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Escola inclusiva – um olhar a partir da situação profissional dos docentes em Portugal

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Academic year: 2021

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profi ssional dos docentes em Portugal

Inclusive School – an approach from the professional

teachers situaƟ on in Portugal

Escuela Inclusiva – una mirada desde la situación

profesional del profesorado en Portugal

Marco Corriente Rosa*

DOI: http://dx.doi.org/10.20435/serie-estudos.v22i44.1043

Resumo

Neste ar go, discute-se o conceito de Escola Inclusiva enquanto escola promotora de direitos huma-nos. Nesta abordagem em que se transmite um olhar a par r da situação profi ssional dos docentes em Portugal, apresentam-se os resultados parciais de um processo de pesquisa, em que se optou por uma estratégia de inves gação qualita va, descri va e interpreta va que nos reportam para os aspetos relacionais e coopera vos no trabalho docente, para as condições de desenvolvimento profi ssional e para as alterações sen das nas suas condições de trabalho, decorrentes das alterações polí cas e sociais que determinaram mudanças signifi ca vas no contexto educa vo. As principais conclusões sugerem que os docentes passaram a ter um importante incremento no seu trabalho que se caracteriza pela burocra zação e fragmentação deste, cada vez mais orientado para a uma lógica na qual a pressão se faz sen r pela performa vidade compe va, potenciando assim a orientação da sua a vidade para a sobrevalorização dos resultados escolares.

Palavras-chave

Inclusão; professorado; mudança. Abstract

This ar cle discusses the concept of Inclusive School as a school promo ng human rights. In this approach, which looks at the professional situa on of teachers in Portugal, we present the par al results of a research process, in which a qualita ve, descrip ve and interpre ve research strategy has been chosen that refers us to the rela onal and coopera ve aspects in the teaching work, for the condi ons of professional development and for the changes felt in their working condi ons, due to the poli cal and social changes that have determined signifi cant changes in the educa onal context. The main conclusions suggest that teachers have an important increase in their work, which is characterized by bureaucra za on and fragmenta on of the same, increasingly oriented to a logic where the pressure is felt by the compe ve performa vity, thus enhancing the orienta on of its ac vity for the overvalua on of school results.

Kei words

Inclusion; teachers; changes.

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As novas realidades discursivas procuram trazer o professorado para o centro desta discussão com uma retórica que se repete quanto à necessidade de valorizar o seu papel, a sua autonomia, ou a sua imagem social, porque lhes cabe formar as novas gerações em conformi-dade com as exigências do futuro, da sociedade da informação, do desenvol-vimento económico ou qualquer outra razão que esteja na moda. No entanto, como referiu António Nóvoa1, os

discur-sos e as prá cas, muitas vezes, revelam mundos dis ntos, construindo uma ideia que não corresponde à intencionalidade declarada.

Assim, os resultados do estudo que realizámos (ROSA, 2016a) permi u--nos conhecer, através de uma aborda-gem inves ga va de caráter qualita vo, narra vo e interpreta vo, o processo

1 Em palestra proferida na Faculdade de

Educação da Universidade de São Paulo, no dia 20 de maio de 1999.

1 INTRODUÇÃO

Equacionar a Educação Inclusiva a par r de uma visão holís ca da escola é a intenção desta comunicação, que coloca, na centralidade dessa problemá ca, a situação profi ssional do professorado e a relevância do seu papel no desen-volvimento e aprofundamento desse paradigma, sempre inconcluso.

A conceção de prá cas e a tudes profissionais que determinam uma Escola que se caracterize por uma ver-tente Inclusiva está subjacente à forma como esta se organiza e àquilo que são as condições de exercício profi ssional dos docentes, designadamente no que diz respeito às suas condições de trabalho, às relações profi ssionais que se estabe-lecem, à componente coopera va do trabalho que se desenvolve entre pares e às condições para um desenvolvimento profi ssional, assente na aquisição de no-vas competências que vão ao encontro dos desafi os que se colocam à Escola e à profi ssão.

Resumen

Este ar culo discute el concepto de Escuela Inclusiva como una escuela que promueve los derechos humanos. En este enfoque, que analiza la situación profesional del profesorado en Portugal, se pre-sentan los resultados parciales de un proceso de inves gación en el que se ha elegido una estrategia de inves gación cualita va, descrip va e interpreta va que nos remite a los aspectos relacionales y coopera vos de la enseñanza, por las condiciones de desarrollo profesional y por los cambios experimentados en sus condiciones de trabajo, debido a los cambios polí cos y sociales que han determinado cambios signifi ca vos en el contexto educa vo. Las principales conclusiones sugieren que los docentes enen un importante incremento en su trabajo, que se basa en la burocra zación y fragmentación, cada vez más orientados para una lógica donde la presión se siente por la perfor-ma vidad compe va, potenciando así la orientación de su ac vidad para la sobrevaloración de los resultados escolares.

Palabras clave

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complexo, mul facetado, idiossincrá co e contextual com o qual os profi ssionais docentes se confrontam no seu trabalho, bem como os dilemas, as contradições e os paradoxos que daí decorrem e que determinam a sua predisposição para dar resposta a uma mul plicidade de exigências.

