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DOUTORADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO SÃO PAULO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO/PUC-SP

Cláudia Simone Pereira Sarmento Quadros

Os impactos da vida acadêmica na religiosidade dos universitários da

UNIMONTES nas áreas do conhecimento: Humanas, Exatas,

Tecnológicas, Biológicas e da Saúde

DOUTORADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

SÃO PAULO

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2

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO/PUC-SP

Cláudia Simone Pereira Sarmento Quadros

Os impactos da vida acadêmica na religiosidade dos universitários da

UNIMONTES nas áreas do conhecimento: Humanas, Exatas,

Tecnológicas, Biológicas e da Saúde

DOUTORADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências da Religião sob a orientação do(a) Prof. Dr. João Décio Passos.

SÃO PAULO

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3 Cláudia Simone Pereira Sarmento Quadros

Os impactos da vida acadêmica na religiosidade dos universitários da UNIMONTES nas áreas do conhecimento: Humanas, Exatas, Tecnológicas, Biológicas e da Saúde

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências da Religião sob a orientação do(a) Prof. Dr. João Décio Passos.

Aprovada em: ___ de ________________ de 2015.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________

Prof. Dr. João Décio Passos PUC/SP

Orientador e Presidente

____________________________________________________

____________________________________________________

____________________________________________________

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4 AGRADECIMENTOS

Mais uma etapa cumprida.

E, como tudo na vida, não podemos deixar de agradecer àqueles que foram de grande importância no processo e na conclusão deste trabalho, no qual coloquei todo o meu empenho e dedicação.

Primeiramente, agradeço a Deus pelo dom da vida e a graça de ter participado deste programa de Pós-Graduação e me capacitado para que eu pudesse chegar até o final deste doutorado, mesmo diante de tantas dificuldades vividas neste período. Ele nunca me abandonou, mas manteve-me forte com Sua generosa presença, providência divina e, acima de tudo, com Sua misericórdia.

Meus sinceros e amorosos agradecimentos ao querido e muito amado esposo Waldeir, que esteve comigo nos momentos de inquietações, ansiedade, desânimo, alegrias e sucessos. Agradeço pelo apoio, pela confiança e valorização sempre tão confiante e entusiasta do meu trabalho, sem nenhuma cobrança. E as minhas queridas e muito amadas filhas, Isabella e Renata, fontes de muita inspiração e, principalmente, motivos para vencer os desafios, possibilitando-me testemunhar que tudo é possível pela graça. E, especialmente, à minha mãe, que soube entender a minha ausência nos muitos momentos, desde que ingressei no doutorado, até a conclusão desta tese, com sua vigilante oração e confiança.

Ao meu orientador, João Décio Passos, pelo acolhimento, sabedoria, tranquilidade, confiança e competência com que mediou todo o processo. Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC/SP, por contribuírem com a ampliação dos meus horizontes nessa área, até então nova, e, em especial, ao professor Ênio José da Costa Brito,pelo apoio e atenção. E como não poderia deixar de mencionar, à Andréia, pessoa singular, que com presteza, educação, competência, bondade sempre me atendeu, encurtando as distâncias.

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5 À professora Ângela, pela disponibilidade e perícia nas correções de língua portuguesa, assim como a todos que contribuíram, de uma forma ou outra, para a realização desta pesquisa.

Aos colegas do curso, que tornaram mais prazerosos os momentos dos créditos e, em especial, Marcelo e Vânia, que se tornaram grandes amigos, nestes anos do doutorado e caminhada rumo a esta conquista.

Agradeço, ainda, à minha tia Tilde, grande educadora e incentivadora, que sempre me apoiou e em quem eu sempre me inspirei. Agradeço, também, às minhas primas, em especial a Ilvaita, e ao Sérgio, pela força, torcida e, principalmente, intercessão junto à Nossa Senhora, mãe amada e espelho para a alma.

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6

É eterna, ó Senhor vossa palavra!

De geração em geração vossa verdade permanece como a terra que firmastes.

Porque mandastes, tudo que existe até agora; todas as coisas, ó Senhor vos obedecem!

Vossa palavra, ao revelar-se, me ilumina, ela dá sabedoria aos pequeninos.

Fazei brilhar vosso semblante ao vosso servo, e ensinai-me vossas leis e mandamentos!

Possa eu viver e para sempre vos louvar; e que me ajudem, ó Senhor vossos conselhos!

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7

A todos os professores do programa de Ciências da Religião e, em especial, a Jorge Claudio Ribeiro, pelas inspirações em toda esta pesquisa,

DEDICO

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8 RESUMO

Objetivo: analisar os impactos da vida acadêmica na religiosidade dos universitários da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes, nas áreas de Exatas, Tecnológicas, Humanas, Biológicas e da Saúde. Justificativa: A Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes − é um dos grandes focos catalisadores da educação e cultura montesclarense e não dispõe de nenhum indicador sobre o impacto da universidade na religiosidade dos acadêmicos. Hipóteses: foi significativo questionar os impactos provocados pela entrada dos acadêmicos na universidade, sob a perspectiva das hipóteses: os impactos vivenciados pelos universitários, em decorrência da vida acadêmica secularizada, interferem na religiosidade dos mesmos; a religiosidade do acadêmico de hoje, no locus universitário, apresenta-se individualizada, subjetiva, e não mais ligada aos princípios das instituições religiosas e da família; os impactos da vida universitária na religiosidade dos acadêmicos, por área do conhecimento, acontecem de formas e com intensidades diferentes, considerando-se os três centros acadêmicos. Aspectos teórico-metodológicos: Diante das características da ideia original, a opção foi realizar uma pesquisa qualitativo-quantitativa, numa abordagem de caráter descritivo e exploratório, instrumentalizado por pesquisas bibliográficas e de campo. Na pesquisa bibliográfica, foram priorizados alguns autores, dentre eles: Taylor (2010), Berger (1985; 2001), Hervieu-Léger (2005), Martelli (2002), Ribeiro (2009) e Pierucci (2000). A pesquisa de campo serviu-se de questionário e entrevista coletiva por meio da técnica de grupo focal. O espaço delimitado para a realização do estudo foi a Unimontes. Participaram do estudo 430 acadêmicos matriculados e frequentes em cursos dos Centros de Ciências Exatas e Tecnológicas, Ciências Humanas e Ciências Biológicas e da Saúde. Resultados obtidos: estatisticamente, os dados revelaram que o ingresso na universidade não alterou a pertença religiosa embora tenha alterado a frequência à igreja pelos compromissos assumidos na universidade. Verificou-se a relativização da adesão religiosa, pela possibilidade de livre escolha, bem como das influências exercidas pelo ambiente acadêmico, caracterizado pelo desenvolvimento da ciência, e por um espírito crítico e mais cético.

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9 ABSTRACT

Purpose: To analyze the impacts of academic life in the religiosity of college students at the State University of Montes Claros – Unimontes, in the areas of Exacts, Technology, Humanities, Biology and Health. Rationale: The State University of Montes Claros − Unimontes − is a major catalyst focus of montesclarense education and culture and does not have any indicator on the impact of the university in the students religiosity. Hypotheses: it was meaningful to question the impacts caused by the students admission at the university from the perspective of the following hypotheses: the impacts experienced by students as a result of a secularized academic life interfere with their religiosity; the students religiosity nowadays, at the university locus, seems individual and subjective, no longer tied to the principles of religious and family institutions; the impacts of college life in the students religiosity, by field of knowledge, take place in different ways and intensities, considering the three academic fields. Theoretical and methodological aspects: Given the characteristics of the original idea, the option was to perform a qualitative and quantitative research on a descriptive and exploratory approach with the help of library and field research. With regards to the written sources, we have chosen especially: Taylor (2010), Berger (1985; 2001), Hervieu-Léger (2005), Martelli (2002), Ribeiro (2009) and Pierucci (2000). For the field research we have made use of a questionnaire and a group interview with the technique of focal group. The place within the study was the Unimontes. The study has included 430 registered and frequent students at the courses of the fields of Exact and Technologic Sciences, Humanities, and Biological Sciences and Health.

