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O GÊNERO PROPAGANDA BANCÁRIA NA PERSPECTIVA DA ANÁLISE DO DISCURSO

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O GÊNERO PROPAGANDA BANCÁRIA NA PERSPECTIVA DA ANÁLISE DO DISCURSO

Luciana Fracasse (Doutoranda em Estudos da Linguagem/Universidade Estadual de Londrina e professora da Universidade Estadual do Centro-Oeste, e-mail: lfracasse@yahoo.com.br)

RESUMO: Este trabalho teve o intuito de refletir sobre as formas de silêncio existentes no gênero propaganda bancária, a partir do dispositivo teórico da Análise de Discurso de linha francesa; verificar os efeitos de sentido produzidos pelo silêncio na publicidade; e apresentar alternativas de trabalho com o discurso publicitário para o ensino de Língua Portuguesa. Ao utilizarmos o suporte revista, analisamos duas propagandas veiculadas na revista Veja, em agosto de 2005, nas quais verificamos temas como responsabilidade, maturidade e liberdade.

Nesses termos, evidenciamos a necessidade do silêncio permeando a elaboração dos anúncios, desde o título ao slogan de cada banco. Afinal, ao elegermos certas palavras, descartamos outras e na publicidade, essa escolha é fatal, pois representa a aceitação versus rejeição dos serviços ofertados.

PALAVRAS-CHAVE: propaganda bancária; condições de produção; silenciamentos.

RÉSUMÉ: Ce travail a pour but de réflechir sur les formes de silence dans le genre publicité bancaire, ayant pour support L’Analyse du Discours de ligne française; de vérifier les effets de sens produits par le silence dans la publicité; de présenter des alternatives de travail utilisant lê discours publicitaire pour l’enseignement de Langue Portugaise. Em prenant le support magasine, on analyse deux publicités parues dans l’hebdomadaire Veja em août 2005, oú on vérifie des sujets tels que la responsabilité, la maturité, la liberté. Dans ce termes on voit le besoin du silence dans l’élaboration des annonces, dès le titre jusqu’au slogan de chaque banque. Enfin, em élégeant certains mots, on en refuse d’autres, et ce choix est fatal étant donné qu’il signifie l’acceptation versus le refus des services offerts.

MOTS CLÉS: publicité bancaire; formes de silence; effets de sens.

1. Contextualização

O presente trabalho filiou-se à Análise de Discurso de linha francesa, a qual tem por objetivo a análise da língua na história, fazendo sentido. A Análise do Discurso é uma “Teoria da Leitura”, que mantém uma relação interdisciplinar com a Lingüística, com o Marxismo e com a Psicanálise. Esta teoria surgiu para responder à pergunta “Como este texto significa?”, uma vez que a AD trabalha não com o que o texto “quer dizer” (posição tradicional da análise do

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conteúdo), mas com o “como” o texto funciona. Nesse sentido, busca compreender a língua fazendo sentido, partindo do trabalho social que constitui o homem e sua história. Nesses termos, concebe a linguagem como mediadora entre o homem e a realidade natural e social.

Nessa perspectiva, não é dada ênfase aos “conteúdos”, mas aos procedimentos discursivos constitutivos do discurso. Assim sendo, elegemos como foco de pesquisa, o discurso publicitário, o qual ao transmitir fatores ideológicos, históricos e sociais, representa uma valiosa fonte de pesquisa para a Análise do Discurso.

Quando mergulhamos neste universo da propaganda, nos deparamos também com os vocábulos “anúncio publicitário”, “publicidade”, “peça publicitária”. Sendo assim, torna-se pertinente apresentarmos as diferenciações estabelecidas entre propaganda e publicidade De acordo com Monnerat (2003), o termo publicidade é derivado de público, do latim publicus, indicando a qualidade do que é público. Já o termo “propaganda”, oriundo do latim propagare (técnica do jardineiro de cravar no solo os rebentos novos das plantas, com o intuito de reproduzir novas plantas que posteriormente terão vida própria), foi retirado do nome Congregatio de propaganda fide, congregação criada em 1622, em Roma, pelo Papa Urbano VIII com o objetivo de propagar a fé, persuadir os pagãos e levá-los à Igreja Católica (SANDMANN, 2001).

