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O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM-TERRA MST E SUAS ARTICULAÇÕES POLÍTICAS EM UM CONTEXTO DE CRIMINALIZAÇÃO DA LUTA CAMPONESA

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O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM-TERRA – MST E SUAS ARTICULAÇÕES POLÍTICAS EM UM CONTEXTO DE CRIMINALIZAÇÃO DA

LUTA CAMPONESA

Lara Barros Pereira

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larabarros.geo@gmail.com Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

GT5 - Movimentos Sociais e Estratégias de Resistência Resumo

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST, enquanto movimento social de luta pela terra, ganha destaque ao longo dos anos no conflito pela superação das contradições do/no campo, não somente pelo seu alcance, mas também por conta da sua organização e articulações políticas.

Compreendendo a urgência e necessidade dessa luta, tendo em vista as crescentes investidas do capital no campo e a questão agrária como está posta, se faz necessário entender como algumas estratégias e opções políticas do próprio movimento levaram ao seu recuo, fazendo com que o número de acampamentos, ocupações e mobilizações não avançasse em detrimento do número de conflitos ainda crescentes. É nesse sentido que a presente pesquisa analisa o MST, suas articulações políticas e estratégias de luta, em um contexto de endurecimento do Estado para com os movimentos camponeses, em destaque o processo de criminalização consolidado a partir da implementação das Leis 12850/2013 e 13.260/2016. Objetiva-se mostrar a trajetória desse movimento social do campo, bem como a forma que este tem se organizado e traçado suas estratégias. É através dos estudos das produções acerca da Geografia Agrária, dados disponibilizados pela Comissão Pastoral da Terra – CPT e análise de leis aplicadas para o campo, que a seguinte pesquisa será fundamentada.

Palavras-Chave: Luta pela terra; Campesinato; Movimentos Sociais; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST.

1. Introdução

A luta pela terra e o conflito pela superação das contradições no campo está presente desde a gênese do Brasil, iniciando-se pela resistência de nativos indígenas contra o cativeiro

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Membro do Grupo de Pesquisa Trabalho, Mobilidade e Relação Campo Cidade (UESB/CNPq) e Grupo de

Pesquisa Estado, Capital, Trabalho e as Políticas de Reordenamentos Territoriais (UFS/CNPq). Bolsista

UESB/Iniciação Científica.

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da terra, nas lutas messiânicas (com seu início no final do século XIX), nos conflitos do cangaço (século XX) e atingindo seu ápice com as Ligas Camponesas, onde camponeses e posseiros resistiam à expropriação e ao assalariamento forçado (entre os anos de 1945 a 1960).

Na continuidade e permanência desta luta histórica, marcada por diversas e distintas formas de resistência e conflitos, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, surge como uma forma de enfrentamento à política de “modernização” e “desenvolvimento”

difundida e respaldada pelo capital ainda no período ditatorial (1964-1985). O MST questionará, por meio das ocupações e acampamentos, o modelo hegemônico da agricultura

“moderna”, totalmente subordinada aos ditames do mercado internacional, em detrimento da agricultura camponesa.

É a partir de suas estratégias e articulações que o movimento ganha força e alcance no território nacional. A expansão do MST se dá devido (e com) a presença de uma classe camponesa que é expropriada e transformada em força de trabalho a serviço do capital e suas personificações atuantes no campo, latinfundários, empresários do agronegócio e demais capitalistas. No entanto, em determinado momento da trajetória histórica desse movimento social do campo, a sua força de atuação é controlada, pacificada e com pouco avanço, devido às crescentes investidas do capital no campo e às estratégias de luta tomadas através da institucionalização.

É nesse sentido que a pesquisa desenvolvida, tem como objetivo principal analisar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra a partir de suas articulações políticas, com demonstração de dados, embasamento teórico e análises dos números de asentamentos e conflitos, bem como a inserção do MST em contextos institucionalizados e vínculos políticos partidários.

