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O art. 72º, nº 2 do CSC e a necessidade de um seguro de responsabilidade civil dos administradores

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

O Art. 72.º, n.º 2 do CSC e a Necessidade de um Seguro de

Responsabilidade Civil dos Administradores

Clara Daniela Moreira de Sousa

Faculdade de Direito | Escola do Porto

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

O Art. 72.º, n.º 2 do CSC e a Necessidade de um Seguro de

Responsabilidade Civil dos Administradores

Clara Daniela Moreira de Sousa

Dissertação de Mestrado em Direito e Gestão, sob orientação do Professor Doutor Armando Triunfante

Faculdade de Direito | Escola do Porto

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Aos meus Pais, Ao Telmo.

Reading furnishes the mind only with materials of knowledge; it is thinking that makes what we read ours.

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Agradecimentos

Aos meus pais e irmão, por todo o apoio e pelo caminho que me deixaram percorrer; Ao Telmo Dias, pela paciência incansável, pela ajuda constante e pelas pertinentes sugestões e correções;

Ao David Moura, pelo incentivo, pela disponibilidade, pela leitura atenta e pelas pertinentes correções;

Ao Ricardo Dias, pela leitura atenta e pelas pertinentes correções;

Ao meu patrono, Dr. Armando Dias, por toda a compreensão demonstrada e pelos ensinamentos que me transmitiu;

Por último,

Ao Professor Doutor Armando Triunfante, pelo acompanhamento, pelas pertinentes correções e pelos ensinamentos que me transmitiu.

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Lista de Siglas e Abreviaturas

AA. VV. Autores Vários

AktG Aktiengesetz al. Alínea art. Artigo arts. Artigos BP Banco de Portugal CC Código Civil

CCom. Código Comercial

CIRE Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas

Cfr. Conforme

CMVM Comissão do Mercados de Valores Mobiliários

CSC Código das Sociedades Comercias

CP Código Penal

CPC Código de Processo Civil

CVM Código de Valores Mobiliários

DL Decreto-Lei

D&O Directors and Officers

Ed. Edição

EOROC Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas

ISP Instituto de Seguros de Portugal

LAS Lei da Atividade Seguradora

LCS Lei do Contrato de Seguro

LGT Lei Geral Tributária

n.º Número

p. Página

pp. Páginas

RJCS Regime Jurídico do Contrato de Seguro

ROA Revista da Ordem dos Advogados

ROC Revisor Oficial de Contas

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Índice

Resumo ... 8

Abstract ... 8

Introdução ... 9

2. A que deveres estão sujeitos os administradores? ... 11

3. A consagração da Business Judgement Rule e a sua relação com o Dever de Cuidado ... 13

4. Reembolso Societário ... 16

5. O D&O Insurance ... 18

5.1 Génese e Breve Caracterização ... 18

5.2 O D&O Insurance na Europa ... 23

5.3 A licitude do D&O Insurance em Portugal ... 24

5.4 As questões em torno do art. 396.º do CSC ... 25

5.5 Caracterização do Seguro de Responsabilidade Civil dos Administradores em Portugal ... 28

5.6 A Garantia de Ressarcimento dos titulares de indemnizações e os Administradores de Facto ... 30

5.7 A proposta de um Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil dos Administradores ... 32

Conclusão ... 41

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Resumo

A presente dissertação tem por objeto os mecanismos de proteção que os administradores têm ao seu alcance para se precaverem dos riscos a que se encontram expostos, centrando-se na análise do seguro de responsabilidade civil dos administradores, internacionalmente conhecido com D&O Insurance.

Assim, após a análise dos deveres que norteiam a atuação dos administradores e dos riscos a que os mesmos se encontram expostos, analisaremos o papel desempenhado pela Business Judgement Rule, consagrada no art. 72.º, n.º 2 do CSC e, por fim, investigaremos se o seguro de D&O é apto a substituir a prestação de caução, nos termos do art. 396.º do CSC, avaliando em que termos pode este seguro ser contratado no ordenamento jurídico português.

Abstract

The present dissertation object of study is the legal mechanisms of protection that directors of Portuguese companies have their power to hedge against risks to which they are exposed, focusing on the analysis of the D&O Insurance. Therefore, after analysing the duties that guide the directors performance and the risks to which they are exposed, we will analyse the role played by the Business Judgement Rule, the international influence of the Portuguese law norm to be considered on this matter, the article 72.º, n.º2 of the Portuguese Companies Code, and, then, investigate whether the D&O Insurance is apt to substitute the provision of a guarantee, considering the article 396.º of the Portuguese Companies Code, and assessing in what terms this insurance can be contracted in Portuguese Judicial order.

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Introdução

A presente dissertação visa traçar um quadro geral dos mecanismos de proteção que os administradores, em exercício de funções, têm ao seu dispor para se precaverem dos diversos riscos a que ficam expostos.

Esta análise inicia-se com a introdução dos riscos e dos deveres a que o administrador se encontra sujeito, versando com maior relevância o dever de cuidado e a consagração da Business Judgement Rule, no art. 72.º, n.º 2 do CSC, de modo a entendermos se esta é, de facto, um mecanismo de proteção dos administradores, conforme é configurada na realidade norte-americana, e em caso afirmativo, em que sentido opera. Ou, se apesar de esse ser o espírito aludido na lei, os administradores não encontram na sua aplicação um mecanismo de defesa, revelando-se, por isso, necessária a contratação pelos mesmos de um seguro de responsabilidade civil.

Segundo o art. 396.º do CSC, a responsabilidade dos administradores tem obrigatoriamente de ser caucionada nos termos legalmente previstos, podendo em sua substituição ser celebrado um contrato de seguro a favor dos titulares de indemnizações. Mas que seguro é admitido em substituição da prestação de caução e em que termos pode ser contratado? Será o Directors and Officers Liability Insurance apto a substituir a prestação de caução, prevista no art. 396.º do CSC?

Estas são, em bom rigor, as questões que pretendemos discutir com a presente dissertação.

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1.

A que riscos estão expostos os administradores?

Do estudo operado pela Associação Empresarial de Portugal, em colaboração com a F. Rego – Corretores de Seguros e a Hiscox – Seguros Especializados1, resulta que

cerca de 46% das sociedades comerciais não sabe da existência de seguros de responsabilidade civil de administradores, motivo pelo qual acreditamos que uma parte dos administradores de sociedades comerciais em Portugal ainda não tenha tomado consciência dos riscos a que se encontra exposto, pelo simples facto de aceitar a nomeação e tornar-se administrador.2

Nas palavras de ELISABETE RAMOS, basta analisarmos algumas disposições

normativas do nosso ordenamento jurídico para perceber que “os administradores estão expostos ao risco da responsabilidade civil; vale por dizer que o exercício do cargo pode ocasionar a constituição de uma obrigação de indemnizar danos ocorridos em patrimónios alheios”.3

Qualquer administrador em exercício de funções corre o risco de lhe serem aplicadas sanções penais como multas e/ou pena de prisão, nos termos dos artigos 509.º, 510.º e 512.º do CSC; ser condenado no pagamento de coimas pela aplicação de contraordenações (art. 401.º do CVM); ser responsabilizado subsidiária e solidariamente no pagamento de multas/indemnizações em que a sociedade seja condenada (art. 11º, n.º 9 do CP); ser condenado em reversão tributária e em responsabilidade tributária (art. 24.º do LGT); ser responsabilizado por danos ambientais causados pela sociedade (art. 3.º do DL 147/2008, de 29 de Julho); ser condenado no pagamento de indemnizações, por responsabilidade civil pela administração da sociedade (arts. 72.º e seguintes do CSC); ser condenado a indemnizar os credores da sociedade pela insolvência da mesma no “montante dos créditos não satisfeitos, até à força dos respectivos patrimónios” (art. 189.º do CIRE); incorrer em despesas de defesa, custas judiciais e reabilitação de imagem.

