provedores de cuidado primários dos idosos (VESPERI, 1983; DIAMOND,  1986  apud  AGICH,  2008).  Constatou­se  a  predominância  das  mulheres  na  profissão,  cujos  salários baixíssimos não faziam jus ao trabalho pesado, fato que as obrigava, muitas vezes, a  assumir  outro  emprego,  para  completar  a  renda.  O  papel  assumido  pelas  auxiliares  de  enfermagem  nessas  clínicas  englobava  cuidados  com  a  higienização,  alimentação  e  demais  funções  básicas  do  cotidiano,  como  auxiliar  os  idosos  a  levantar  da  cama,  por  exemplo.  Ademais, os idosos residentes nessas clínicas eram, em maior ou menor grau, dependentes e,.

(21) 19 . por isso, não poderiam realizar as atividades de vida diária com a segurança mínima exigida  para tal (AGICH, 2008).  A  dependência  que  aflige  os  idosos,  no  entanto,  não  lhes  tira  necessariamente  a  autonomia 4 ,  que  envolve  o  poder  de  decisão  e  escolha  do  idoso  que  recebe  o  cuidado  em  longo  prazo,  como  é  o  caso  dos  velhos  que  vivem  em  instituições  de  longa  permanência  (AGICH, 2008). Aliás, é um consenso entre os estudiosos (MINAYO; COIMBRA Jr, 2004;  VIEIRA, 2003) que a autonomia do idoso deve ser respeitada e estimulada, não importando o  ambiente em que  vive, tendo em  vista que possui relação direta com sua qualidade de  vida.  Não  é  à  toa  que  o  cuidador  é  alertado  para  a  importância  da  manutenção  da  autonomia  do  idoso:  O bom cuidador é aquele que observa e identifica o que a pessoa pode fazer por si,  avalia as condições e ajuda a pessoa a fazer as atividades. Cuidar  não é fazer  pelo  outr o, mas ajudar  o outr o quando ele necessita, estimulando a pessoa cuidada a  conquistar   sua  autonomia,  mesmo  que  seja  em  pequenas  tar efas  (BRASIL,  2008, p. 7, grifo nosso). . Muitas  vezes,  contudo,  não  existe  um  interesse,  ou  esforço  coletivo  dentro  das  ILPs  para que a autonomia do idoso seja preservada. É o que Vesperi (1983 apud AGICH, 2008, p.  123) observou nas clínicas de repouso americanas: “[...] essas práticas­padrão das clínicas de  repouso  constituem  assaltos  impressionantes  à  autonomia”  e  se  baseiam  em  um  modelo  médico  de  treinamento,  em  sua  maioria.  Não  é  à  toa  que  “a  educação  dos  auxiliares  de  enfermagem e  seu trabalho diário são definidos de uma  maneira  física e centrada na tarefa”  (DIAMOND, 1986, p. 1290). Esta, por sua vez, é “orientada antes para a ação objetiva a ser  executada  que  para o  receptor  da  ação”  (AGICH, 1982,  p.  66).  A  execução  da  tarefa,  pelos  auxiliares, é tão enfatizada que, durante o curso de preparo, eles são ensinados a não fazerem  perguntas,  nem  tomar  iniciativa,  devem  apenas  obedecer  às  ordens  de  seus  superiores  (DIAMOND, 1986).  Várias semelhanças podem ser apontadas com respeito ao trabalho desses auxiliares de  enfermagem e as funções assumidas pelos cuidadores de idosos, que exercem sua atividade:  A partir dos objetivos estabelecidos por instituições  especializadas ou responsáveis  diretos,  zelando  pelo  bem­estar,  saúde,  alimentação,  higiene  pessoal,  educação,  cultura, recreação e lazer da pessoa assistida (BRASIL, 2002). . 4 . A autonomia é entendida aqui como a capacidade que o idoso tem de decidir sobre seus atos, ainda que não  consiga executá­los..

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