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A DESAPROPRIAÇAO INDIRETA - ASPECTOSRELEVANTES E O NOVO CODIGO CIVIL

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A DESAPROPRIAÇAO INDIRETA - ASPECTOS RELEVANTES E O NOVO CODIGO CIVIL

CURITIBA

2005

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FÁBIO JosÉ BRANTE

A DESAPROPRIAÇÃO INDIRE'I`A - ASPECTOS RELEVANTES E O NOVO CODIGO CIVIL

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito, na Faculdade de Direito, Setor de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Prof. Dr. Romeu Bacellar

Filho.

CURITIBA

2005

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FÁBIO JosÉ BRANTE

A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA - ASPECTOS RELEVANTES A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA NO NOVO CÓDIGO CIVIL

Monografia aprovada como requisito parcial à obtenção de grau de Bacharel em Direito, na Faculdade de Direito, Setor de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Paraná, pela seguinte banca examinadora:

Orientador: \ WF; ~_ /,a I. Í `\\`- *_ _ _... _"“' '

Prof. Romeu Bacellar Filho

Áâpr,CÀ,,¿,¿, Q<>»¿1@ta<L<L0.(L<> , rol”. Angela Cassia Costaldello

P1/oi”. Adriana da _jZÍosta Ricardo Schier

Curitiba, 14 de outubro de 2005

ii

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SUMÁRIO

RESUMO ... ¿ ...

1 INTRODUÇAO ...

2 A PROPRIEDADE ...

2.1 Evolução Histórica e Conceito de Propriedade ...

2.2 A Propriedade Particular e o Interesse Público ...

2.3 A Função Social da Propriedade ...

3 A DESAPROPRIAÇÃO ...

3.1 Histórico da Desapropriação ...

3.2 Conceito de Desapropriação ...

3.3 Pressupostos para a Desapropriação ...

3.4 Das Etapas da Desapropriação ...

3.4.1 Fase Declaratória ...

3.4.2 Fase Executória ...

4 A DESAPROPRIAÇÃO

4.1 Noções Gerais ...

4.2 Histórico da Desapropriação Indireta ...

4.3 Desapropriação Indireta no Brasil ...

4.4 A Desapropriação Indireta e a Via de Fato ...

5 A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA E O NOVO CÓDIGO CIVIL 5.1 Introdução ...

5.2 A Prescrição da Ação de Desapropriação Indireta ...

5.3 Desapropriação Judicial, Baseada na Posse Pro Labore ...

5.4 Acessão Invertrda ...

6 CONCALUSÃO ... I ...

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ...

111

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Este trabalho aborda como tema a Desapropriação Indireta, instituto que surgiu de maneira jurisprudencial na realidade jurídica brasileira, para solucionar questões de fato que não eram enfrentadas por nosso ordenamento. Como esse instituto não era previsto legalmente, muitos doutrinadores o repudiavarn e consideravam-no uma forma de justificativa ao esbulho cometido pela Administração contra a propriedade particular. Contudo, o Novo Código Civil brasileiro traz em seus artigos a descrição de uma forma de desapropriação muito semelhante ao conceito de Desapropriação Indireta, bem como, em outro artigo, propugna um filndamento de defesa desse instituto. Assim, temos que o Novo Código Civil trouxe novidades ao nosso ordenamento, que podem ser consideradas como uma espécie de normatização, se não da Desapropriação Indireta, pelo menos do ideal que esse instituto possui.

Palavras-chave: Direito Administrativo, Propriedade, Desapropriação, Desapropriação Indireta, Novo Código Civil.

iv

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l

1. INTRODUÇÃO

Em nossa Constituição, o direito à propriedade é consagrado como um direito fundamental do cidadão. É através da Desapropriação Indireta que o direito à

propriedade sucumbe, mesmo que ilegalmente, em razão de um ideal maior, que seria o interesse coletivo. Dessa forma, abordamos neste trabalho conceitos ínsitos e necessários para a elaboração da idéia de Desapropriação Indireta - o direito à propriedade e a Desapropriação - bem como, realizamos estudos específicos sobre a Desapropriação Indireta.

O direito à propriedade, tratado em nosso primeiro capítulo, moldou-se ao longo do tempo, deixando de atender única e exclusivamente aos interesses

particulares do proprietário e passando a visar, também, uma destinação social ao bem.

Daí termos a expressão Função Social da Propriedade, que demonstrou ser uma fonna de limitação ao antigo direito absoluto do proprietário. É exatamente em beneficio dos interesses coletivos, que essas limitações foram estabelecidas, a fim de evitar abusos por parte do proprietário ou, até mesmo, forçando-o a adequar sua propriedade da melhor maneira possível ao ambiente que a circunda.

A mais drástica das formas de intervenção na propriedade particular pela Administração, a Desapropriação, é abordada em nosso segundo capítulo e trata-se de método aquisitivo de bens pela Administração Pública. Nossa Constituição prevê que, caso a propriedade não cumpra sua fimção social, o proprietário poderá perder seu bem, sendo necessário, contudo, a observância de procedimento especificamente elaborado. Assim, resta que a única forma de perca da propriedade privada para a Administração Pública, dever-se-ia dar exclusivamente através de procedimento pré­

detenninado, que prevê uma necessária declaração de utilidade pública ou interesse social, um acerto quanto ao justo valor a ser pago como indenização e, por fim, o pagamento prévio, realizado em dinheiro ou, em casos específicos, através de títulos da dívida pública.

Contudo, na realidade, existem casos que não se adequam exatamente ao

procedimento desapropriatório. Em nosso terceiro capítulo, então, adentramos ao

estudo da Desapropriação Indireta, que, para renomados autores da doutrina brasileira,

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não passa de esbulho cometido pela Administração. Trata-se, em verdade, de instituto criado jurisprudencialmente, que visa solucionar uma situação de fato, que tenha ocorrido sem o procedimento legalmente estabelecido. Assim, temos que em um caso concreto, a Administração agiu sem observar todos os requisitos necessários para a realização da Desapropriação, mas que efetivamente se ocupou da propriedade e a utilizou para um fim público. Tendo-se em vista o interesse coletivo e o princípio da intangibilidade da obra pública, muitas vezes o proprietário vê-se impossibilitado de utilizar os devidos interditos que o restabeleceriam na posse da propriedade e obriga-se a requerer a devida indenização pela propriedade ilegalmente apossada, na forma de Ação de Desapropriação Indireta.

E, por fim, abordamos, em nosso último capítulo, inovações legislativas trazidas pelo Novo Código Civil, relacionadas estruturalmente à Desapropriação Indireta. Na análise de alguns artigos, podemos perceber, por exemplo, que o prazo prescricional da ação de Desapropriação Indireta, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça de nosso País, deve ser revisto. E, além disso, é necessário ressaltarmos também a previsão, neste nosso novo Código, de uma desapropriação judicialmente realizada, que se enquadra muito bem à teoria da Desapropriação Indireta; bem como, da especificação daquilo que Maria Helena Dinizl chamou de “Acessão Invertida”, que pode vir a fundamentar casos de Desapropriação Indireta.

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 4, São Paulo: Saraiva, 2004.