Segundo Sandmann (op. cit.), em português, “ publicidade é usado para a venda de produtos e serviços e propaganda tanto para a propagação de idéias como no sentido de publicidade”.

Nesse contexto, propaganda se apresenta como o termo abrangente e pode ser utilizado em todos os sentidos. Justificamos que nesta pesquisa, os termos publicidade e propaganda estão sendo usados como sinônimos.

O discurso publicitário, ao interagir com os receptores, apresenta-lhes os bens de consumo da sociedade capitalista e os incentiva a se tornarem autênticos consumidores. Quando desempenha esse papel, o discurso publicitário transfigura-se em um dos instrumentos de controle social, e o faz através da simulação do igualitarismo, na qual “remove da estrutura de superfície os indicadores de autoridade e poder, substituindo-os pela linguagem da sedução”

(CARVALHO, 2001, p. 17).

Assim, o objetivo da propaganda - tornar as necessidades e os desejos de sua clientela homogêneos - é atingido pelo uso da repetição e por um apelo ao inconsciente. Mucchielli (1978, p. 1), ao pesquisar sobre a arte de persuadir, menciona que a situação inter-humana básica é aquela em que se dispõem, de forma direta ou indireta, um indivíduo com o objetivo de influenciar e um outro destinado a receber tal influência.

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O modo de persuadir oscila de acordo com o produto, faixa etária, sexo e classe social do possível consumidor, sendo assim, o discurso publicitário será elaborado minuciosamente para atender a um certo tipo de público e, conseqüentemente, obter o controle social sobre ele.

Para entendermos como esse domínio ocorre, considera-se o lugar social em que o enunciador-publicitário está falando e também deve-se saber que aparelho ele está representando: a Escola, o Estado, a Igreja, a Imprensa, etc.

Dessa forma, buscamos aprofundar pesquisas sobre o funcionamento do discurso publicitário, suas condições de produção, seu interdiscurso e intradiscurso, os valores ideológicos que o permeiam, o público ao qual se destina, os recursos verbais e não-verbais que o estruturam, o modo como se constrói uma identidade para os consumidores e, principalmente, os silêncios que o circundam.

É do nosso conhecimento que os textos publicitários são veiculados pela mídia eletrônica:

televisão, Internet, rádio, cinema; e pela mídia impressa: revistas, listas e guias, jornais, mala direta entre outros.No entanto, nessa pesquisa enfocaremos especificamente o meio de veiculação impresso, representado pela Veja. Para Gonzáles (2003), a revista fornece muitas vantagens aos anúncios publicitários como: espaço para abordagens mais detalhadas e de diversos impactos para cada anúncio publicado; clima adequado para se tratar de assuntos específicos entre outras.

As revistas, ao contrário das mídias televisivas, não atingem uma grande parte de nossa sociedade, no entanto, a audiência das propagandas impressas em suas páginas é sempre maior que a sua veiculação, pois uma revista pode ser lida por mais de uma pessoa e ainda, pelo fato de ser impressa, pode ser lida novamente. Desse modo, sua permanência entre os consumidores é a maior de todos os meios de comunicação (GONZALES, 2003).

2. O discurso publicitário e a Análise do Discurso

O discurso publicitário, ao transmitir fatores ideológicos, históricos e sociais, representa uma valiosa fonte de pesquisa para a Análise do Discurso. Segundo Vestergaard e Schroder, “a função da propaganda vai muito além da venda de um produto – ela opera por caminhos sutis no sentido de nos levar a adotar um determinado modo de vida ou incorporar determinados padrões de necessidades” ( 2000, p.7).

Ao procurarmos compreender os efeitos de sentido produzidos por uma publicidade, levamos em conta um aspecto que é essencial para a AD, a noção de ideologia, definida por Gregolin

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(1995) como um conjunto de representações que dominam as diferentes classes dentro da sociedade.

Para Althusser (2001, p.85), a ideologia “é a representação imaginária que interpela os sujeitos a tomarem um determinado lugar na sociedade, mas que cria a ilusão de liberdade do sujeito”. Para ele, a ideologia é reproduzida através de aparelhos ideológicos, como por exemplo: o aparelho religioso, o político, o escolar, entre outros, nos quais as classes sociais são organizadas em um todo complexo de atitudes e representações.

A mídia, hoje, funciona como um dos mais fortes aparelhos ideológicos e, entre as diversas formas de textos midiáticos, a publicidade destaca-se como grande disseminadora de valores.

