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Conhecimentos, atitudes e práticas sobre zika

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Academic year: 2021

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Artigo Original

Conhecimentos, atitudes e práticas sobre zika

Knowledge, attitudes and practice about zika

Resumo

No Brasil um surto causado pelo vírus zika foi relatado em 2015 e estima-se a ocorrência de 1,5 milhões de casos entre 2015 e 2016. Este trabalho pretende descrever conhecimentos, atitudes e práticas sobre zika em gestantes e puér-peras de uma maternidade de alto risco no estado do Rio de Janeiro. Objetiva traçar o perfil das mulheres, analisar as características socio-demográficas, clí-nico-epidemiológicas, investigar conhecimentos, atitudes e práticas sobre zika destas mulheres e construir um escore de avaliação do conhecimento sobre a doença. Trata-se de um estudo seccional realizado por meio de questioná-rio estruturado elaborado com base no modelo da OMS. A criação do escore (EFWC) permitiu a qualificação do grau de conhecimento sobre zika. A maior parte das gestantes e puérperas julgou insuficiente a informação que possui sobre zika (71%) em relação a sinais e sintomas (68,3%), causa (67,5%), pre-venção (61,8%) e consequências (57%). A partir do cálculo do escore, obser-vou-se que 1,6% das mulheres não tinham conhecimento algum sobre zika; 58,5% das mulheres tem conhecimento ruim ou inferior sobre zika. Não foi observada correlação entre renda, escolaridade ou idade da população deste estudo ao conhecimento sobre zika medido pelo escore.

Palavras-chave:

Conhecimento, atitude, prática, zika vírus.

Abstract

In Brazil an outbreak caused by the zika virus was reported in 2015 and an estimated 1.5 million cases were reported in 2015 and 2016. This paper aims to describe knowledge, attitudes and practices about zika in pregnant and postpartum women of a high risk maternity hospital in the state of Rio de Janeiro. It aims to trace the profile of women, analyze the demographic, clinical and epidemiological characteristics, investigate knowledge, attitudes and practices about zika of these women and build a knowledge assessment score on the disease. This is a sectional study car-ried out using a structured questionnaire based on the WHO model. The score (EFWC) was elaborated to assess the degree of knowledge about zika. Most of pregnant and postpartum women considered the informa-tion they had about zika insufficient (71%) regarding signs and symptoms (68.3%), cause (67.5%), prevention (61.8%), consequences (57%). The score revealed that 1.6% of the women had no knowledge about zika; 58.5% of women had poor or inferior knowledge about zika. No correla-tion was found between income, schooling or age of the study populacorrela-tion and knowledge about zika measured by the score.

Key words:

Knowledge, attitude, practice, zika virus.

Original

Monica Sá Bastos Forrester

Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fundação Oswaldo Cruz

Keila Mara Cassiano

Universidade Federal Fluminense

Rosa M. F. Teodósio

Global Health and Tropical Medicine (GHTM), Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), Universidade NOVA de Lisboa (UNL)

Philip J. Havik

Global Health and Tropical Medicine (GHTM), Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), Universidade NOVA de Lisboa (UNL)

Mayumi Duarte Wakimoto

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Introdução

O vírus zika, transmitido por mosquitos do género Ae-des, nomeadamente, Aedes aegypti, foi identificado pela primeira vez em 1947 em macacos Rhesus na Floresta zika em Uganda, quando se fazia monitorização da febre amarela silvestre. As primeiras infeções humanas foram relatadas em 1950 [1] no Uganda e na República Unida da Tanzânia. Outros surtos do vírus zika foram registra-dos em África, nas Américas, na Ásia e na região do Pa-cífico [2]. Até os anos 2000 os casos tinham ocorrido de forma esporádica, porém, em 2007 um surto foi rela-tado nas ilhas Yap, da Micronésia, seguido por um surto na Polinésia-francesa [3]. A transmissão fora da África demonstrou o potencial de propagação desta doença. No Brasil, um surto foi relatado em 2015 e estima-se a ocorrência de 1,5 milhões de casos entre 2015 e 2016. Supõe-se que a introdução do vírus no Brasil esteja rela-cionada com um evento esportivo em 2013, momento em que participantes da Polinésia-francesa terão entra-do no país. Logo em seguida foi descrita transmissão autóctone no nordeste do Brasile posteriormente no Rio de Janeiro [4,5]. A partir de 2016, entretanto, hou-ve um declínio no número de casos, coincidindo com o aumento de casos de chikungunya. Em 2016, foram registrados 216.207 casos prováveis de febre causada por ZIKV, sendo confirmados laboratorialmente o total de oito óbitos, sendo quatro deles no estado do Rio de Janeiro [6]. Em 2017, por sua vez, até a semana epide-miológica 50 haviam sido registrados 17.338 casos pro-váveis, com maior incidência nas regiões Centro-Oeste e Norte (38,8 casos e 12,5 casos/100 mil hab. respe-tivamente). Especificamente com relação às gestantes, no período compreendido entre as semanas 45 de 2015 e 40 de 2018 (08/11/2015 a 06/10/2018) haviam sido registrados 2.812 casos confirmados [6].