1 “A esmagadora maioria das empresas (83,4%) não tem um Seguro de Responsabilidade Civil para Diretores e Administradores de Sociedades Comerciais. As empresas que possuem este tipo de seguro são de maior dimensão e antiguidade.” Para mais desenvolvimentos, consultar AA. VV., 2013, p. 19.

2 Sobre os riscos que assombram os administradores, vide FARIA (2015, p. 64), KEAN (2016), RAMOS

(2010, p. 241), RAMOS (2012, p.175) e VASCONCELOS (2006, p.9).

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Relativamente à exposição dos administradores ao risco, refere ALAN HEVESI que “em qualquer universo de pessoas na atividade humana, encontraremos sempre um exemplo de todo o tipo de resposta. Talvez encontraremos pessoas muito ricas que queriam estar nos conselhos de administração e agora já não querem estar, porque têm [muito] mais a arriscar.”4

Ora, a realidade é angustiante se nos dispusermos a ponderar todos os riscos a que o administrador fica sujeito. Por esta razão, muitos serão os que recusam a nomeação, acabando por se perder, potencialmente, um gestor intelectualmente competente. Outros, por desconhecimento, aceitam sem ponderarem os riscos a que ficam sujeitos e as condições oferecidas para o exercício do cargo.

Como poderá alguém sentir-se cativado a ingressar na administração de uma sociedade comercial, se “a aceitação do cargo pressupõe adequados e efetivos mecanismos de proteção?”5

2. A que deveres estão sujeitos os administradores?

Para além da exposição ao risco, “o ingresso no cargo de administrador de uma sociedade implica que o titular esteja adstrito a observar um extenso e não completamente determinado rol de deveres jurídicos”.6 A assunção do risco, que se associa à inovação, à criatividade e às possibilidades de ganho, exige que a atuação do administrador seja balizada por um quadro de princípios, que deve nortear o exercício das funções de administração.

COUTINHO DE ABREU refere que alguns deveres resultam “imediata e

especificamente da lei, impondo aos administradores deveres legais específicos.”7

Outros, atendendo à diversidade de situações com que os administradores se deparam,

4 Vide AA.VV. 2005, p. 1018 (tradução nossa).

5 Vide RAMOS, 2010, p. 373. Nas palavras de PEDRO PAIS DE VASCONCELOS (2007, p. 11),“Sem esta

proteção, só quem fosse muito imprudente passaria a aceitar o cargo, o que se traduziria num grave acréscimo para o sistema.”

6 Citamos RAMOS, 2010, p. 103. No mesmo sentido, SERAFIM (2011, p. 528) refere que “A relação que se estabelece entre administrador e sociedade tem fundamento numa especial dose de confiança que é depositada naquele para que, de forma diligente, gira um património alheio, de modo a maximizar o interesse do ente que administra.”

7 A título de exemplo, é dever dos administradores não ultrapassar o objeto social (art. 6.º, n.º4 do CSC),

não exercer por conta própria ou alheia, sem consentimento da sociedade, atividade concorrente com a desta (arts. 254.º, 398.º, 3 e 5, 428.º do CSC), etc. Cfr. ABREU, 2010, p. 12.

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“não podem ser especificados em elenco fechado” 8, tendo o legislador optado pela consagração de deveres gerais de conteúdo abstrato e indeterminado, cuja concretização será conseguida através da intervenção doutrinal e jurisprudencial.9

O art. 64.º do CSC acolhe os deveres legais gerais ao consagrar expressamente o dever de cuidado e o dever de lealdade dos administradores10, estabelecendo que os gerentes ou administradores da sociedade devem observar deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da atividade da sociedade adequados às funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado e deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesse dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores.

Ignorando a intensa discussão da doutrina nacional em torno dos deveres a que os administradores se encontram adstritos, o art. 64.º do CSC releva, por si só, em sede de ilicitude e de culpa, encontrando-se, por um lado, associada à ilicitude os factos que violem os deveres de comportamento impostos pela norma e à culpa a falta de diligência empregue pelo administrador. Há quem entenda, de forma contrária, que o art. 64.º do CSC apenas releva para efeitos de ilicitude ou de culpa11.

Nos termos do n.º1 do art. 72.º do CSC, no que respeita à responsabilidade do administrador perante a sociedade, a culpa é presumida, o que implica a inversão do

8 Cfr. ABREU, 2010, p. 14. Optamos pela qualificação dos deveres impostos aos administradores proposta

por COUTINHO DE ABREU. O ilustre autor distingue deveres contratuais, de deveres legais específicos e

gerais. RefereSERAFIM(2011, p. 53) que “sem prejuízo das distintas formas de qualificação dos deveres

funcionais impostos aos administradores, é indiscutível, por um lado, a primazia que é dada aos deveres fundamentais de cuidado e de lealdade na construção do entendimento do que seja uma administração correta e atenta, e por outro lado, a necessidade da definição do cumprimento daqueles deveres ir mais além do que é expressamente mencionado na lei, o que arriscamo-nos a dizer, é quase nada.” No mesmo sentido, FERREIRA (2009, p. 710) refere que “é precisamente a qualidade desta gestão ou administração que (…) os deveres de cuidado visam acautelar”, referindo-se a um dever de gestão ou de administração.

FRADA (2012,p. 67) refere a existência (não expressa) de um dever de legalidade.

9 Vide SERAFIM, 2011, p. 529. É clara a influência dos direitos anglo-saxónicos, nomeadamente do norte-americano, na consagração dos deveres fundamentais, previstos no art. 64.º CSC, com inspiração nos

Principles of Corporate Governance, promulgados em 1992 pelo American Law Institute, onde se

encontram plasmados os fiduciary duties - duty of care e o duty of loyalty. A consagração de tais deveres resulta da concepção dos administradores como fiduciaries. É realizada uma analogia entre a posição dos administradores e a posição dos trustrees. Para mais desenvolvimentos, consultar SERAFIM, 2011, p. 530,

NUNES, 2006, p.20, FERREIRA,2009, p.682, e SILVA,1997,p.605.

10Na sua redação originária, o art. 64.º CSC tinha recebido a influência do §93 AktG (diligência do gestor criterioso e ordenado10), a que se soma, com a reforma de 2006, a influência anglo-saxónica Cfr. RAMOS,

2010, p.107.

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ónus da prova12. A sociedade autora fica dispensada de provar a culpa, cabendo-lhe apenas o ónus de alegar e provar a ação ou omissão violadora do dever (ilicitude).

Ora, se os administradores se encontram sujeitos a determinados preceitos que devem nortear a sua atuação e, em caso de violação, podem incorrer em responsabilidade, por que não deve a sociedade fornecer ao administrador mecanismos de proteção para que este aceite gerir um património alheio e possa, assim, suportar a sua exposição ao risco?

