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A ESCOLA COMO LUGAR DE RELAÇÕES DE PODER E DO SUJEITO INSTITUCIONALIZADO

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Academic year: 2020

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Edição 27, volume 1, artigo nº 10, Outubro/Dezembro 2013 D.O.I: 10.6020/1679-9844/2710

Página 202 de 213

A ESCOLA COMO LUGAR DE RELAÇÕES DE

PODER E DO SUJEITO INSTITUCIONALIZADO

THE SCHOOL AS A PLACE OF POWER RELATIONS

AND SUBJECT INSTITUTIONALIZED

Leila Cristina da C. S. Almeida1

1

Universidade Federal do Pará/Departamento de Psicologia Social/Belém, Pará, Brasil, leila.almeida@ig.com.br

Resumo – Esta discussão temática aborda o poder e a instituição como estruturas presentes e atualizadas nos operadores sociais. Um desses operadores é a escola que, em suas atitudes afirmativas de inclusão, participação e busca por excelência, produz imperativos arbitrários que, embora falem de mudança social, muitas vezes se articulam criativamente para manter modelos dominantes. Porém, mesmo que os modos de viver e de pensar no sujeito sejam instituídos e que existam relações diversas de poder atravessando essas relações, a escola é desafiada a produzir outras realidades sociais mobilizando e potencializando também outras práticas. Palavras-chave: Relações de poder. Instituição escola. Mobilização. Modos de vida.

Abstract – This discussion addresses the power and the institution as structures present and updated in the social workers. One of these operators is the school in their affirmative attitudes of inclusion, participation and pursuit of excellence that producesarbitrary imperatives, they speak of social change, oftenarticulate creatively to keep the dominant models. But even if the modes of living and thinking in the subject are introduced and there are diverse relations of power through these relationships, the school is challenged to produce others social realities also mobilizing and leveraging other practices.

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1. Introdução

A busca por conhecimento faz o homem intencionar o seu próprio desenvolvimento e a compreensão dos fenômenos sociais que o afetam. O exercício pleno da autonomia e da liberdade aparece como conseqüência da trajetória de aprendizagens. Seja na família, seja na escola, seja no trabalho as relações que se estabelecem passam a ser mais que experiências adquiridas e partilhadas em um dado momento da vida social.

Neste artigo se analisará a escola através da problematização dessas relações que nela se estabelecem, bem como as estruturas que sustentam as suas ações, sendo ela uma instituição que „ensina para‟ e „prepara para‟. E ainda, diante dessas estruturas, como se dão as tramas do poder e da institucionalização da vida. Para tal, se optou pelas leituras de alguns sociólogos e filósofos entre eles, BERGER e LUCHMANN, ORTEGA Y GASSET, FLÁVIA SCHILLING, MICHEL FOUCAULT, PIERRE BOURDIEU.

2. O homem e a sua identidade particular

Segundo BERGER e LUCHMANN (1985), diferente dos outros animais, o homem não nasce com suas possibilidades de ser e de estar no mundo fixadas biologicamente. Na mesma proporção que em seu processo de adaptação ao meio está mais vulnerável que os outros animais, as forças ambientais não definem previamente a sua condição no mundo, uma vez que sua relação com estas se dá de maneira “variável e em variação”.

Sobre isso, estes autores afirmam:

Apesar dos evidentes limites fisiológicos estabelecidos para a gama de possíveis e diferentes maneiras de tornar-se homem nesta dupla correlação com o ambiente, o organismo humano manifesta uma imensa plasticidade em suas respostas às forças ambientais que atuam sobre ele (BERGER e LUCHMANN,1985, p. 71).

O fator biológico é determinante em características ou pré-disposições orgânicas em qualquer ser vivo. Contudo, no ser humano ela não prescreve e nem define condutas e experiências. Talvez esse seja um traço potencial de humanidade

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Página 204 de 213 a se desenvolver na relação homo-sapiens e homo-socius. Segundo esses autores, qualquer predicado impreciso, imensurável e imponderável do eu humano como identidade particular, se dá por processos sociais e não biológicos.