É dentro dessa dialética que se apresentará uma refl exão sobre o ceito de inclusão, as a tudes e as con-tradições que resultam das evidências que os resultados do estudo sobre a situação profi ssional do professorado em Portugal, designadamente quanto aos impactos que os fatores polí cos e sociais recentes veram na profi ssão e à forma como essas infl uências podem condicionar as a tudes potenciadoras de uma escola (mais) inclusiva. Assume-se assim, o pressuposto de que uma ver-dadeira escola inclusiva só é possível com um corpo docente empenhado, mo vado e valorizado.

2 ABORDAGEM METODOLÓGICA ͳ OBJETIVOS, METODOLOGIA E PARTICIPANTES

O Enfoque no processo de recolha de dados incidiu em dois cenários muito concretos que se desenvolveram em dis ntos momentos. Assim, procurámos conhecer e compreender os fatores obje vos e subje vos que contribuíram para operar uma transição na iden dade dos docentes, através de uma profunda revisão do Estatuto da Carreira Docente (ECD) e, por outro lado, na abordagem

que se efetuou à crise económica e financeira, com cortes consideráveis na educação, que, com medidas muito concretas, implicaram a deterioração da qualidade do processo educa vo e uma difi culdade acrescida às condições de trabalho e de vida do professorado.

Os dados foram recolhidos junto de docentes que exercem a sua a vidade profi ssional no sistema de ensino público em Portugal, a Ministra da Educação do XVII Governo Cons tucional e os líde-res das duas Federações Sindicais que representam a profi ssão docente, desig-nadamente da Federação Nacional dos Professores (Fenprof) e da Federação Nacional da Educação (FNE). Para o efeito, realizámos um total de 27 entre-vistas e dois grupos de discussão que implicaram o envolvimento de mais 13 docentes, num total de 40 protagonistas.

A u lização dessas técnicas per-mi u-nos recolher um manancial de in-formação, a par r da qual se pretendeu chegar a um entendimento profundo e, até, a uma dimensão subje va dos par cipantes (seja no plano individual ou cole vo) e dos fenómenos, dirigin-do a intenção da pesquisa para grupos reduzidos, mas a serem intensamente estudados (DENZIN; LINCOLN, 2006).

Nesse caso, considerou-se per-tinente seguir uma metodologia de inves gação qualita va, interpreta va e descri va, pois entendeu-se que seria a mais adequada para compreender os processos e os fenómenos inerentes à problemá ca da inves gação que versa sobre a situação profi ssional do

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profes-sorado em Portugal. Assim pretendemos efetuar uma inves gação acerca “das ideias, da descoberta dos signifi ca vos inerentes ao próprio indivíduo, já que ele é a base de toda a indagação” (PACHECO, 1995, p. 16).

O paradigma interpretativo as-senta em posições fenomenológicas e interpreta vas, assumindo uma impor-tância ainda maior quando se trata de inves gações que incidem sobre os pen-samentos de sujeitos como refere Geertz (1973 apud BOGDAN; BIKLEN, 1994). O que os fenomenologistas enfa zam é a componente subje va do comporta-mento das pessoas. Tentam penetrar no mundo conceptual dos indivíduos, para o compreender, de que forma o constroem e quais os signifi cados que se atribuem para os acontecimentos das suas vidas quo dianas.

A dimensão fenomenológica parte do mundo conhecido, do qual se faz uma análise descri va com base nas experi-ências vividas. Do mundo conhecido e das experiências intersubje vas obtêm--se sinais e indicações para interpretar a diversidade dos símbolos, a par r dos quais é possível interpretar os processos e estruturas sociais em curso (HUSSERL, 1982).

O processo de análise das entre-vistas e dos grupos de discussão foi-se desenvolvendo através de um método dedu vo, a par r dos tópicos que elaborámos e também, num processo indu -vo, atribuindo valor aos dados que iam imergindo, em duas fases, numa análise ver cal (MILES; HUBERMAN, 1994), a

par r do discurso de cada par cipante, e uma análise horizontal ou compara va, com recurso a comparações constantes (GLAUSER; STRAUSS, 1967), para encon-trar temas comuns e dis n vos, procu-rando triangular os dados destas dife-rentes técnicas qualita vas de recolha.

3 INCLUSÃO ͵ CONCEITO, ATITUDES E CONTRADIÇÕES

O movimento por uma escola inclusiva tem avanços signifi ca vos na década de 1990, com um marco

onável, a Declaração de Salamanca, em 1994. A emergência desse paradigma no contexto educa vo consiste em acres-centar à integração sica de alunos com Necessidades Educa vas Especiais (NEE) nas escolas públicas, o envolvimento académico nas classes regulares destas. Assume-se, assim, com clareza, que a heterogeneidade interpessoal é um fa-tor que promove o desenvolvimento de comunidades escolares mais complexas, acreditando-se que dessa complexidade surja uma maior riqueza e tolerância.