Esta, em bom rigor, é a questão que pretendemos discutir com a presente dissertação nos termos que infra desenvolveremos.

3.

A consagração da Business Judgement Rule e a sua relação com

o Dever de Cuidado

A Business Judgment Rule é uma regra jurisprudencial, de origem norte-americana, consagrada no §4.01 dos Principles of Corporate Governance13. Esta é

descrita por referência ao dever de cuidado, não sendo aplicada a situações de violação do dever de lealdade14. Com a sua consagração na ordem jurídica norte-americana

estabeleceu-se uma presunção de licitude da atuação dos administradores. Para que esta presunção opere, as decisões de gestão têm de ter sido tomadas pelo administrador de um modo desinteressado e independente, com base em informação suficiente e com a convicção, de boa-fé, de que essa decisão terá sido a melhor para prosseguir os fins da sociedade. Encontrando-se preenchidos estes requisitos, o mérito da decisão empresarial do administrador não será sindicado e o administrador não será responsabilizado.

Analisando o dever de cuidado, intimamente ligado ao funcionamento da business

judgment rule, PEDRO CAETANO NUNES subdivide-o em duty to monitor, duty to inquiry,

dever de realizar um reasonable decisionmaking process e dever de assumir uma

reasonable decision.15 O duty to monitor impõe ao administrador um controlo de

informação e vigilância, permitindo-lhe a delegação de poderes; o duty to inquiry impõe

12 Nos termos do art. 799.º CC, a presunção de culpa já resultaria das regras gerais.

13 “Qual o motivo subjacente à business judgment rule?” Vide NUNES,2006, p.24 e FERREIRA, 2009,

p.695.

14 Vide NUNES, 2006, p. 23. TRIUNFANTE (2007, p.60) refere que “o dever de cuidado tem sido dividido em três parcelas distintas: reunião da competência e disponibilidade para o exercício de funções; obrigação de acompanhar e vigiar a atividade social; obrigação de obter informação indispensável à tomada de decisões.”

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ao administrador o dever de efetuar uma investigação quando tome conhecimento de algum facto estranho que possa, eventualmente, causar algum dano à sociedade; o dever de realizar um reasonable decisionmaking process obriga o administrador a obter toda a informação necessária e razoável no processo decisório para que o mesmo se sinta habilitado a tomar uma boa decisão; e o dever de assumir uma reasonable decision impõe que o administrador tome uma decisão ponderada, equitativa e oportuna.

Em conformidade com PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, para a análise da Business

Judgment Rule, partiríamos da consideração da área de administração da sociedade

discricionária, na qual o administrador opera em consonância com os deveres fundamentais, previstos no art. 64.º do CSC, e com deveres operacionais de gestão que admitem alguma margem de escolha do comportamento a adotar16.

O desdobramento do dever de cuidado ou a consideração da área discricionária da administração servem de mote à aplicação da Business Judgment Rule, prevista no n.º 2 do art. 72.º do CSC. 17

O regime societário português, contrariamente à originária Business Judgment

Rule, consagra uma presunção de ilicitude. A responsabilidade é excluída se os

administradores provarem que atuaram em termos informados, livres de qualquer

interesse pessoal e segundo critérios de racionalidade empresarial, nos termos do n.º2

do art. 72.º do CSC.

Esta opção do legislador português toma em consideração o regime geral de responsabilidade civil previsto no nosso ordenamento jurídico, uma vez que se se tivesse optado pela introdução da presunção de licitude da atuação do administrador, presente no modelo norte-americano, reverter-se-ia o espírito da lei portuguesa, tendo-se, portanto, preferido consagrar a insindicabilidade do mérito das decisões empresariais, quando tomadas nos termos do n.º2 do art.72.º do CSC.

Deste modo, nos termos do n.º2 do art. 72.º do CSC, é necessário que, em primeiro, o administrador tenha tomado uma decisão (ainda que pela negativa,

16Refere VASCONCELOS (1995,p. 132) que a administração se encontra dividida em duas áreas – uma discricionária e outra vinculada. A violação de deveres que se incluam na área vinculada, referentes a matéria que não esteja sujeita à discricionariedade do administrador é sempre causa de responsabilidade civil, desde que verificados os pressupostos gerais exigidos para a responsabilidade civil por factos ilícitos. Os deveres vinculados correspondem aos deveres legais específicos - cfr. distinção proposta por ABREU. No mesmo sentido, COSTA (2007, p.68) refere que “não se aplicará o art. 72.º, n.º 2, quando as

decisões são estritamente vinculadas e a decisão atende aos deveres específicos legais.”

17N

UNES (2006, p. 9) analisou a “(in)sindicabilidade do mérito de decisões empresariais” na Sentença da

3.ª Vara Cível de Lisboa, de 27 de Outubro de 2003, que se debruça sobre um pedido de condenação de administradores por danos causados à sociedade no exercício da sua função.

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15

decidindo, conscientemente, não atuar), para que se possa posteriormente analisar a razoabilidade do processo de tomada de decisão18.

Depois para aferir da razoabilidade do processo de tomada de decisão, é necessário inspecionar se o administrador assumiu uma postura consciente e ativa, obteve a informação necessária e razoável para se sentir habilitado a tomar a decisão em causa e, ainda, se o processo de tomada de decisão foi desprovido de qualquer interesse pessoal, tendo a decisão sido tomada no exclusivo interesse social. Esta análise deve, também, atender à dimensão da empresa, à complexidade da decisão, aos custos inerentes a cada uma das opções de decisão disponíveis, ao tempo disponível e ao leque de decisões possíveis. Só se a decisão tiver sido tomada em termos informados, no exclusivo interesse social, sem qualquer noção de obter vantagens pessoais ou que favoreçam terceiros, é que o mérito da decisão não será sindicado em tribunal.19

Nas palavras de GABRIELA FIGUEIREDO DIAS, o regime societário português

acolheu a Business Judgment Rule mitigada20, da qual não resulta uma verdadeira

proteção para os administradores (contrariamente ao que se verifica nos tribunais norte-americanos), pois se estes não conseguirem provar os requisitos previstos no n.º2 do art. 72.º do CSC, ilidindo a ilicitude e a culpa da sua atuação21, o mérito da sua decisão será avaliado e os administradores correm o risco de serem responsabilizados perante a sociedade.

Por isso, perguntamos se o administrador se encontra verdadeiramente protegido, nos termos do n.º 2 do art. 72.º do CSC? Ou, se, ainda assim, deverá o administrador precaver-se e celebrar um contrato de seguro de D&O?

18 Vide SERAFIM, 2011, p.554 e SILVA, 1997, p. 624.

19 Nas palavras de DIAS (2006,p.46),o administrador tem uma obrigação de meios e não de resultado. COSTA (2007, p.80) sustenta que “a atividade empresarial que envolve autonomia de julgamento é

arriscada e não deverá implicar responsabilidade pelo resultado, desde que se paute pelos limites

procedimentais (em sentido estrito) e funcionais que o art. 72.º, n.º2, passou a oferecer ao administrador.”

20Cfr. DIAS,2006,p.70.