Segundo Monnerat (2003), ao propagar os valores e ideais da classe dominante, a ideologia apresenta-se no discurso publicitário em três dimensões: na construção das relações entre o produtor/anunciante e o público; na construção da imagem do produto; e na construção do consumidor como membro de uma comunidade. A dimensão voltada para o consumidor torna-se a mais relevante para o publicitário, pois é a propaganda que constrói “o tipo ideal de consumidor pelos modelos de comportamentos consumistas divulgados e baseados no senso comum” (op. cit. p. 46).

Nesses termos, quando tentamos compreender os efeitos de sentido produzidos por uma propaganda, devemos considerar o poder ideológico que a permeia, bem como as condições de produção em que ela se realiza.

Para Orlandi (2001), as condições de produção correspondem ao sujeito, à situação e também à memória. Em sentido estrito, referem-se ao momento da enunciação, ou seja, ao contexto imediato; em sentido amplo, abrange o contexto sócio-histórico e ideológico.

A memória refere-se ao interdiscurso, definido por Orlandi (op. cit. p.31) “como aquilo que fala antes, em outro lugar, independentemente.” É através do interdiscurso, ou memória discursiva, que as palavras que dizemos fazem sentido, pois seus significados são oriundos de outros dizeres que se encontram armazenados em nossa memória e que vem à tona com outras palavras a cada enunciado produzido.

Desse modo, constatamos uma ligação entre o que já foi dito e o que se está pronunciando, há, portanto, relação entre o interdiscurso e o intradiscurso. O interdiscurso, como já dissemos, corresponde à constituição do sentido por meio de formulações produzidas e já esquecidas que dão respaldo à nossa fala. O intradiscurso designa o ato da formulação do que dizemos em um certo momento, em determinadas condições.

De fato, o sentido de um texto não existe em si, é, pois, definido pelas posições ideológicas dispostas no processo sócio-histórico no qual as palavras são produzidas.Seguindo o mesmo

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raciocínio teórico, lembramos que em todo texto devemos considerar aquilo que é dito naquele momento, o que já foi dito e esquecido e também aquilo que não foi dito, mas faz sentido. A partir das noções de interdiscurso, de ideologia e de formação discursiva a Análise de Discurso aborda o não-dizer. Estas noções nortearão o desenvolvimento da pesquisa dando-nos respaldo para comprovarmos que “há sempre no dizer um não-dizer necessário”

(Orlandi, 2001, p.82). Segundo a autora (op. cit. p.83), para analisarmos o não-dizer, temos que partir do dizer, de suas condições e da relação com a memória, com o saber discursivo, para então delimitarmos as margens do não-dito que contornam o dito significativamente

2.1. Silêncio e implícito

Segundo Orlandi, (2001, p.82), “o não-dizer tem sido objeto de reflexão de alguns lingüistas”.

Nesse ponto, a autora propõe a distinção entre o implícito, apresentado por O. Ducrot e o silêncio, trabalhado pela Análise do Discurso. Para a autora, o conceito de silêncio envolve

“uma região teoricamente diferente da do implícito” (2002, p. 106).

O implícito é definido como o não-dito que se contrapõe ao dizer, já o silêncio, não é o não- dito que embasa o dizer, mas aquilo que é apagado, colocado de lado, excluído.Orlandi (op.

cit. p. 176) afirma que “compreender o silêncio além da divisão explícito/implícito ou pressuposto/subentendido” nos mostra que a relação como o não-dizer possibilita espaços de recorrência de processos de significação bem mais complexos que não ficam somente em um dizer que precisa ser explicitado.

Ainda para a autora, há não-ditos que devem permanecer não-ditos, ou seja, eles configuram um apagamento do sentido, afastam os sentidos não-desejados, que precisam ser evitados.

Seria uma forma de anti-implícito, não o não-dito necessário para o dito mas, o não-dito obrigatoriamente excluído, apagado.

Dessa forma, como o efeito de sentidos produzido nos discursos instaura uma sobra que é o sentido “literal”, há também um efeito construído pela relação do silêncio com o não-dito, o qual produz como sobra o “implícito”.