A inclusão apresenta-se como um passo em frente para além da presença sica e social do aluno nas escolas como era suposto no paradigma da integra-ção, mas também com a par cipação efe va na interação com os seus pares, com direito a intervenções e interações com os docentes e par cipação a va na comunidade escolar. Pretende-se, portanto, que todos os alunos aprendam juntos respeitando a diversidade. Correia (2001) acrescenta que a diversidade

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pode ser defi nida como o conjunto de diferenças individuais, que, em muitos casos, devem ser objeto de intervenções adequadas e individualizadas, referindo--se obviamente a apoios educativos adequados.

A inclusão vem ques onar as cas e a organização da educação espe-cial e regular, mas também o conceito de integração – o chamado mainstreaming. A inclusão refere-se à vida social e edu-ca va de todos os alunos. Devem ser incluídos nas escolas regulares e não so-mente colocados na corrente principal. O vocábulo integração, muitas vezes ainda referido em meio escolar, é confundido frequentemente com os princípios da educação inclusiva e, em muitos casos, traduz uma representação equivocada da educação inclusiva, assim como o processo inverso também é válido, isto é, muitas vezes fala-se em inclusão, tra-zendo à tona, do discurso, das a tudes e das representações, o paradigma da integração.

Não menos importante que as terminologias e as suas contradições é a discussão que se deve centrar nas a tudes, nas polí cas e nas condições concretas para desenvolver e aprofundar prá cas, que, do meu ponto de vista, sempre e constantemente, possibilitarão margens de refl exão e de melhoria, pois devemos ter em conta que a própria realidade social, ela mesma, é dinâmica e, portanto, exigirá respostas à altura dessa mesma caracterís ca de con nua transformação. Por outro lado, deve-mos ter em conta que o termo inclusão

é amplamente difundido, ainda que o conceito não seja totalmente consensual do ponto de vista académico e social.

A perspetiva inclusiva conduz--nos a uma rutura com as abordagens tradicionais e abre novos desafios a toda a comunidade educa va, as quais apontam para que todos os alunos, in-dependentemente das suas diferenças, tenham uma igualdade de oportunida-des na sociedade.

Em trabalho de inves gação rea-lizado anteriormente (ROSA, 2005), foi possível concluir, a par r da análise dos dados, que a inclusão se enquadra em conceções que se baseiam na igualdade de direitos e oportunidades, na par -cipação e no respeito pela diferença, mas também se salienta o facto de se encontrar grandes difi culdades na conci-liação de um trabalho de qualidade para alunos com NEE integrados em turmas regulares, emergindo a necessidade de um trabalho individualizado de reforço, que não será mais do que criar condições de igualdade para todos os que, por al-guma razão, se encontrem em situação de maior vulnerabilidade.

Foi referido também, no mesmo estudo, que a realidade conceptual está longe de uma realidade prática, pois torna-se di cil à escola responder aos pressupostos da inclusão, uma vez que, não sendo um elemento estanque da sociedade, é altamente permeável ao contexto sociopolí co, não podendo alhear-se à mercantilização dos ser-viços públicos básicos, sobretudo na saúde e na educação, da degradação

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das condições de vida das comunidades proporcionadas pela crescente onda de polí cas de globalização neoliberal, cujo lema dominante é limitar a despesa do estado nos serviços públicos colocando em causa os direitos, acentuando as diferenças individuais e aumentando as assimetrias sociais. Consideramos, por isso, que o que está em causa são os direitos sociais e que a sua perda re-presenta uma regressão civilizacional, o que, aliás, foi uma dura realidade sen da na sociedade portuguesa e que se inten-sifi cou sensivelmente a par r de 2011, com um programa de intervenção ex-terna com grandes impactos no sistema educa vo em Portugal (BENAVENTE et al., 2015; ROSA, 2016a), como teremos possibilidade de explanar mais adiante.

Passadas pra camente três déca-das desde a década de 1990, período marcante em que o movimento pela Escola Inclusiva teve um importante incremento, podemos afi rmar, em re-trospe va, que os princípios humanos e progressistas da Educação Inclusiva, enquanto importante alicerce da coesão social, têm sido amplamente postos em causa por aquilo que tem sido uma transposição do discurso e da lógica dos mercados para as polí cas educa vas.

A educação tem sido alvo de um processo ideológico que se baseia numa narra va vaga e incerta que oscila entre vocábulos como o mérito, a excelência e o rigor para jus fi car a mensuração enquanto critério de qualidade numa lógica de prestação de contas (perfor-maƟ vity), impregnando uma crença e

uma orientação mercan lista que se tem consubstanciado nas múl plas chama-das de atenção para os constantes apelos às novas necessidades económicas, que, dessa forma, se tem exprimido por uma subordinação das polí cas educa vas às demandas dos mercados, uma en dade desprovida de rosto e de dimensão hu-mana, com agendas muito próprias, que nos trazem um conceito de progresso e de nova modernidade baseadas em polí cas de baixos salários, exploração, precariedade e erosão dos direitos fundamentais, colocando em causa di-reitos humanos. Dessa forma, as novas exigências interpretadas por polí cas europeias, na maior parte dos casos, com pressões muito acentuadas sobre os governos dos estados membros, têm-se pragma zado pelo contraponto com as exigências de uma escola e de uma so-ciedade promotoras de inclusão, que se refl etem no abandono de preocupações no exercício, desenvolvimento e apro-fundamento de prá cas democrá cas e de cidadania, pois o que interessa é produzir trabalhadores dóceis, que se deixem explorar, numa lógica de con-formismo, abdicando da sua dimensão de cidadãos, levando a que a sociedade atual se veja confrontada com uma crescente onda de analfabeƟ smo cívico.