21COSTA (2007,p.77)refere que o art. 72.º, n.º 2 do CSC atua ao mesmo tempo sobre a ilicitude do facto e a culpa do agente, contribuindo para uma leitura mais completa e precisa do próprio art. 64.º do CSC.

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4. Reembolso Societário

22

O Reembolso Societário é um mecanismo através do qual a sociedade comercial procede ao reembolso do administrador pelas despesas que este tenha tido no exercício das suas funções.

Em 1939, na sequência do caso New York Dock Company v. McCollom, gerou-se a convicção de que o reembolso societário reclamava uma intervenção legislativa que expressamente autorizasse a sociedade comercial, em determinadas condições, a reembolsar os administradores das despesas de defesa. Neste caso, os administradores da New York Dock Company, demandados com fundamento em perdas e danos causados à sociedade, no montante de 11 milhões de dólares, conseguiram defender-se com sucesso de todas as imputações e, nesse sentido, reclamaram junto da sociedade comercial o reembolso dos montantes pagos em custas judiciais e encargos de defesa. Com sérias dúvidas sobre se tinha ou não poderes para efetuar o reembolso reclamado, a sociedade comercial solicitou uma decisão junto do Supreme Court for Onondaga

County Nova Iorque, que decidiu no sentido desfavorável ao pagamento de tais

montantes pela sociedade, pelo facto de a defesa, ainda que favorável aos administradores, não ter acrescentado nenhum benefício substancial à sociedade.23

ELISABETE RAMOS refere que “a Corporate Indemnification se consolidou na prática societária norte-americana, sendo-lhe reconhecidas as virtualidades de permitir o recrutamento de pessoas mais capazes que, na ausência de mecanismos de proteção do seu património pessoal, não estariam disponíveis para correr o risco de escrutínio judicial de decisões empresariais tomadas de boa-fé e no interesse da sociedade; e de conferir os meios necessários a uma efetiva resistência às ações infundadas.” 24

Atualmente, as leis dos diversos estados norte-americanos consagram normas reguladoras da Corporate Indemnification25. Todavia, este regime não garante que o

22 Corporate Indemnification (tradução RAMOS, 2010, p.341) e Carta de Conforto (tradução FARIA, 2015,

p. 60).

23 Neste sentido, RAMOS, 2010, p. 245, nota de rodapé n.º 951. 24 Citamos RAMOS, 2010, p. 247.

25Em geral, as leis sobre corporate indemnification, [na sua maioria influenciadas pelo Estado de

Delaware], reconhecem poderes à sociedade para reembolsar os seus administradores (…) e fixam os

padrões de conduta a observar pelos mesmos de que depende esta prestação societária; impõem o reembolso de despesas sempre que os agentes tenham obtido ganho da causa; prescrevem o procedimento necessário para ser autorizada a corporate indemnification; prevêm que o tribunal possa ordenar que a sociedade realize a corporate indemnification; permitem que na pendência do processo a sociedade preste os meios necessários à defesa dos administradores; estabelecem regimes não exclusivos.” Vide RAMOS, 2010, p. 248.

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administrador seja reembolsado de toda e qualquer despesa de defesa26. Esta limitação assumida pelo Reembolso Societário expõe os administradores a algumas despesas que não são, assim, assumidas pela sociedade, pelo que este é um dos fatores apontados para o despoletar de um novo mecanismo de proteção - o D&O Insurance, que infra analisaremos.

No que concerne ao nosso ordenamento jurídico, ELISABETE RAMOS refere que “as complexas questões suscitadas em torno do reembolso societário têm autonomia

dogmática relativamente às coberturas oferecidas pelo D&O Insurance. Trata-se de

saber se a sociedade beneficia da faculdade ou tem o dever de reembolsar os administradores de perdas patrimoniais que estes tenham sofrido em consequência de ações de responsabilidade contra si intentadas.” 27

O ordenamento jurídico português não contempla disposições normativas que especificamente regulem esta matéria. Porém, a apatia legislativa não deve ser entendida como uma ausência de tutela, nem como uma proibição total e absoluta da transferência dos custos de defesa para a sociedade comercial.28

O art. 527.º do CPC atribui a responsabilidade pelo pagamento das custas à parte vencida, mas ainda que o administrador seja absolvido da ação de responsabilidade civil, não lhe sendo imputado o pagamento de custas, este sempre terá de suportar o pagamento dos honorários do seu advogado ou, tendo o litígio terminado com a celebração de uma transação, as custas serão assumidas a meio (art. 537.º, n.º2 do CPC).

Questiona-se, assim, se estes custos devem onerar o património pessoal do administrador ou se lhe assiste o direito de reivindicar o reembolso pela sociedade?

ELISABETE RAMOS admite, para este efeito, a convocação do art. 1167.º do CC, que impõe ao mandante a obrigação legal de indemnizar o mandatário29 do prejuízo

sofrido em consequência do mandato, concluindo, contudo, que não há nexo causal que permita essa aplicação analógica, nos termos dos art. 948.º, n.º1 do CC e 2.º do CSC.

Contudo, a ilustre autora equaciona a via orgânico-funcional para fundamentar o reembolso societário em Portugal, explicando que “não basta garantir a

26 Por norma, “a maior parte das jurisdições impede que a sociedade reembolse os administradores de condenações ou transações ocorridas em ações intentadas pela ou em nome da sociedade (por exemplo, as

derivative suits), autorizando tão só o reembolso de despesas razoáveis. Um dos perigos da indemnification nas derivative suits é a circularidade. Significaria que as condenações ou transações

seriam pagas pelo administrador à sociedade que, mais tarde, a título de reembolso devolveria esses montantes acrescidos do reembolso das despesas. “ Vide J.HANKS 1988, p. 1240 e RAMOS, 2010, p. 254.

27 Citamos RAMOS, 2010, p. 341. 28 Cfr. RAMOS, 2010, p. 341.

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irresponsabilidade pelas consequências danosas das decisões tomadas ao abrigo do n.º2 do art. 72.º.” Nesse sentido, acrescenta, e bem, que “de modo a garantir um exercício

protegido da discricionariedade empresarial (…), é preciso que o património pessoal do administrador não esteja sob a ameaça de ser consumido em despesas de defesa provocadas por lides infundadas. Parece-nos, assim, que a solução consagrada no art.

72.º, n.º2 - ao reconhecer, ainda que numa formulação não muito feliz, um espaço de irresponsabilidade dos administradores – só será completamente operativa se articulada com o dever de a sociedade reembolsar os administradores de despesas causadas por processos donde resulte a sua não responsabilidade. Se a atuação do administrador não violou os deveres funcionais, se os atos que suscitaram a ação de responsabilidade foram praticados no exercício das suas funções, tanto os incrementos (…) como as diminuições patrimoniais que eles envolvem devem ser integrados no património da sociedade.”30

Admitindo, pela via orgânico-funcional, a possibilidade de as sociedades comerciais em Portugal beneficiarem da faculdade ou do dever de reembolsar os administradores de perdas patrimoniais que estes tenham sofrido, em consequência de ações de responsabilidade contra estes intentadas, entendemos que é necessário delimitar, no seio da atividade de gestão e de representação dos administradores, quais as despesas que devem ser abrangidas pelo reembolso societário. Só, assim, se poderá considerar o reembolso societário um instrumento de proteção dos administradores.