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2. A PROPRIEDADE

2.1 Evolução Histórica e Conceito de Propriedade

Quando do surgimento das primeiras civilizações, a propriedade era tida como

comunitária. A citarmos como exemplo as tribos indígenas que no Brasil se encontravam antes da chegada dos portugueses em nossos litorais, a maioria dos utensílios utilizados pelos indígenas, eram considerados de domínio comum. A excetuarmos algumas armas e redes de dormir, todos os outros objetos, como, por exemplo, a comida e as ocas, eram considerados bens de todos, sendo, contudo, que nem a propriedade da terra era cogitada, pois era costume das tribos realizarem mudanças de localidades de épocas em épocas, não se fixando, dessa fonna, por muito tempo a determinado local. Assim, temos que inicialmente a propriedade era tida como coletiva e foi com o passar do tempo que essa propriedade foi se individualizando.

Contudo, historicamente falando, é no direito romano que vamos encontrar o surgimento da idéia de propriedade, notadamente em relação à propriedade imóvel.

Bem acentua Maria Helena Diniz, que:

Na era romana preponderava mn sentido individualista de propriedade, apesar de ter havido duas formas de propriedade coletiva: a da gens e a da família. Nos primórdios da cultura romana a propriedade era da cidade ou gens, possuindo cada indivíduo uma restrita porção de terra (1/2 hectare), e só eram alienáveis os bens móveis. Com o desaparecimento dessa propriedade coletiva da cidade, sobreveio a da família, que, paulatinamente, foi sendo aniquilada ante o crescente fortalecimento da autoridade do paterfamílías.2

Nesse período histórico, a propriedade era tida como absoluta, ou seja, o proprietário tinha a plenitude da disposição sobre a coisa. Sendo interessante

ressaltarmos que uma das primeiras formas de limitação a essa propriedade, até então absoluta, surge em razão do alto grau de religiosidade que permeava a população.

Tendo-se em vista a seriedade do culto prestado aos mortos à época - lembrando que cada família tinha um cemitério particular, onde sepultava seus mortos - quando fosse vendida detenninada propriedade, a família que a possuía, passaria a ter o direito de passagem para que assim pudesse render seus cultos aos mortos.

2 Dn×11z,‹›p_ cit., p. 109-110.

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Já na idade média, a propriedade da terra surge de forma a organizar uma estrutura. Caracterizada por uma divisão entre domínio eminente e domínio útil da terra, a propriedade perde seu conceito unitário. No Feudalismo, o senhor feudal passa a ter o domínio absoluto não só de suas terras, mas também sobre aqueles que nela habitavam. Os vassalos, detentores do domínio útil da terra, poderiam viver e trabalhar dentro do feudo, mas tendo as obrigações de entregar ao senhor feudal parte do que produziam, bem como lutar em defesa do senhor feudal.

Por fim, é a Revolução francesa que marca o fim do Feudalismo e traz a criação do modelo capitalista da propriedade, até hoje por nós adotado. O Código Civil Francês de 1.804 estabelece a propriedade como direito absoluto e exclusivo do homem que lavra a terra, ou seja, retomamos a ter um conceito unitário. O direito de propriedade é elevado à condição de direito natural, em pé de igualdade com as liberdades fundamentais. Contudo, a idéia de propriedade não mais se reflete como um direito absoluto de agir, mas passa a ser pautada em razão de uma destinação mais publicista e social, como bem salienta Francisco Carlos Duarte, quando diz que, “em resumo, a noção de propriedade, que era considerada no direito romano como direito absoluto no sentido de que tinha o proprietário a plenitude da disposição sobre a coisa, evolui até o momento em que ela passou a ter também uma destinação ou função social, em virtude de uma nova perspectiva publicista e social, que abandonou a idéia privatista de propriedade.”3

Por fim, podemos concluir que, modemamente, “a propriedade é um direito complexo, se bem que unitário, consistindo em um feixe de direitos consubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar as coisas que lhe serve de objeto”.4 Bem como, pode também sofrer uma série de limitações, sejam legais, jurídicas ou voluntárias.

2.2 A Propriedade Particular e 0 Interesse Público

Como conceituado anteriormente, a propriedade detém em si uma série de direitos, notadamente refletindo-se nas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar a

3 DUARTE, Francisco Carlos. Ação de Indenização por Desapropriação Indireta. Curitiba: Juruá, 2003, p.

23.

4 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 193 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 109.

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5

coisa. Contudo, demonstrando-se que a idéia de absolutismo ao direito de propriedade já é ultrapassada, temos que este pode e deve submeter-se a um interesse maior, ou seja, o interesse coletivo. E é pautando-se nesse interesse da coletividade que se fundamenta, muitas vezes, o instituto da desapropriação, que é considerado por muitos doutrinadores como a fonna mais drástica, legalmente possível, de intervenção na propriedade.

Ao falar-se em interesse coletivo, logo desponta a noção de algo que seja contrário ao interesse individual. Contudo, em verdade, o interesse público deve ser idealizado como o interesse do todo, o interesse do próprio conjunto social. Tanto é que Celso Antonio Bandeira de Mello traz um questionamento que demonstra claramente o “espírito” do interesse público, ao indagar se “poderá haver um interesse público que seja discordante do interesse de cada um dos membros da sociedade?”5

É claro que não. E é evidente também que, na maioria dos casos, o particular diretamente atingido por restrições ou até mesmo pela perca de determinado direito em face do interesse público, discordará e, assim, o interesse do particular demonstrar-se-á contrário ao interesse da coletividade. Contudo, seria impossível que determinado interesse coletivo viesse de encontro ao interesse particular de todos os indivíduos da coletividade. Assim, temos que, segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, “o interesse público deve ser conceituado como o interesse resultante do conjunto dos interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua

qualidade de membros da sociedade e pelo simples fato de o serem.”6

Uma das importantes conclusões a que chega este referido autor, através da conceituação transcrita, é quanto à desvinculação que costumeiramente se dá ao supor­

se que “sendo os interesses públicos interesses do Estado, todo e qualquer interesse do Estado (e demais pessoas de direito público) seria zpso facto um interesse público.”7

Temos claro que o Estado é pessoa jurídica que existe em nossa sociedade e, como tal, encontra-se muitas vezes em concorrência com os demais sujeitos de direito.

Portanto, mesmo sendo o encarregado pelo cumprimento dos interesses da coletividade, o Estado também é uma pessoa, que pode vir a ter seus interesses

5 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17“ ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 51.

6 Ibid., p. 53.

7 Id.

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particulares. Porém, tais interesses particulares do Estado só podem ser buscados quando coincidirem com os interesses públicos, como não é o caso, por exemplo, da vontade do Estado em majorar cada vez mais os impostos cobrados, para assim obter mais dinheiro para sua administração, bem como tencionar uma indenização muito menor no caso de uma desapropriação. São casos em que, agindo dessa fonna, o interesse particular do Estado não estaria a representar o interesse coletivo e, portanto, não poderia ser aplicado como tal.

2.3 A Função Social da Propriedade

É com a Constituição de 1934 que surge, pela primeira vez, a idéia de uma

função social a ser relacionada com a propriedade, em nosso direito. Essa

Constituição, inspirada na Constituição de Weimar, estabelecia em seu art. 113, item 17,que:

É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito à indenização ulterior.

Contudo, a década de 30 foi politicamente conturbada. A Constituição

promulgada em 1934 teve “vida curta” e, após a implantação, por Getúlio Vargas, do Estado Novo, é imposta ao País uma nova Constituição, em 1937. Desta feita, a Constituição de 1937 não reprisou a citação realizada na Constituição de 1934 sobre a função social da propriedade.

Por fim, é somente com a Constituição de 1946 que temos restaurado a previsão

de um cumprimento de uma função social pela propriedade. Previa a Constituição de

1946, em seu art. 147, entre os princípios da ordem econômica e social, que “O uso da

propriedade será condicionado ao bem-estar social. A lei poderá, com observância do

disposto no art. 141, §l6°, promover a justa distribuição da propriedade, com igual

oportunidade para todos”.