2. Metodologia

Para realizar a pesquisa sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra a

partir de suas articulações políticas, e como as questões relacionadas a essa realidade se

expressa tanto no espaço agrário como urbano, foi realizado o levantamento de dados

(nacional, estadual e regional) sobre assentamentos do MST, bem como a coleta do número

de conflitos no campo, mobilizações e acampamentos, onde buscou-se compreender as

estratégias do movimento e o que motivou o resfriamento dessa luta que é também pela

superação das contradições no campo. Também foram analisadas as leis nº. 7170/1983 e

13.260/2016 e outras mais que repercutem diretamente no campo e na atuação dos

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movimentos sociais, com seus conteúdos ideológicos e classistas. Através dos resultados obtidos e do aparato teórico e metodológico utilizado, esperou-se reunir os elementos necessários para tratar o tema de pesquisa, contribuindo cientificamente e socialmente para os debates no campo da Geografia e demais Ciências Sociais, como também para a reflexão dentro das bases dos Movimentos sociais do/no campo.

Para tanto, realizou-se, no primeiro momento, uma análise do contexto de surgimento e consolidação do MST, com a finalidade de elucidar as principais diretrizes políticas deste movimento social, e apontar as relações destas com as estratégias que repercutem diretamente no resultado da luta. No segundo momento do artigo, optou-se por realizar um debate e leitura sobre a inserção do movimento em contextos políticos partidários e o recuo do próprio MST.

E, por fim, na terceira parte do artigo, realizou-se uma análise da configuração Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra na atualidade, apontando o que levou à fragilidade da atuação do mesmo e o que o leva a permanecer e resistir em meio às adversidades e investidas que este têm enfrentado.

3. Trajetória Histórica da Luta pela Terra e o MST

A terra, enquanto propriedade privada, sinônimo de poder e riqueza, aparece também como forma, meio e condição imprescindível para a reprodução social da classe camponesa, fazendo necessária a luta por esta. As ações camponesas se expressam no campo brasileiro como sinômino de resistência e contraposição às formas de dominação e atuação do capital, sendo tais experiências camponesas fundamentais para mostrar que outro modo vida, trabalho e organização social são possíveis. É essa classe que, por meio de sua luta histórica, torna-se alvo das práticas ideológicas das classes dominantes presentes no campo, na forma de latifundiários, empresários do agronegócio e demais capitalistas que utilizam a terra como meio de exploração, produção e reprodução do capital.

A luta pela terra e o conflito pela superação das contradições no campo está presente desde a gênese do Brasil, iniciando-se pela resistência de nativos indígenas contra o cativeiro da terra, nas lutas messiânicas (com seu início no final do século XIX), nos conflitos do cangaço (século XX) e atingindo seu ápice com as Ligas Camponesas, onde camponeses e posseiros resistiam à expropriação e ao assalariamento forçado (nos anos de 1945 a 1960).

É dando seguimento à esta luta histórica, marcada por diversas formas de resistência e

conflitos que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST surge. Representando

o enfrentamento à política de “modernização” e “desenvolvimento” do campo, difundida pelo

capital no período ditatorial (1964-1985), o MST resistirá e questionará, por meio das

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ocupações e acampamentos, o modelo hegemônico da agricultura burguesa moderna, subordinada aos ditames do mercado internacional, em detrimento da agricultura camponesa.

A década de 1960 é marcada por modificações no sistema sociometabólico do capital que repercutiram, diretamente, na configuração da estrutura agrária do Brasil. É nesse período que a difusão de um modelo de “modernização” para o campo assume e passa a representar o principal objetivo do Estado, em benefício das classes burguesas e dominantes:

[...] as políticas voltadas a difusão de um modelo de desenvolvimento e modernização, pelo Estado, beneficiaram as classes dominantes, permitindo o pleno desenvolvimento do capital no campo, em detrimento da racionalidade camponesa e dos trabalhadores rurais que veem a terra como possibilidade de reprodução social – por meio do trabalho. (SOUZA, 2008, p.5)

A atuação desse modelo desenvolvimentista, fez com que inúmeros camponeses e posseiros perdessem a condição necessária para a sua reprodução que acontece com base na terra, além de fazer com que estes fossem transformados em proletários, sujeitos migrantes e desempregados. Parte dessa população passa a residir nos espaços da periferia urbana, na tentativa de alcançar a subsistência e formas de trabalho. Mas, ainda assim, o camponês não perde sua relação com a terra e traça diversas estratégias para permanecer enquanto camponês, seja no espaço urbano ou agrário.