A infeção por ZIKV pode ser assintomática ou sintomá-tica e o período de incubação varia de 2 a 7 dias. Em geral, a doença tem um curso auto-limitado com dura-ção de 4 a 7 dias, sendo as principais manifestações clí-nicas: febre baixa (<38,5o C) ou ausente, erupções na pele, conjuntivite não purulenta, edema periarticular, mialgia, artralgia, astenia, cefaleia e linfonodomegalia. A transmissão ocorre através picada de fêmeas infetadas da espécie Aedes aegypti, e entre hospedeiros humanos por via transmissão sexual e vertical. O diagnóstico da doença pode ser realizado por métodos diretos, tais como: (1) pesquisa de genoma do vírus zika por trans-crição reversa seguida por reação em cadeia da polime-rase (RT-PCR) e; (2) isolamento do vírus em amostras

de sangue por inoculação em células e camundongos recém nascidos. O diagnóstico pode ainda ser realiza-do por métorealiza-dos indiretos, nomeadamente: (1) ensaio imunoenzimático ELISA, (2) teste de neutralização por redução de placas – PRNT, (3) inibição da hemagluti-nação e (4) estudo anatomopatológico seguido de pes-quisa de antígenos virais por imuno-histoquímica. Os testes sorológicos podem apresentar reações cruzadas com outros flavivírus [7].

A prevenção acontece, principalmente, por medidas que evitem a proliferação dos mosquitos, como a eli-minação de locais em que o mosquito possa procriar, com água parada, e o uso de larvicidas. Outras medidas visam garantir que seres humanos não tenham conta-to com o mosquiconta-to, como o uso de repelentes, roupas compridas e barreiras físicas como redes, telas, mosqui-teiros, e portas e janelas fechadas. Estratégias inovado-ras de controle biológico têm sido desenvolvidas como o uso da Wolbachia para redução da competência vetora de Aedes aegypti [8]. O uso de preservativos nas relações sexuais tem sido recomendado, bem como o adiamento de viagens para gestantes que se deslocam para áreas de risco, uma vez que não há vacinação específica contra o vírus zika. Não há tratamento específico, apenas trata-mento de suporte como repouso, ingestão de líquidos e uso de medicamentos para febre e dor [9].

1. Processo histórico do vírus zika

no Brasil

A possível ligação entre o vírus zika e os casos de micro-cefalia foi levantada pelas autoridades de saúde e espe-cialistas em novembro de 2015. A associação foi refor-çada com o isolamento do vírus, a partir de tecido ce-rebral fetal e fluido amniótico [10,11]. Posteriormente, estudos epidemiológicos encontraram evidências da associação [12,13]. Em 2016, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou emergência de saúde pública nas Américas, frente à situação epidemiológica relacio-nada à infeção com o vírus zika na gestação e anoma-lias congénitas, especialmente microcefalia [14]. Foram elaboradas recomendações apontando a necessidade de reforçar a vigilância, preparar laboratórios para dete-ção adequada do vírus e confirmadete-ção laboratorial da infeção, eliminar os mosquitos, formar e preparar as equipas multiprofissionais para orientar e cuidar da po-pulação na prevenção da transmissão, minimização de sintomas e incentivo para pesquisas de investigação do vírus e suas complicações [14]. Esse quadro representou

