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DISCUSSÕES SOBRE A SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR NO MODELO DE ORGANIZAÇÃO ESTRATÉGICA

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Academic year: 2021

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DISCUSSÕES SOBRE A SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR NO MODELO DE ORGANIZAÇÃO ESTRATÉGICA

Priscila Bonato Galhardo* (Laboratório de Estudos sobre o Desenvolvimento e Aprendizagem, Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade, Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo – SP, Brasil; Guilherme Elias da Silva (Laboratório Interinstitucional de Subjetividade e Trabalho, Departamento de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Maringá – PR, Brasil.

contato: priscilabonatogalhardo@gmail.com

Palavras-chave: Gestão estratégica. Saúde mental. Psicossociologia.

Entender sobre gestão possui relevância no que concerne ao modelo de administração que as organizações foram adotando ao longo do tempo. Gestão trata-se de um sistema de organização de poder, que se pauta em um conjunto de técnicas, designadas a racionalizar e otimizar o funcionamento das organizações. É um sistema que se transforma no decorrer do processo histórico. Exemplo disso são as transformações referentes às modalidades de exercício e a própria natureza do poder gestionário entre a organização científica do trabalho e o gerenciamento das empresas multinacionais (Chanlat, 2011).

Considerando a importância de se estudar os novos modelos de gestão, é possível apresentar as características da organização estratégica e quais suas consequências à saúde mental do trabalhador. O modelo de gestão estratégica tem sido marcado por meio da cultura da urgência, da flexibilização, do gerenciamento pela qualidade e da mobilização da psique a serviço da empresa. O modo de poder é considerado gerencialista, induzindo a um comportamento produtivo em busca pela rentabilidade (Gaulejac, 2007). Logo, o trabalhador da gestão estratégica tem vivenciado formas de trabalho que permite indagações quanto ao seu bem-estar e à sua saúde mental.

Pesquisas têm apresentado formas de adoecimento do trabalhador em alguns moldes de gestão na atualidade (Gaulejac, 2007; Limongi França & Rodrigues, 2005; Tamayo, 2008). Entre os principais adoecimentos encontram-se a depressão, o estresse, a síndrome de Burnout, a “adição ao trabalho”, entre outros modos de sofrimento, como por exemplo as consequências de formas de assédio.

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Nessa perspectiva, é possível questionar: será que o modelo de gestão estratégica tem sido favorecedor na promoção de saúde mental e na prevenção ao adoecimento dos trabalhadores? Portanto, o objetivo deste estudo foi investigar se o modelo de gestão estratégica tem sido favorecedor na promoção de saúde mental e na prevenção ao adoecimento dos trabalhadores.

Como recurso metodológico, realizou-se uma pesquisa bibliográfica de caráter exploratório a partir da psicossociologia do trabalho. Essa abordagem tem como eixo principal o interesse pelas intervenções baseadas na relação indivíduo/sociedade, recusando separar o indivíduo e o coletivo, o afetivo e o institucional, os processos inconscientes e os processos sociais. Estuda-se o social, que apresenta dimensões subjetivas, emocionais e inconscientes e o psíquico, que se modela por uma cultura, pelo simbólico e pela sociedade (Gaulejac, 2001; Silva & Hashimoto, 2013).

Para tanto, estruturou-se essa pesquisa, apresentando as características da organização estratégica, as possíveis patologias desenvolvidas nos modelos de gestão estratégicos e algumas possibilidades práticas e reflexivas sobre a promoção de saúde no mundo do trabalho.

