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Cad. Saúde Pública vol.14 suppl.1

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Academic year: 2018

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ZEGERS, F. 14

Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 14(Supl. 1):7-23, 1998

ZEGERS, F.

Não é fácil comentar o artigo do Dr. Zegers, por várias razões. Primeiro, porque o tema é tão re-cente, que não há experiência que permita sus-tentar uma opinião bem fundamentada. Se-gundo, porque o Dr. Zegers não só revela seu profundo conhecimento da biologia do desen-volvimento embrionário, como também mos-tra ter passado por um longo processo filosófi-co de meditação e análise sobre o assunto. As-sim, é difícil que o comentarista se sinta auto-rizado para qualquer contestação. Terceiro, porque o estilo do artigo é descritivo, fazendo com que os conhecimentos atuais e as novas situações que derivam dos progressos na re-produção assistida sejam muito claramente colocados, mas sem pronunciar-se quanto à valorização das condutas alternativas que po-deriam ser tomadas em cada caso.

Esta, que poderia ser a principal crítica ao trabalho, é o elemento fundamental em que o discurso do Dr. Zegers se baseia, isto é, que o conhecimento é libertador à medida que nos oferece mais elementos para fazermos nosso próprio julgamento interior e tomarmos nos-sas próprias decisões.

O artigo deixa, entretanto, alguns vazios so-bre os quais o autor não se pronuncia. Zegers refere que “o número de concepti criopreserva-dos aumenta em quantidades alarmantes...”, mas não propõe alternativas de solução para esse problema. Basta lembrar que, no Reino Unido, tomou-se recentemente a decisão de autorizar que concepticriopreservados e ‘aban-donados’ pelos seus progenitores fossem refu-gados, o que provocou uma enorme polêmica. É evidente que existe um limite na capacidade que os laboratórios têm de acumular concepti

criopreservados. A implicação prática desta realidade é que uma proporção desconhecida, mas não desprezível, desses conceptiestá con-denada a não sobreviver desde o momento de sua criação no laboratório.

Na introdução, Zegers deixa implícito que esses concepti não são ainda indivíduos ou pessoas, uma vez que possuem apenas de duas a quatro células, e somente quando cada um deles já não puder mais se dividir em gêmeos é que passa a ter um caráter único em matéria e

espírito. Poderíamos concluir, portanto, que seria moralmente permitido, mesmo sob uma perspectiva católica, que esses conceptifossem refugados?

Em determinados momentos de sua expo-sição parece que o pensamento de Zegers seria contrário a essa posição, quando discute os ris-cos de demarcar os inícios (curiosamente no plural) de uma pessoa. Mas se o conceptus ain-da não possui espírito (se o possuísse não se saberia para onde ir ao transformar-se a maté-ria em dois gêmeos) e não se pode considerar ainda como um indivíduo, qual seria o motivo de ter um valor maior que o espermatozóide que o gerou? Só porque já uniu-se a um oócito, apesar de não ter ainda caráter individual? Ca-da espermatozóide tem o potencial de Ca-dar ori-gem a um (ou mais) indivíduos com caracterís-ticas genécaracterís-ticas únicas. Uma vez refugado esse espermatozóide, nunca mais haverá a possibi-lidade de existir um ser humano com as carac-terísticas daquele que seria gerado dele.

Voltando ao esplêndido texto de Zegers, ele diz: “Cada vez que se deseja demarcar os inícios de uma pessoa, utiliza-se um juízo de valor que leva implícito que a etapa prévia ao suposto início é menos importante ou tem menos trans-cendência que a etapa seguinte”. Essa é uma realidade incontestável. Daí a dificuldade em discutir “os inícios de uma pessoa” e de impor uma definição que todos tenham que aceitar. Este é precisamente o cerne do excelente arti-go que comentamos.

Vida, para mim, é um contínuo, em que o material genético vai passando de uma geração a outra através dos gametas, concepti, em-briões, fetos e indivíduos já nascidos. Apesar dos riscos colocados por Zegers, que temos que aceitar e frente aos quais temos que per-manecer alertas, é impossível dar o mesmo va-lor a cada uma dessas etapas da seqüência que permite a continuidade da espécie humana.

Só à consciência esclarecida de cada um de nós cabe decidir onde colocamos o nosso limi-te. Por outra parte, a sociedade organizada tem que encontrar formas de coibir possíveis abu-sos. Enquanto é verdade que o médico precisa de formas de controle social, as normas que lhe são impostas não podem estar ligadas a de-terminada fé, mas baseadas no conhecimento e no humanismo, aos quais Zegers faz uma im-portantíssima contribuição com seu trabalho.

Debate sobre o artigo de Fernando Zegers-Hochschild

Debate on the paper by Fernando Zegers-Hochschild

Departamento de Obstetrícia e Ginecologia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, Brasil.

Referências

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