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uma nova e desafiadora ameaça epidemiológica para as populações em países com arboviroses endémicas. No mesmo ano, o Ministério da Saúde publicou o Protoco-lo de Vigilância e Resposta à ocorrência de Microcefalia e/ou Alterações do SNC com o objetivo de orientar profissionais de saúde e vigilância para o atendimento de pessoas com microcefalia e/ou alterações no SNC sugestivas de infeção congênita [5]. Se, inicialmente a zika estava apenas relacionada com infeções humanas esporádicas caracterizadas por uma doença semelhante à dengue, passa a ser reconhecida como uma ameaça à saúde global. O verdadeiro impacto da doença é prova-velmente subestimado e há evidências de que a infeção assintomática seja frequente[3,15].

A OMS desenvolveu uma metodologia para avaliação de conhecimentos, atitudes e práticas, denominada “KAP” (knowledge, attitudes and practice), em relação a diferentes doenças e agravos [16]. Assim, pretende-se construir uma base de dados capaz de contribuir para preencher lacunas existentes nos conhecimentos, atitu-des e práticas neste grupo específico de mulheres em idade fértil (faixa etária de 10 a 49 anos). Além disso, dados e resultados encontrados podem fornecer evidên-cias para melhor compreensão dos fatores que influen-ciam a infeção, em especial na população de gestantes e puérperas. Desse modo, será possível colaborar com autoridades de saúde no desenvolvimento de políticas e estratégias educativas adequadas para orientação sobre riscos e prevenção do vírus.

As formas de divulgação de informações qualificadas e atualizadas sobre zika podem não ter o impacto neces-sário sobre a população de áreas endêmicas para arbovi-roses. Ressalta-se a validade da investigação no que diz respeito a apoiar a implementação de estratégias para prevenção e controle, assim como para divulgação de informação e orientação correta e oportuna aos resi-dentes em áreas endêmicas para arboviroses.

O presente estudo visou descrever conhecimentos, ati-tudes e práticas sobre zika em gestantes e puérperas atendidas em uma maternidade de alto risco do Estado do Rio de Janeiro, Brasil.

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo seccional e descritivo, com abor-dagem quantitativa. O trabalho foi realizado na mater-nidade do Hospital Estadual Adão Pereira Nunes, situa-da no Município de Duque de Caxias, Estado do Rio de Janeiro. Esta é considerada maternidade de alto risco,

ou seja, um serviço hospitalar com capacidade tecnoló-gica e o perfil de recursos humanos em conformidade com os critérios para a referência à gestação de alto ris-co [7]. Foram incluídas gestantes e puérperas ris-com ida-de maior ou igual a 18 anos, pacientes ida-desta maternida-de maternida-de alto risco, no período maternida-de setembro a outubro maternida-de 2018. A partir dos dados do atendimento, a população de interesse tinha o tamanho de 1200 casos. A seleção da amostra foi feita por método aleatório sim-ples: para cada nova paciente atendida no acolhimento no período da coleta de dados, lançava-se uma moeda para saber se a paciente ia participar ou não da pesquisa. Caso a face da moeda voltada pra cima fosse cara, a pa-ciente era incluída na amostra, e se a face fosse coroa, a paciente não era incluída na amostra, respeitando o di-reito da paciente de desejar participar ou não da pesqui-sa. No período designado para coleta de dados, foi ob-tida uma amostra de 123 mulheres do universo de 1200 mulheres definido anteriormente. As pacientes foram convidadas a participar da pesquisa na sala de acolhi-mento da maternidade e foi solicitada a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), após a leitura do documento. Foi considerado como critério de exclusão: “mulheres que foram selecionadas pela segunda vez a participar da pesquisa”. Consideran-do-se uma seleção por amostragem aleatória simples, a margem de erro global resultante d foi calculada pela seguinte fórmula:       − = N n pq z d 1 1 .