Ao que se refere à estrutura de gestão estratégica, é possível compará-la com os modelos mais tradicionais de gestão. As organizações, que eram submetidas aos modelos de gestão científicos e clássicos, apresentavam um modo de gestão disciplinar com caráter opressivo e estático. Em contrapartida, o modelo da gestão estratégica, na atualidade, busca uma implicação subjetiva e afetiva do trabalhador, em que todos os registros da vida social são atingidos. A organização é personificada de tal forma que o indivíduo passa a ter diversos sentimentos por ela. Possui um funcionamento “sociopsíquico” de dominação, regido por um objetivo de transformação da energia psíquica em força de trabalho. Portanto, a ruptura com o modelo disciplinar ocorre por princípios de um modelo de gestão que mobiliza a psique (angústias e desejos) sobre objetivos de produção (Pagès, Bonetti, Gaulejac, & Descendre, 1987).

Pagès et al. (1987) salientam que a organização se torna o objeto de investimento amoroso, diferente do modelo clássico de gestão, em que se canalizava tal sentimento aos chefes. Investe-se em uma entidade anônima, em suas regras, seus princípios, suas políticas e não mais em uma pessoa. “Isto garante uma reprodução mais segura da organização, com menor sujeição

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aos acasos conjunturais das relações interpessoais, e ao mesmo tempo, uma sujeição mais rigorosa do indivíduo” (Pagès et al., 1987, p. 148). Nessa perspectiva, observa-se que o controle, modelo de gestão estratégica, toma maior sutileza, buscando o investimento psíquico do indivíduo à organização.

Diante do exposto, é possível refletir que a racionalidade implacável das tecnologias de gestão pode estar suscitando uma irracionalidade de comportamentos por parte dos trabalhadores. Tem-se de um lado a racionalidade instrumental e de outro um mundo sem sentido, dominado pela incoerência e paradoxo. Por isso, Gaulejac (2007) vai utilizar a metáfora da doença, como um artifício para descrever os diferentes sintomas que decorrem diretamente pela forma que a gestão apresenta problemas e soluções.

Sennett (2001) reflete que as características dessa última geração do capitalismo têm se detido na intensa flexibilidade e na visão de curto prazo, emulando valores como lealdade, cooperação e confiança. Em contrapartida tem se estimulado o individualismo, a competitividade, aliados ao desaparecimento de carreiras estáveis e vínculos profissionais. Tais aspectos podem levar a condições de sofrimento e desgastes psíquicos, como: a depressão, o esgotamento profissional e a adição ao trabalho.

A depressão gera um sentimento de lassidão, de mal-estar difuso, uma “repulsa”, a impressão de não aguentar (Gaulejac, 2007). Isso contribui ao desenvolvimento de alguns aspectos que caracterizam a depressão, como a alteração de humor, em graus variáveis de tristeza e melancolia; a disposição e o estado de ânimo; a qualidade e as perspectivas de vida, o comportamento e até o funcionamento do corpo. Além disso, compromete a atividade profissional, pois por vezes, o indivíduo não consegue trabalhar, tem dificuldade de concentração, cansaço excessivo, sentimentos negativos e afastamento das atividades sociais (Limongi França & Rodrigues, 2005).

O esgotamento profissional (burnout) acontece quando nos esforçamos demasiadamente para atingir um fim irrealizável. É um constructo composto pelas dimensões de exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização pessoal (Tamayo, 2008). Entende-se que o esgotamento profissional (burnout) representa o preço que o trabalhador paga por sua dedicação ao cuidar de outras pessoas ou de sua luta para alcançar uma grande realização

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(Limongi França & Rodrigues, 2005). Portanto, a necessidade de se afirmar e o desejo de realização profissional se transformam em obstinação e compulsão (Gaulejac, 2007).

Na adição ao trabalho (work addicts) o sujeito desenvolve uma relação de dependência ao trabalho. Há um hiperativismo, que tem efeitos estimulantes aos trabalhadores. Para Gaulejac (2007, p. 223) “a hiperatividade é uma sobrecarga de trabalho que se instala duravelmente porque é considerada como normal e aceita voluntariamente. É vivida com uma resposta a uma exigência de organização, ainda que resulte, de fato, de uma ‘opção’ pessoal”.