Results: statistically, the data has revealed that the admission at the university had not changed the religious affiliation but had changed the frequency at the church because of the demands of college life. There has been noticed the relativity of religious affiliation, brought about by the possibility of free choice as well as by the influences exerted by the academic environment which is characterized by the development of science and a critical and skeptical spirit.

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10 LISTA DE SIGLAS

CCBS Centro de Ciências Biológicas e da Saúde CCET Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas CCH Centro de Ciências Humanas

CCSA Centro de Ciências Sociais Aplicadas CEMF Centro do Ensino Médio e Fundamental

CEPT Centro de Educação Profissional e Tecnológica CRE Ciências da Religião

FACEART Faculdade de Educação Artística

FADEC Faculdade de Administração e Finanças FADIR Faculdade de Direito

FAFIL Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras FAMED Faculdade de Medicina

FELP Fundação Educacional Luiz de Paula

FUNM Fundação Norte Mineira de Ensino Superior LSD Least Significant Diference

PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais

SECTES Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior UAB Universidades Abertas do Brasil

UNE União Nacional dos Estudantes

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11 LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Sexo... Gráfico 2: Idade dos Universitários... Gráfico 3: Estado Civil... Gráfico 4: Universitários com filhos... Gráfico 5: Distribuição de alunos por Centros... Gráfico 6: Cursos dos Respondentes... Gráfico 7: Turno dos Respondentes ... Gráfico 8: Cor/Etnia dos Respondentes... Gráfico 9: Renda familiar dos Respondentes... Gráfico 10: Situação de moradia dos Universitários... Gráfico 11: Distribuição percentual dos estudantes considerando a atividade (trabalho/estágio) remunerada... Gráfico 12: Distribuição percentual dos estudantes considerando o tipo de escola que cursou... Gráfico 13: Religião do pai... Gráfico 14: Religião da mãe... Gráfico 15: Grau de escolaridade do pai... Gráfico 16: Grau de escolaridade da mãe... Gráfico 17: Religião atual dos Universitários... Gráfico 18: Distribuição percentual dos universitários que gostam de frequentar outros rituais além dos da sua religião... Gráfico 19: Distribuição percentual dos que frequentam os rituais de sua religião atual... Gráfico 20: Minha religião antes de entrar na universidade era? ... Gráfico 21: Índice percentual de universitários que considera sua religião é que é a verdadeira... Gráfico 22: Cabe a mim definir os rumos da minha vida... Gráfico 23: A concorrência entre as religiões me faz questionar a verdade de algumas delas... Gráfico 24: Aborto... Gráfico 25: Casamento...

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12 Gráfico 26: Homossexualidade...

Gráfico 27: Eutanásia... Gráfico 28: Relações homossexuais... Gráfico 29: Orientações das questões Sexuais de minha igreja... Gráfico 30: Orientações da minha igreja sobre aborto... Gráfico 31: Orientações de minha igreja sobre casamento... Gráfico 32: Orientações da minha igreja sobre homossexualidade... Gráfico 33: As pessoas devem ter só uma religião... Gráfico 34: Questões mais importantes para os universitários... Gráfico 35: A universidade o afastou da sua religião... Gráfico 36: O que mais admiram nas religiões... Gráfico 37: O que mais criticam nas religiões...

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13 SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...

CAPÍTULO I - SECULARIZAÇÃO: permanências e transformações... 1.1 Delimitações e aprofundamentos teóricos... 1.2 Modernidade: ciência e secularização... 1.3 A secularização: raízes históricas... 1.4 A secularização no Brasil: aspectos sócio-históricos e culturais... 1.4.1 Do Brasil Colônia ao Brasil Império... 1.4.2 Do Brasil Império ao Brasil Republicano... 1.4.3 Do Brasil República à contemporaneidade... 1.5 O processo de modernização de Montes Claros: um marco no sertão mineiro...

CAPÍTULO II - UNIVERSIDADE: UM RESGATE HISTÓRICO... 2.1 A instituição universitária ao longo da história: relações com a religião.. 2.2.Ensino Superior no Brasil: colocações sobre a sua trajetória... 2.3 Campo religioso brasileiro e desdobramentos na vida universitária... 2.4 Resgates históricos: a Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES...

2.4.1 Uma retomada crítica...

CAPÍTULO III A SECULARIZAÇÃO FRENTE À RELIGIÃO NAS ÁREAS DE HUMANAS, EXATAS/TECNOLÓGICAS E BIOLÓGICAS/SAÚDE... 3.1 A pesquisa... 3.2 Apresentação e análise dos dados... 3.2.1 Análise quantitativa... 3.2.1.1 Sexo dos Universitários... 3.2.1.2 Idade dos Universitários... 3.2.1.3 Situação conjugal... 3.2.1.4 Universitários com filhos...

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14 3.2.1.5 Centros...

3.2.1.6 Cursos dos Respondentes... 3.2.1.7 Turnos... 3.2.1.8 Cor/Etnia... 3.2.1.9 Renda familiar... 3.2.1.10 Situação atual de Moradia dos Universitários... 3.2.1.11 Atividade remunerada (trabalho ou estágio)... 3.2.1.12 Antecedentes escolares... 3.2.2 A religião do pai... 3.2.3 Religião da mãe... 3.2.4 Grau de escolaridade dos pais... 3.2.5 Religião atual dos Universitários... 3.2.6 Frequência em outros rituais além dos da sua religião... 3.2.7 Frequência aos rituais da religião atual... 3.2.8 Religião antes de entrar na universidade... 3.2.9 Apenas a minha religião é verdadeira... 3.2.10 Cabe a mim definir os rumos da minha vida... 3.2.11 A concorrência entre as religiões por fiéis me faz questionar a verdade de algumas delas...

3.2.12 Religiosidade e comportamento dos universitários... 3.2.12.1 Aborto... 3.2.12.2 Casamento... 3.2.12.3 Homossexualidade... 3.2.12.4 Eutanásia... 3.2.12.5 Relações homossexuais... 3.2.13 Concordância com as orientações da Igreja...

3.2.13.1 Concordo com as orientações de minha Igreja em questões sexuais...

3.2.13.2 Concordo com as orientações da minha Igreja na questão do aborto...

3.2.13.3 Concordo com as orientações de minha igreja na questão do casamento...

3.2.13.4 Concordo com as orientações de minha Igreja na questão da

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15 homossexualidade...

3.2.13.5 As pessoas devem ter só uma religião e seguir suas orientações... 3.2.14 As questões mais importantes para os universitários... 3.2.15 A universidade o afastou da sua religião ... 3.2.16 Aspectos que mais admiram e mais criticam nas religiões... 3.3. Análise qualitativa Grupo focal: com a palavra, os universitários...

3.3.1 Cabe, principalmente, a mim, definir os rumos da minha vida... 3.3.2 Contribuição das orientações religiosas... 3.3.3 As pessoas devem seguir ou não mais de uma religião... 3.3.4 Influência da universidade na religiosidade dos acadêmicos... 3.4 Análise geral dos dados quantitativos e qualitativos...

CONSIDERAÇÕES FINAIS...

REFERÊNCIAS...

ANEXO A – QUESTIONÁRIO... ANEXO B - Tabelas questionário CCBS... ANEXO C - Tabelas questionário CCET... ANEXO D - Tabelas questionário CCH...

130

131 132 134 136 138 139 140 143 144 145

151

155

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16 INTRODUÇÃO

Vivemos sob o paradigma da modernidade, em um mundo individualista, hedonista e secularizado, onde presenciamos mudanças profundas num ritmo veloz e em um tempo, segundo Weber (Cf.1993), marcado por uma intensa perda dos sentidos existenciais e essenciais de tempos passados, em que novas expressões religiosas ganham espaço, enquanto religiões tradicionais perdem força. Mas, o cristianismo continua hegemônico, não só quanto às tendências do campo religioso brasileiro, bem como, em certa medida, no mundo ocidental. Com frequência, a imprensa noticia fatos e histórias, retratando conflitos religiosos, comportamentos de indivíduos, comunidades, grupos e, até mesmo, sociedades inteiras, que, em nome de um credo religioso, propõem-se aos atos dos mais inusitados, enquanto outros, independente das normas oficiais da religião que professam formalmente, conduzem as suas vidas à sua própria maneira e entendimento, com uma religiosidade individualizada, articulada, ou não, com a secularização. Dentro desse contexto social, religião e religiosidade, dois elementos centrais na vida do ser humano, têm sido assuntos frequentes e de impacto na atualidade, alimentando o interesse tanto no âmbito acadêmico, como da sociedade em geral.