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'/

E seguindo essa mesma linha, a Constituição de 1967 também relacionou a função social da propriedade entre os princípios da ordem econômica e social, quando estipulou que:

Art. 157. A ordem econômica tem por fim realizar a justiça social, com base nos seguinte princípios:

(...)

III- função social da propriedade.

Temos, por fim, que a nossa atual Constituição, de 1988, reiterou o que vinha sendo conceituado pelas nossas Constituições anteriores. Estabeleceu, inicialmente, a propriedade e o cumprimento da sua função social como princípio da garantia individual e coletiva, em seu art. 5°, XXII, XXIII8, e também como cláusula pétrea de nosso ordenamento, em razão da previsão do art. 60, § 4°, IV. Bem como, manteve também a previsão da propriedade e sua função social entre os princípios da ordem econômica, em seu art. 170, II e III9. Assim, temos estabelecido que a propriedade não pode deixar de se compatibilizar com sua função social.

Portanto, a propriedade não deixou de ser tida como individual, como de exploração e uso individual, mas limita-se também a alguns interesses coletivos, melhor dizendo, à função social, que pode ser considerada um conjunto de normas que limitam o direito de propriedade, em defesa do coletivo, principalmente segundo o que prevê o art. 182, §2° e 186 da Constituição Federal.

An. 182. (...) (...)

§2°. A propriedade urbana cumpre a sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

' Art. 5°. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção do qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residente no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...); XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atendera a sua função social...”.

i _-Ut. 170. “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I­

soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade...”.

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III- observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Bem como, no caso de não cumprimento pela propriedade de sua função social, estabelece a própria Constituição Federal algumas conseqüências que podem ser levadas a cabo. É o que prevêem o arts. 182, §4°, e 184 da Constituição Federal.

An. 182. (...) (...)

§4°. É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I- parcelamento ou edificação compulsórios;

II -imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

§l°. As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.

§2°. O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.

§3°. Cabe à Lei Complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação.

Com o transcrito acima, podemos ver claramente que a intenção de nosso ordenamento não é somente a de estabelecer uma função social à propriedade, mas também fazer com que essa função seja observada e efetivada, sob pena de

cumprimento das conseqüências constitucionalmente previstas. Trata-se de uma forma

de impor aos proprietários o dever de utilizarem suas propriedades como bem

entenderem, mas também de fonna a beneficiar o coletivo. E caso o proprietário não se

submeta à utilização da propriedade conforme a sua função social, poderá ser punido

com a obrigação compulsória de adequar sua propriedade à função social, com um

aumento progressivo do imposto pago pela propriedade e até com a efetiva perca da

propriedade, pela desapropriação.

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3. A DESAPROPRIAÇÃO

3.1 Histórico da Desapropriação

O surgimento do instituto da desapropriação é muito questionado pelos doutrinadores. Os romanos teriam conhecido esse instituto, já que a propriedade para eles, como já mencionado, era tida como sagrada e inviolável, mesmo diante da utilidade pública? Existiria um princípio de desapropriação no direito romano, que fosse exercido arbitrariamente ou os atos realizados devem ser considerados como abusos de poder por parte de imperadores?

Conclui José Carlos de Moraes Salles que “é óbvio, entretanto, que embora não houvessem conhecido o instituto tal como hoje se apresenta, os romanos “sentiram°, por assim dizer, o fenômeno da desapropriação. Povo que levou a efeito a execução de numerosas e importantíssimas obras públicas teria, é evidente, de defiontar-se com a posição de proprietários atingidos pelas mesmas.”10

Tem-se como indiscutível que foi também a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão que “consagrou a propriedade como inviolável e sagrada, só permitindo que alguém fosse privado da mesma apenas nos casos de manifesta necessidade pública e mediante justa e prévia indenização”“. Dessa forma, é a partir da Revolução Francesa, também, que surge a idéia de desapropriação tal qual a conhecemos.

Já no Brasil, o primeiro diploma a regular a desapropriação foi o Decreto de 21/05/1821. E a Constituição do Império do Brasil, de 1824, previa o direito à propriedade em sua plenitude, bem como, a possibilidade da Administração toma-se proprietária do bem particular caso necessitasse, sendo o proprietário particular previamente indenizado. E a lei ordinária que complementou essa disposição

constitucional, foi a Lei de 09/09/ 1826, que citou e especificou, pela primeira vez em nosso ordenamento, a necessidade e utilidade pública.

Dentre outras tantas normas produzidas sobre o tema no Brasil, podemos citar algumas, como, por exemplo, a Constituição de 1934, trazendo agora uma referência à

1° SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 43 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 61.

“ Ibid., p. 63.

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“indenização justa” - contudo, essa expressa observação é retirada do texto

constitucional quando da promulgação, por Getúlio Vargas, da Constituição de 1937.

E, logo em seqüência, temos o advento, em 21/06/1941, do Decreto n° 3.365, que mesmo com inúmeras alterações, ainda é nossa atual Lei de Desapropriações.

A Constituição de 1946 traz como inovações, primeiramente, um acréscimo aos pressupostos básicos: além da necessidade e da utilidade pública, o interesse social.

Bem como, exigiu que a indenização, além de prévia e justa, fosse também em dinheiro, com exceção à desapropriação de propriedade territorial rural. E em 1962, é produzida a Lei n° 4.132, que regulariza os casos de desapropriação por interesse social.

Por fim, as Constituições de 1967/1969 mantiveram as mesmas hipóteses de desapropriação, enquanto a Constituição de 1988 estabeleceu, por exemplo, a competência privativa da União para legislar sobre desapropriação (art. 22, II) e, em seu art. 184, §4°, a possibilidade de desapropriação para fins de refonna agrária, do imóvel que não cumprisse com a sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária. E, finalmente, sobre a desapropriação de imóvel rural, por interesse social, para fins de reforma agrária, em O6/O7/ 1993, é produzida a Lei Complementar n° 8.629.

3.2 Conceito de Desapropriação

A conceituação do instituto da desapropriação não propicia relevantes controvérsias na doutrina. Mesmo em face de inúmeras definições, o instituto é

“desenhado” de forma semelhante entre a maioria dos autores, como descreve Romeu Bacellar Filho, ao versar que “a desapropriação é a transferência compulsória, ou não, de um bem do domínio particular para o domínio público, por necessidade e utilidade pública ou interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro ou títulos da dívida pública. É a forma mais drástica de intervenção do Estado na propriedade, pois, para o particular, resulta a perda dela.”12

Assim como Hely Lopes Meirelles e Celso Antonio Bandeira de Mello, dentre tantos outros autores, a conceituação trazida por Romeu Bacellar Filho aborda

12 FILHO, Romeu Bacellar. op. cit., p. 165.

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ll

pontualmente e especificamente todos os detalhes que permeiam a desapropriação.

Partindo-se da idéia de uma necessária transferência de um bem do domínio privado ao domínio público, seja essa transferência compulsória (através do exercício, pelo Estado, de seu Poder) ou mesmo através de um acordo entre o privado e o público.

Estabelece também a necessidade do cumprimento dos pressupostos necessários à desapropriação, quais sejam, necessidade e utilidade pública ou interesse social - que mais adiante serão analisados. E ressalta, também, a necessidade da existência de uma prévia e justa indenização, seja em dinheiro ou através de títulos da dívida pública, conforme especifica o texto da lei a cada caso em concreto.