Segundo o filósofo ORTEGA Y GASSET (1994) a „humanidade no homem‟ não tem um ponto fixo e dado para sempre. Embora pareça redundante o termo acima, a ideia do filósofo é destacar que não só a humanidade é uma possibilidade ética para o ser humano, mas que essa humanidade é construída no seu estar na história.

Tal reflexão é feita com a seguinte afirmação:

Ora bem, resulta que o homem não tem natureza; nada nele é invariável. Em vez de natureza tem história, que é o que não tem nenhuma outra criatura. A história é o modo de ser próprio a uma realidade cuja substância é, precisamente, a variação; portanto, o contrário de toda substância. O homem é insubstancial. Que vamos fazer? Nisso estriba sua miséria e seu esplendor. Ao não estar circunscrito a uma consciência fixa, imutável - a uma „natureza‟. (Ortega y Gasset,1994, p.646)

De acordo com este autor, é justamente por não possuir um ser dado que ele está em “franquia para ser”. Assim, o único remédio para sua insubstancialidade é a cultura que o faz escolher, decidir por si mesmo e se distinguir dos outros, ao mesmo tempo, que o faz possuir uma existência coletiva e circunstancial.

No homem a construção de sua autonomia se relaciona com a capacidade de ter liberdade. Além de ser vital para o desenvolvimento pleno do ser humano, a autonomia é possibilidade para a maturidade dos processos psicológicos, para constituição de subjetividades. Sendo assim, o desejo de liberdade é o sinal eloqüente da incompletude do homem e da sua construção social e histórica. Portanto, no homem há inquietudes, potência e vontade desviante.

Baseado nessa abordagem pode-se afirmar que as formações socioculturais são complexas e variáveis no homem, assim como, as possibilidades de humanização podem ser produzidas de diversas formas pelo próprio homem e não dadas biologicamente. De tal proposição pode-se inferir duas conclusões: que pelas possibilidades fornecidas pela abertura para o mundo em seu processo de humanização, o homem se autorregula e que pela plasticidade e instabilidade do organismo humano ele está suscetível às influências socialmente determinadas.

Diante destas conclusões, surgem as seguintes indagações: o homem em seu processo de humanização exerce, de fato, o poder da autogovernança? Que força exerce a institucionalização sobre sua vontade? Ou ainda, um questionamento

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Página 205 de 213 mais próximo ao enfoque deste artigo: é possível pensar a escola como uma instituição sem poder? É possível pensar uma relação não institucionalizada entre seus sujeitos?

De acordo com BERGER e LUCHMANN (1985), uma instituição é formada por relações entre pessoas e toda instituição impõe controle e padrões de condutas através de hábitos que especializam e moldam um padrão. A instituição é uma produção humana em sociedade, não apenas uma necessidade biológica. Tal análise remetida à escola revela o seguinte paradoxo, a aquisição de conhecimento no aluno é elemento de transformação social e de emancipação intelectual, contudo, o próprio conhecimento já é culturalmente determinado. Assim, é possível falar na constituição de um „eu humano particular‟ sem afetações com processos de institucionalização e poder? Eis a questão!

Os processos de participação que fundamentam o sentido social da escola, bem como, o reconhecimento das formas de organizações que dela surge como: grêmio estudantil, associação de pais, conselho escolar, entre outros, num primeiro olhar nasceram da vontade de fazer parte, de protagonizar. O que significa dizer que é inerente à dinâmica educacional o surgimento de grupos que desestabilizam o “hábito” escolar, a rotina e ajudam a colocar em xeque a existência da instituição escola.

Daí entende-se que, semelhante a novas formas de organização do currículo escolar, o aluno também constrói constantemente outras maneiras de se relacionar com a escola. A formação acadêmica é apenas uma parte que pode perder seu significado se descolada da vivência de uma dada realidade. Não é só o aluno que precisa da escola para se desenvolver. A escola também precisa do aluno e da comunidade para transformar-se continuamente e atualizar as suas intervenções.