5. O D&O Insurance

5.1 Génese e Breve Caracterização

“As raízes do D&O Insurance situam-se na Europa, mas é nos EUA que ele encontra o caldo de cultura que fomentará a sua prosperidade.”31

A primeira apólice de D&O Insurance foi comercializada pelo Lloyd’s Bank em 1934. O crash bolsista em 1929, a consequente onda de responsabilização dos administradores em virtude dos danos causados e a promulgação de medidas tendentes à proteção dos investidores - Securities Act (1933) e Securities Exchange Act (1934) -

30Vide RAMOS, 2010, p. 360.

31 Citamos RAMOS, 2010, p. 254. Sobre a génese do D&O Insurance ver VASCONCELOS, 2007, p. 13 e

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obrigaram os administradores a procurar um mecanismo de proteção rápido e eficaz, surgindo o Directors and Oficcers Liability Insurance. O seguro de D&O despontou, assim, com o intuito de proteger os membros da administração de sociedades comerciais e as próprias sociedades, contra perdas patrimoniais reclamadas por terceiros que resultassem do incumprimento negligente de deveres legais ou estatuários, omissões, falhas ou erros de gestão cometidos no exercício de funções de administração e representação da sociedade.

Todavia, apenas nos anos 60 se registou um aumento substancial na procura de seguros D&O, em parte estimulado quer pelo acréscimo acentuado de litígios contra os administradores na comunidade norte-americana32, quer pelas limitações apresentadas

pela Corporate Indemnification33, ficando o ano de 1964 marcado como aquele em que o primeiro segurador norte-americano disponibilizou este seguro.

Com as primeiras apólices, surgiu um leque de dúvidas e receios. Questionava-se a onerosidade e complexidade das apólices comercializadas, colocavam-se problemas de danos punitivos34 e ordem pública35, alertando-se para o perigo de anulação do efeito preventivo da responsabilidade civil dos administradores, pelo facto de alegadamente se cobrirem os danos decorrentes da violação intencional e dolosa dos deveres dos

32 Relativamente à realidade norte-americana, RAMOS (2010, p.241) refere que a “sociedade [é] intensamente litigiosa, cultora da atitude «file first and think later, imbuída do «deep pocket thinking»”, na qual abundam os instrumentos processuais que facilitam a litigância contra os administradores (class

action, shareholder derivate suit, direct action, strike suits) que são os alvos prediletos. Esta realidade

encontra-se, ainda, estritamente relacionada com as particularidades das regras de distribuição de custas processuais (american rule), com a conexão dos honorários dos advogados ao sucesso da causa (contingente fees) e com a licitude das condenações no pagamento de indemnizações em montante superior aos danos (punitive damages).

33 Relativamente à Corporate Indemnification ou Reembolso da Companhia vide ponto 4.

34 No ordenamento jurídico norte-americano são lícitas as condenações no pagamento de indemnizações

em montante superior aos danos. “A locução «danos punitivos» refere a possibilidade de o lesante ser condenado a pagar uma indemnização que, não estando suportada pelo dano, tem uma finalidade meramente punitiva. A luz do ordenamento jurídico português, «o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão» (art. 564.º do CC). O dano é a medida máxima da indemnização. (…) Parece-nos que, em regra, os administradores [em Portugal] não correm, efetivamente, o risco de serem condenados a pagar os danos

punitivos e, nesse sentido, esta exclusão de marcada influência anglo-saxónica mostra-se desnecessária.” Vide RAMOS, 2010, p. 487. Nas palavras de GOMES (1989, p.107), “esta terminologia parece

compreender, contudo, duas situações distintas – uma, em que a indemnização atribuída se reconduz, ainda, a uma finalidade de reparação do dano e outra, em que tal indemnização tem um escopo essencialmente punitivo-preventivo.”

35 Public Policy – vide RAMOS (2010, p. 254) – “a expressão public policy refere as limitações à liberdade

de estipulação. A fronteira entre a liberdade contratual e os limites de public policy é traçada por cada tribunal, na resolução do caso concreto.”

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administradores, diminuindo o nível de diligência36 que os mesmos observavam no exercício das suas funções37.

Contudo, em simultâneo, apelava-se à contratação do Seguro de D&O, alegando-se que o mesmo era suscetível de fomentar a confiança dos agentes económicos38 e de reduzir a aversão ao risco dos administradores segurados que, nas palavras de ELISABETE RAMOS, “na ausência do seguro, não estariam dispostos a servir de

administradores”.39

Os seguradores começaram por comercializar apólices de D&O compostas por duas coberturas - Side A e Side B –, mas atualmente as apólices podem consagrar uma terceira – Side C. A primeira protege os administradores dos riscos que não são absorvidos pela corporate indemnification. É através da cobertura A que o D&O

Insurance é idóneo a mitigar o risco pessoal do património do administrador,

revelando-se fundamental relativamente àqueles que exercem o cargo com diligência e, apesar do seu desempenho, continuam expostos ao risco de responsabilidade, podendo ser demandados em ações sem fundamento.40 Ainda que destas venham a ser absolvidos, os

administradores sempre terão de suportar encargos com a sua defesa e, eventualmente, custos com a reabilitação da sua imagem ou com transações que acordem para o término do litígio. O seguro de D&O permite transferir esse risco para o segurador, que suportará as despesas necessárias, como, por exemplo, encargos de defesa e, se for caso disso, pagamento de indemnizações aos lesados e/ ou custos com reabilitação de imagem, até ao limite da franquia estabelecida na apólice.

36Para contrariar o perigo de anulação do efeito preventivo da responsabilidade civil, estimulavam-se medidas tendentes a manter a diligência do segurado em níveis razoáveis como, por exemplo, o estabelecimento de franquias adequadas, a exclusão do dolo, o agravamento dos prémios ou até a recusa em renovar as apólices de D&O.

37Para mais desenvolvimentos, consultar SÁNCHEZ, 2004, p. 4.

38 Nas palavras de DIAS (2007, p. 320), “a caução obrigatória das responsabilidades vem, assim,

afirmar-se como instrumento priveligiado de incentivo aos terceiros para o estabelecimento de relações comerciais com a sociedade, assegurada que fica a ressarcibilidade dos danos que possam vir a sofrer em virtude desse relacionamento.”

39RAMOS, 2010, p. 313.

40 A maior inquietação que, a nosso ver, justifica a contratação do D&O Insurance prende-se com “o

administrador que desempenha o seu múnus com diligência e lealdade [e que] continua, apesar do seu desempenho, exposto de forma substantiva ao risco de responsabilidade.” Vide RAMOS, 2010, p. 242. Por

exemplo, as strikes suits, muito comuns na realidade norte-americana, são ações de responsabilidade civil intentadas contra o administrador, sem qualquer fundamento, apenas com o intuito de extorquir uma transação (settlement) favorável ao demandante. Veja-se, neste sentido, TRAUTMAN &ALTENBAUMER -PRICE, 2012, p. 3.

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A cobertura B garante a sociedade pelos montantes desembolsados a título de

corporate indemnification41 e a terceira cobertura (Side C) garante as responsabilidades

da própria sociedade comercial perante terceiros lesados.