Uma forma de resistência encontrada, foi a de lutar pelo direito à terra militando nos movimentos sociais de luta pela terra, entre estes, dentro do MST, que teve como marco do seu processo de institucionalização o 1º Encontro Nacional dos Sem-Terra, realizado em 1984, onde foram definidas as suas principais diretrizes políticas e o próprio nome deste movimento social (SIMONETTI, 2007).

São diversas as estratégias traçadas pelo movimento e as formas de luta, mas é por meio das ocupações de terras e latinfúndios que “os sem-terra espacializam a luta, conquistando a terra e territorializando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST” (FERNANDES, 2001, p.1). A ocupação tem sido a principal ação da luta pela terra.

Entendendo a terra como meio de reprodução social da classe camponesa, os

acampamentos e ocupações efetivadas, aparecem como forma de acesso à terra, representando

também a ação de resistência inerente à formação camponesa no interior do processo

contraditório de desenvolvimento e expansão do capitalismo no campo, que tem em seu

propósito recriar a classe camponesa aos moldes do mercado, na tentativa de anular a forma

de trabalho com a terra que essa classe tradicional desenvolve, assim como na busca por

novos capitalistas e espaços para a expansão e atuação do capital. Segundo Oliveira:

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O capital não expande de forma absoluta o trabalho assalariado, sua relação de trabalho típica, por todo canto e lugar, destruindo de forma total e absoluta o trabalho familiar camponês. Ao contrário, ele, o capital, o cria e recria para que sua produção seja possível, e com ela possa haver também a criação, de novos capitalistas. (1991, p. 20)

A luta pela terra aparece como resistência e contraposição às formas de dominação e atuação do capital, que se materializa através da expropriação, exploração e controle da produção. Como aponta Fernandes:

Com a expansão do capitalismo no campo e, consequentemente, com a sujeição da renda da terra ao capital, a luta pela terra é, antes de mais nada, uma luta contra a essência do capital: a expropriação e a exploração.

Entendendo o desenvolvimento capitalista como desigual e contraditório, compreendemos que o capitalismo não é capaz de conter apenas um modelo de relação social, logo, o trabalho assalariado não é a única via. (1998, p. 11) São diversos os desafios enfrentados pelo MST e à medida que a dinâmica de acumulação do capital se intensifica, novas barreiras para as conquistas e resistência do movimento são impostas, bem como surgem novas necessidades para o movimento alcançar os seus objetivos. Assim, devido a complexidade das lutas e o papel que as mesmas exercem na configuração da sociedade, é fundamental refletir acerca das estratégias e articualções políticas que circundam o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.

4. Inserção em Contextos Políticos Partidário e Recuo Do MST

Ao longo da trajetória do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra na luta pela terra, o movimento tem mantido relações com diversas esferas do Estado de diferentes formas, alternando “entre posições de confronto e de negociação. Apresentando-se, a cada governo, ora mais próximo, ora mais distante, e realizando a luta pela reforma agrária em duas frentes, diretamente no terreno e no campo político-institucional” (MARQUES, p. 184, 2006). Essas relações se dão tanto de forma conflituosa, como também de forma estável, onde a busca pelos avanços em contextos institucionalizados o reprime menos que a luta através das ocupações, mas também resfria a sua luta e deixa os sujeitos militantes mais distantes dos trabalhos de base.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST é considerado uma das

maiores expressões enquanto movimento social de luta pela terra no continente latino-

americano nas últimas décadas, com fortes apoios e relações que têm sido cultivadas e

matidas ao longo da sua trajetória. Mas essas articulações aparecem no atual contexto como

motivo de reflexão dentro do próprio movimento, gerando confrontos de opniões nas bases

onde a luta acontece.