Por fim, temos considerada a desapropriação como a fonna mais drástica de intervenção do Estado na propriedade. Essa relevância à desapropriação também é dada por Hely Lopes Meirelles, sendo que o primeiro parágrafo que este autor dedicou à desapropriação, em seu livro Direito Administrativo Brasileiro, prevê que “dentre os atos de intervenção estatal na propriedade destaca-se a desapropriação, que é a mais drástica das formas de manifestação do poder de império, ou seja, da soberania intema do Estado no exercício de seu domínio eminente sobre todos os bens existentes no território nacional.”l3

3.3 Pressupostos para a Desapropriação

Para a efetiva realização da desapropriação, prevê nossa Constituição a necessidade da presença de pressupostos fáticos que fundamentem e comprovem o interesse da coletividade, que sobrepujará o interesse do proprietário privado. Esses pressupostos podem ser constitucionalmente definidos em: necessidade pública;

utilidade pública e; interesse social. Contudo, segundo José Carlos de Moraes, o autor Seabra Fagundes alude à questão, fazendo-o nos seguintes termos:

3. A rigor, não seria necessário desdobrar em três as causas justificativas do direito de expropriar. O conceito de utilidade pública é em si tão amplo, que a menção apenas dessa causa bastaria a autorizar a incorporação ao patrimônio estatal da propriedade privada tanto quanto fosse útil fazê-lo, com quanto tal se afigurasse necessário ou de interesse social. A utilidade não implica necessariamente necessidade ou interesse

13 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 293 ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 576.

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social (em sentido estrito); mas o procedimento que for de necessidade pública ou de interesse social será, forçosamente, de utilidade pública.”

Entretanto, muitos doutrinadores consideram relevante o fato dessa tripartição dos pressupostos, realizada em nossa Constituição. Como Hely Lopes Meirelles, defendem que o motivo dessa partição foi o de “indicar discriminadamente a natureza

e o grau dos interesses a serem atendidos pela Administração em cada ato

expropriatório.”l5 E segue, o referido autor, fazendo uma conceituação de cada um dos pressupostos, a vermos:

2.1.3.l. Necessidade pública: a necessidade pública surge quando a administração defronta situações de emergência, que, para serem resolvidas satisfatoriamente, exigem a transferência urgente de bens de terceiros para o seu domínio e uso imediato.

2.l.3.2. Utilidade pública: a utilidade pública apresenta-se quando a transferência de bens de terceiros para a Administração é conveniente, embora não seja imprescindível.

A lei geral das desapropriações (Dec-lei 3.365/41) consubstanciou as duas hipóteses em utilidade pública, pois só emprega essa expressão em seu texto.

2.1.3.3. Interesse social: o interesse social ocorre quando as circunstâncias impõem a distribuição ou o condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividade em beneficio da coletividade ou de categorias sociais merecedoras de amparo específico do Poder Público. Esse interesse social justificativo de desapropriação está indicado na norma própria (Lei 4.132/62) e em dispositivos esparsos de outros diplomas legais. O que convém assinalar, desde logo, é que os bens desapropriados por interesse social não se destinam à Administração ou a seus delegados, mas sim à coletividade ou, mesmo, a certos beneficiários que a lei credencia para recebê-los e utilizá-los convenientemente.”

Por fim, podemos ressaltar que a Lei 3.365/41, nossa regra geral de desapropriação, em seu art. 5°, tacitamente unificou as noções de necessidade e utilidade pública, fazendo menção escrita somente a esta. Dessa forma, temos que a noção de utilidade pública abrange o conceito de necessidade pública, como bem explicita José Carlos de Moraes Salles, ao citar que “todavia, não obstante o legislador constituinte ter consagrado a tricotomia e entendermos que a mesma se faz útil, não hesitamos em afirmar que o conceito de necessidade pública é abrangível pelo de utilidade pública.”l7

'4 FAGUNDES, Seabra. “Da Desapropriação no Direito Constitucional Brasileiro”. In Revista de Direito Administrativo. n° 14.

15 MEIRELLES. op. cit., p. 584.

1° Ibid., p. 584-585.

” SALLES. op. cit., p. 94.

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13

E cumpre somente ressaltar, também, uma discussão doutrinária no que diz respeito ao referido art. 5° da Lei 3.365/41. Cabe estabelecer se a relação de utilidade pública trazida por esse artigo é taxativa ou meramente exemplificativa (discussão essa que não nos cabe adentrar).

3.4 Das Etapas da Desapropriação

O procedimento da desapropriação ocorre através de duas fases bem distintas.

Inicia-se com a necessária declaração, pelo Poder Público, de utilidade pública ou interesse social do bem a ser desapropriado - fase declaratória. E, por fim, culmina o procedimento através da fase executória, que pode ocorrer de maneira administrativa ou judicial, onde ocorrerá propriamente o acerto de valores, a efetivação do pagamento e a final transferência do bem ao futuro proprietário - geralmente o Estado.

3.4.1 Fase Declaratória

Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, a “declaração de utilidade pública é

o ato através do qual o Poder Público manifesta sua intenção de adquirir compulsoriamente um bem determinado e o submete ao jugo de sua força expropriatória” 18 . Pela declaração de utilidade pública, ficará o proprietário cientificado da intenção do Estado ou ente público em transferir para seu patrimônio o bem particular. Irremediavelmente, o proprietário deverá submeter-se aos interesses maiores.

A declaração de utilidade pública, uma vez publicada, não produzirá os efeitos da desapropriação. Como dito acima, esse procedimento é composto por duas fases e a declaração somente consistiria em uma informação dos desejos e motivos que levaram o Poder Público a ensejarem tal declaração. Sobre isso, Hely Lopes Meirelles prescreve que “a declaração expropriatória pode ser feita por lei ou decreto em que se identifique o bem, se indique seu destino e se aponte o dispositivo legal que a autorize.

Como se trata, entretanto, de ato tipicamente administrativo, consistente na especificação do bem a ser transferido compulsoriamente para o domínio da

'* MELLO. op. zit., p. 771.

(19)

Administração, é mais próprio do Executivo, que é o Poder administrador por

. . 19

excelencia.”

Hely Lopes Meirelles destaca pontos sobre os quais deverá versar a declaração de utilidade pública. Esta deverá especificar o bem que sofrerá a desapropriação, bem

como deve expressar o destino ao qual se objetiva a utilização do bem a ser desapropriado. E deverá, também, ser citado o dispositivo legal que autoriza a realização da desapropriação, qual seja, onde se encaixa o caso concreto na previsão legal. E, por fim, prevê ele as duas maneiras pelas quais pode ser feita a declaração de utilidade, quais sejam, por lei ou decreto. Aponta também que a desapropriação é instituto ínsito ao Poder Executivo - pois é ato de natureza administrativa - e que,

dessa forma, esse é o grande responsável e sujeito ativo da maioria das

desapropriações que ocorrem, através, portanto, do Decreto.

Para Celso Antonio Bandeira de Mello, realizada a declaração de utilidade pública, geraria os efeitos de “a) submeter o bem à força expropriatória do Estado; b)

fixar o estado do bem, isto é, de suas condições, melhoramentos, benfeitorias existentes; c) conferir ao Poder Público o direito de penetrar no bem a fim de fazer verificações e medições, desde que as autoridades administrativas atuem com moderação e sem excesso de poder; d) dar início ao prazo de caducidade da

declaração.”2°

Assim, como já dito, o primeiro efeito relevante que surge após a declaração de utilidade pública de determinado bem, segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, é a noção de sua imediata submissão ao Poder Público, à força expropriatória do Estado.