Aqui,

z

refere-se ao valor da variável aleatória com distribuição normal padrão para o qual o valor da fun-ção de distribuifun-ção acumulada é igual a (1−a)/2

(

a

=

nível de confiança). Sendo assim, o valor de

z

está intimamente ligado ao intervalo de confiança dese-jado. No presente caso, usamos um intervalo de con-fiança de 95%, cujo valor correspondente a esta área na curva normal é de 1,96; p é a estimativa preliminar da proporção de interesse e q=1− p. Devido à in-suficiência preliminar de estimativa para as proporções desejadas, e à variedade de proporções estimadas neste trabalho, o produto pq foi substituído pelo seu valor máximo: 0,25.

n

é o tamanho da amostra e N é o tamanho da população. Sendo assim, o presente estudo está sujeito a erros máximos de 8,4% nas proporções estimadas, considerando o nível de 95% de confiança. Os dados foram coletados a partir de um questionário elaborado para a pesquisa, com base no modelo desen-volvido pela Organização Munidal de Saúde para

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ava-liação de conhecimentos, atitudes e práticas em relação a zika [16] e foram dispostos em um banco de dados do programa Epidata, versão 3.1. A análise estatística dos dados foi feita através do programa IBM SPSS, versão 22.0. Foram calculadas proporções de interesse para todas as variáveis e cálculo de mínimo, máximo, média, mediana, desvio padrão, coeficiente de variação – para as variáveis quantitativas. A variabilidade da distri-buição de uma variável quantitativa foi considerada

bai-xa se , moderada se

e alta se . A normalidade da distribuição de uma variável quantitativa foi avaliada pelos testes de Kolmogorov Smirnov e Shapiro Wilk. A distribuição da variável foi considerada normal apenas se ambos os tes-tes concluíssem que a distribuição era normal, ou seja, se ambos os testes apresentassem valor maior que o nível de significância de 5%. A associação en-tre duas variáveis quantitativas foi investigada por análise de correlação, pelo coeficiente de correlação de Spearman. A significância do coeficiente de relação foi avaliada pelo teste do coeficiente de cor-relação, pelo qual conclui-se que um coeficiente é significativamente não nulo se o p-valor do teste for menor que o nível de significância 0,05. A ção foi considerada forte se o coeficiente de correla-ção apresentasse valor absoluto maior que 0,7. Todas as discussões foram realizadas ao nível de significân-cia máximo de 5% ou seja, foi adotada a seguinte re-gra de decisão nos testes de significância estatística: rejeição da hipótese nula sempre que o p-valor asso-ciado ao teste foi menor que 0,05.

A partir das respostas para as questões que avaliam o conhecimento sobre zika, foi definido e proposto o cálculo de um escore, denominado “Escore Forrester Wakimoto Cassiano” (EFWC) que avalia o conheci-mento global do entrevistado sobre a zika e os fato-res associados a ela. A seguir são listadas as questões incluídas na construção do escore e a pontuação dada de acordo com as respostas do entrevistado.

Questão 1 – Quem pode contrair zika?

O respondente ganha 0,5 ponto se responder “Todas as pessoas” ou ganha 0,1 ponto para cada uma das outras al-ternativas que responder: “homens adultos”, “mulheres adultas”, “mulheres grávidas”, “crianças”, “adolescentes”. Pontuação máxima a somar no escore: 0,5.

Questão 2 – Como pode ser transmitido o vírus zika?

O respondente ganha 0,3 ponto para cada uma das

respos-tas correrespos-tas que marcar: “mosquitos” e “relações sexuais” Pontuação máxima a somar no escore: 0,6.

Questão 3 – Como uma pessoa pode contrair zika?

O respondente ganha 0,2 ponto para cada uma das res-postas corretas que marcar: “picada de mosquito”, “atra-vés de relações sexuais”, “atra“atra-vés de um vírus”, “atra“atra-vés de uma transfusão de sangue” ou “transmissão de mães para filhos”.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0.

Questão 4 – Quais são os sintomas de zika?

O respondente ganha 0,2 ponto para cada sintoma cor-reto que marcar.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0.

Questão 5 – É possível evitar zika?

O respondente ganha 0,75 ponto se responder "sim" e 0,3 ponto se responder "talvez".

Pontuação máxima a somar no escore: 0,75.

Questão 6 – Como se pode evitar zika?

O respondente ganha 0,1 ponto para cada uma das res-postas corretas que marcar.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0

Questão 7 – Existe tratamento para zika?