As apólices de D&O começaram por ser contratadas individual e diretamente pelo administrador, que suportava o pagamento do prémio. O risco de ser condenado a indemnizar a sociedade, à custa do seu património pessoal, era, assim, transferido para o segurador. Com a expansão do mercado de D&O, o seguro continuou a ser contratado pelo administrador, mas em regime de “remuneração indireta.”42 Em ambas as

conjunturas, o administrador assumia a posição de segurado e de tomador do seguro. Atualmente, o mercado segurador impõe que a sociedade comercial assuma a posição de tomadora do seguro e suporte o pagamento do prémio, subscrevendo um seguro de grupo para todos os membros da administração, que figuram na apólice como segurados.

Nas palavras de ANTONIO RONCERO SÁNCHEZ,as próprias companhias de seguros

recusam a contratação do seguro de D&O individualmente por cada membro da administração segurado, antes impõem a contratação de um seguro de grupo pela sociedade comercial. Aliás, do ponto de vista prático, o seguro de D&O contratado para segurar todos os membros da administração da sociedade comercial permite ao segurador estimar com maior precisão o risco segurado e impede a ocorrência de lacunas de proteção, eliminando as dificuldades que poderiam surgir se cada administrador celebrasse um contrato de seguro com um segurador diferente.43

A construção do conteúdo típico da apólice de D&O Insurance permite conciliar e acautelar os interesses dos três intervenientes44 – segurador, tomador do seguro e

segurado. Por norma, o segurado transfere o risco para o segurador, não tendo de

41 Relativamente ao funcionamento da corporate indemnification, RAMOS (2010, pp. 264 e 267)esclarece

que “a cobertura fornecida pelo Side B está dependente do pagamento pela sociedade de uma franquia de valor considerável, enquanto a Side A não tem essa franquia associada. A prática veio mostrar que as sociedades decidiam não prestar a corporate indemnification, de modo a forçarem o funcionamento do

Side A (…) e evitar a franquia. A indústria seguradora reagiu a este comportamento das sociedades,

introduzindo a chamada «presumptive indemnification provision». Quer ela significar que existindo uma reclamação, é presumido que a sociedade prestou a corporate indemnification aos administradores no limite do que é legalmente permitido. Ou seja, quanto aos montantes correspondentes a esta presunção de prestação de corporate indemnification, os administradores não receberão qualquer quantia do segurador, porque se presume que eles a receberam da sociedade (ainda que tal não tenha efetivamente acontecido).”

42Fringe benefit – tradução vide VASCONCELOS, 2007, p. 14.

43 Cfr. SÁNCHEZ, 2004, p. 10 e, no mesmo sentido, RAMOS (2010, p. 311) explica esta prática negocial

com “razões de economia de escala na contratação do seguro e de regularização dos sinistros” salientando “a prevenção de litígios entre seguradoras na hora de gerir um sinistro provocado por administradores que são solidariamente responsáveis e dificuldades no exercício do direito de regresso entre administradores segurados e não segurados”.

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suportar as despesas de defesa e as indemnizações em que seja condenado à custa do seu património pessoal (Side A). A sociedade comercial tomadora do seguro transfere a sua responsabilidade para o segurador, que lhe garante os montantes desembolsados a título de corporate indemnification e as responsabilidades da própria perante terceiros (Side B e Side C).45

ELISABETE RAMOS salienta as diversas vantagens económicas suscetíveis de

impulsionar a contratação do seguro D&O pela sociedade comercial, nomeadamente “a captação e recrutamento de pessoas que, na ausência do seguro, não estariam dispostas a servir como administradores; a facilitação no recrutamento de administradores independentes; a redução da aversão ao risco do administrador protegido pelo seguro; a assunção, por parte dos administradores, do nível de risco adequado e, por conseguinte, o incremento do dinamismo da gestão; a redução dos custos reputacionais conexionados com reclamações de responsabilidade; a intensificação da vigilância exercida sobre os administradores; e a proteção do património social, quando a cobertura do risco de responsabilidade civil cobre a responsabilidade perante a sociedade.” 46 Por sua vez, o

segurador tem o interesse próprio em evitar o conluio entre o administrador segurado e o terceiro lesado e de que o segurado seja absolvido das imputações de responsabilidade ou, em caso de condenação, que a indemnização seja a mais baixa possível.47

A maioria das apólices de D&O Insurance são tailor made48, isto é, permitem que as partes possam negociar e contratar a apólice mais vantajosa, adequando-a à sua concreta realidade empresarial e delimitando o risco, mediante a materialização dos factos, sujeitos, espaço e tempo abrangidos pela mesma.

Neste sentido, acrescentam TRAUTMAN E ALTENBAUMER-PRICE que “o seguro de

D&O não é padronizado e é largamente negociado e minutado para ir ao encontro das

necessidades de uma determinada empresa.”49

45 DIAS (2007, p. 320) refere que a “sociedade beneficia directa e indirectamente, do caucionamento, não

só porque assim se liberta de uma parte da responsabilidade perante terceiros, sendo esta assumida, por tranferência, pela seguradora, como, dependendo do tipo de cobertura contratada, a sociedade pode em certos casos, obter da seguradora o reembolso das indemnizações que, por força da responsabilidade que solidariamente assume com os seus dirigentes perante accionistas e outros terceiros, possa ser chamada a liquidar. (…) A sociedade pode ainda beneficiar (…) igualmente [da] cobertura de riscos tipicamente societários.”

46 Citamos RAMOS, 2010, p. 313.

47 Neste sentido, RAMOS (2010, p. 322 e 2012, p.188). 48 Feito à medida (tradução de RAMOS, 2010, p. 298).

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5.2 O D&O Insurance na Europa

A procura do D&O Insurance foi muito mais tardia na Europa, comparativamente à experiência norte-americana.

Refere ELISABETE RAMOS que “pese embora as diferenças que contradistinguem

cada um dos regimes, as ordens jurídicas europeias têm em comum uma matriz imperativa que impede convenções limitadoras ou excludentes de responsabilidade.”50

Por esse motivo, a procura do seguro de D&O justifica-se à luz da consagração de regimes de responsabilidade civil mais gravosos para o administrador no continente europeu.51 Porém, outros fatores revelaram-se necessários para que este seguro se

intrometesse verdadeiramente no seio da matriz europeia, nomeadamente a vulgarização dos seguros de proteção jurídica e de responsabilidade civil profissional52, a “pressão de

standards internacionais”53, a “internacionalização dos seguradores norte-americanos

especialistas nesta linha de seguro que o oferecem em todo o globo”54, a internacionalização das sociedades comerciais e dos mercados financeiros, a contratação de cidadãos europeus por sociedades norte-americanas sujeitando-os à intensa litigação, à legislação norte-americana e às suas políticas de Corporate Governance, obrigando os administradores a recorrer ao mesmo mecanismo de proteção – o D&O Insurance.