Bem como, é a partir desse momento que será fixado o estado do bem, a sua real situação, que deverá ser efetivamente indenizada em dinheiro.

Após a declaração, temos também que o ente que está interessado na desapropriação, passa a ter o direito de penetrar no bem, com o objetivo apenas de realizar medições, verificações e estudos da área, sem, contudo, agir com excesso de poder, conforme especifica a Lei n° 3.365, em seu art. 7°2l. E fato interessante a se

19 MEIRELLES. op. Cir., p. 586.

2° MELLO. op. cit., p. 772.

21 Art. 7°. “Declarada a utilidade pública, ficam as autoridades administrativas autorizadas a penetrar nos prédios

compreendidos na declaração, podendo recorrer, em caso de oposição, ao auxílio de força policial. Àquele que

for molestado por excesso ou abuso de poder, cabe indenização por perdas e danos, sem prejuízo da ação penal.”

(20)

15

ressaltar também, é que realizada a declaração de utilidade pública ou interesse social, o ente que deseja realizar a desapropriação, terá um prazo para que possa efetivamente passar à fase de execução da desapropriação. Esse prazo de caducidade é de dois anos para a declaração de interesse social ou de cinco anos para a declaração de utilidade pública - podendo, essas declarações, serem renovadas já a partir de um ano da decadência.

E sobre os efeitos da declaração, também descreve Hely Lopes Meirelles:

Os efiitos da declaração expropriatória não se confundem com os da desapropriação em si mesma. A declaração de necessidade ou utilidade pública ou de interesse social é apenas o ato-condição que precede a efetivação da transferência do bem para o domínio do expropriante. Só se considera iniciada a desapropriação com o acordo administrativo ou com a citação para a ação judicial, acompanhada da oferta do preço provisoriamente estimado para o depósito. Até então a declaração expropriatória não tem qualquer efeito sobre o direito de propriedade do expropriado, nem pode impedir a normal utilização do bem ou sua disponibilidade, lícito é ao particular explorar o bem ou nele construir mesmo após a declaração expropriatória, enquanto o expropriante não realizar concretamente a desapropriação, sendo ilegal a denegação de alvará de construção: o impedimento de pleno uso do bem diante da simples declaração de utilidade pública importa restrição inconstitucional ao direito de propriedade, assim como o apossamento sem indenização equivale a confisco.22

Reafinna, o citado autor, que a mera declaração de utilidade pública ou interesse social não dá campo a todos os efeitos da desapropriação. Em verdade, é mero ato formal, gerador de alguns efeitos já citados e, obviamente, requisito à segunda fase da desapropriação, a fase executória.

3.4.2 Fase Executória

É na fase executória que se darão todas as providências para que, efetivamente, se realize a vontade que foi declarada pelo expropriante, quando da declaração de utilidade pública ou interesse social - integração do bem ao patrimônio público. A fase executória pode ocorrer de duas formas distintas, quais sejam: extrajudicialmente ou judicialmente. Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello:

a) Extrajudicial, quando o poder expropriante e o expropriado acordam com relação ao preço e pode, por isso, concretizar-se a aquisição compulsória mediante acordo no que respeita à indenização, operando-se, então, sem intervenção do Poder J udiciário.

22 MEIRELLES. op. ciú., p. 587-588.

(21)

b) A desapropriação judicial tem lugar quando o expropriante ingressa em juízo com a propositura da ação expropriatória. Neste caso, a manifestação judicial poderá ser, ainda, de dois tipos: 1) homologatória, quando o proprietário do bem aceita, em juízo, a oferta feita pelo expropriante; aí, o juiz apenas homologa o acordo judicial; 2) contenciosa, quando o proprietário e o expropriante não acordam em relação ao preço, que terá que ser fixado pelo juiz, após arbitramento.”

É evidente que o ideal seria a realização da desapropriação apenas na órbita administrativa, ou seja, sem a necessária intervenção do Poder Judiciário. Contudo, caso seja inviável qualquer acerto entre as partes, o processo judicial deverá seguir o rito especial estabelecido pela Lei das Desapropriações, Decreto-Lei 3.365, sendo admitidos supletivamente os preceitos do Código de Processo Civil. O foro para a propositura da ação é o da situação do bem expropriado.

Já com relação aos fatos a serem apresentados e defendidos em juízo, apenas poderão ser discutidos alguns fatos relativos à declaração de utilidade pública ou interesse social. Não cabe aqui discussão quanto ao mérito da desapropriação a ser realizada, mas apenas uma análise aprofundada se realmente o ato da declaração cumpre todos os requisitos exigidos em lei (não apresentando, assim, nenhum vício fomial), bem como a fixação do quantum da justa indenização a ser paga. Segundo Hely Lopes Meirelles:

No processo de desapropriação o Poder Judiciário limitar-se-á ao exame extrínseco e fonnal do ato expropriatório e, se conforme à lei, dará prosseguimento à ação para admitir o depósito provisório dentro dos critérios legais, conceder a imissão na posse quando for caso e, a final, fixar a justa indenização e adjudicar o bem ao expropriante.

Neste processo é vedado ao juiz entrar em indagações sobre a utilidade, necessidade ou interesse social declarado como fundamento da expropriação (art. 9°.), ou decidir questões de domínio ou posse. Nada impede, entretanto, que, por via autônoma, que a lei denomina “ação direta” (art. 2O°.), o expropriado peça e obtenha do Judiciário o controle de legalidade do ato expropriatório, como veremos adiante. Mas é óbvio que, no próprio processo de desapropriação, o juiz pode e deve decidir sobre a regularidade extrínseca do ato expropriatório (competência, forma, caducidade etc), assim como sobre as nulidades processuais.”

Destacamos, por fim, que em se tratando de desapropriação de bem imóvel, a justa indenização deverá ser prévia, confonne prevê nossa Constituição. Dessa forma,

a desapropriação somente se completará após seja realmente efetuado o pagamento.

23 MELLO op. cú., p. 770-771.

24 MEIRELLES. op. Cir., p. 589.

(22)

17

4. A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

4.1 Noções Gerais

A desapropriação indireta se dá quando o Poder Público, agindo de maneira diversa à qual prevê expressamente nosso ordenamento, apossa-se de detenninado bem privado. Dessa forma, explicita João Nunes Sento Sé, que “a “desapropriação indireta” se verifica quando a Administração ocupa, em caráter defmitivo, uma propriedade privada, sem a observância do processo expropriatório regular. Seu

fundamento reside no princípio da intangibilidade da obra pública.”25

Assim, é a desapropriação indireta forma do Poder Público adquirir a propriedade de determinado bem, deixando de se adequar ao procedimento previamente e constitucionalmente estabelecido. A desapropriação, como já citada, tida como a mais drástica das formas de atuação do Estado sobre a propriedade particular, passa a ter uma vertente que, acima de tudo, deixa de observar as previsões legalmente estabelecidas. E, pautando-se pelo princípio da intangibilidade da obra pública, temos que uma vez afetado o bem pelo Poder Público, somente resta ao proprietário reclamar a devida indenização. Assim descreve Carlos Eduardo Vieira de Carvalho, que “quase todos concordam, todavia, que, uma vez verificada a afetação, a incorporação do bem à fmalidade pública, não mais caberá às ações possessória e reivindicatória, restando ao particular expropriado haver a indenização.”26

Portanto, com a desapropriação indireta, age o Poder Público de forma, muitas vezes, a cometer esbulho à propriedade privada, como descreve, por exemplo, Hely Lopes Meirelles:

A desapropriação indireta não passa de esbulho da propriedade particular e, como tal, não encontra apoio em lei. É situação de fato que se vai generalizando em nossos dias, mas que a ela pode opor-se o proprietário até mesmo com os interditos possessórios.