A religião, presente na vida do ser humano ao longo de sua história, parte importante da memória cultural e do desenvolvimento histórico de toda humanidade, apresenta-se como um sistema de crenças e práticas em relação ao sagrado, que unem, em uma mesma comunidade, todos que a ela aderem, enquanto a religiosidade pode ser entendida como uma categoria no cerne de toda a sociologia da religião, como postulado por Simmel, ou seja, um fundamento do comportamento do homem religioso que dá sentido a todas as suas ações e emoções (Cf. VANDENBERGHE, 2010). A religiosidade, diferentemente da religião, é uma prática que implica uma visão pessoal, ou seja, cada pessoa expressa a sua prática religiosa a partir de seu entendimento próprio e age conforme aquilo que crê.

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17 necessidades cotidianas, com suas práticas religiosas, normalmente, realizadas no âmbito pessoal ou em comunidades. No entanto, também em relação às instituições ou Igrejas, percebe-se uma grande margem de autonomia. Segundo Simmel (2010, p. 11), “a religião sobreviveu às religiões, tal como uma árvore sobrevive à colheita periódica de seus frutos”e, apesar de haver certo enfraquecimento da vida cristã na sociedade, em decorrência da secularização, a religiosidade e a religião parecem cada vez mais vivas

Assim sendo, e considerando que o homem é um ser religioso e que vivencia sua espiritualidade em tudo o que faz e com todos com quem se relaciona, estudar a religião e a religiosidade abre possibilidades para a compreensão dos grandes conflitos da atualidade e do passado, dando-nos a oportunidade de interrogar padrões construídos historicamente. Por sua vez, conhecer as crenças dos universitários significa olhá-los e refletir sobre a complexidade da sua humanidade nas dimensões social, física, psíquica e religiosa, uma vez que a educação, mesmo na academia, tem como objetivo não só proporcionar aos indivíduos o desenvolvimento de aptidões intelectuais, mas, também, formar o ser espiritual e social. E o entendimento da religião e da religiosidade dos acadêmicos, como autêntica dimensão humana, possibilitará a contemplação desses aspectos no projeto educativo da universidade, pois, acredita-se que o educador, parte importante desse processo, estabelece, na relação com os acadêmicos no decurso da produção do conhecimento, um irrevogável compartilhamento de sua vida e, indiscutivelmente, de sua religiosidade, partilhando, assim, a essência da sua alma.

As universidades públicas acolhem alunos de diferentes crenças, indivíduos, essencialmente, religiosos, ou não, o que justifica a ampla divulgação de eventos, como as festas tradicionais das diversas comunidades religiosas, encontros religiosos para jovens, cursos de religião, grupos de oração, encontros com Cristo e diversos outros eventos de caráter religioso em seus murais e paredes. É comum, ainda, a realização de missas, cultos, celebrações de páscoa e de natal, promovidas por alunos de vários cursos e áreas do conhecimento. Sendo assim, vale compreender os impactos vividos pelos universitários em sua religiosidade a partir da sua relação com a academia, o que se prefigura como objeto desta tese.

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18 pós-graduação, no contato com os alunos, no diálogo sobre o que observam durante os estágios, seminários dos estágios e, mesmo, em seus depoimentos, os quais indicam ser a religião algo que perpassa suas vidas constantemente, mesmo que não vinculados a alguma religião, pois, suas convicções encontram-se estruturadas por meio de preceitos ligados a atos religiosos, demonstrando a importância da dimensão das crenças pessoais. Dessa forma, na valorização da religiosidade dos acadêmicos, que esta pesquisa possibilite o reconhecimento da liberdade religiosa, aspecto legal e moral subjacente à secularização.

Antes mesmo de adentrarmos nas questões relativas ao desenvolvimento da pesquisa, é preciso apresentar o cenário sociocultural e histórico onde se estabeleceu a UNIMONTES, a Universidade Estadual radicada em Montes Claros, que há 158 anos foi cravada no sertão de Minas Gerais, como um esteio, que, ainda nos dias atuais, converge para si não só habitantes do norte mineiro, mas, até do sul da Bahia, em busca de melhores condições de saúde e, principalmente, de educação.

Montes Claros, que nasceu, ainda, no período imperial brasileiro, teve significativos avanços com o investimento da Igreja Católica, após a Proclamação da República, para conquistar o povo do interior, trazendo-os para o verdadeiro catolicismo, na tentativa de alargar os vínculos destes com a Igreja, em substituição ao vínculo que esta possuía com o Estado, antes de 1889. E foi nesse cenário que o montesclarence fundamentou suas tradições e valores, tendo como princípio o legado católico, que propiciou alicerçar a sociedade, com a instauração da diocese, favorecendo, diretamente, o desenvolvimento da região. Assim, a narrativa identitária desse povo, bem como o processo de urbanização e desenvolvimento de Montes Claros, constroem-se sob a influência da hegemonia católica, que continua a influenciar essa sociedade, política e culturalmente, mesmo com o estabelecimento da modernização e secularização no Brasil.

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19 das humanas – a primeira, como um encaminhamento mais humanístico do conhecimento e dos sujeitos, a área das exatas, cujo tratamento do conhecimento é de natureza mais lógico e racional e, por último, a biológica e da saúde, responsáveis pela formação da graduação na área da saúde e pelos cursos de graduação em Ciências Biológicas, bacharelado e licenciatura.

Para melhor entendermos este trabalho de pesquisa, faz-se necessário compreendermos o perfil dos universitários da UNIMONTES sujeitos desta pesquisa e, nessa perspectiva, vermos abrir-se um grande leque de possibilidades, pois, ao se considerar o acadêmico, percebe-se que ele já traz consigo certa bagagem de referências de cultura-mundo hipermediada (Cf. LIPOVETSKY; SERROY, 2010), a qual lhe permite se reconfigurar a todo momento, com novas demarcações e valores, o que, no entanto, dificulta selecionarmos aqui as características para delimitação de modelos. Mas, tomando como base os dados referentes aos pais, percebe-se que menos de um quarto deles possui curso superior e mais de 50% têm renda de um a dois salários mínimos, o que os caracterizam como baixo capital cultural. Ou seja, a maioria dos universitários constitui-se da primeira geração com acesso ao ensino superior e de egressos de escolas públicas, realidade esta que se acentua para os alunos do Centro de Ciências Humanas, em relação aos outros centros pesquisados.

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20 A segunda hipótese propôs que a religiosidade do acadêmico de hoje, no locus universitário, apresentava-se individualizada, subjetiva e não mais ligada aos princípios das instituições religiosas e da família, o que se verificou com expressividade, pois os acadêmicos se consideram independentes e definidores dos rumos de suas vidas, sem, no entanto, deixarem de reconhecer a família como quesito mais importante para eles. A terceira hipótese considerava que os impactos da vida universitária na religiosidade dos acadêmicos, por área do conhecimento, aconteciam de formas e com intensidades diferentes, considerando-se os três centros acadêmicos.

Quanto à abordagem metodológica, propôs-se para este trabalho uma pesquisa quantitativo-qualitativa, ou seja, uma articulação lógica desses fatores com os pressupostos sóciohistóricos e culturais, no próprio contexto de realização da pesquisa. Levando-se em consideração o objeto de pesquisa, foi necessário um construto teórico e um trabalho de campo, onde foram coletados os dados, através de um questionário com perguntas fechadas, numa adaptação do utilizado por Jorge Claudio Ribeiro (2009), autorizado pelo mesmo e publicado pela Editora Loyola: Olho d’Água, pesquisador este que a muito se dedica aos estudos da religiosidade dos jovens universitários.