É importante destacar que, segundo esses autores, toda instituição impõe controle e tipificação de condutas que permitem previsibilidade de ações. Nessa perspectiva, para o aluno a tipificação de condutas se expressa na objetivação do seu processo de ensino e aprendizagem e, portanto, na institucionalização de seu modo de ser e de estar no mundo. Nota-se isso quando o mundo institucionalizado é experimentado como única realidade possível.

Com isso, „na construção social da realidade‟ a consciência individual interioriza as estruturas objetivadas pelo mundo social. Nessa lógica, o conhecimento será sempre virtualidade, ou seja, se dará no futuro. Portanto, para o

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Página 206 de 213 sujeito cognoscível a realidade apresentada e objetivada é o caminho verdadeiro e válido para o conhecimento. Apreende-se com isso, que o modelo já foi dado e passa agora a ser indispensável como modo correto de conhecer por ter forma pragmática e quantificável.

Tal abordagem se confirma no pensamento abaixo:

Não é preciso insistir em que aqui “verificação empírica” e “ciência” não são entendidas no sentido dos modernos cânones científicos, mas no sentido de conhecimento que pode ser confirmado na experiência, tornando-se em seguida sistematicamente organizado como corpo de conhecimento. (BERGER e LUCHMANN,1985, p.95)

As verdades aprendidas são reproduzidas pelos indivíduos como realidade subjetivada. Dessa forma, ideias e comportamentos vão se institucionalizando através de relações lógicas que dominam o sujeito. Entender os mecanismos desses processos lógicos na escola é uma produção necessária, assim como entender que falas estão sendo aprisionadas quando se elege “aqueles saberes” e não outros.

É fundamental possibilitar a reflexão sobre os efeitos políticos das relações instituídas no espaço escolar. Para tal, os seus sujeitos devem assumir uma postura de atenção aos processos que tipificam condutas. Para tanto, é importante observar que o discurso de verdade foi construído em uma determinada época e a história analisada pode trazer à tona o cenário dessa época ao invés de reproduzir padrões e justificativas cristalizadas.

3. A ofensiva civilizatória

Para MICHEL FOUCAULT (1998) desde o século XVIII o corpo passa por esquemas minuciosos e novas técnicas de docilização que vigiam cada processo de atividade controlando o tempo, o espaço e o movimento. O corpo está mergulhado num campo político, no qual permeiam funcionamentos, manobras e técnicas.

Na instituição escola a docilização dos corpos apresenta uma face tecnológica bastante criativa. Observa-se novamente como exemplo, agora sob um segundo olhar, a formação do grêmio estudantil, da associação de pais, do conselho escolar. Sobre estes não se sustenta mais ou unicamente a vontade de protagonizar, mas a necessidade de uma justificação institucionalizada de

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Página 207 de 213 legitimidade desses grupos para o desenvolvimento e para a garantia de qualidade na escola.

Tal reflexão é elaborada da seguinte forma:

„O Homem-Máquina‟ de La Mettrie é ao mesmo tempo uma redução materialista da alma e uma teoria geral do adestramento, no centro dos quais reina a noção de „docilidade‟ que une ao corpo analisável o corpo manipulável. É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado. (FOUCAULT, 1998, p.188)

O exercício e o deslocamento do poder na relação entre instituição e indivíduo visam tornar o corpo útil. O poder não está localizado na instituição, ele não pertence a alguém. Ele se constitui através de táticas e estratégias de controle e de disciplina numa relação mediada por saberes que torna a relação poder e saber diretamente implicada.

As análises de FOUCAULT falam de uma economia do corpo que ao torná-lo dócil o modela, o treina e o aperfeiçoa para ser útil através de uma organização interna de eficácia do movimento. Daí compreende-se a escola e outros analisadores sociais como espaços vigiados, nos quais é necessário romper comunicações perigosas e codificar os desvios, investindo, assim, nessa economia do corpo.

Todavia, para que haja qualquer forma de resistência é preciso saber quem são os operadores dos mecanismos de poder. E ainda, quanto mais complexa for a instituição mais operadores de poder terão. A resistência, portanto, seria uma ação sobre uma ação que ao problematizar uma prática e reagir sobre as formas de assujeitamento também estará produzindo deslocamento do poder. Ou seja, onde há relação de poder há formas de resistência.