O respondente ganha 0,75 ponto se responder sim e 0,3 ponto se responder "talvez2.

Pontuação máxima a somar no escore: 0,75

Questão 8 – Qual é o tratamento para zika?

O respondente ganha 0,4 ponto para primeira resposta correta que marcar dentre as respostas corretas “repou-sar bastante”, “tomar medicamento para febre e dores”, “beber muito líquido” e 0,3 para cada uma das demais respostas que marcar.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0

Questão 9 – Se uma mulher grávida tiver zika, quais os riscos que ela corre?

O respondente ganha 0,4 ponto para primeira resposta correta que marcar dentre as respostas “pode adoecer”, “corre o risco de aborto espontâneo”, “pode ter dificul-dade no parto” e 0,3 para cada uma das demais respos-tas que marcar.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0

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quais os riscos para o feto/bebé?

O respondente ganha 0,2 ponto para cada resposta que marcar, uma vez que todas as respostas propostas são corretas.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0

Questão 11 – O que é microcefalia?

O respondente ganha 1,0 ponto se mostrar que sabe algo sobre microcefalia.

Pontuação máxima a somar no escore: 1,0

Questão 12 – Acha que existe uma li-gação entre zika e microcefalia?

O respondente ganha 0,4 ponto se responder “sim” e 0,2 ponto se responder “talvez”

Pontuação máxima a somar no escore: 0,4

O escore ficou assim definido: a soma dos pontos ob-tidos pelo respondente nas questões de 1 a 12 supra-citadas. De acordo com a pontuação máxima de cada questão, o escore varia de 0 a 10 e é uma medida do conhecimento geral do entrevistado sobre o que já se sabe sobre zika. A classificação do conhecimento do entrevistado de acordo com o valor do seu escore fica definida conforme relação exibida no Quadro 1. O projeto foi submetido ao Comité de Ética do Insti-tuto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz. CAAEE: 58085816.2.0000.5262

Resultados

No total foram entrevistadas 30 puérperas e 93 ges-tantes. Apenas o grupo das gestantes apresentava queixas (88/93). O sintoma mais frequente foi lom-balgia (54,5%). Observou-se maior concentração de mulheres no último trimestre de gestação (81,7%). O perfil socio-demográfico da população de gestantes e puérperas entrevistadas está descrito na tabela 1. A idade variou de 18 a 42 anos, mediana 23 anos e mé-dia 24,8 anos, CV=0,26 . A renda familiar variou de 1 a 3 salários mínimos, média e mediana de 1,5 salários mínimos, CV= 0,37. A renda per capita variou de 0,2 a 1,5 salários mínimos, com média e mediana de 0,3 salários mínimos, CV=0,52. O número de pessoas na família foi de 2 a 8, com média de 4,6 e mediana de 4, CV=0,26.

O conhecimento das participantes sobre zika foi in-vestigado (tabela 2) incluindo questões sobre quando e como ouviram falar de zika e em quem confiam para

obter informações sobre zika. A maior parte das res-postas (77,2%) apontou para o conhecimento por meio da imprensa (radio/televisão/jornais) e pelo agente de saúde em segundo lugar (13,8%), que também foi apontado como aquele em quem as mulheres mais con-fiam para dar informações sobre a doença. A maior par-te das gestanpar-tes e puérperas julgou insuficienpar-te a infor-mação que possui sobre zika (71%) em relação a sinais e sintomas (68,3%), causa (67,5%), prevenção (61,8%), consequências (57%).

A partir das respostas das mulheres às questões dispos-tas na tabela 2, foi calculado o Escore FWC de conhe-cimento sobre zika (tabela 3). A distribuição do escore apresentou média de 3,0, desvio padrão 1,89 e mediana 3,29 (0-6,32), c.v. 0,63. A matriz de correlação (tabela 4) demonstra que em nenhum par de variáveis há forte correlação (< 0,7).

Atitudes e práticas

A maior parte das mulheres tem dúvidas sobre a atitu-de atitu-de evitar a graviatitu-dez frente a uma epiatitu-demia atitu-de zika, desconhece os motivos e a forma de evitar a gravidez. Embora parte das respostas aponte para a discriminação contra um bebé com microcefalia, há também incerteza quanto ao tipo de discriminação Destacou-se o “pre-conceito pelo facto de ser diferente” dentre as respostas que afirmam haver discriminação (tabela 5).