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21 religiosidade.

Vale aqui esclarecer que para cada categoria elencada utilizou-se das contribuições teóricas dos seguintes autores:

 No quesito “cabe a quem definir os rumos da minha vida”, utilizou-se dos conceitos de Ribeiro (Cf. 2009), que defende que o jovem universitário requisite sobre si responsabilidade e maior autonomia, e, ainda, Hervieu-Léger (Cf. 2005), que coloca a influência do processo de individualização como pano de fundo para o entendimento da vida na modernidade;

 Quanto à questão “como veem as orientações religiosas relativas aos diversos temas apresentados”, as respostas foram analisadas segundo Hervieu-Léger (Cf. 2005), pois a autora defende que as crenças conformam-se, cada vez menos, com os modelos estabelecidos;

 Já a questão “como deve ser a adesão religiosa” foi entendida segundo o olhar de Vandenberghe (Cf. 2010) sobre as teorias de Simmel, o qual postula que a religião não mais estrutura o conjunto da sociedade, e, ainda, segundo Hervieu-Léger (Cf. 2005), que defende o caráter múltiplo da recomposição das crenças na modernidade;

 E para entender se os universitários reconhecem a influência da universidade em sua religiosidade, elegeu-se, prioritariamente, Simmel (Cf. 2008), o qual entende a religiosidade como uma qualidade da alma humana, portanto, a religiosidade como uma forma de agir e de ser do homem, e, também, Ribeiro (Cf. 2009), para quem a religiosidade, além de humana, é histórica e culturalmente determinada.

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22 Entendeu-se, portanto, que a revolução científica foi fundamental, tornando-se um importante caminho para a consolidação da modernidade, atrelada ao processo de secularização no mundo ocidental, indiscutivelmente rumo ao futuro e redimensionando, assim, o lugar ocupado pela religião na sociedade contemporânea, a qual deixa de ser referência para as relações sociais, com a valorização, em contrapartida, do pensamento livre, embasado em explicações lógico-racionais, que remodelaram a sociedade. A religiosidade, no entanto, viu-se locada num universo globalizado e plural, em meio a uma diversidade de sistemas e signos de crenças. E mais, uma religiosidade que, além de perder espaço na vida moderna, segundo Hervieu-Léger (Cf. 2005), vê-se individualizada, caracterizada pela bricolagem e, por vezes, difusa e eclética. Nesse cenário, a secularização vem possibilitando a quebra da hegemonia da Igreja Católica,que segundo Weber, perde o papel de referência única na vida das pessoas e reduz a função do clero no Estado laico.

No segundo capítulo, buscou-se realizar um resgate histórico da universidade, explorando a trajetória do ensino superior no Brasil, o campo religioso brasileiro e os consequentes desdobramentos na vida acadêmica, buscando elucidar como surgiu a UNIMONTES e como esta se constituiu em marco de desenvolvimento para toda a região norte mineira.

No terceiro capítulo, são apresentados os resultados da pesquisa empírica, desenvolvida com 430 universitários das diversas áreas do conhecimento (humanas, exatas, biológicas e da saúde), e fundamentados na articulação lógica dos dados quantitativos e qualitativos fornecidos, respectivamente, a partir do questionário e do grupo focal, servindo os mesmos como base para a análise, discussão e compreensão dos impactos provocados pela vida acadêmica na religiosidade dos universitários, a partir de aspectos subjetivos às suas vidas e em relação às condutas sugeridas pelas Igrejas às quais pertencem.

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(24)

24 CAPÍTULO I - SECULARIZAÇÃO: permanências e transformações

A história que aconteceu na secularização do cristianismo ocidental é tão ampla e tão multifacetada que se poderia escrever diversos livros do tamanho deste e ainda não fazer justiça a ela.Isto é ainda mais verdadeiro na medida em que minha área escolhida, a cristandade latina, não é homogênea (TAYLOR, 2010, p 45,47).

Consideramos imprescindível fazermos uma abordagem sobre a secularização e, assim, pretendemos, neste capítulo, retomar as principais linhas teóricas sobre o tema, trazendo à tona as principais teses dos autores que consideramos mais importantes no que diz respeito às teorias da secularização no mundo e no Brasil, pois a secularização é um termo que tem sido tema de debate e discussões, especialmente na sociologia da religião, e aplicado em diferentes sentidos. Em alguns momentos, tem sido tomado como teoria, em outros, como tese, às vezes, no sentido jurídico-político, outras, no sentido filosófico-ideológico.

Como não poderia deixar de ser, a universidade hoje se encontra como parte desse processo. Faz-se necessário, então, a compreensão da secularização como processo sócio histórico e, nessa perspectiva, lançarmos mão do contexto em que ela se faz presente, a modernidade. Ao abordarmos a modernidade, nossa intenção é compreender como esse processo impactou, e continua a impactar, o âmbito religioso.

1.1 Delimitações e aprofundamentos teóricos

(25)

25 reconstituição diacrônica sobre a secularização, entendendo-a como coadjuvante no processo de modernização do mundo ocidental.

Partiu-se, então, da compreensão sobre a modernidade, principalmente sobre modernidade e religião, que segundo Campos e Gusmão (2010, p.74), “em termos contemporâneos, seja qual for o formato assumido – moderno ou pós-moderno, para não citarmos outros – o fenômeno religioso detém o espírito e a alma do indivíduo no seu centro gravitacional”, adotando-se a modernidade como pano de fundo dessas construções. E se faz necessário entender a modernidade no delinear da construção da ciência, ou seja, o encaminhar do processo da racionalização humana. Sendo assim, primeiramente, buscou-a no conceito de Gilddens (Cf. 1991), que a entende, de maneira bem geral, como um estilo de vida ou uma forma de organização social, que surgiu na Europa a partir do século XVII e influenciou todo o mundo ocidental. Segundo Passos (2006, pp. 123-124),

A racionalidade moderna triunfou com suas estratégias e modelos teóricos e técnicos de maneira progressiva, contraditória e localizada. Não constituiu um movimento progressivo linear nem homogêneo. [...] Do ponto de vista cultural, convieram nas diversas localidades atingidas pela modernização, culturas diferenciadas, ora com significados e práticas paralelos àqueles modernos, ora configurando territórios culturais híbridos.

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26 momentos para cada país, permitindo, assim, que a realidade descrita por ela seja também pertinente ao Brasil.

Entendido assim o conceito de modernidade e o processo de racionalização do mundo, buscou-se estruturar o conceito de secularização, optando-se por partir dos escritos de Berger (1985), que conceitua a secularização como “o processo pelo qual setores da sociedade e da cultura são subtraídos à dominação das instituições e símbolos religiosos” (BERGER, 1985, p.119). Em sua obra, O Dossel Sagrado, Berger descreve o fenômeno religioso, remontando às suas origens históricas e suas consequências. Para o autor, a secularização foi, efetivamente, a retirada do “dossel sagrado”, representado pelo catolicismo e sua hegemonia. Ainda segundo ele, o termo “secularização” atua em dois níveis, o subjetivo, que se refere à consciência no âmbito individual, e no nível da sociedade e da cultura, o chamado pluralismo religioso, um correlato sócio estrutural de secularização da consciência, o qual leva à individualização, ou seja, possibilita a predominância da religiosidade na esfera privada, na vida cotidiana. E assim, esta religiosidade “limita-se a domínios específicos da vida social, que podem ser efetivamente segregados dos setores sacralizados da sociedade moderna” (BERGER, 1985, p. 145).