Constunado o apossamento dos bens e integrados ao domínio público, tomam-se, daí por diante, insuscetíveis de reintegração ou reivindicação, restando ao particular espoliado haver a indenização correspondente, da maneira mais completa possível, inclusive correção monetária, juros moratórios, compensatórios a contar do esbulho e

25 SÉ, João Nunes Sento. “Desapropriação Indireta”. In Revista de Direito Público. n° 15, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 138.

CARVALHO, Carlos Eduardo Vieira de. “Desapropriação Indireta”. In Revista de Direito Público. n° 97, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 176.

26

(23)

honorários de advogado, por se tratar de ato caracteristicamente ilícito da . . ~ 27

Administraçao.

4.2 Histórico da Desapropriação Indireta.

O surgimento da idéia de desapropriação indireta se dá na França e seu esplendor produtivo foi entre o período de 1850 à 1880 - em 1880 surge a teoria da empríse, que ocorre quando a Administração pratica um atentado, sob a forma de desapossamento, contra a propriedade privada imóvel, mas em condições tais que esse atentado não pode ser considerado como desprovido totalmente de base legal, como ocorre com a denominada via de fato. Para os doutrinadores franceses, essa

desapropriação indireta, em seu ordenamento, poderia efetivar-se de duas maneiras: 1) quando diante de casos pré-estabelecidos em lei de desapropriação indireta, como, por exemplo, para a abertura de novas vias ou nos casos de ocupação prolongada por mais de cinco anos, em virtude de obras públicas, entre outros e; 2) nos casos de domínio ilegítimo (erro), pela Administração, da propriedade particular - esse caso, doutrinaria e jurisprudencialmente instituído. Assim, descreve Cláudia de Rezende Machado de Araújo que:

Como se assinalou anterionnente, os doutrinadores franceses admitem duas modalidades de desapropriação indireta. A primeira abrange os casos de desapropriação previstos em lei. A outra é resultante do domínio ilegítimo da propriedade particular pelo Estado, em virtude de construção de uma obra pública.

Neste último caso, ocorre a invasão da propriedade particular pela Administração Pública, sem o devido processo de desapropriação. Esta modalidade é aceita pela doutrina e jurisprudência como um caso de desapropriação indireta, apesar de não haver uma previsão legal específica.28

Dessa forma, temos que a desapropriação indireta se dá não com a realização do esbulho da propriedade, mas, sim, como conseqüência dos atos realizados pela Administração. E assim também esclarece Gilberto Siqueira Lopes, quando destaca que “ocorre a desapropriação indireta na França, quando a ocupação de um imóvel pela Administração acontece, não como objetivo principal da ação do Estado, mas

27 MEIRELLES. op. Cir., p. 577.

28 ARAUJO, Cláudia de Rezende Machado de. “Desapropriação Indireta”. In Revista de Informação

Legislativa. n° 131, Brasília: Senado Federal, p. 271.

(24)

19

como resultado e conseqüência secundária de uma atuação destinada a outro

objetivo.”29

Assim, conclui-se que para a realidade francesa, a desapropriação indireta passa longe de ser um esbulho da propriedade, mas limita-se a casos especificamente previstos em lei ou, até mesmo, nos casos em que haja erro por parte da atuação da Administração, ao assumir o domínio ilegítimo de uma propriedade - sendo, contudo, nunca de fonna premeditada ou dolosa.

4.3 Desapropriação Indireta no Brasil

Foi baseando-se na produção francesa, então, que a teoria da desapropriação indireta chegou a ser utilizada no Brasil. Mais especificamente, basearam-se nossos tribunais na segunda hipótese criada pela doutrina e jurisprudência francesa, a do domínio ilegítimo, confonne traz Cláudia de Rezende Machado de Araújo, ao acentuar que “foi esta última modalidade de desapropriação indireta, ou seja, aquela resultante do domínio ilegítimo da Administração, que influenciou os tribunais brasileiros, resultando na construção jurisprudencial hoje aceita pelos julgadores com o nome de desapropriação indireta.”30

Segundo Joaquim de Almeida Baptista, teria sido o Ministro Orosimbo Nonato o primeiro brasileiro a utilizar o termo desapropriação indireta aqui no Brasil, confonne expõe:

A expressão “desapropriação indireta”, foi atribuída ao saudoso Min. Orosimbo Nonato, que a teria usado, pela primeira vez, em idos tempos, e, com a seqüência, foi incorporada em nosso vocabulário jurídico. Não poderia prever S. Exa., que acabasse a cômoda designação, por criar uma errônea interpretação do que significava. Na atualidade, tem-se visto freqüentes afirmações, à guisa de sua conceituação, que se trataria de uma expropriatória, à qual apenas faltou o pagamento prévio, ou a prévia iniciativa da propositura da ação.3 1

29 LOPES, Gilberto Siqueira. A Desapropriação e as Limitações do Direito à Propriedade. São Paulo:

Vellenich, p. 69.

3° ARAÚJO. op. cit., p. 273.

3 1 BAPTISTA, Joaquim de Ahneida. “Da Não Aplicabilidade do Art. 34 da Lei de Desapropriações às Ações de

Desapropriação Indireta”. In Revista de Direito Público. n° 80, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 121.

(25)

Entretanto, podemos notar que, com o passar do tempo, a ideologia francesa que serviu de espelho à desapropriação indireta no Brasil, acabou transformando-se e aumentando seu campo de atuação de maneira indevida.

Com o amadurecimento da teoria da desapropriação indireta no Brasil, começa

a operar uma inusitada modificação nos pleitos judiciais. Primeiramente, os proprietários, ao terem conhecimento do apossamento, ajuizavam ações possessórias ou reivindicatórias, mas esbarravam no fato do desaparecimento do bem particular e sua conseqüente integração ao domínio público. Após isso, as ações foram sendo transformadas em indenizatórias - caso o invasor de uma propriedade individual fosse

um particular, o proprietário expropriado poderia utilizar-se dos interditos possessórios; entretanto, no caso de o invasor ser a própria Administração, a solução apresentada foi a da desapropriação indireta.

Por fim, a teoria foi ganhando um campo de aplicação cada vez maior, chegando a, atualmente, justificar esbulhos realizados pela Administração, conforme lembra Gilberto Siqueira Lopes, ao sustentar que “em nosso país a jurisprudência tem afrouxado o rigor do conceito, permitindo, em muitos casos, que verdadeiros esbulhos sejam perpetrados em prejuízo dos particulares.”32 Bem como, João Nunes de Sento Se traz que:

O conceito de desapropriação indireta, porém, vem sendo destorcido entre nós, com graves prejuízos para o proprietário.

Esquecida de que a desapropriação indireta é uma forma expropriatória anômala, só

admitida em situações excepcionais, a jurisprudência vem agasalhando

injustificadamente sérios atentados da Administração contra a propriedade privada, regularizados posteriormente sob a invocação de desapropriação indireta. Olvidando firme posição doutrinária no sentido da admissibilidade dos interditos contra atos da Administração, ela está permitindo o prosseguimento de obras iniciadas em condições visivelmente irregulares, remetendo o proprietário, com grandes sacrifícios, para uma interminável luta judicial em busca de sua indenização.”

Assim, devido a essa distorção da idéia original da desapropriação indireta, esse instituto aqui no Brasil passou a ser considerado, por vários doutrinadores, como um esbulho praticado pela Administração. Defendem que à Administração não é justo, muito menos legal, apossar-se de propriedade particular a seu bel interesse.