Nessa perspectiva, o silêncio remete-se ao caráter de incompletude da da linguagem, assim todo dizer é uma relação fundamental com o não-dizer. Orlandi (2002, p. 13) define o silêncio como a “respiração” (o fôlego) da significação, um lugar de recuo necessário para que se possa significar, para que o sentido faça sentido. O silêncio é classificado em: a) silêncio fundador, aquele que existe nas palavras; b) silenciamento ou política do silêncio, que se divide em b1) silêncio constitutivo, o qual nos revela que uma palavra apaga outras

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palavras; e b2) o silêncio local, corresponde à censura, algo que é proibido dizer em uma dada conjuntura.

Envolvidos por esta concepção do não-dito, abordado como silêncio, é que nos propomos a analisar o funcionamento dos silêncios na produção discursiva das propagandas bancárias, pois como afirma Navarro (2006, p. 71), o trabalho do analista do discurso consiste em compreender outros sentidos que estão à margem do texto, isto é, “escutar” e fazer “falar” a relação entre o dito e o não-dito”.

2.2. A construção de identidades

Seja como pesquisadores, professores ou acadêmicos, não podemos negar que a mídia intervém na constituição dos sujeitos na pós-modernidade. Nesse sentido, os estudos sobre o conceito de identidade e a sua formação ganham especial relevância em nosso trabalho, uma vez que estamos investigando o papel das mídias televisivas e impressas e os seus impactos sobre os ouvintes/leitores diante de possíveis categorias como, por exemplo, a

“personalização” ou a “individualidade”.

Na realidade, como afirma Hall (2006), “a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia”, pelo contrário, com a multiplicação dos sistemas de significação e representação cultural, nos deparamos com uma multiplicidade desconcertante de identidades possíveis, e, muitas vezes, acabamos nos identificando, ainda que temporariamente, com cada uma das identidades apresentadas.

Ainda segundo o autor (2006), “os fluxos culturais”, entre as nações e o consumismo global criam possibilidades de “identidades compartilhadas”, assim temos “consumidores para os mesmos bens, “clientes para os mesmos serviços, “públicos” para as mesmas mensagens e imagens. Nesse ponto, Tasso (2006) afirma que as práticas sociais e discursivas veiculadas na mídia materializam discursos de saber e de poder, ditando aquilo que somos ou que devemos ser.

Diante das considerações feitas até o momento, nos voltamos ao âmago de nosso trabalho e nos deparamos com a afirmação de que a linguagem se constitui para garantir e unificar os sentidos e os sujeitos, ou seja, a identidade construída pela nossa relação com a linguagem nos torna familiares à espécie humana. (ORLANDI, 2002).

3. Propagandas do Banco Real: análise e reflexões

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Nessa análise, constatamos a predominância dos temas: “valorização do jovem universitário”, conferindo oportunidade e credibilidade aos jovens que queiram abrir sua conta corrente como universitário; e “maturidade”, enfocando a figura da mulher e profissional que durante a trajetória de sua vida, chega à maturidade e tem a opção de desenvolver atividades que lhe conferem liberdade.

O corpus, aqui analisado, é composto por duas propagandas sobre o Banco Real, veiculadas na revista Veja, no mês de agosto de 2005. Vale ressaltar que nesta época, o Banco Real estava promovendo o Concurso Banco Real Talentos da Maturidade 7ª edição, portanto, durante o mês de agosto de 2005, as revistas Veja dos dias 03, 17 e 24 de agosto trouxeram a propaganda do Banco Real divulgando este concurso.

No entanto, a revista Veja de 10 de agosto de 2005 apresentou uma propaganda do Banco Real com temática diferente das demais do referido mês, ou seja, não se divulgou o concurso Talentos da Maturidade e o incentivo à participação, e sim, os serviços que o Banco Real oferece aos universitários. Encontramos, portanto, no mesmo mês, uma temática voltada para o apoio às necessidades dos jovens universitários.

3.1. Análise da propaganda 1 ( Veja, 10/08/2005)

Texto:

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Um banco que sabe bem o que o universitário quer para o futuro realmente pode oferecer tudo isto.

1. 800 reais de crédito pré-aprovado*.

2. Real Minicard Visa **.

3. Conta corrente no seu nome.

4. Dicas de viagens inesquecíveis, porque ninguém é de ferro.

Acesse www.bancoreal.com.br/universitário, cadastre-se e pé na estrada.

Real Universitário. Para sempre, um parceirão.