A obra de Berger (Cf 1985) também contribui, efetivamente, com o entendimento que o cristianismo serviu ao processo de secularização quanto à especialização institucional da religião. E mais além, o autor vai propor o caminho inverso da secularização, o da dessecularização, onde defende a presença das práticas religiosas na vida das pessoas, pois “o impulso religioso, a busca de um sentido que transcenda o espaço limitado da existência empírica neste mundo, tem sido uma característica perene da humanidade” (BERGER, 2001, p. 19). Sendo assim, abrimos um parêntese para explicar que esse impulso religioso é claramente percebido na universidade, na sua subjetivação, na busca individual da religião, mas, presente, também, nos novos movimentos religiosos, que consideram esse espaço um dos mais secularizados e racionalizados. Ele ainda afirma a existência de três fatores imprescindíveis à secularização: a individualização da religião, que gera o segundo fator o pluralismo religioso, e o terceiro, no qual as tradições religiosas disputam as submissões de suas populações numa situação de mercado. Mas, vale esclarecer, nesta tese, só se analisará os alcances dos dois primeiros fatores.

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27 perda de influência dos maiores sistemas religiosos, seguida por uma reconstituição da religiosidade, sob nova modalidade. E nisso, estabelece-se um verdadeiro paradoxo – se a modernidade propicia, por um lado, essa desqualificação da religião, por outro, ela favorece a expansão de novas crenças. Nesse momento, resgata-se outro importante filósofo, Charles Taylor (Cf. 2010), a fim de relacioná-lo a essas construções de Hervieu-Léger (Cf. 2005), quanto à ampliação da fragilização das crenças, pois, para eles, as sociedades modernas são inerentes à secularização, notoriamente ligadas à idéia da privação social e cultural da religião.

Outra colaboração de Hervieu-Léger é a “bricolagem”, que se apresenta como uma maneira de individualização da crença, uma nova forma de crer, onde há liberdade na dinâmica de construção dos sistemas de fé, de acordo com o que faz sentido para o indivíduo. Segundo a autora (2005, p. 56), “as crenças se disseminam. Conformam-se cada vez menos aos modelos estabelecidos. Comandam cada vez menos as práticas controladas pelas instituições”. Nesse momento, os crentes se veem desobrigados a não pertencerem a nenhuma instituição particular, pois, nesse contexto, cada um busca encontrar o próprio sentido para sua crença.

Quanto ao termo “religiosidade”, optou-se por Georg Simmel, para quem ela é uma qualidade intrínseca à alma humana. Segundo ele,

A religiosidade, enquanto qualidade íntima de vida ou modo incomparável de existência, adquire substância ao perambular pela diversidade material do mundo e assim se encontra face a face consigo mesma: de um lado está o mundo da religião e, de outro, o sujeito da religião (SIMMEL, 2006, p. 28).

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28 os circunda – no caso, a universidade é uma prática que possibilita jogar mais luz nesse contexto, o qual oferece subsídios para maiores análises a fim de se traçar um panorama mais amplo.

1.2 Modernidade: ciência e secularização

“A ciência é um fenômeno social tão antigo e vem enfrentando tantas transformações ao longo de sua história que qualquer tentativa de construir um conceito universal em torno desta atividade seria, no mínimo, incompleta” (GERMANO, 2011, p. 4). Esta é a mesma opinião de Pombo (Cf. 2003), que afirma ser tão profundo o alargamento do conceito de ciência que, muitas vezes, torna-se difícil estabelecer a fronteira entre a ciência e a política, a ciência e a economia, a ciência e a vida das comunidades humanas, a ciência e a arte e assim por diante. Sendo assim, em vez de conceituarmos a ciência, iniciamos este tópico relacionando alguns aspectos da mesma sob o paradigma da modernidade, tomando, para isso, as ideias e contribuições de alguns autores para um melhor entendimento da mentalidade moderna, que segundo Najmanovich (2001, p. 11), “compreende uma rede complexa de idéias, conceitos, perspectivas intelectuais, estilos cognitivos e atitudes valorativas que caracterizam uma época ampla”.

De acordo com Chassot (Cf. 2004), o conceito de ciência moderna começou a se firmar no século XVI, através de uma releitura do mundo natural, que rompeu com paradigmas até então tidos como imutáveis e que trouxe rupturas com o senso comum e com o fundamentalismo religioso. Aranha (Cf. 2005) faz alusão às ciências da natureza como uma forma de conhecimento relativamente recente, que surgiu, no início do século XVII, quando Galileu estabeleceu os novos métodos de investigação da física e da astronomia, inaugurando a ciência moderna. Se na Antiguidade e na Idade Média o saber estava voltado para a compreensão desinteressada da realidade, na Idade Moderna, buscou-se o saber ativo, o conhecimento capaz de atuar sobre o mundo para transformá-lo. Posteriormente, outras ciências aprimoraram seus métodos, com enorme repercussão sobre a tecnologia, de maneira que o novo saber ampliou a capacidade humana de agir sobre a natureza e transformá-la.

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29 e, ao mesmo tempo, entrelaçados e imbricados no seio do processo histórico, os quais mudaram a história do homem sobre o planeta, pois o homem de ciência caminhou e evoluiu para construir. E, sendo um ser dotado de razão, vê-se sempre obrigado a utilizar esse poderoso instrumento para definir, justificar e levar adiante seus objetivos, ressignificando sua vida e, consequentemente, o ambiente em que vive. E é notório que a ciência tem influenciado tanto o ser humano como a sociedade, muito mais do que a religião, nos últimos séculos.

No entanto, convém esclarecer que nem sempre foi assim. Ao se retroceder um pouco na história, é possível comprovar que a história da ciência em si é muito curta visto que a história escrita e documentada do conhecimento pode-se retomar desde os longínquos e remotos séculos da Antiguidade Clássica, mas, a ciência em si, aquilo que denominamos como tal, data somente do século XVII, momento em que nasce com a revolução galileana. É claro que os homens a adquiriam e acumulavam observações e conhecimentos sobre o mundo, porém, não possuíam as técnicas indispensáveis à sua coordenação racional e à sua reelaboração progressivamente. Podemos dizer, então, que a filosofia, naqueles tempos, englobava o que denominamos ciência, e, a partir do século XII, engaja-se em um movimento de independência para afirmar-se com os seus métodos próprios. Vale aqui ressaltar que esse século é marcado, também, pelo surgimento das primeiras universidades.

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30 sistemático, preciso e com maior objetividade. Chassot (Cf. 2004) complementa que a perspectiva histórica sobre o desenvolvimento da ciência moderna mostra que o paradigma científico moderno ofereceu uma nova visão de mundo, opondo-se à visão Aristotélica.

Ainda segundo Chassot (Cf. 2004), a ciência moderna como se entende hoje um conjunto de conhecimentos com características e métodos próprios de abordagem cunhada através de nomes como Galileu, Bacon, Kepler, Copérnico, Newton e Descartes, somente pode ser chamada de moderna porque a partir do momento em que houve a descoberta das ferramentas como prolongamento da mão, facilitadores do trabalho, é que surgiu o que se pode chamar de ciência: capaz de explicar os fenômenos de maneira mais rigorosa, de fazer previsões capazes de transformar o mundo, o que, por consequência, minimizou a importância dos demais modos de compreensão da realidade, tais como, o mito, a religião e o bom senso da vida cotidiana. Dib-Ferreira (2010, pp. 95-110), por sua vez, fala da revolução científica para afirmar que somente

[...] após a “revolução científica”, quando a ciência moderna foi fundamentada pela primeira vez, por volta de século XVII, a ciência passou a ter um método, uma forma única de construir conhecimento e produzir as “verdades científicas", que só seriam aceitas como verdades se pudessem ser provadas e comprovadas por qualquer pesquisador, por meio daquilo que hoje conhecemos como método científico.

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31 observa Japiassu,

Daí por diante, não é mais a religião, a filosofia e os mitos que determinam nossa visão do mundo. Nossa visão de mundo passa a ser determinada pela ciência. Ocorre a substituição da verdade dos dogmas religiosos pela verdade dos dogmas da ciência (JAPIASSU, 1996, p. 10).