Nas palavras de PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, “O D&O Insurance veio a entrar na Europa através da Inglaterra e da Alemanha”, sendo atualmente acolhido e contratado nas ordens jurídicas europeias.55

No Reino Unido, a Section 233 – Provision of Insurance - Companies Act (2006) confirmou a licitude do seguro de responsabilidade civil contratado pela sociedade comercial. Na Alemanha, o Aktiengesetz (93, 2, 2.ª parte da AktG) permite, mas não impõe, que a sociedade comercial contrate o seguro para proteção dos seus administradores (D&O Versicherung). Na França, a sociedade comercial é, na

50 Cfr. RAMOS, 2010, p. 282. 51 Vide VASCONCELOS, 2007, p. 13.

52 A este respeito, RAMOS (2010, p. 289) refere que “na biografia do D&O Insurance convergem não só a

experiência norte-americana como a sua linhagem europeia. Esta última desenvolve-se a partir de seguros de proteção jurídica de gestores (na modalidade de cobertura de despesas legais) e de seguros de responsabilidade civil profissional destinados a advogados e outros profissionais que integrassem os conselhos de administração das sociedades. Também esta influência pode explicar (…) deficiências na cobertura, desta vez por não terem sido consideradas as especificidades dos regimes de responsabilidade dos administradores.” Para mais desenvolvimentos ver RAMOS, 2010, p. 319 e VASCONCELOS, 2007, p. 9.

53 Expressão usada por RAMOS (2010, p. 288), para se referir à pressão dos seguradores e resseguradores

norte-americanos que comercializavam o D&O Insurance.

54 Citamos RAMOS, 2010, p. 287.

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generalidade, a tomadora do seguro que subscreve a apólice, com cobertura tailor made, em que os dirigentes figuram como segurados (Code des Assurances). Questiona-se se a contratação do seguro pela sociedade a favor dos administradores, em determinadas circunstâncias, pode integrar o crime de abuso de bens sociais. Em Espanha, após a alteração ao art. 73 da Ley de Contrato de Seguro, em 1995, os entraves à contratação do seguro de responsabilidade civil dos administradores foram eliminados. Em Itália, por norma, os seguradores aceitam segurar a responsabilidade dos administradores perante os credores sociais (art. 2394.º do Codice Civile Italiano) e terceiros diretamente lesados (art. 2395.º do Codice Civile Italiano), não aceitando apenas, por vezes, segurar os administradores perante a sociedade comercial, a não ser em casos que a sociedade assuma o pagamento de um prémio adicional.

5.3 A licitude do D&O Insurance em Portugal

“Nas ordens jurídicas europeias de civil law, a doutrina revisita dois argumentos relativos à ilicitude do seguro financiado pela sociedade: o afrouxamento da diligência aplicada pelos administradores no desempenho do cargo e o desrespeito das proibidas [cláusulas de] exoneração e limitação da responsabilidade”.56

Seguindo este entendimento, o n.º1 do art. 74.º do CSC institui que “é nula a cláusula, inserta ou não em contrato de sociedade, que exclua ou limite a responsabilidade dos fundadores, gerentes ou administradores”, motivo pelo qual se equaciona a existência no art 74.º do CSC de um alegado obstáculo que impeça a contratação e o pagamento do seguro que cobre a responsabilidade civil dos administradores pela sociedade comercial.57

Porém, refere ELISABETE RAMOS que a disciplina do art. 74.º do CSC “não

constitui um entrave à contratação por parte da sociedade do seguro de responsabilidade civil dos administradores”58, salientando inclusive que “na praxis portuguesa o seguro

56 Cfr. RAMOS, 2010, p. 338.

57 O n.º2 do art. 396.º do CSC impede a sociedade de suporte os encargos relativos à contratação do

seguro de responsabilidade civil dos administradores.

58RAMOS (2013, p.872) refere que o art. 74.º do CSC não constitui um entrave à contratação do seguro de

D&O pela sociedade, baseando-se nos seguintes pontos: “a pressão das regras de responsabilidade civil sobre os administradores, embora diminuída mantém-se – especialmente porque se encontram excluídos da cobertura do seguro os comportamentos dolosos; o seguro não exclui ou limita a responsabilidade dos administradores, antes diminui o risco de os administradores pagarem as respetivas indemnizações; a sociedade, apesar de pagar o prémio, também é favorecida pelo seguro, pois permite que ela recrute pessoas que, sem o seguro, não estariam disponíveis para aceitar os vários riscos de litigância e

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de responsabilidade civil dos administradores é contratado pela sociedade que, por essa razão, paga o prémio.”59

ELISABETE RAMOS acrescenta que a transferência do risco de responsabilidade

civil operada pelo seguro de D&O não equivale a convenções de exclusão ou limitação de responsabilidade dos administradores, uma vez que “estes continuam a ser juridicamente responsáveis pelos factos ilícitos e de acordo com os mesmos pressupostos. O que ocorre com a celebração do seguro é que as consequências patrimoniais da referida responsabilidade são assumidas total ou parcialmente por um sujeito distinto de quem é declarado responsável.”60

No mesmo sentido, ANTONIO RONCERO SÁNCHEZ menciona que “na prática

predominam de forma abundante os pressupostos do contrato de seguro concluídos pela própria sociedade, uma possibilidade que foi discutida no passado, mas que hoje é inquestionável.”61 O ilustre autor acrescenta que “a contratação do seguro não constitui

um pressuposto de exoneração de responsabilidade dos administradores, sendo unicamente uma limitação em sentido económico.”62

5.4 As questões em torno do art. 396.º do CSC

O revogado art. 174.º do Código Comercial consagrava que os diretores teriam sempre de caucionar a sua gerência na forma estabelecida nos estatutos, e, no silêncio destes, pela forma determinada em assembleia geral, sem a qual não poderiam iniciar o exercício de funções.63

Aquando da elaboração do Projeto de Código das Sociedades Comerciais, RAÚL

VENTURA refletiu sobre a adequação das quantias ao caucionamento da

responsabilidade dos administradores, ponderando, já em 1980/81 “o risco de não haver administradores dispostos a prestar a caução.”64 Acabou por propor no projeto de

responsabilidade civil; também os credores sociais e terceiros são beneficiados pelo seguro; se os administradores fossem obrigados a pagar o prémio do seguro, seria natural que a sociedade os tivesse de reembolsar da respetiva importância, designadamente através do aumento das remunerações; a admissibilidade de a sociedade pagar o prémio tem ainda a seu favor o n.º2 do art.396.º - os encargos do seguro podem ser suportados pela sociedade na parte em que a indemnização exceda os limites fixados no n.º1 do art. 396.º do CSC.” 59Vide R AMOS, 2010, p. 338. 60Citamos RAMOS, 2010, p. 339. 61 Cfr. SÁNCHEZ,2004, p.10. 62 VideSÁNCHEZ, 2004, p. 5. 63 Cfr. art. 174.º Código Comercial. 64 Vide VENTURA, 1994, p. 200.

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Código das Sociedades Comerciais aquilo que é hoje o art. 396.º do CSC, “uma singularidade no contexto de legislações várias”65, assumidamente influenciado pelo art. 2387.º do Codice Civile Italiano, então revogado.66

No que respeita a consagração do art. 396.º no CSC, PEDRO PAIS DE VASCONCELOS critica ferozmente, dizendo que “constitui um velho vício português a dificuldade em harmonizar com os outros. (…) Neste domínio, como em muitos outros, o legislador não resistiu à tentação de legislar “à portuguesa”. Em vez de fazer como os demais, sem lhe ocorrer que está cada vez mais inserido num mundo globalizado e na União Europeia, principalmente numa matéria cosmopolita como é, em geral, o Direito Comercial e, em particular o direito das bolsas e dos seguros, o legislador nacional não resistiu a improvisar e a fazer diferente. E fez muito diferente.”67

Em 2006, o legislador português entendeu manter esta disposição normativa, introduzindo pequenas alterações68, relativamente à forma de caucionar a

responsabilidade dos administradores, mas criando sérias dúvidas em torno da sua interpretação.