No pensamento desse autor apreende-se que as verdades construídas socialmente especializam saberes para que estes possam documentar individualidades nos corpos. Nos discursos com efeito de verdade o poder legal lança mão de técnicas e manobras para fracionar as punições e extrair dos corpos disciplina e controle. Com isso, das verdades históricas se tem o desdobramento em outras verdades que com efeitos de poder legitimam e excluem saberes.

Percebe-se essa reflexão na seguinte afirmativa:

A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua “política geral” de verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros; [...] o estatuto

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Página 208 de 213 daqueles que têm o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro. (FOUCAULT, 1998, p.12)

Na instituição escola há controle das mínimas parcelas da vida, exemplificada na distribuição dos indivíduos no espaço, no uso do uniforme, no boletim individual de desempenho, etc. A disciplina é uma das faces desse controle, uma vez que corpo disciplinado é corpo eficiente. Nela, os discursos de verdade organizam uma nova economia do tempo de aprendizagem. Contudo, as próprias relações de poder geram tensões que estão constantemente em atividade e podem também desmobilizar o “regime de verdade”.

Diante do exposto, retoma-se a reflexão inicial do homem em seu processo de humanização estar aberto para o mundo socialmente construído e a partir daí possuir uma identidade particular. Tanto em BERGER e LUCHMANN quanto em FOUCAULT encontra-se uma crítica a tentativa de naturalização da relação de poder e da institucionalização da vida. Os processos são historicamente construídos, portanto, são precedidos da ação dos homens para se constituírem em práticas discursivas materializadas.

Para SCHILLING (2004), paradoxalmente, a instituição escola apresenta a proposta de retirar o véu dos olhos, de apresentar a luz da verdade e do progresso científico ancorada na possibilidade de domesticar o ser humano para que este continue sendo guiado. Ou ainda, a “ofensiva civilizatória” da escola impõe a cada grau estudado, paralelamente, um grau de colonização.

Esta autora também tece suas críticas às relações de poder naturalizadas na escola que institucionalizam ações e pensamentos no sujeito como única possibilidade de reconhecimento social. Ainda segundo SCHILLING, nessa perspectiva normalizadora da vida a escola acaba por confirmar as aptidões sociais do sujeito como naturais: “a cada um o seu lugar, de acordo com sua capacidade natural” (2004, p. 65)

A Educação brasileira vem propondo várias discussões, sobretudo a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394/96, nas quais as perguntas-chave têm sido: o que é Aprendizagem significativa? Como relacionar Currículo e Vida? Como promover a Educação Inclusiva? Por trás destas indagações, a grande questão é: como subsidiar a experiência de um ser humano gerenciador de suas próprias ideias e atuante nas problemáticas do seu tempo histórico sem modelos prescritos?

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Página 209 de 213 Segundo ENGUITA (1989) o sentido ideológico da escola a coloca como lugar estratégico para a manutenção de modelos políticos. Sob a justificativa da utilidade da vida humana a educação é a virtude do equilíbrio, da justaposição entre a liberdade e o controle.

Esse autor expressa seu pensamento nesta proposição:

Aparentemente, o lugar e o sentido da educação seriam: Educá-los, mais não demasiadamente, o bastante para que aprendessem a respeitar a ordem social, mas não tanto que pudessem questioná-la. O suficiente para que conhecessem a justificação de seu lugar nesta vida, mas não ao ponto de despertar neles expectativas que lhes fizessem desejar o que não estavam chamados a desfrutar. (ENGUITA, 1989, p. 112)

Compreende-se que as relações que se dão na escola são articulações do seu intra e extra muros. Porém, o modelo institucional que se constitui no interior da escola orienta as práticas entre professor-aluno, aluno-aluno, professor-professor, etc, num jogo constante de interesses e subjugações. Nessa perspectiva, o alto grau da formação é a mediocridade, uma vez que a escola, em seu sentido inaugural, promete a liberdade intelectual e só permite conhecimentos pragmáticos e práxis reconhecidos como válidas socialmente.