A revolução científica teve uma relevância significativa no que viria a se tornar a Europa moderna e o mundo colonial por ela instituído através das técnicas desenvolvidas a partir dessa revolução. E, vale ressaltar aqui, que não só no campo empírico, pois “A revolução científica de 1500-1600 afetou todos os campos da ciência como propôs novas técnicas de investigação científicas, bem como quanto aos objetos que o cientista estabelecia para si mesmo” (RONAN, 1997, p. 08), relevando o papel que a ciência poderia desempenhar na filosofia e até na própria sociedade. Uma mudança tão profunda que estabeleceu uma transformação radical do modo pelo qual o homem via o mundo que o circundava, ocasionando, paulatinamente, um novo contexto social, político e cultural, o que possibilitou o nascer da ciência crítica, moderna, quantitativa e racionalista.

Para um melhor entendimento da modernidade, faz-se necessário contextualizar o termo que, ao longo dos tempos, passou por diversas significações. Historicamente, a modernidade é definida por Reale e Antiseri (Cf. 1999) como o fenômeno da civilização moderna ocidental, registrado a partir das transformações culturais ocorridas nos fins da Idade Média e que ficou conhecido como Renascimento. De acordo com Evangelista (Cf. 2007), no Renascimento, movimento este iniciado pela nobreza italiana e patrocinado pela burguesia mercantil e urbana local, o que era considerado moderno o foi em contraposição àquilo que era antigo, tendo um sentido de respeito aos gigantes da Antiguidade, sobre cujos ombros os modernos se colocavam. No século XVII, o moderno passou a ser visto como o novo, contraposto ao antiquado. A concepção de modernidade como projeto civilizatório só foi desenvolvida por influência do Iluminismo, a partir do século XVIII. Dessa fase em diante, o moderno tomou o sentido de “época mais recente”, ou seja, o nosso tempo, o presente que se abre ao futuro (Cf. EVANGELISTA, 2007).

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32 sentido, conforme descrição de Giddens (Cf. 1991), uma das principais características iniciais da modernidade foi, sem dúvida, a mudança. Assim,

Os modos de vida produzidos pela modernidade nos desvencilharam de todos os tipos tradicionais de ordem social, de uma maneira que não têm precedentes. Tanto em sua extensionalidade quanto em sua intensionalidade, as transformações envolvidas na modernidade são mais profundas que a maioria dos tipos de mudança característicos dos períodos precedentes (GIDDENS, 1991, p. 14).

Para Burckhardt (Cf. 1996), uma característica do período é a descoberta do indivíduo por ele mesmo, contrariando o que acontecia na Idade Média, onde o homem somente se via como membro de conjuntos e apreendia informações sobre o universo que o cercava através das lentes da religião. O Renascimento pode ser considerado como um marco do início da Idade Moderna, uma vez que reflete o desenvolvimento de uma nova vida e de uma nova mentalidade, vinculadas à ascensão da cidade e da burguesia e inovando, consideravelmente, a vida intelectual da elite artística e filosófica.

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33 Burckhardt (Cf. 1996) observa que a sociedade europeia, no período da passagem da era medieval para a modernidade, passou por um estado de forte angústia coletiva, resultante de uma série de acontecimentos trágicos e de uma postura de afastamento da Igreja Católica dos fiéis, que precisaram de novos suportes para seus medos e receios. Essa resposta deu-se, inicialmente, com o Humanismo, movimento filosófico que surgiu na Itália entre os séculos XIV e XVI, que logo se espalhou por grande parte da Europa. Liderado por intelectuais que, buscando imitar Jesus, aspiravam a uma religião mais simples, sem tantos dogmas, o Humanismo é considerado como origem de todo pensamento moderno.

Como nas universidades medievais os estudos estavam voltados apenas para três carreiras o direito, a medicina e a teologia o humanismo, criticando a cultura tradicional, surgiu com o objetivo de atualizar a forma como essas instituições ministravam os estudos. Os humanistas se dedicaram aos estudos humanísticos, que incluíam a poesia, a filosofia, a história, a matemática e a eloquência, sendo esta última uma fusão entre a retórica e a filosofia (Cf. SKINNER, 1996). Colocando o homem como o centro das coisas, os estudiosos da época passaram a reaver uma concepção de mundo baseada no homem. As ideias humanistas se expandiram. O pensamento humanista ganhou expressão a partir de estudiosos europeus, oriundos da França, Inglaterra e Alemanha, que, depois de estudar nas universidades da Itália, voltavam aos seus países onde passaram a lecionar, provocando o “desencadeamento de uma revolução intelectual que acabaria levando à derrubada da escolástica” (SKINNER, 1996, p. 217).

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34 consequentemente, nesses locais, a ciência teve destacado papel, principalmente, nas áreas de matemática e astronomia (Cf. KRISTELLER, 1982).

Kumar (Cf. 1996) ressalta que o desenvolvimento da humanidade e o futuro próspero da modernidade implicavam seguir em frente, numa ruptura em relação às épocas históricas anteriores e pouco respeito pelo seu próprio passado, ainda que este fosse significativo como referência para o necessário contraste dos tempos. Tal ruptura ganhou corpo com a Revolução Científica do século XVII, que impulsionou as ciências naturais para um patamar até então inédito, com Galileu, Kepler e Newton, entre outros pensadores, que, nas áreas da matemática, física e astronomia, promoveram amplos avanços e contribuíram para estabelecer a concepção moderna de ciência.

Nesse contexto, a crença de que apenas a ciência levaria os homens a um mundo melhor foi acompanhada por uma série de críticas ao cristianismo e, em especial, à Igreja Católica e ao clero. O método racional foi aplicado até mesmo na religião, e, na busca por uma religião natural, no sentido de racional, surgiu o deísmo que, embora ainda não tivesse se tornado um movimento organizado, conflitou com o cristianismo por dois séculos. Para os deístas, bastavam algumas verdades religiosas, sentidas como manifestação a todo ser racional: a existência de um Deus único, de um sistema de recompensas e punições distribuídas por aquele Deus e a obrigação dos homens à virtude e à piedade. Outros produtos da aplicação da razão à religião foram o ceticismo, o ateísmo e o materialismo.

Com o desenvolvimento da burguesia urbana levada a interpretar a história e a existência humana muito mais como o produto do mérito ou demérito da pessoa e não tanto como efeito da riqueza ou do destino, a religiosidade reveste-se de um caráter intensamente pessoal muitas vezes considerado parte integrante da essência de qualquer experiência religiosa (BOURDIEU, 2007, p. 49).

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35 mais usado a serviço dos propósitos práticos: a ciência tornou-se um valor em si mesma. Ela escolhe seus objetos por si mesma, modela-os com base nas suas necessidades internas e nada questiona para além de sua própria realização” (SIMMEL, 2006, p. 61). Portanto, as luzes possibilitaram a instauração da onipotência da razão crítica, num sistema de valores feito de tensões e rivalidades suscetíveis de reconfigurar o discurso e a prática das ciências.

A crescente valorização da capacidade de pensamento livre fez com que muitas explicações do mundo humano e social, que na era medieval estavam fundamentadas somente no divino ou no sobrenatural, fossem abandonadas e substituídas por explicações lógico-racionais e científicas. Todo esse contexto propicia o surgimento e o crescente desenvolvimento da secularização, no campo político e, principalmente, no campo sociocultural, onde se percebe a migração da manifestação religiosa para fora do espaço público, o que, segundo Taylor (Cf. 2010), podemos chamar de “humanismo exclusivo”, o qual restringe nosso horizonte existencial à dimensão humana.

Segundo colocações de Hervieu-Léger (Cf. 2005), o fenômeno da secularização redimensionou o lugar da religião no mundo contemporâneo, fazendo com que ela perdesse o status de matriz significante das relações sociais ao dividir a produção de significados com outras instâncias, dentre as quais se destaca a ciência. Porém, nem toda a história das ciências nos mostra que a ciência moderna é inimiga da religião, porque também pretende compreender o mundo. E este mundo é o mesmo para o sábio e o crente (JAPIASSU, 2005, p. 120). O problema começa além dessa coexistência: na pretensão da religião de conhecer no lugar das ciências, portanto, a fé se transforma em dogma. A religião se converte em obstáculo para o espírito crítico, para o avanço das ciências e o processo de libertação humana.