Resulta, inequivocamente, do art. 396.º do CSC que a responsabilidade dos administradores tem de ser caucionada quando estes integrem a administração de sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação e de sociedades queultrapassem, durante dois anos consecutivos, dois dos seguintes limites - total do balanço de € 20.000.000, total de vendas líquidas e outros proveitos no valor de € 40.000.000 e/ou número de 250 trabalhadores empregados em média durante o exercício.

Esta caução, nos termos do art. 623.º do CC, pode ser prestada por meio de

depósito de dinheiro, títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por penhor, hipoteca ou fiança bancária.69

65 Citamos RAMOS, 2010, p. 323. No mesmo sentido, CÂMARA ( 2008, p. 58) refere que “o esquema de

cobertura obrigatória de responsabilidade dos principais titulares de órgãos sociais não deixa de ser um corpo estranho em termos comparatísticos.”

66 VENTURA (1994, p. 202) esclarece que o art.º 2387.º do Codice Civile Italiano, entretanto revogado pelo art. 24.º da Lei n.º 281 de 1985, influenciou o n.º1 do art. 396.º CSC.

67VASCONCELOS (2007, p. 37).

68 Alterações introduzidas através do DL n.º 76-A/2006, de 29 de Março.

69SERENS (2012, p. 78) indica a competência da assembleia geral que eleja os administradores para

selecionar a espécie de caução a ser prestada, referindo que inexistindo disposição sobre a espécie que deve revestir, cabe ao próprio administrador a escolha. Segundo RAMOS (2010, p. 329), “O seguro de

caução parece revelar uma certa inadaptação aos requisitos propostos pela nova redação do art. 396.º, 2. Na verdade, o seguro de caução não cobre danos patrimoniais, nem lucros cessantes; “é celebrado com o devedor da obrigação a garantir ou com o contragarante a favor do respectivo credor”; exige a identificação obrigatória do tomador do seguro e do segurado quando forem pessoas distintas; há

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Acrescenta o n.º2 do art. 396.º do CSC, que a caução pode ser substituída por um contrato de seguro a favor dos titulares de indemnizações70, cujos encargos não podem ser suportados pela sociedade, a não ser que este exceda o mínimo legal previsto no n.º1 do art. 396.º do CSC.

Nas sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado e nas sociedades que cumpram os critérios da alínea a) do n.º2 do art. 413.º do CSC, a prestação de caução pelos administradores é obrigatória, não podendo ser dispensada, nos termos do n.º3 do art. 396.º do CSC. Esta, contudo, pode ser opcionalmente substituída por um contrato de seguro a favor dos titulares de

indemnizações.

Confrontando com as características do seguro de D&O, facilmente depreendemos que o seguro plasmado no n.º 2 do art. 396.º do CSC não é o D&O

Insurance, uma vez que o pagamento do prémio do seguro não pode ser suportado pela

sociedade comercial, devendo ser efetuado pelo administrador que o queira contratar. Ainda assim, no processo de consulta pública referente à proposta de alteração ao CSC em 2006, a CMVM explicou que “interessaria [a inclusão dos vários potenciais titulares de indemnizações]71 de modo a estimular os seguros de responsabilidade civil dos administradores (D&O Insurance), que tão intensa utilização têm merecido no estrangeiro”.

A inclusão no art. 396.º do CSC dos vários potenciais titulares de indemnizações levanta uma questão que apenas confirma a impossibilidade de o seguro de D&O ser apto a substituir a prestação de caução pelos administradores, nos termos em que é configurado no n.º2 do art. 396.º do CSC. A caução deve ser prestada a favor dos

titulares de indemnizações, podendo “em alternativa ser substituída por um seguro

contratado com idêntica finalidade.72 Acontece, porém, que em princípio o seguro de D&O exclui da sua cobertura atuações dolosas dos administradores, como infra

desenvolveremos, pelo que, nessas circunstâncias, o seguro de responsabilidade civil

jurisprudência que admite a recupração do crédito pago pelo segurador mediante sub-rogação nos direitos do credor.” Para mais desenvolvimentos vide REGO,2011,p.422 e SIMÃO, 2013, p. 677.

70TRIUNFANTE (2007, p.387) refere que “as cauções referidas poderão ser substituídas por um contrato de seguro, já não a favor da sociedade, mas dos titulares de indemnizações, alteração que se compreende e felicita.”

71 Antes das alterações introduzidas com a reforma de 2006, CORREIA (1993, p. 594) já admitia a

possibilidade de a prestação de caução como modo de proteção dos interesses de acionistas e de terceiros contra eventuais atos ilícitos dos administradores.

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dos administradores não permite garantir o efetivo ressarcimento dos lesados titulares

de indemnizações.

5.5 Caracterização do Seguro de Responsabilidade Civil dos Administradores em Portugal

Embora o D&O Insurance seja inapto para substituir a prestação de caução, nos termos do art. 396.º do CSC, ELISABETE RAMOS refere que o “debate [em torno do

seguro D&O é] exclusivamente doutrinal, já que não se conhecem sentenças judiciais que se tenham debruçado sobre esta questão, nem disposições legais que expressamente proíbam a contratação do seguro pela sociedade [em Portugal].”73 Aliás, nas suas

palavras, “o seguro de responsabilidade civil dos administradores viveu durante muito tempo longe da praxis societária e seguradora portuguesas”, [mas] a experiência portuguesa recebe este seguro – e não devem restar dúvidas de que ele já faz parte da [nossa] realidade.”74

Para isso, “a indústria seguradora “construiu” um seguro de responsabilidade

civil, com características próprias, moldado em função das exigências do art. 396.º.”75

Porém, o seguro divulgado nas páginas da internet de diversas companhias seguradoras é na generalidade um produto muito idêntico ao D&O Insurance, ao admitir a contratação76 do seguro pela sociedade comercial, que assume a posição de tomadora do seguro, “com a obrigação de repercutir o valor dos prémios pagos na esfera dos administradores-segurados.”77 Por isso, concordamos com ELISABETE RAMOS e

“temos sérias dúvidas de que esta alternativa apresentada pela indústria seguradora cumpra o disposto no art. 396.º, 2.”78 Ainda assim, na prática, parece ser isso que acontece.

Em Portugal, o seguro de responsabilidade civil encontra-se “dotado de um acervo de características estabilizadas no seu percurso internacional”79, da qual resulta uma

certa tipicidade social.80

73 Vide RAMOS, 2010, p. 338. 74 CitamosRAMOS, 2010, p. 303. 75 Cfr. R

AMOS, 2013, p. 315.

76 Sobre o órgão competente para decidir a contratação do Seguro de D&O, vide R

AMOS, 2010, p.429.

77 Cfr. RAMOS, 2013, p.317. 78 Citamos RAMOS, 2013, p.317. 79 Vide RAMOS, 2010, p. 304.

80 No mesmo sentido VASCONCELOS (2007, p. 35) refere que “a apólice, incluindo as condições gerais, as

condições particulares e as exclusões, etc., deve ser interpretada de acordo com o tipo social do D&O

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