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Os trabalhadores sem-terra são os principais sujeitos desse processo. Desde o princípio da luta recebem o apoio de diferentes instituições, por meio de alianças que formam uma articulação política. As instituições envolvidas defendem a ocupação como forma de acesso à terra. Nos vinte anos da formação do MST, em diferentes conjunturas, recebeu ou tem recebido apoio da Comissão Pastoral da Terra, – CPT, dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais, da Central Única dos Trabalhadores – CUT, do Partido dos Trabalhadores – PT, de outros partidos políticos e de diversas outras organizações. Todavia, a relação na articulação sempre gerou um embate político, por causa das diferentes concepções das atribuições que as partes das alianças têm no desenvolvimento da luta pela terra. Algumas das questões do embate são relativas à autonomia dos trabalhadores. Muitas vezes, as organizações tentaram interferir nas decisões dos trabalhadores, não distinguindo as respectivas competências. Isso acontece, por exemplo, quando pretenderam coordenar as lutas, tentando representar os trabalhadores, defendendo que o MST devesse apenas apoiar os sem-terra, quando na verdade os sem-terra são e fazem o Movimento. (FERNANDES, p. 5, 2001)

Nesse sentido, o MST, na tentativa de alcançar maior visibilidade e progressos no que diz respeito à reforma agrária e à própria luta pela terra, manteve algumas alianças político- partidárias, depositando o rigor da luta e confiança em espaços institucionalizados. O que pode-se perceber no estudo, que está em andamento, é que esses “acordos” não responderam positivamente a intenção inicial do movimento, que era de emergir e não recuar frente às investidas do capital, considerando também que o Estado como está posto é burguês e representante das clases dominantes.

Uma forte relação ainda cultivada é a que foi estabelecida com o Partido dos Trabalhadores – PT e o seu governo. Entretanto:

Essa aproximação é simultânea a redução de sua combatividade em relação ao período anterior. É, portanto, um caso emblemático do fenômeno que observamos em diversos países latinoamericanos: a relação estreita entre movimentos e Estado e suas consequências para a organização e luta dos trabalhadores (CORRÊA, 2013, p. 46).

O resfriamento da luta pela terra, que se expressa na redução do número de áreas destinadas a projetos de reforma agrária e de ocupações de terra por um lado, e o aumento da violência no campo, tentativas e concretização de assassinatos de militantes, prisões arbitrárias e a consolidação de relações de trabalho mais precarizadas no campo (ver quadro 01), por outro lado, evidenciam o acirramento das contradições e, portanto, novas formas de articulação e enfrentamento por parte da classe trabalhadora e camponesa para continuar existindo.

Quadro 01 – Comparativo dos Conflitos no Campo no Brasil (2005, 2010 e 2015)

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Tipo de conflito 2005 2010 2015

Assentamentos 45.509 40.442 *

Acampamentos 90 35 27

Ocupações 437 180 200

Conflitos trabalhistas 276 204 80

Ameaças de assassinatos no campo 56 55 59

Assassinatos no campo 38 34 50

Conflitos por terra 777 638 771

Fonte: Organizado por PEREIRA, L. B; OLIVEIRA, G. M.; SOUZA, S. T. Com base em dados da Comissão Pastoral da Terra. Cadernos Conflitos no Campo 2005, 2010 e 2015.

*Os assentamentos em 2015 ainda não tinham sido contabilizados, onde o dado estará no caderno de 2016, ainda não publicado.

Tal quadro não se altera, pelo contrário, no ano de 2016. Segundo o Caderno Conflitos no Campo, organizado pela CPT, nesse ano foram registrados 1536 conflitos no campo, sendo 1.079 pela terra. O número de ocupações/retomadas 194 e acampamentos 22. Registrou-se ainda 69 conflitos trabalhistas e assasinatos 61, sendo este o maior número desde o ano de 2003, quando se teve 73 trabalhadores assassinados

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.