* Os produtos estão condicionados à inexistência de restrições cadastrais.

** Consulte a mensalidade do seu cartão.

Slogan: Fazendo mais que o possível Assinatura:

Considerando as condições de produção do anúncio publicitário e o intradiscurso a ele pertencente, observamos que a propaganda 1 é composta por duas páginas preenchidas pela foto de uma jovem, provavelmente universitária, e pelo texto sobre os serviços ofertados pelo Banco Real.

A valorização dos jovens universitários, de maneira geral, é a temática desse anúncio publicitário. Já na primeira frase do texto “Um banco que sabe bem o que o universitário quer para o futuro realmente pode oferecer tudo isto” observamos o empenho do Banco Real em saber os desejos e preocupações com o futuro que o público universitário revela. Esse empenho é reforçado pelos modalizadores “bem” e “realmente”, os quais produzem um efeito de sentido de veracidade para os serviços ofertados.

Para elencar todos os benefícios que serão ofertados aos futuros clientes, o enunciador faz uso da catáfora, com a construção “... pode oferecer tudo isto.” E na seqüência, apresenta os itens que compõem o “tudo isto”, ou seja, o crédito pré-aprovado, o Real Minicard, a conta corrente no nome do universitário e as dicas de viagens.

Como percebemos, há ênfase nas necessidades que o universitário possui, por meio do destaque conferido a determinadas palavras, com o uso do sublinhado na construção do texto:

“...o que o universitário quer...”; “conta corrente no seu nome”; “dicas de viagens”.

Além disso, o uso do sublinhado no trecho “conta corrente no seu nome” produz um efeito de sentido de valorização do ser humano, reconhecimento de sua existência e maturidade e ao

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mesmo tempo silencia a responsabilidade que o jovem terá ao assumir uma conta corrente em um banco.

O uso dos asteriscos, nos itens ofertados, revela que há informações silenciadas naquele momento, no entanto, na lateral esquerda do anúncio, esses asteriscos são esclarecidos com letras menores, referindo-se às restrições que o futuro cliente pode ter.

Quanto ao interdiscurso que permeia a construção do anúncio, temos o enunciado “...porque ninguém é de ferro.”, retomando um clichê muito utilizado pelos trabalhadores, estudantes, sociedade em geral, quando se referem à quantia de atividades que realizam em seu cotidiano e produz um efeito de solidariedade aos universitários.

No final do texto, o uso dos imperativos “acesse”, “cadastre-se” incentiva a tomada de decisão do universitário em ser um cliente do banco e a expressão “e pé na estrada” produz duplo efeito de sentido, pois pode se referir às dicas de viagens sugeridas pelo Banco e também ao fato de se tornar um cliente em potencial.

O enunciado “Real Universitário. Para sempre, um parceirão” produz os efeitos de durabilidade, de segurança, proteção e proximidade que o banco pode oferecer aos universitários e ao mesmo tempo silencia todas as atribuições que o futuro cliente terá que assumir para contar com o apoio desse banco.

Em termos de silêncios, o slogan “Fazendo mais que o possível” também revela a existência de silêncios necessários à credibilidade do banco, pois nem sempre sabemos o que é realmente possível ou não para que uma agência bancária faça.

Nesse contexto, verificamos que, embora o anúncio publicitário tenha o objetivo de vender os serviços ofertados pelo Banco Real, o publicitário assume uma formação discursiva que silencia a busca de lucros e produz um efeito de sentido voltado para a valorização do ser humano, em suas necessidades e anseios.

3.2. Análise da propaganda 2 (Veja, 17/08/2005)

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Texto:

Maria Helena, 25 anos, professora.

Maria Helena, 64 anos, pintora.

Concurso Banco Real Talentos da Maturidade 7ª edição

Aproveite a liberdade que a maturidade te dá.

Participe ou incentive alguém a participar.

Categorias para quem tem 60 anos ou mais:

 Artes Plásticas * Literatura * Música Vocal

 Contador de Histórias (nova categoria) Categorias para todas as idades:

 Monografia * Programas Exemplares

Acesse www.bancoreal.com.br, passe em uma agência do Banco Real ou ligue para 0800120077.