32 LoPEs. op. cit., p. 71.

33 SE. op. cit., p. 152.

(26)

21

Concluindo-se que, para eles, não seria admissível a submissão do direito à propriedade privada a mero interesse do Estado, bem como não é admissível a submissão do mesmo direito à propriedade a qualquer outra pessoa privada.

4.4 A Desapropriação Indireta e a Via de Fato.

Como dito anteriormente, o conceito de desapropriação indireta que por nós foi aplicado, surgiu originariamente na França. Contudo, o instituto não fora inteiramente importado desse País, mas aqui chegou de forma parcial, recebendo, a partir de então, aplicação e conceituação jurisprudencial e doutrinária.

Notadamente, alguns autores souberam distinguir a desapropriação indireta da via de fato. Porém, jurisprudencialmente, foi-se criando, através da desapropriação indireta, uma fonna de se resolver o esbulho que, consciente ou inconscientemente, a Administração causava a detenninado proprietário. E é dessa maneira que a ação de desapropriação indireta passou a ser uma forma de compensação ao particular pelo bem (propriedade) que dele tivesse sido retirado e que já pertencesse defmitivamente ao domínio público, como bem especifica Hely Lopes Meirelles:

Vê-se, pois, que na desapropriação indireta o bem esbulhado se integra no domínio público, não por título legal, mas por situação de fato que toma impossível o seu retomo ao domínio do particular, compensando-se o despojamento do bem pela mais completa indenização em dinheiro. Daí por que a ação não é de reivindicação, mas sim de indenização. É ação ordinária diferente da expropriatória prevista e regida pelo Decreto-lei 3.365/41, pois o seu rito é outro, pautado unicamente pelo Código de Processo Civil, sem as peculiaridades da ação de desapropriação típica, que começa com o depósito para irnissão na posse e termina com a adjudicação do bem ao domínio do expropriante, após a efetivação integral do preço ao expropriado. 34

João Nunes de Sento Sé, já citado, lembra que a doutrina francesa divide de maneira clara aquilo que seriam prejuízos causados pelos trabalhos públicos, a empríse e a via de fato.

A utilização da propriedade privada pelos trabalhos públicos, seria nada mais do que a pura passagem ou acomodação de homens ou utensílios para a realização de determinada obra. O objetivo é a mera utilização da área como meio para a efetiva

34 MEIRELLES, Hely Lopes. “Ação de Desapropriação Indireta”. In Estudos e Pareceres de Direito Público.

v. 6, São Paulo: Revista dos Tribrmais, p. 255.

(27)

realização de detenninada obra - não tem a intenção, a Administração, de toma-se proprietária da área.

Com relação à emprise, assegura o referido autor que em França essa noção é mais larga do que a de desapropriação indireta, abrangendo, por exemplo, os casos de requisição de imóvel. No dizer de J oão Nunes de Sento Sé, parafraseando Francis-Paul Benoit, “há, porém, °emprise°, diz o mesmo mestre, quando a Administração pratica um atentado, sob forma de desapossamento, contra a propriedade privada imóvel, mas em condições tais que esse atentado não pode ser considerado como desprovido totalmente de base legal - hipótese em que existiria via de fato - podendo até ser

inteiramente regular.”35

E, por fim, teríamos que a via de fato seria uma decisão tomada pela

Administração, sem que nenhum texto ou princípio jurídico a pennitisse tomar. Sobre isso, assenta novamente João Nunes de Sento Sé que “há via de fato, afinna Waline, quando a Administração comete um atentado grave, seja a uma liberdade pública, seja ao direito de propriedade de um cidadão, por um ato manifestamente ilegal, ou, empregando a expressão de muitas decisões recentes do Tribunal de Conflitos,

“manifestamente insuscetível de ter conexão com a aplicação de algum texto de lei.””36 Com a ajuda da doutrina francesa, resta claro os casos que compreenderiam a desapropriação indireta e os casos de via de fato. Esta é totalmente desprovida de previsão legal e já a desapropriação indireta, se dá de maneira ilegal, dentro de um procedimento previamente estabelecido. Bem como, ressaltamos novamente, deve ficar claro que o objetivo principal da Administração, deve ter sido única e exclusivamente a realização da obra e que, em conseqüência desse objetivo, por erro de execução, deu-se a necessária intervenção em propriedade alheia. Dessa forma, prevê João Nunes de Sento Sé que “toma-se necessário, demais, excluir da noção de desapropriação indireta o elemento intencional. Assim, deve afastar-se dela a idéia de uma invasão consciente da propriedade particular, ainda que para a construção de uma obra pública. Parece-nos também que ela apenas pode ocorrer nos mesmos casos de

35 SÉ. op. cit., p. l4l.

36 Id.

(28)

37

23

utilidade pública em que se admite que a Administração desaproprie, para a

implantação de uma obra.”37

E é dessa forma que estabelece parte da doutrina estrangeira em seus

ordenamentos, ao recepcionarem esse instituto, como já dito, de patemidade francesa.

A citannos como exemplo a Argentina, temos que em nosso vizinho País, entende-se como necessário para a realização da desapropriação indireta, a declaração de utilidade pública. Assim, fica estabelecido que, para a Administração realizar adesapropriação indireta, deve primeiramente ser feita a declaração de utilidade pública, mesmo que depois se passe por cima dos demais procedimentos necessários à desapropriação - a desapropriação indireta exige a declaração de utilidade pública.

Nestes termos, Francisco Carlos Duarte transcreve trecho de Altamira, ao dizer que “com efeito, observa Altamira que “a desapropriação irregular ou inversa consiste na apropriação, pela Administração Pública, de um bem privado, declarado de utilidade pública, sem o emprego dos procedimentos legais expropriatórios. ' ”38

Sendo assim, adotando a Argentina como exemplo, parece-nos dificil uma confusão entre a desapropriação indireta e a via de fato. Como as possibilidades da desapropriação indireta são expressamente previstas ou, neste caso, devem ser declaradas, o instituto não adquire a forma de proteção ao esbulho praticado pela Administração. Caberia ao Brasil prever em seu ordenamento as possibilidades para a realização da desapropriação indireta e, assim, deixarmos de ver tal instituto como figura de defesa ao ato ilegal praticado pela Administração.

SÉ. op. cit., p. 145.

38 DUARTE. op. cit., p. 52.

(29)

5. A DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA E O NOVO CÓDIGO CIVIL

5.1 Introdução

Cabe, por fim, fazermos observações quanto a aplicação de certas modificações legais que foram introduzidas em nosso ordenamento, em razão do advento do Novo Código Civil.

Primeiramente, iremos tratar de fato que ainda hoje é` discutido, que é a prescrição da ação de desapropriação indireta. Essa prescrição, atualmente, já está bem fixada em nossos tribunais, compreendida no período de vinte anos; mas, é de interesse da Fazenda Pública que esse período seja menor para, assim, justificar a extinção do direito de ação o mais rápido possível. Dessa maneira, temos constantes tentativas de fundamentações em defesa de prazos, por exemplo, qüinqüenais para a desapropriação indireta, todas, porém, rechaçadas pela jurisprudência.

Posteriormente, abordaremos tema em que o Novo Código inovou, ao prever expressamente em seus artigos, formas de perca da propriedade que muito se

assemelham à desapropriação indireta, mas que doutrinariamente assumiram os nomes de desapropriação judicial e acessão invertida. Sobre isso, lembra Cláudia de Rezende Machado de Araújo que:

Apesar de muitos autores entenderem que a desapropriação indireta é inconstitucional, há outros, como Norberto Guarinello, que defendem a sua transfonnação em norma legal.