4 O CONTEXTO

Os aspetos contextuais são decisi-vos no desenvolvimento deste estudo, pois determinam, em grande parte, os estados de alma dos protagonistas em

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análise e interferem diretamente com os aspetos subjacentes às mudanças operadas. Assim passamos a caracterizar dois momentos, a revisão do Estatuto da Carreira Docente (ECD), um processo que se iniciou em 2006, e o programa de assistência fi nanceira externa, com medidas orçamentais restritivas que determinaram cortes em importantes áreas, neste caso concreto com fortes repercussões no sistema educa vo.

O mais recente processo de altera-ção do ECD, que se inicia em 2006 e que culmina com o DL n. 15/2007 de 19 de janeiro, implicou uma tremenda revolu-ção no ECD, pra camente desfi gurando--o, ou melhor dizendo, transfi gurando a profi ssão. Um processo conturbado e nada pacífico para o professorado Português, pois, inclusivamente, esse dia foi decretado como dia nacional de luto dos professores e educadores, pela Plataforma Sindical, uma plataforma histórica para onde convergiram todos os sindicatos de docentes.

De acordo com Stoleroff (2007), o confl ito em torno do ECD, destaca--se pela con nuidade e intensidade da mobilização dos docentes e pela uni-dade sindical, sobressaindo da reforma generalizada também noutros setores da Administração Pública. Segundo o mesmo autor, a importância desse con-fl ito deriva da dimensão desse grupo profi ssional, do alcance e da abrangência das reformas, das caracterís cas par cu-lares dos processos de negociação e do papel da Educação no desenvolvimento do País.

O movimento muito amplo e clara-mente maioritário em torno da defesa e afi rmação da profi ssão docente assume um contorno de movimento social muito importante para a afi rmação de uma iden dade profi ssional que foi decisi-va para provocar recuos por parte do Ministério da Educação (ME) e conquis-tas parcelares por parte do professorado, uma vez que estas não signifi caram um retrocesso ao ponto de par da.

Muito embora os resultados do processo de inves gação demonstrem que essas conquistas foram parcelares, contudo não foram incipientes, tendo em conta a situação anterior, os docentes e os seus sindicatos valorizam-nas, nomea-damente pelo fi m de uma carreira hierar-quizada e a simplifi cação de um processo de avaliação que veio alterar todo o mapa relacional e coopera vo no trabalho do-cente. Os recuos verifi cados decorreram de processos de grande unidade e resis-tência protagonizados pelos docentes e pela plataforma sindical dos professores que, só dessa forma, puderam forçar o diálogo e a negociação com o ME liderado por Maria de Lurdes Rodrigues.

A par r do ano de 2011, mais con-cretamente, a austeridade imposta por instâncias internacionais, a que se aliou um governo de direita, desencadeou medidas devastadoras nas áreas sociais do estado (BENAVENTE et al., 2015) e, no caso que abordamos presentemente, no sistema educa vo e na profi ssão docente.

As tendências neoconservadoras e neoliberais das políticas em curso são sinte zadas por Benavente et al.

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(2015, p. 19), quando se refere que há elementos no contexto mundial que favoreceram e favorecem polí cas de retrocesso à Escola tradicional, “a escola das notas e dos exames, da seleção e da exclusão”. Uma leitura feita a par r do discurso paradigmá co do Ministério de Educação e Ciência, liderado por Nuno Crato, um Ministro com uma postura conservadora e que transporta a Escola para uma linguagem de um passado de ditadura fascista, que teve o seu ocaso em abril de 1974. As medidas e o dis-curso sobre as polí cas educa vas em Portugal trazem fortes reminiscências a tempos de outrora.

O recurso a mecanismos sofi s ca-dos de controlo passa a ter uma ligação muito direta entre obje vos e resultados ob dos por valores mensuráveis, através de diversos instrumentos, resultados de exames, rankings, recurso a meios esta s cos e comparabilidades. Com a imposição de tendências e prioridades, normaliza-se, em meio escolar, a compo-nente sele va assentes no pressuposto da inevitabilidade e das desigualdades sociais, fomentando-se o individualismo e a compe ção como motores do suces-so pessuces-soal (BÓIA, 2003).

Uma das possíveis leituras do pro-cesso de gestão da crise em Portugal é que aquela se transformou num instru-mento de dominação, pois serve para legi mar decisões polí cas e económicas que amputam nos cidadãos o direito um exercício de par cipação que os defi ne enquanto tal, afastando-os de todas as possibilidades de decisão.