Dessa forma, acredita-se que a grande preocupação para os autores aqui trabalhados, não é se a escola, a família ou o Estado têm consciência da existência dessas formas de controle. O perigo está quando não há problematização sobre a institucionalização da vida e se afirma a necessidade de manuais e da gerência dos operadores sociais para conduzir as ações humanas.

Assim, a possibilidade de se enxergar a escola como lugar de dissensos e de intercessões a nomeia como o espaço potente do conflito e da mudança social, no qual a institucionalização das relações que se dão em seu espaço, não institucionalizem também nossa forma de ver e de problematizar as relações.

4. O poder de mobilizar para manter

Em BOURDIEU (2000) o dominante e o dominado estão implicados no processo, ambos estão enredados numa teia de cumplicidades. Assim, o sistema simbólico tem por trás formas de classificação que tornam as referências já cristalizadas e fixadas em estruturas dadas que enquadram o pensamento e as ações.

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Página 210 de 213 É enquanto instrumentos estruturados e estruturantes de comunicação e de conhecimento que os sistemas simbólicos cumprem sua função política de instrumentos de imposição ou de legitimação da dominação, contribuem para assegurar a dominação de uma classe sobre outra (violência simbólica) dando o reforço da sua própria força às relações de força que as fundamentam e contribuindo assim, segundo a expressão de Weber, para a “domesticação dos dominados”. (BOURDIEU, 2000, p.11)

A imposição do mundo social também é imposição de posições ideológicas para que estas convençam como produção do próprio sujeito. O poder para BOURDIEU é dominação e imposição de estruturas simbólicas que interiorizam no sujeito esquemas de classificação.

De acordo com este autor, poder simbólico é também violência simbólica que produz permissão de subordinação ao poder do outro. Uma vez que se busca o consenso inconsciente entre os sujeitos, menores se tornam as possibilidades de posições antagônicas em uma mesma estrutura.

Na instituição escola, as relações de poder, embora partam de divergências e lutas internas constantes e com características próprias, aqueles que possuem maior capital social e cultural acabam dominando. Isso implica dizer que a luta pela classificação entre os grupos leva à manutenção da relação dominador e dominado, e portanto, leva a uma conformação consensual sobre a unidade e a identidade do grupo.

Dessa forma, em BOURDIEU a legitimação do domínio do poder simbólico depende da participação ativa dos sujeitos, porém não casualmente e sim articulado a priori através de conceitos prontos. Para isso, há atitude de submissão e inércia às forças dominantes e também há composição dos interesses e objetivos convergentes. Consequentemente, esse poder é instituído como algo natural na vida social, sem o qual o ser humano não pode viver.

A esse respeito o sociólogo faz a seguinte afirmação:

O poder simbólico como poder de construir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a visão do mundo e, deste modo, a acção sobre o mundo, portanto o mundo; poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é obtido pela força (física ou econômica), graças ao efeito específico de mobilização, só se exerce se for reconhecido, quer dizer, ignorado como arbitrário. (BOURDIEU, 2000, p.14)

A realidade por ser socialmente construída e sob constantes relações de poder não tem nada de natural na composição de padrões de comportamentos e de modos de ser e de estar no mundo. Seus produtos são imposições bem elaboradas que transformam as diversas formas de poder, socialmente construídos, em “poder

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Página 211 de 213 subordinado”. Portanto, para BOURDIEU a tomada de consciência do arbitrário é condição necessária para por em xeque a naturalização das estruturas de dominação.

Diante dessa proposição, a escola pode colaborar sobremaneira para assegurar o consenso sobre o legítimo e o ilegítimo, mas pode também resistir à reprodução inconsciente das estruturas dominantes.

Embora se reconheça que não há instituição sem relações de poder, a habilidade humana para construções sociais pode fazê-la resistir a processos de colonização e atuar em outras possibilidades de autorregulação. E ainda, considerando a perspectiva da construção social da realidade, é possível construir também outros problemas acerca dessa realidade, para que estes potencializem novas formas de atuar na sociedade.