Slogan:

Fazendo mais que o possível

Assinatura:

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Conforme já comentamos anteriormente, a propaganda 2 faz parte da divulgação do Concurso Banco Real Talentos da Maturidade 7ª edição realizado no mês de agosto de 2005. Assim, as condições de produção que dão suporte para este anúncio estão pautadas na natureza do concurso, ou seja, um concurso realizado para pessoas que tenham 60 anos ou mais e se enquadrem na categorias “Artes Plásticas, Literatura, Música Vocal e Contador de Histórias”

ou para as pessoas de todas as idades que queiram participar nas categorias de monografia e programas exemplares.

Por ser uma instituição bancária que se apresenta como organizadora do concurso, observamos que além dos objetivos financeiros, o Banco Real também está voltado para a valorização do ser humano em diferentes idades, aliás, a temática da valoração humana tem sido uma constante na construção de anúncios bancários de modo geral.

Ao observamos o intradiscurso, ou seja, o modo como o anúncio é construído, verificamos que a propaganda 2, organizada em duas páginas, apresenta a foto de uma senhora de 64 anos, chamada Maria Helena e é pintora. Ela está segurando uma foto sua, da época em que era mais jovem e exercia a profissão de professora. Ao fundo das fotos, temos o cenário de uma sala e um quadro sendo pintado, o que evidencia a sua nova profissão: pintora.

É interessante observamos que a repetição nas estruturas: “Maria Helena, 25 anos, professora/Maria Helena, 64 anos, pintora” evidencia as mudanças ocorridas na vida de Maria Helena, desde a idade até a profissão. Esta mudança também é retratada nas duas fotos, nas quais a foto mais antiga apresenta um rosto com um sorriso mais discreto e na foto mais atual, vemos um rosto mais sorridente.

No enunciado “Aproveite a liberdade que a maturidade te dá”, verificamos o uso do imperativo “Aproveite” produzindo um efeito de aconselhamento para as pessoas que se identificam com a Maria Helena.. Ao mesmo tempo, reconhecemos a existência de silêncios significativos nos termos “liberdade” e “maturidade”, pois podemos compreender que só teremos liberdade quando formos mais maduros. Isto é ideologicamente revelado até pelo peso conferido às profissões “professora” e “pintora” em nossa sociedade, evidenciando que a profissão “professora” não confere tanta “liberdade” como o fato de ser pintora. Assim, os silêncios que perpassam as palavras escolhidas para o anúncio significam que quanto mais jovens somos, mais desempenhamos atividades que nos tiram a liberdade e que só com o alcance de uma idade mais madura poderemos ser mais livres.

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Vale ressaltar o efeito de proximidade, entre o Banco Real e os possíveis participantes, que o anúncio produz por meio da construção corriqueira “te dá” e também pelos imperativos

“acesse”, “passe”, “ligue”, “participe ou incentive”.

Assim como na propaganda 1, voltada para o público universitário, há a busca da valorização do futuro cliente, que ainda é jovem e tem muitos planos para o futuro, na propaganda 2, encontramos a mesma valorização humana voltada para as pessoas com mais idade.

Constatamos, portanto, que a formação discursiva do publicitário tanto está voltada para o bem estar do banco quanto para o bem estar dos possíveis clientes. E para garantir que o anúncio atinja seus objetivos, o enunciador faz uso de recursos lingüísticos e visuais que produzem efeito de argumentação e convencimento, mas também silencia muitas outras palavras que ainda em seu silencio, produzem sentido e nos leva a refletir sobre a veracidade dos fatos anunciados, a formação ideológica de quem os produz e o poder de sedução que está intrínseco no discurso publicitário.

4. Considerações finais

Perante a riqueza da linguagem publicitária, constatamos que nossa pesquisa representa apenas algumas pinceladas sobre a teoria dos silêncios e os demais conceitos fornecidos pela Análise de Discurso, os quais estão sendo a base para novas investigações nessa área, como é o caso do nosso atual projeto de pesquisa isolado, o qual é fruto da pesquisa desenvolvida no curso de Doutorado, cujo título é: “As formas de silêncio no discurso da propaganda bancária”, com ênfase para as propagandas bancárias da década de 70.

Num âmbito geral, consideramos que nossos objetivos foram alcançados, na medida em que refletimos sobre os silenciamentos presentes nos anúncios e constatamos que estes produzem efeitos de sentido que beneficiam a imagem da agência bancária, pois a busca de lucros é silenciada e a valorização do ser humano é o efeito que permanece ao longo do discurso.