Nunca como agora o desígnio, assumido pelo país como es-tado membro da UE, da cons-trução de um espaço europeu comum de educação nos impôs uma posição tão claramente periférica, subalterna e tão exposta a defi cit democrá co. O alinhamento dos decisores polí cos com a agenda hege-mónica supranacional encontra na crise um aliado na defesa de medidas que nos conduzem perigosamente a uma regres-são social. (BENAVENTE et al., 2015, p. 50-51).

Segundo Santos (2007), a tensão entre capitalismo e democracia não é facto recente. Em grande medida, a fun-ção do Estado numa sociedade capitalis-ta seria tencapitalis-tar equalizar as demandas de lucro que o sistema capitalista exige, e as necessidades dos cidadãos. Enquanto os grupos marginalizados lutam por inclu-são social, as empresas disputam espaço dentro do mercado de bens e serviços. Essa dinâmica deve ser administrada pelo Estado através do contrato social, na medida em que é esse mesmo contra-to que “regula a tensão entre regulação social e emancipação, entre ordem e progresso” (SANTOS, 2007, p. 86).

As demandas polí cas que advêm das exigências da economia capitalista em crise entram pela porta da escola e instalam-se assumindo a forma e o con-teúdo dos processos de subordinação hierárquica (BENAVENTE et al., 2015).

De acordo com Rosa (2016a), os valores da execução orçamental, que

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rondavam os 5% do Produto Interno Bruto (PIB), baixaram para 4% do PIB. Essa redução implicou uma redução de recursos a diversos níveis e com fortes impactos na profissão docente, pois, durante período de 2011 e 2015, o nú-mero de docentes nas escolas reduziu-se em cerca de 34%. Essa redução foi feita através da operacionalização de medidas muito específi cas, das quais destacamos com especiais efeitos:

a) a reorganização da rede escolar, encer-rando escolas de pequena dimensão e centralizando em grandes unidades e a fusão de agrupamentos de escolas já existentes, um fenómeno que fi cou conhecido por Mega-Agrupamentos; b) o aumento do número de alunos por

turma;

c) uma reorganização curricular que reduziu as áreas de expressão, poten-ciando a disciplina de Matemá ca e de Português.

A essas medidas de corte, juntam--se também os cortes nos salários. Os impactos sen dos na dimensão pessoal e profi ssional da classe docente são tre-mendos, levando a que os sen mentos sejam pontuados pelo desencanto com a profi ssão, pelo desgaste acentuado e pela vontade de a abandonar, por via de rescisão ou mesmo por aposentação, conforme os casos. Também é notório o aumento do risco para doenças no âmbito da saúde mental, pois ao des-gaste que se sente junta-se o facto de exis rem menos docentes no sistema, com as consequências de uma maior precariedade nas condições de trabalho

e de vida e uma intensifi cação e com-plexifi cação do trabalho docente, que é desenvolvido numa lógica mercan lista de obtenção de resultados, valorizando--se mais o produto que o processo, não levando em linha de conta as condições de par da.

4.1 Aspetos relacionais e cooperativos no trabalho docente2

A análise dos vários quadros legais que se foram sucedendo sugere altera-ções na forma dos docentes trabalharem e se relacionarem entre si. Os docentes na sua generalidade concordam que as relações laborais e o trabalho coo-perativo foram comprometidos pelas novas demandas, sen dos e signifi cados concretos que dão um pragma smo aos efeitos das mudanças operadas, par -cularmente, na forma como sentem e interpretam as suas funções, a qual, em muitos casos, choca com as suas

vas e mo vações iniciais, aquelas que outrora os levaram a optar pela escolha da profi ssão.

A generalidade dos par cipantes consideram que as relações profi ssionais e, nomeadamente, o trabalho coopera -vo fi caram comprome dos pelas altera-ções operadas na carreira, dando ênfase às relações de subordinação hierárquica, que assumiram um importante relevo e veram o seu expoente máximo de confl ito nas alterações ao processo de

2 Os nomes atribuídos aos excertos discursivos

dos par cipantes, que serão introduzidos de aqui em diante, são fi c cios.

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avaliação de desempenho na vigência da Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, a par r de 2006, incremen-tando-se uma componente compe va que é o contraponto da solidariedade, da entreajuda e da cooperação, aspetos essenciais para um exercício da docên-cia numa vertente (que se pretende) refl exiva.

Foram ainda apontados comentá-rios que sugerem um défi ce democráƟ co que nos permite inferir que as relações de igualdade entre pares foram postas em causa por uma relação, então, hie-rarquizada. São feitas várias referências à democracia como uma prá ca que se transmite no seu pleno exercício, dizen-do no fundizen-do que a escola não a pode transmi r se não a pra ca. Uma refl exão que urge lançar no atual panorama edu-ca vo em Portugal.

O trabalho cooperativo é uma importante vertente para o desenvol-vimento profi ssional e lança o desafi o e a responsabilidade social que cada docente tem que assumir na defesa da sua iden dade profi ssional.

A saída para o desenvolvimen-to profi ssional na escola. É a força da convicção do que é ser professor e cada vez mais, cada um de nós, cada um dos professores, chamar para si essa função, aquilo que está inerente a essa função… e não se esquecer… e passar a pala-vra, sempre que possa fazê-lo, passar a palavra, embora pos-sa parecer paspos-sar por “chato”, mas tem que ser (Almiro).