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36 Apesar de Einstein ter considerado que “a ciência sem religião é aleijada; a religião sem ciência é cega”1 (JAPIASSU, 2005, p. 174), acredita-se que, com a

consolidação da ciência no século XIX, a mesma enfraqueceu o pensamento religioso coletivo, abrindo caminho para o cientificismo, crença segundo a qual a ciência pode tudo explicar e que essa foi, e ainda é, a mais poderosa e profunda forma de conhecimento, jamais impressa pelo homem até então, apresentando-se como o emblema da libertação do espírito e do modo de ver as coisas fora de todo preconceito, de todo dogma e de toda superstição.

Nesse contexto, o lugar que o universo religioso ocupava nas sociedades tradicionais foi, e vem sendo, remodelado pela modernidade, período marcado pela subjetividade e individualismo, pela autonomia e autodeterminação em um contexto de pluralidade, em que os costumes, desvinculando-se do autoritarismo religioso tradicional, ameaçam o controle sobre os sentidos e bens simbólicos produzidos no interior das instituições religiosas (Cf. STEIL, 2001; HERVIEU-LÉGER, 2005).

Hervieu-Léger (Cf. 2005) faz alusão à modernidade religiosa para caracterizar a questão da identidade no mundo contemporâneo, marcado pela “crise da transmissão regular de instituições e dos valores de uma geração a outra”, resultando em indivíduos com liberdade para livre escolha no campo religioso e sem se filiarem a uma determinada instituição religiosa. Enfim, numa sociedade amnésica, imediatista, que não valoriza a memória coletiva, os indivíduos, caracterizados como peregrinos, ou seja, que se encarregam de “ajustar as suas crenças aos dados de sua própria existência”, vivem uma religiosidade também peregrina (HERVIEUR-LÉGER, 2005, p. 100).

Conforme interpretação de Giddens (Cf. 1990), apesar de existir, na modernidade, uma tendência ao enfraquecimento ou perda dos laços comunitários e afetivos, registra-se, no entanto, a oportunidade de construção da religiosidade num universo globalizado e plural, que estabelece, através de um individualismo religioso, relações de partilha, reciprocidade e participação na diversidade de sistemas e signos de crença. Na abordagem de Chaves (2011, p. 129):

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37 A religião passa a ser de foro íntimo, fruto da construção identitária subjetiva e autônoma, que não precisa mais prestar contas a uma tradição ou instituição. Mas mesmo dentro das tradições ‒ para quem adere de forma singular a uma tradição e a ela se vincula ‒ a pluralidade se faz presente também na lógica do subjetivo, da eficácia simbólica e segmentária, numa autonomia das experiências e de referências religiosas onde o indivíduo ou grupo busca reconduzir a tradição a uma visão particular e fragmentada de mundo a partir de ressignificações da semântica desta.

E Hervieu-Léger (Cf. 2005), para quem a “bricolagem”, ou seja, uma religiosidade ajustada conforme as conveniências individuais, é uma das características relevantes da religião na modernidade, afirma:

A descrição desta modernidade religiosa organiza-se a partir de uma característica maior, que é a tendência geral à individualização e subjetivização das crenças religiosas. Todos os inquéritos confirmam que este duplo movimento trabalha simultaneamente as formas da experiência, da expressão e sociabilidade religiosas. [...] Mas o aspecto mais decisivo desta ‘desregulação’ aparece sobre tudo na liberdade que os indivíduos se concedem de ‘recompor’ o seu próprio sistema crente fora de qualquer referência a um corpo de crenças institucionalmente válido. Este duplo fenômeno surge de maneira particularmente legível nos países que se supõe serem os mais secularizados da Europa, a saber, os países escandinavos (HERVIEU-LÉGER, 2005, pp. 47-48).

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38 sempre mais, conhecer sempre mais, comunicar sempre mais e sempre mais depressa” (HERVIUE-LÉGER, 2005, p. 44).

Hervieu-Léger (Cf. 2005) entende a secularização como uma perda de influência dos maiores sistemas religiosos, acompanhada por uma religiosidade sob uma nova modalidade, pois a religião na modernidade está mais difusa e eclética, e as pessoas, de forma individualizada, experimentam fontes de fé diversas, sem se comprometerem com nenhuma religião especifica. E é nesse cenário que a modernidade produz a secularização, a busca incessante pelo novo, onde o conhecimento deixa, contudo, espaços vazios a serem ocupados pelas crenças. Esse é o grande paradoxo da modernidade: de um lado, a desqualificação dos sistemas religiosos totalizantes e, de outro, a criação de um campo fértil para a expansão das crenças.

Nesse campo de formação de novas crenças é que se encontram as novas comunidades religiosas, uma nova demanda das peregrinações, o aumento das vendas de livros de inspiração esotérica, uma nova maneira de construir o sentimento de pertença de uma identidade coletiva. Então, não podemos entender que existe uma indiferença em relação às crenças, porém, o que acontece é que as crenças não estão mais sob o poder das grandes instituições e, com isso, vê-se uma tendência generalizada à individualização e a subjetivização das mesmas, fundamentadas numa ampla liberdade de escolha. E, como consequência, surge a “bricolagem” das crenças, caracterizada por uma flexibilização destas e por uma associação entre temas de diferentes religiões, enfraquecendo os dispositivos de enquadramento institucional.

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39 incidem nas diversas áreas da atividade humana, fazendo com que a sociedade moderna passe por profundas transformações, e essas transformações têm relação com a religião cristã, em função de seu lugar central na sociedade europeia e com a visão religiosa ou sagrada do mundo. Portanto, pode-se dizer que a sociedade moderna perde seu caráter religioso e se torna uma sociedade secular, mas a secularização não pode ser confundida com a perda da religião na modernidade, como observaHervieu-Léger (2005, p. 46):

Falou-se, muito equivocadamente, de “retorno do religioso” ou de “revanche divina”, para designar, desordenadamente, o atual desenvolvimento dos novos movimentos espirituais, o aumento das correntes carismáticas, o renovamento das peregrinações ou ainda o sucesso dos livros de inspiração esotérica nas livrarias. Longe de reatar com o universo religioso das sociedades do passado, estes fenômenos fazem surgir, pelo contrário, o caráter paradoxal da Modernidade do ponto de vista da crença. (...) As instituições religiosas continuam a perder a sua capacidade social e cultural de imposição e de regulação das crenças e das práticas. O número de seus fiéis diminui e os próprios fiéis adaptam o “pega e larga”, não apenas em matéria de prescrições morais, mais igualmente em matéria de crenças oficiais. Por outro lado, esta mesma modernidade secularizada oferece, porque é geradora simultaneamente de utopia e de opacidade, as condições mais favoráveis à expansão da crença. Quanto maior é a incerteza quanto ao futuro, quanto mais intensa é a pressão de mudança, mais as crenças se proliferam, diversificando-se e disseminando-se até ao infinito. O principal problema, para uma sociologia da modernidade religiosa, é por isso tentar compreender no seu conjunto o movimento pelo qual a Modernidade continua a minar a credibilidade de todos os sistemas religiosos e aquele pelo qual ela faz ao mesmo tempo, surgir novas formas de crença. Para responder a esse problema, é necessário ter compreendido que a secularização não é, antes de mais, a perda da religião no mundo moderno.

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40 1.3 A secularização: raízes históricas

Para a abordagem das raízes históricas da secularização, iniciamos pelo estudo etimológico do termo, proveniente do latim clássico saecularis, adjetivo relacionado ao substantivo saeculum, cujos significados incluem “era, época, geração, idade, e um período de cem anos,” e com o tempo, adquiriu outros, como “o mundo”, “a vida do mundo” e “o espírito do mundo” e, para os eclesiásticos, foi difundido como algo mundano, hedonista, o que remete à definição de Silva (2004, p. 68), que o termo refere-se, ainda, “à noção de profano, porque não eterno (logo sem origem divina), o que nos reenvia a uma mundi visão de natureza não religiosa”. As diversas mudanças semânticas do termo e a impossibilidade de reconduzir essa noção a uma concepção unitária não depende, segundo Marramao (Cf. 1997), meramente, como no caso de outros termos característicos da modernidade, da sua polissemia ou polivalência semântica, porém, depende de uma “estrutural ambivalência de significado, a qual dá lugar a premissas diametralmente inversas, ou melhor dizendo, ubiquitário” (MARRAMAO, 1997, p. 44).