Vale destacar que os sentidos produzidos nos silêncios reafirmam o quanto cada ouvinte/leitor é essencial para que a agência bancária se mantenha, pois pelo viés do anúncio, novos clientes são conquistados e isso ocorre pela sintonia que se estabelece entre a identidade dos possíveis enunciatários e os objetivos do banco. Recorrendo ao emocional, ao desejo de ser único e também às nossas fragilidades, o discurso da propaganda bancária se estabelece de maneira convincente, positiva e pertinente ao nosso contexto social, e estes efeitos são atingidos pelo caráter persuasivo que este discurso possui.

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Quanto às condições de produção, observamos que estas são voltadas para valores humanos, envolvendo temas como responsabilidade, maturidade, liberdade e o respeito pela vida de cada ser humano. Estes valores são retomados pelo interdiscurso, no qual nossa memória discursiva é acionada e, por ela, atribuímos sentidos ao discurso bancário como algo necessário e capaz de suprir nossos anseios ou necessidades. Nesses termos, evidenciamos a relevância dos silêncios permeando a elaboração dos anúncios, desde o título até o slogan de cada banco, afinal, ao elegermos certas palavras, descartamos outras e na publicidade, essa escolha é fatal, pois representa a aceitação versus rejeição dos serviços ofertados.

Outro fator de extrema importância refere-se à contribuição dessa pesquisa junto aos professores, acadêmicos e demais pesquisadores, uma vez que as análises realizadas se apresentam como sugestões para o trabalho com a leitura, numa perspectiva discursiva, em sala de aula, e por meio desta, a oralidade, a produção textual e a análise lingüística também pode ser trabalhadas. Acreditamos que esse olhar sobre a leitura, enfocando as condições de produção do discurso, formação ideológica e discursiva e silenciamentos, resulta numa análise substancial não só para o gênero propaganda, mas para os demais gêneros que povoam o universo escolar e social.

5. Referências

ALTHUSSER, L. Aparelhos ideológicos de estado. 8 ed. Rio de Janeiro: Graal Ltda, 2001.

CARVALHO, Nelly de. Publicidade: a linguagem da sedução. 3.ed. São Paulo: Ática, 2001.

GONZALES, Lucilene. Linguagem publicitária: análise e produção. São Paulo: Arte &

Ciência, 2003.

GREGOLIN, Maria do Rosário V. A análise do discurso: conceitos e aplicações. Alfa, São Paulo, n.39, p.15-21, 1995.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 11. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

MONNERAT, Rosane Mauro. A Publicidade pelo Avesso: propaganda e publicidade, ideologias e mitos e a expressão de idéias – o processo de críticas da palavra publicitária.

Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2003.

MEY, Jacob L. Etnia, identidade e língua. Trad. De Maria da Glória Moraes. In: SGNORINI, Inês (org). Língua(gem) e identidade: elementos para uma discussão no campo aplicado.

Campinas, SP: Mercado de Letras, 1998.

MUCCHIELLI, Roger. A Psicologia da Publicidade e da Propaganda. Rio de Janeiro:

Livros Técnicos e Científicos, 1978.

NAVARRO, Pedro. O pesquisador da mídia: entre a “aventura do discurso” e os desafios do dispositivo de interpretação da AD. In: NAVARRO, Pedro (org.). Estudos do texto e do discurso: mapeando conceitos e métodos. São Carlos: Claraluz, 2006.

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ORLANDI. Eni P. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 3 ed. Campinas: Pontes, 2001.

_____. As formas do silêncio: nos movimentos dos sentidos. . 5. ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 2002.

_____. Discurso e leitura. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

_____. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. Campinas: Pontes, 2004.

_____. Discurso e texto: formulação e circulação dos sentidos. 2. ed. Campinas: Pontes, 2005.

TASSO, Ismara Eliane Vidal de Souza. Mídia televisiva e políticas públicas de inclusão na pós-modernidade: igualdade, solidariedade e cidadania. In: NAVARRO, Pedro (org.). Estudos do texto e do discurso: mapeando conceitos e métodos. São Carlos: Claraluz, 2006.

VESTERGAARD, Torben e SCHRODER, Kim. A Linguagem da Propaganda. Trad. João Alves dos Santos. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

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