Uma referência incontornável é também ao clima de subserviência em relação ao regime de gestão e direção das escolas. Nesse âmbito, são referidas expressões como o medo que se sente e o cuidado exagerado para não afetar nenhuma susce bilidade do poder.

Se já havia pouca democracia na escola, agora pode-se dizer que não há nenhuma. Não há uma prática democrática e fala-se na importância da de-mocracia, mas se não existe a práƟ ca, logo… É uma coisa me-taİ sica, não existe! É abstrata, isso é muito negaƟ vo (Inês).

4.2 Condições para o desenvolvimento profissional

As condições para cada docente desenvolver o seu trabalho e se de-senvolver profi ssionalmente são uma questão central na classe docente. Os par cipantes são unânimes ao conside-rar que atualmente as condições para o seu desenvolvimento profissional não são as melhores, atribuindo que a inexistência dessas condições passa por várias razões, concretamente as que a seguir apontamos, que vieram à luz da análise efetuada aos seus segmentos dis-cursivos, rela vamente a esses aspetos em par cular.

A precariedade e a falta de segu-rança, no que diz respeito ao vínculo laboral é um dos obstáculos apontados às condições favoráveis para o desenvol-vimento profi ssional, pode-se dizer que há aqui um sen mento de instabilidade

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emocional e profissional associada a esse fator.

Alguma quebra de solidariedade entre pares, que resulta da introdução de uma maior compe vidade entre os docentes é amplamente referido, uma vez mais as relações de cooperação assumem-se como fator promotor do desenvolvimento profi ssional.

Uma das coisas que nos faz melhores profissionais é as discussões de grupo, entre colegas do mesmo grupo. A parƟ lha de dúvidas, a parƟ lha de questões, faz com que nós fiquemos melhores também (Roberta).

Uma vez mais, o processo de avaliação do desempenho é apontado, desta vez como entrave às condições para o desenvolvimento profissional, pois toda a burocracia que tal processo envolve representa um acréscimo de tra-balho que, inevitavelmente, tem como consequência um incremento de fadiga, para além do dispêndio de tempo. Dessa forma, a fadiga e o desgaste são a con-sequência de um trabalho cada vez mais árduo e mul facetado para responder às exigências do sistema, cons tuindo--se como uma importante barreira ao desenvolvimento profi ssional.

As pessoas estão, psicologica-mente, um bocado fragilizadas e tendem talvez a não invesƟ r tanto em algumas coisas por-que estão cansadas. Existe um grande cansaço entre os colegas (Carla).

A falta generalizada de recursos que se vai sen ndo cada vez mais, resul-ta da acumulação de várias imposições orçamentais e já começam a ser um en-trave, pois também limitam o trabalho dos docentes.

Por fi m, a oferta formaƟ va, que é considerada escassa e deficitária, também é um fator que os docentes consideram cons tuir um obstáculo ao seu desenvolvimento profi ssional, pois trata-se de uma profi ssão em que se sente uma necessidade permanente de atualização pedagógica e cien fi ca,

A formação contínua […] é importante para o nosso desen-volvimento, porque as coisas estão sempre a evoluir e estão sempre a mudar e acho que nós também temos que entrar nessa evolução, a formação é importante, até porque tu po-des fazer uma formação, outro colega faz outra formação, e depois encontram-se e acaba por haver a parƟ lha dos conhe-cimentos de uns e de outros, esclarecendo dúvidas (Álvaro).

4.3 Condições de trabalho

A alteração das condições de tra-balho surge como assunto incontornável quando se trata de defi nir alterações ao ser e sen r do professorado. Assim, decorrente de um conjunto de medidas, surgem consequências imediatas com um impacto determinante na fragmen-tação do trabalho docente e na sua intensifi cação.

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O aumento do número de alunos por turma, que passou de 26 para 28 e, mais recentemente, de 28 para 30, é uma das principais razões de atribuição à deterioração das condições de trabalho.

O aumento do número de alunos por turma. A nível de Língua Estrangeira, na apren-dizagem, é impossível. É fi ngir que estamos a ensinar, com um número tão grande de alunos por turma, não se consegue… Só fazendo o pino. Há muito mais difi culdade (Nádia).

Um exemplo bem ilustra vo das difi culdades sen das por essa par ci-pante, que neste caso concreto se refere à difi culdade em ensinar uma língua es-trangeira com mais alunos. Acreditamos que esse fator traz claros prejuízos para a aprendizagem dos alunos, uma vez que se sobrevalorizam os aspetos de natureza burocrá ca, em detrimento dos aspetos pedagógicos.

Uma turma do ensino secun-dário, de artes, com 30 alunos, num trabalho, com folhas lar-gas, para fazer uma maquete, não cabíamos dentro da sala. 30 alunos numa turma de Artes do Secundário é impensável. A gente faz, mas não dá a atenção que deve dar, e alguns alunos perdem-se (Reinaldo).