Assim, como está presente no quadro acima e nas informações do ano de 2016 e parcial do ano de 2017, o processo de resfriamento da luta é uma evidência ao observar que o número de ocupações e acampamentos foram reduzidos de forma significativa, concomitante ao número de conflitos e assassinatos ainda crescentes, com o passar dos anos no Brasil, realidade que se acentuou no governo do Partido dos Trabalhadores – PT, que, inicialmente, levava em suas propostas e bandeiras a reforma agrária. O MST se deixou levar pelas promessas e bandeiras de um partido político que, apesar de se mostrar mais favorável às lutas das classes mais abastardas da sociedade, visava chegar ao cargo mais alto do Estado burguês e, ao consegui-lo, reprimiu a luta pela terra e “escancarou” as portas para a expansão do capital e todas as suas personificações no campo.

5. O MST na Contemporaneidade: Fragilidades e Resistência

O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra no Brasil tem uma trajetória marcada por avanços e retrocessos, como todo movimento social, perpassando por diferentes governos e momentos políticos, e evidenciando a sua capacidade de organização e resistência, se fazendo

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Ressalta-se que no ano de 2017, até o final do mês de maio foram registrados 36 casos de trabalhadores

assassinatos, vinte desses em duas chacinas, a primeira ocorrida no mês de abril, no município de Colniza, Mato

Grosso e o segundo no município de Pau Darco no Pará no mês de maio.

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ativo e estruturado enquanto movimento social de luta pela terra por mais de quarenta anos. A atuação em frentes divergentes e a tentativa de conciliar o inconciliável, ou seja, o Estado burguês com a luta emancipatória dos camponeses e trabalhadores, causou uma fissura na luta pela terra e no próprio MST.

A estratégia e atitude que o movimento tomou, em um momento que ele julgou ser de fragilidade e de necessária inserção e apoio dentro das esferas do poder responsável por mediar a reforma agrária, acabou sendo mais danoso que o próprio momento em si, pois foi a partir dessa atitude que a luta do MST deixou de ser algo construída nas bases e camadas populares e passou a ocupar os cargos e instâncias estatais.

Marques faz uma análise da, chamada por ela, terceira fase política vivenciada pelo MST, que é quando o governo “popular” do Partido dos Trabalhadores ocupa a presidência do país:

O Governo Lula inaugura a terceira fase, que corresponde a um momento de inflexão em relação ao período anterior, porém sem descontinuidade. A economia continua a ser conduzida de acordo com os parâmetros estabelecidos pelo Governo FHC e o setor do agronegócio mantém-se no papel de importante beneficiário e colaborador da política econômica. O número de famílias assentadas ao longo dos três anos do Governo Lula tem sido muito inferior ao estabelecido no Plano de Reforma Agrária apresentado no início do mandato. Contudo, novas contradições surgem nas relações entre o MST e o Estado. (2006, p. 18)

É nesse momento que lideranças optam estrategicamente e politicamente por ocupar cargos dentro do legislativo e outros setores institucionalizados do Estado, isso aparece como uma contradição que, ora foi positiva no que diz respeito aos paliativos necessários para manter os assentamentos e, ora negativa, pois foi a partir dessa mudança que novas conquistas foram inviabilizadas na/para luta travada contra o Estado, o capital e tudo aquilo que os norteiam foi desarticulada e resfriada.

Foi no governo de Dilma Rousseff, no ano de 2016, que a Lei nº 12.850 – Que aponta

os movimentos sociais como organizações criminosas – foi sancionada, já na transição dos

governos Dilma para o governo golpista de Temer foi implementada a lei n. 13.260/2016 –

Lei Antiterrorismo. Estas podem ser consideradas como uma forma real de conter o

crescimento e luta da classe trabalhadora e dos movimentos de luta pela terra. Legitima ainda

as diversas formas de ameaças e mortes de camponeses que lutam pela terra. Sendo a mais

incisiva forma de ação do Estado para criminalizar os movimentos sociais, conhecida como

lei Antiterrorismo, que representa um afronto às garantias constitucionais de liberdade de

expressão e associação, se estabelecendo como mais um respaldo para a repressão dos

trabalhadores em luta pela terra ou para nessas permanecer.