A partir das reflexões realizadas, nota-se que por mais que se busque o conhecimento e a compreensão do social, o mundo da gestão ainda sofre uma insuficiência que se conjuga em uma visão empobrecida, mecânica e simplista da ação social. Para tanto, propõe-se, a discussão de alternativas para uma vida psíquica mais saudável aos trabalhadores. Como ponto de partida sugere-se que as organizações se dediquem à escuta das ciências sociais e do trabalho que, por meio de um conjunto de disciplinas, se preocupa com a conduta humana e a dimensão social. Uma das contribuições das ciências sociais é apresentar que qualquer pessoa em situação profissional, tem capacidade de ação no contexto de seu trabalho. Isso é essencial para fazer as coisas, alcançar objetivos, influenciar seu ambiente e melhorar sua posição (Chanlat, 2011).

Outra contribuição é o campo da psicossociologia, que abrange, justamente, as formas de individualidade que correspondem às formações sociais. Busca-se a análise de um “saber psicossociológico”, que abre caminho à compreensão da experiência como resultado da ação do homem no mundo, e, consequentemente, possibilita dar sentido às práticas sociais (Carreteiro & Barros, 2011).

A intervenção da psicossociologia se apoia na dimensão clínica e na pluralidade. A dimensão clínica refere-se à atenção dada aos sentidos que no decorrer do trabalho vão se coproduzindo juntos aos participantes da intervenção. Ela auxilia os sujeitos a melhor compreenderem o significado das situações vividas e encontrarem respostas aos problemas por meio de uma diagnóstico institucional preciso. A pluralidade, por sua vez, representa que todo objeto de trabalho se constrói e é analisado nas interfaces de várias disciplinas, abandonando a ideia de apreensão total (Carreteiro & Barros, 2014).

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pensamentos sobre uma ordem social submetida a interesses econômicos. Não obstante, faz-se o desafio de reabilitá-la à construção de “gestão humana de recursos”, facilitando um percurso à emancipação e à saúde humana. Um mundo em que o bem-estar e a saúde tenham mais preciosidade, para transmitir ao próximo, formas de vida mais saudáveis e felizes.

Referências

Carreteiro, T.C.O.; Barros, V.A. (2011). Clínicas do trabalho: contribuições da psicossociologia no Brasil. In Bendassolli, P.F.; Soboll, L.A.P. Clínicas do trabalho: Novas perspectivas para compreensão do trabalho na atualidade. São Paulo, SP: Atlas.

Carreteiro, T.C.O.; Barros, V.A. (2014). Intervenção psicossociológica. In Bendassoli, P.F.; Soboll, L.A.P. Métodos de pesquisa e intervenção em psicologia do trabalho: Clínicas do trabalho. São Paulo, SP: Atlas.

Chanlat, J.-F. (2011). O desafio social da gestão: a contribuição das ciências sociais. In Bendassoli, P.F.; Soboll, L.A.P. Clínicas do trabalho: Novas perspectivas para compreensão do trabalho na atualidade. São Paulo, SP: Atlas.

Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social: ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. Aparecida, SP: Ideias & Letras.

Limongi França, A. C., & Rodrigues, A. L. (2005). Stress e trabalho: uma abordagem psicossomática. São Paulo: Atlas.

Pagès, M., Bobetti, M., Gaulejac, V., & Descendre, D. (1987). O poder das organizações. São Paulo: Atlas.

Sennett, R. (2001). A corrosão do caráter: consequência pessoais do trabalho no novo capitalismo. Rio de Janeiro, RJ: Record.

Silva, G. E., Hashimoto, F., & Soldera, L. M. (2013) Organizações estratégicas: campo de (re)produção da ideologia narcisista e do espetáculo. Temas em Psicologia, 21(1), 121-137. Tamayo, M. R. (2008). Burnout: aspectos gerais e relação com o estresse no trabalho. In Tamayo, M. R. Estresse e cultura organizacional. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.

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