Mais uma referência às dificul-dades sentidas, neste caso por um par cipante que se dedica ao ensino de artes visuais, que refere difi culdades na organização do espaço sico, pelo

número de alunos, mas também e, uma vez mais, pelo acompanhamento peda-gógico que se perde, nomeadamente, no acompanhamento de alunos com mais difi culdades.

Dentro desses exemplos há duas evidências, por um lado, o acréscimo de desgaste a que os docentes estão sujei-tos, pelo facto de trabalharem com mais alunos e, por outro lado, a constatação que a qualidade pedagógica diminui, com consequências para as aprendiza-gens dos alunos.

O preenchimento de papéis são uma treta, mas é assim, sou professor, sei ler e escrever e preencho os papéis que eles quiserem. O problema é que depois fi co demasiado tempo a tratar (…) dos papéis e não faço o que devia fazer, que é ter uma relação com os meus alunos cordial, colaboraƟ va, es-Ɵ mulante ou eses-Ɵ muladora. Isso é que era importante. (Filipe).

A fragmentação do trabalho do-cente, com o incremento de tarefas díspares também é um dos indicadores que os par cipantes apontam, como ali-ás já foi referido anteriormente quando mencionámos o incremento de tarefas burocrá cas, mas não só, pois, a tendên-cia que se tem verifi cado, em que cada docente tem mais turmas, mais níveis de escolaridade e uma maior diversidade de trabalho, no âmbito de apoios e tutorias, faz com que o tempo para a sua forma-ção e para a preparaforma-ção do seu trabalho le vo seja amplamente colonizado.

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Eu sinto que há uns anos atrás eu Ɵ nha tempo para falar com os meus colegas, encontráva-mo-nos, e que hoje mal nos cru-zamos. Já chegou a acontecer, há tempos atrás, encontrar um colega, quase no fi nal do ano e chegarmos à conclusão que, estando na mesma escola, não nos cruzamos e nem nos vimos (Fernanda).

A forma como os docentes se encontram menos disponíveis para o trabalho com os seus pares, portanto coopera vo, ou mesmo para tratar de assuntos profi ssionais e para discussões que podem ser enriquecedoras, no sen do da par lha, é notória e, várias vezes, mencionada. Uma novidade

vamente recente também decorre da amplifi cação do espaço escolar a outros estabelecimentos, com a cons tuição dos referidos Mega-Agrupamentos.

A nossa escola era pequena e passou a uma escola grande. A mobilidade entre escolas tam-bém é uma coisa que não agra-da a ninguém (…). Desenvolvo trabalho em duas escolas, com vários ciclos de ensino, o que também acho prejudicial ao trabalho, uma pessoa tem que avaliar vários níveis e isso aumenta-lhe as difi culdades, essencialmente em termos de tempo, porque obriga a gastar mais tempo com a avaliação dos alunos e obriga a passar mais tempo na escola porque, em horas mortas, tens que

transitar entre escolas. Se for preciso tens que te deslocar duas vezes à mesma escola, isto é, o tempo que podias estar a dar aulas ou a preparar al-guma coisa, andas de um lado para o outro (Nuno).

A intensifi cação do trabalho acaba por ser uma consequência das novas demandas, como se pode constatar por todas as razões apontadas pelos par cipantes as quais, segundo estes, cons tuem-se como fatores que agra-vam o desgaste e a fadiga.

Sou professor de Educação Musical, estou com turmas das 8.20h até às 16 h, onde estou sempre sujeito a uma grande carga sonora, porque é disso que se trata, vou ter perturba-ções do sono, os níveis de stress vão aumentar, a minha capa-cidade audiƟ va, com o tempo, vai diminuir. Vou ter problemas de tensão arterial, vou ter problemas de concentração, isto está tudo estudado pela OMS. Isto é válido para mim e para qualquer outra pessoa que esteja sujeita às mesmas condições. Considero que esta profi ssão é de desgaste e, com a intensifi cação do trabalho, esse desgaste ainda é mais potenciado. Havia medidas do anterior ECD que defendiam mais os profi ssionais, nomea-damente com o alívio da carga horária a parƟ r de determina-da idetermina-dade (Domingos).

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Uma referência clara, num exem-plo ilustra vo, de intensifi cação da carga de trabalho, neste caso concreto, um docente de Educação Musical, sujeito a uma es mulação audi va constante e intensa.

Para terminar, surge mais um exemplo da intensifi cação de trabalho e da sua infl uência na vida par cular, designadamente, no tempo de descanso e na vida familiar.

A minha vida social nunca foi muito intensa, mas cada vez é menor, porque o ter disponibi-lidade para me encontrar com familiares ou amigos, etc… é cada vez mais raro, depois, ine-vitavelmente, o meu descanso, não consigo estar um dia sem trabalhar para a escola (Clara).