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Considerando o golpe que ocorreu no ano de 2016, onde o atual presidente Michel Temer com o Partido do Movimento Democrático Brasileiro ocupou o lugar da até então presidenta Dilma Rousseff, fez com que os movimentos sociais fizessem uma reflexão e retorno às bases, que é onde acontece de fato a luta pela terra e na terra. Esse momento em que os conflitos se acirram com o auge da classe burguesa nas ocupações dos espaços públicos e privados, os movimentos sociais se levantam e saem do até então comodismo e resistem às investidas do Estado e capital na produção e luta camponesa.

6. Considerações Finais

O capital e suas personificações, aliado ao Estado burguês, não cessam as intensas e cruéis investidas no campo, na tentativa de comprimir o camponês, junto com a sua produção, modo de vida e luta pela terra, seja através do discurso ideológico de “modernização” e

“desenvolvimento” do campo, como também utilizando do aparato jurídico e legal para criminalizar os sujeitos da luta ou/e também com a cooptação de lideranças dos movimentos sociais.

Ainda em meio aos conflitos, o campesinato, seja organizado em torno dos movimentos sociais ou não, resiste e permanece na luta, que é, antes de qualquer coisa, pela superação das contradições no campo e da relação capital versus trabalho.

O resfriamento da luta pela terra aparece como uma tentativa do Estado, movido pela insaciabilidade para e do capital, de desmobilizar os movimentos sociais e desarticular a sua luta, utilizando das mais variadas formas, como foi apontado ao decorrer da presente pesquisa. Portanto, se faz necessária a retomada da luta radical e da reflexão junto às bases dos movimentos sociais, para que dessa forma o conflito pela superação das contradições avance, tenha força e articulação para resistir às crescentes investidas do capital e das suas personificações no campo, que são os latifundiários, o agronegócio e os demais capitalistas.

Considerando a via institucionalizada como um empecilho e barreira para o avanço, como também uma estratégia própria do Estado, essa não pode ser uma opção para aqueles que lutam contra a essência do capital e pela permanência em seu espaço com seu modo de vida e trabalho, que acontecem por meio e na terra.

Referências Bibliográficas

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CONFLITOS NO CAMPO BRASIL 2005. Organização e seleção: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz e José Batista Gonçalves Afonso – Goiânia: CPT Nacional – Brasil, 2006.

CONFLITOS NO CAMPO BRASIL 2010. Organização e seleção: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Isolete Wichinieski – Goiânia: CPT Nacional – Brasil, 2011.

CONFLITOS NO CAMPO BRASIL 2015. Organização e seleção: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia: CPT Nacional – Brasil, 2015.

CORRÊA, Ana Elisa Cruz, Movimentos Sociais e Estado: O governo do PT e o apassivamento do MST, Anais do V Simpósio Internacional Lutas Sociais na América Latina, ISSN 2177-9503, 2013.

FERNANDES, Bernardo Mançano, A ocupação como forma de acesso à terra, XXIII Congresso Internacional da Associação de Estudos Latino-Americanos, Washington – DC, set, 2001.

MARQUES, Marta Inez Medeiros, Relação Estado e MST: algumas fases e faces, Lutas &

Resistências, Londrina, v.1, p.184-196, set. 2006.

SIMONETTI, M. C. L., A geografia dos movimentos sociais em tempos de globalização:

O MST e o Zapattismo, 2007.

SOUZA, Suzane Tosta, As investidas do capital na produção camponeza através da ideologia de “modernização” e “desenvolvimento” do campo, 2008.

FERNANDES, Bernardo Mançano. A territorialização do MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra - Brasil. Ano 1, n. 1 p. 2 – 44, 1998.

OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino, A agricultura camponesa no Brasil. São Paulo:

Contexto, 1991.

Referências

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