Norberto Guarinello entende inadequada a denominação de desapropriação indireta da doutrina francesa, considerando mais apropriado o termo desapropriação irregular da doutrina espanhola. Defende ainda, com propriedade, em seu trabalho Problemas atuais da desapropriação - da desapropriação indireta, a transformação da desapropriação indireta em norma legal, como fizera a legislação argentina já em 1977. Nesse sentido, a legislação estaria complementando a Constituição Federal, estabelecendo mais alguns casos de desapropriação.”

E é isso o que nos parece ter ocorrido. O Novo Código Civil agiu de forma a legalizar prováveis formas de desapropriação indireta, notadamente em seus arts.

1.228, §4°, e 1.255, parágrafo único, agindo de forma a complementar a Constituição.

39 ARAÚJO. op. ‹zi¢., p. 274.

(30)

25

5.2 A Prescrição da Ação de Desapropriação Indireta

A questão da prescrição da ação de desapropriação indireta é fato que ainda gera controvérsias no âmbito doutrinário, contudo apresenta-se bem fixado em nossa jurisprudência, notadamente no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça.

Defendem alguns autores, que tratam a desapropriação indireta como uma mera dívida que a Fazenda possui com o proprietário, a aplicabilidade do Decreto n°

20.910/62, que regula a prescrição qüinqüenal contra a Fazenda Pública, prevendo em seu Art 1°. “As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originam.”

Essa regra, prevista em citado Decreto, harmoniza-se com o que estabelece o Decreto-lei n° 3.365/41, em seu Art. 10°. “A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e fmdos os quais este caducará.”

Contudo, a discussão não se encerra por aí. Além dos autores que propugnam a possibilidade da prescrição em cinco anos, há ainda uma outra discussão que também é travada. Trata-se de decidir se a ação de desapropriação indireta seria uma ação pessoal ou uma ação real. Caso considerada ação pessoal, em razão de seu objetivo meramente indenizatório, que gera o dever de pagar para a Administração, a prescrição ocorreria em vinte anos, conforme art. 17740 do Código Civil de 1916. E caso fosse considerada ação real, de natureza possessória, reivindicatória, etc, o prazo

prescricional, segundo o Código Civil de 1916, era de dez anos para presentes e quinze anos para ausentes.

O Novo Código Civil brasileiro não trouxe mais expressamente transcrita a diferenciação da prescrição nos casos de ações pessoais ou de ações reais. Dessa forma, com o Novo Código, essa discussão fica deixada de lado, sendo que o prazo passa a ser único.

4° Art. 177. “As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e,

entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas.”

(31)

Contudo, temos que ressaltar que não foi essa a única mudança que o Novo Código Civil brasileiro trouxe a esta questão. Como dito acima, a jurisprudência era bem fundamentada no argumento de que as ações de desapropriação indireta eram consideradas como ações reais e com prescrição vintenária, como descrevem Súmula do STJ de n° 119 “A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos” e Ementa de Recurso de Embargos n° 63.833, julgado em 18/05/1972, pelo Supremo Tribunal Federal, cujo Relator foi o Ministro Eloy da Rocha.

Ementa.

AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRESCRIÇÃO. A AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA INCLUI-SE ENTRE AS AÇÕES REAIS. OS BENS INDIRETAMENTE DESAPROPRIADOS, PORQUE APROVEITADOS PARA FINS DE NECESSIDADE OU UTILIDADE PÚBLICA, OU DE INTERESSE SOCIAL, NÃO PODEM SER REAVIDOS IN NATURA. IMPOSSIVEL VINDICAR O PRÓPRIO BEM, A AÇÃO, CUJO FUNDAMENTO E O DIREITO DE PROPRIEDADE, VISA, PRECIPUAMENTE, A PRESTAÇÃO DO EQUIVALENTE DA COISA DESAPROPRIADA, QUE E A INDENIZAÇÃO ASSEGURADA NA CONSTITUIÇÃO, COMO PRESSUPOSTO DO ATO DE RETIRADA DA PROPRIEDADE, DE SEU TITULAR. INAPLICABILIDADE DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL A AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA . O ART. 177 DO CÓDIGO CIVIL DEVE APLICAR-SE EM HARMONIA COM AS ARTS. 550 E 551 DO MESMO CÓDIGO; VIVO O DOMÍNIO, NÃO PODE DEIXAR DE SER CONSIDERADA VIVA A AÇÃO QUE O PROTEGE. ENQUANTO O

EXPROPRIADO NÃO PERDE O DIREITO DE PROPRIEDADE, POR EFEITO DE USUCAPIAO DO EXPROPRIANTE, VALE O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL SOBRE O DIREITO DE PROPRIEDADE E O DIREITO A INDENIZAÇÃO, E TEM ELE A AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. O PRAZO, PARA ESTA AÇÃO, E O DA REIVINDICATÓRIA.JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE ESSAS QUESTÕES. EMBARGOS CONHECIDOS E RECEBIDOS.

Ao nosso ver, esse julgado serviu de base para entendimento que se alastrou até hoje em nossos Tribunais. Fica nele explicitado que a ação de desapropriação indireta é ação real e, também, que prescreve em vinte anos. Contudo, como vimos, a previsão para a prescrição de ações reais era de dez anos para presentes, segundo o Código Civil de 1916. Temos que destacar, porém, que a jurisprudência considera que se deva utilizar em consonância o art. 55041 do Código Civil de 1916. Considera-se, neste

41 Art. 550. “Aquele que, por vinte anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquirir­

lhe-á o domínio, independentemente de título e boa-fé que, em tal caso, se presume, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual lhe servirá de título para a transcrição no Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a l0(dez) anos se o possuidor houver

estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.”

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caso, que está se falando em prescrição aquisitiva e não extintiva. Portanto, o prazo que é levado em consideração pelos tribunais superiores de nosso País não é o prazo que extingue o direito à ação, mas sim o prazo de onde nascerá um direito ao novo proprietário, a Administração, através da usucapião do bem.

Desse modo, temos que o Novo Código Civil alterou parcialmente não só o regime da prescrição, como também modificou o tempo para a usucapião. Hoje, confonne prevê o art. 1.23842 e seu parágrafo único do Novo Código Civil, o prazo para a ação de usucapião reduziu-se para quinze ou dez anos. Assim, parece-nos que deve ser revisto o estabelecido na citada Súmula 119 do STJ, sendo que o prazo prescricional lá estabelecido não encontra mais respaldo em nosso ordenamento.

Na hipótese de nossos tribunais superiores entenderem pela manutenção do raciocínio sempre usado, que considera a desapropriação indireta uma ação real, com prescrição aquisitiva, pelo nosso atual Código Civil está estipulado um prazo de dez anos para a usucapião, conforme parágrafo único do art. 1.238, Entretanto, nada impede que a partir de agora nossos Ministros passem a considerar a desapropriação indireta uma ação real, com prescrição extintiva do direito de ação ou, até mesmo, uma ação pessoal, de mera indenização, quando, então, passará a ter também como prazo prescricional o período de dez anos, conforme prevê o art. 20543 do Novo Código Civil.

5.3 Desapropriação Judicial, Baseada na Posse Pro Labore Prevê o art. 1.228 do Novo Código Civil:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

(...)

§4° O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de 5 (cinco) anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

42 Art. l.238. “Aquele que, por 15 (quinze) anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.”

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Art. 205. “A prescrição ocorre em 10 (dez) anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.”

Referências

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