5 CONCLUSÕES

Uma profissão docente que re-clama mais autonomia para dar uma resposta mais congruente aos desafi os cada vez mais complexos que lhe são colocados passou a ter um importante incremento no seu trabalho que se ca-racteriza pela burocra zação e fragmen-tação deste, cada vez mais orientado para a uma lógica em que a pressão se faz sen r pela performaƟ vidade com-peƟ Ɵ va, potenciando assim a sobreva-lorização dos resultados numa lógica de valorização através de instrumentos de precisão mensurável, relegando, para um outro plano, processos que visem à capacitação da Escola no sen do de

combater a exclusão social, construir exemplos de boas prá cas na inclusão, de promover o sucesso escolar e de democra zar o acesso às formas elabo-radas de cultura. Muito embora esses pressupostos adornem os discursos ofi ciais, poderemos mesmo afi rmar que esbarram com uma realidade bem difu-sa, sobretudo se vermos em conta as condições em que os docentes exercem o seu trabalho.

O conceito de inclusão está longe de ser consensual. Existem bons e va-liosos contributos para a sua defi nição. Existe uma riqueza retórica que contrasta com a pobreza da generalidade dos con-textos educa vos e sociais para a colocar em prá ca, encontrando-se argumentos que a transportam para as dimensões da utopia ou do romanƟ smo. A inclusão é um ingrediente para sociedades mais ricas e tolerantes e um pilar essencial da democracia. Esta, para ser apren-dida, tem que ser pra cada e vivida, assim o dizia John Dewey há cem anos, na sua obra Democracia e Educação. A inclusão alimenta-se e cresce a par r da convivência e da par cipação. Em meio escolar, os professores são um elemento chave e indispensável para a construção de uma escola inclusiva. Acreditamos, por isso mesmo, que as condições em que exercem o seu trabalho são de-terminantes para o desenvolvimento de competências e metacompetências essenciais para a sua efe vação e para a sua promoção. Só com Escolas promoto-ras de inclusão podemos ter sociedades inclusivas e vice-versa.

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quentemente, o seu poder e pres gio, e por outro lado, a rigidez das suas cúpulas hierárquicas, como sejam os órgãos de direção e gestão das escolas.

As lideranças das escolas encon-tram-se cada vez mais distantes de processos de gestão democrá ca. Lima (2014) caracteriza-as como uma pós--democracia gestionária, isto é, uma gestão centrada nos resultados esco-lares e numa racionalização das redes escolares, a par de processos de grande deterioração das condições de trabalho nas escolas e da (re)centralização do poder. Segundo o autor, essa situação é mo vada por polí cas de austeridade e de ajustamento económico, como as que têm ocorrido no sul da Europa, designa-damente em Portugal. Na sua perspe va, o governo democrá co das escolas surge como uma preocupação deslocada, fora de tempo e das prioridades polí cas, mas também, e sobretudo, associada ideologicamente a uma irresponsabi-lidade, em termos de gestão racional, efi caz e efi ciente dos estabelecimentos de ensino. A Escola, nos seus aspetos organizacionais, fi ca assim pra camen-te expurgada dos processos de eleição, de colegialidade e de par cipação nas decisões, componentes que, para os docentes, são imprescindíveis ao desen-volvimento de processos de par cipação assentes em princípios democrá cos.

Para finalizar, um convite à re-fl exão e um dilema. Fará sen do falar em Escolas Inclusivas sem debater as situações atuais de organização escolar, dos currículos, no que diz respeito à sua Um dos principais meios para dar

resposta aos desafi os da escola atual é a aposta na formação inicial e ao longo da vida dos docentes. Para além desses aspetos, é essencial o tempo, que deve ser disponibilizado para que se possam entreajudar e explorar aspetos da sua prá ca pedagógica num clima posi vo, saudável, evolu vo e refl exivo. A forma-ção, que pode ser em ambientes formais, mas também a par r da própria prá ca em ação, assim como a disponibilida-de disponibilida-de tempo são muito importantes e per nentes, pois permitem iden fi car e par lhar os sucessos, os insucessos e as inquietações próprias do processo educa vo.

As implicações emocionais, na for-ma como é vivida e sen da a profi ssão, são pontuadas por sen mentos como o desencanto, a desmo vação e a revolta. Estes decorrem de um profundo desa-cordo com as polí cas educa vas que têm originado um processo de erosão do estatuto social da profi ssão. A descrição dos sen mentos que se foi desocultan-do, a par r da análise efetuada, permite compreender que os docentes vivem a sua vida profi ssional de forma fragmen-tada, com extremos que se deslocam entre a paixão e o desencanto (ROSA, 2016b).

A enorme ambiguidade e avaliação pública a que o trabalho dos docentes se encontra sujeito exerce sobre estes uma pressão que os situa entre dois ex-tremos, por um lado, a luta permanente para ampliar a sua margem de autono-mia no processo de trabalho e,

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conse-conceção e prioridades e, fi nalmente, dos docentes, da sua formação e das condições em que desenvolvem o seu trabalho. Poderá a Escola ser inclusiva para os que a frequentam se não for

inclusiva para os que nela trabalham, no que diz respeito ao seu acolhimen-to, valorização profi ssional e social e na implicação da sua par cipação nas decisões?

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Sobre o autor:

Marco Corriente Rosa: Doutorado em Educação pela Universidade de Huelva (Espanha).

E-mail: marcocorriente@gmail.com

Recebido em março de 2017.

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Referências

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