5. Considerações finais

A escola como lugar de relações de poder e do sujeito institucionalizado discute as práticas aprendidas e naturalizadas que classificam diferenças e produzem dicotomias no processo de subjetivação do sujeito. Dessa forma, o modo de ser não só se aprende, por ser construção social, mas também se assimila arbitrariamente.

Tanto para BERGER e LUCHMANN como para MICHEL FOUCAULT como para Pierre BOURDIEU, cada autor com suas especificidades, existem práticas não articuladas que precisam ser ouvidas e percebidas. A realidade por ser construída é também para ser duvidada e problematizada e não para ser simplesmente aceita como autoevidente. E ainda, é preciso estar atento aos consensos compartilhados nas instituições por estes produzirem controle e serem indicadores da identidade entre grupos.

A institucionalização das relações na escola é interiorizada como natural por se perder a sua construção histórica. Ou ainda, não se pergunta sobre os seus operadores e nem a quem interessa. Geralmente há um seguimento progressivo dos modelos e visões apresentadas. Para isso, deve-se desacostumar constantemente de conceitos cristalizados e considerar a existência de olhares não valorizados por nossos esquemas classificatórios.

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Página 212 de 213 Contudo, embora o „pré-construído‟ esteja presente em tudo que se aprende na escola é possível construir coletivamente reações por reflexões e resistências, ao invés do aprendizado por sedimentação de idéias e da tradição de comportamentos. Assim, diante da relação de poder e das relações de dominação presentes na escola o desafio está em ver a realidade apresentada como uma possibilidade e não como sentido absoluto e irrefutável da vida em sociedade.

Aliás, assim como não se nasce individualista e nem dócil, mas estas são incorporadas ao modo de ser do homem pelas relações sociais, o olhar estratificado e valorativo sobre as pessoas e o mundo também é aprendido. Analisar o conhecimento apresentado para buscar articulações que não sejam somente através de causa e efeito é uma prática a ser mobilizada pela escola. Afinal, lá podem ser materializadas discussões potentes de grupos que já reivindicam, nos quais sua composição vem de encontro a práticas de controle e de reprodução da realidade.

Referências

BERGER, Peter e LUCHMANN, Thomas. A Construção Social da Realidade- 12ª Ed. RJ: Vozes,1985, p. 69 a 126 e p. 173 a 241.

BOURDIEU, Pierre. O poder Simbólico- 3ª Ed. RJ: Bertrand Brasil, 2000, p. 7 a 58 e p. 75 a 106.

ENGUITA, Mariano. A face oculta da escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópoles: Vozes, 1998, p. 09ª 29 e p. 117 a

161.

__________. Microfísica do Poder- 13ª Ed. Rj: Graal, 1998, p. 1 a 14 e p. 167 a 177.

GASSET, Ortega Y. Passado e por venir para el hombre actual. Madrid: Revista de Occidente, 1974.

MACIEL, Carlos Alberto Batista. A Dança do Poder nas Instituições Sociais, in: Revista do Centro Sócio-Econômico V. o5. Belém: UFPA, 2000, p. 77 a 100. MARTIN, Roderick. Sociologia do Poder. RJ: Zahar, 1978, p. 57 a 84.

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Página 213 de 213 SOUZA, Jessé. A Construção Social da Subcidadania. BH: Ed. UFMG e RJ:

IUPERJ, 2003, p. 63 a 89.

SCHILLING, Flávia. A sociedade da Insegurança e a Violência na Escola. São Paulo: Moderna, 2004.

Sobre a autora

Leila Cristina da C. S. Almeida – Mestranda em Psicologia Social pelo Programa

de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Pará. Possui Especialização Lato Sensu em Psicologia Educacional com ênfase em Psicopedagogia Preventiva (2011), graduação em Pedagogia pela Universidade da Amazônia (2003) e graduação em Filosofia pela Universidade Federal do Pará (1998). Atualmente é Técnica em Educação da Secretaria de Estado de Educação do Pará. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Orientação e Educacional, bem como em Coordenação Pedagógica.

Referências

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