De acordo com Martín-Barbero (Cf. 1995), a secularização pode ser conceituada como um processo racional típico da modernidade, que tem, como uma de suas principais características, o declínio da religião, marcado pela perda de autoridade das instituições e símbolos religiosos, mas, também, o declínio do Estado e da família.

Existem controvérsias quanto ao uso inicial do termo. Diz-se que o vocábulo “secularizar” foi usado, primeiramente, por Longueville, delegado francês, em 1646. Para ele, secularizar, um termo que surgiu no período da reforma protestante, significava “a expropriação dos bens eclesiásticos em favor dos príncipes ou das Igrejas nacionais reformadas” (MARRAMAO, 1997, p. 17). Nesse sentido, secularizar ficou subentendido no campo político-jurídico. Entretanto, no final do século XVI, essa mesma expressão foi usada com uma conotação diferente daquela empregada por Longueville. Nos embates canônicos franceses, aparece o termo “secularização” como transitus de regularis a canonicus, que se traduz como a passagem de um religioso “regular” ao estado “secular”, ou seja, “redução à vida laica de quem recebeu ordens religiosas ou vive segundo regra conventual” (MARRAMAO, 1997, p. 17).

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41 origem, no âmbito jurídico para indicar a expropriação dos bens eclesiásticos em favor dos governantes ou das Igrejas nacionais protestantes, passando, depois, a ser aplicado a alguém que tenha abandonado a vida eclesiástica, e com a sociologia moderna, o conceito adquiriu o significado de evolução histórica da sociedade ocidental moderna (MARRAMAO, 1995, p. 29). Já na história, o termo “secularização” foi utilizado no final do século XVI, no espaço jurídico-político, na língua francesa, para descrever a “redução da ação do clérigo em função do estado laico” (MARTELLI, 2002, p. 274). Depois, o conceito foi utilizado no sentido de retirar das Igrejas os seus direitos de propriedades. Porém, quanto à origem do uso conceitual do termo, segundo Maramao (1997, p. 18), a mesma se estabelece na esfera do Direito Canônico e, apesar das transformações da época moderna, continua com força até os dias de hoje. Quanto ao seu sentido semântico, Bloch, 1924, p. 90 apud Marramao, 1997, p. 22 diz que

[...] a secularização se demonstra em dois paradoxos, primeiramente como uma espécie de soberania mundana e posteriormente como conflito de poderes. O primeiro paradoxo apresenta que a secularização da puissance royale em soberania absolutamente intra-mundana historicamente se apresenta como uma verdadeira e própria alteração do sentido de resultados, como um “efeito perverso” convencido justamente pelas pretensões de monopólio do sagrado apresentadas pela igreja.

O segundo paradoxo envolve um conflito entre o Estado, que desenvolve características religiosas em seus procedimentos, e a Igreja, que assume uma postura de racionalização burocrática, produzindo, então, uma inversão de valores, isto é, a Igreja passa a ter características estatais e o Estado, características religiosas.

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42 seja, sua significação nos dias atuais, é bem exposta por Berger (1985, p.119):

[...] processo pelo qual setores da sociedade e da cultura são subtraídos à dominação das instituições e símbolos religiosos. Quando falamos sobre a história ocidental moderna, a secularização manifesta-se na retirada das Igrejas cristãs de áreas que antes estavam sob manifesta-seu controle e influência: separação da Igreja e do Estado, expropriação das terras da Igreja, ou emancipação da educação do poder eclesiástico.

O conceito, no entanto, extrapola os limites descritos, porquanto a secularização

[...] afeta a totalidade da vida cultural e da ideação e pode ser observada no declínio dos conteúdos religiosos nas artes, na filosofia, na literatura e, sobretudo, na ascensão da ciência, como uma perspectiva autônoma e inteiramente secular, do mundo (...) da sociedade e da cultura (...) também há uma secularização da consciência (BERGER, 1985, p. 119).

A secularização da consciência leva à estruturação de uma sociedade pluralista, que se fundamenta em pressupostos individualistas e com significações segundo a sua maneira de ver e existir no mundo.

O pluralismo não só permite que escolhamos (profissão, esposo, esposa, religião, partido), mas nos obriga a isto, assim como a oferta moderna de consumo obriga a decisões. Segundo o autor supracitado, já não é possível não escolher, pois é impossível fechar os olhos diante do fato de que uma decisão formada poderia ter sido diferente. E nisso “duas instituições centrais da sociedade moderna promovem a passagem do destino para as possibilidades de escolha e para a compulsão de escolher: a economia de mercado e a democracia” (BERGER; LUCKMANN, 2005, p. 59).

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43 Na esfera religiosa, isso significa a perda do caráter sagrado dos acontecimentos. Fato este, diretamente, relacionado às características da modernidade, período marcado pelas revoluções industrial e francesa, pelas alterações nas formas de governo e pelas incertezas, que, segundo Giddens (2002, p. 21), pode ser entendido como um período “equivalente ao ‘mundo industrializado’ desde que ser reconheça que o industrialismo não é sua única dimensão institucional”. Com a secularização, o campo religioso vai se tornando cada vez mais polissêmico e, paradoxalmente, ao invés de produzir o declínio do sagrado, produziu o surgimento de novas formas de religiosidade. Assim,

No interior do campo religioso, aliás, e sob este preciso aspecto, parecem diminuir cada vez mais as diferenças entre a figura das religiões alternativas e a das religiões normais, isto é, institucionalizadas. Num e noutro modelo, fora e dentro das instituições que enquadram o religioso, o analista detecta um intercâmbio crescente de atitudes, práticas e conceitos religiosos. Um fenômeno que muitos se arriscam a chamar de sincretismo ameaça assim reorientar o campo religioso inteiro (SANCHIS, 1995, p. 11).

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44 [...] ainda que a expressão ‘teoria da secularização’ se refira a trabalhos dos anos 1950 e 60, a teoria pode ser encontrada no Iluminismo. A idéia é simples: a modernização levou necessariamente a um declínio da religião, tanto na sociedade como na mentalidade das pessoas. E é justamente essa idéia central que se mostrou estar errada. Com certeza, a modernização teve alguns efeitos secularizantes, em alguns lugares mais do que em outros. Mas ela provocou o surgimento de poderosos movimentos de contra-secularização. Além disso, “secularização a nível societal não está necessariamente vinculada à secularização em nível da consciência individual”.

Berger (Cf. 2001) discorda de que a modernização leva, consequentemente, à secularização, pois assim como ela tem efeitos secularizantes, também provoca um grande movimento de dessecularização, tendo como argumento que as instituições religiosas perderam influência e poder na sociedade, mas as crenças e práticas religiosas ainda estão presentes na vida das pessoas e se reorganizam a partir de novas instituições.

Verificamos, então, que as instituições religiosas e comunidades tiveram estratégias diferentes de relação com o mundo: a rejeição e a adaptação. Os que rejeitaram esse mundo conseguiram sobreviver e até deram frutos no cenário atual. Diferentemente aconteceu com as religiões que procuraram se adaptar à modernidade e acabaram não tendo sucesso e fracassaram. Logo, houve um crescimento das instituições religiosas tradicionalistas que rejeitaram mudanças e uma queda das instituições que tentaram se ajustar.

O impulso conservador na igreja católica sob o comando de João Paulo II produziu frutos tanto em número de conversões como no entusiasmo renovado entre católicos de origem, especialmente em países ocidentais. Pode-se também assinalar, “surtos igualmente vigorosos de religiões conservadoras em todas as outras comunidades religiosas – islamismo, hinduísmo, budismo – assim como movimentos de renascimento em comunidades menores” (BERGER, 2001, p. 13).

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Gráfico 7 - Turno dos Respondentes
Gráfico 8 - Cor/Etnia dos Respondentes
Gráfico 15: Grau de escolaridade do pai
Gráfico 17: Religião atual dos Universitários
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