O percentual de mulheres que realiza práticas de pre-venção em relação à infeção por ZIKV foi menor em relação às que não tomam medidas ou as desconhecem, com destaque para o uso de repelente de mosquitos no corpo e a remoção de água parada/estagnada. Pelo menos metade das mulheres acha que o governo não tomou algu-ma medida para proteger a população contra zika e quase todas as mulheres não sabem citar ações do governo contra Escore Forrester Wakimoto Cassiano de

conhecimento sobre zika (EFWC) Classificação do conhecimento sobre zika EFWC=0,0 Nenhum conhecimento

0,0 < EFWC ≤2,0 Conhecimento Muito Ruim 2,0 < EFWC ≤4,0 Conhecimento Ruim 4,0 < EFWC ≤6,0 Conhecimento Moderado 6,0 < EFWC ≤8,0 Conhecimento Bom 8,0 < EFWC <10,0 Conhecimento Muito Bom EFWC=10,0 Total Conhecimento

Quadro 1: Classificação do conhecimento do entrevistado de acordo com o valor do Escore FWC

(6)

Variável Global n=123 F % Idade 18 - 21 44 35,8 21 - 24 20 16,3 24 - 27 13 10,6 27 -30 11 8,9 30 - 33 12 9,8 33 - 36 11 8,9 36 - 39 11 8,9 39 - 42 1 0,8 Cor Branca 17 13,8 Preta 82 66,7 Parda 24 19,5

Escolaridade Ensino Fundamental Incompleto 39 31,7

Ensino Fundamental Completo 36 29,3

Ensino Médio Incompleto 28 22,8

Ensino Médio Completo 20 16,3

Estado de Naturalidade Não respondeu 44 35,8

Alagoas 1 0,8

Bahia 1 0,8

Rio de Janeiro 76 61,8

São Paulo 1 0,8

Município de Residência Não respondeu 52 42,3

Duque de Caxias 43 35,0 Magé 1 0,8 Nilópolis 1 0,8 Paracambi 1 0,8 Rio de Janeiro 24 19,5 Salvador 1 0,8

Tem abastecimento público de água Não 28 22,8

Sim 78 63,4

Não tem resposta 17 13,8

Precisa armazenar água por interrupção no

abastecimento de água Não 15 12,2

Sim 88 71,5

Não tem resposta 20 16,3

Atividade de trabalho Não Trabalha 101 82,1

Faxineira 4 3,3

Serviços Gerais 4 3,3

Vendedora de Cosméticos Por Revistas 4 3,3

Cuidadora de Idoso 3 2,4 Cozinheira 2 1,6 Diarista 2 1,6 Costureira 1 0,8 Manicure 1 0,8 Técnica de Enfermagem 1 0,8

Renda familiar Não respondeu 4 3,3

Até 1 salário mínimo 34 27,6

1 a 2 salários mínimos 72 58,5

2 a 4 salários mínimos 13 10,6

Número de pessoas na família 2 6 4,9

3 6 4,9

4 56 45,5

5 20 16,3

(7)

Questão F %

Quem pode contrair zika Todas as pessoas 71 57,7

Homens Adultos 1 0,8

Mulheres Adultas 1 0,8

Gestantes 15 12,2

Adolescentes 1 0,8

Não sabe/ não tem resposta 36 29,2

Como pode ser transmitido o vírus zika

Mosquitos 92 74,8

Água Poluída 5 4,1

Ambiente 3 2,4

Vírus 2 1,6

Não sabe/ não tem resposta 31 25,2

Como uma pessoa pode contrair zika Picada de mosquito 93 75,6

Não sabe/ não tem resposta 31 25,2

Febre 74 60,2

Sinais e Sintomas de zika Dor de Cabeça 60 48,8

Erupção Cutânea 47 38,2

Dores Articulares 24 19,5

Diarreia 1 0,8

Não sabe/ não tem resposta 46 37,4

É possível evitar zika Não 8 6,5

Sim 36 29,3

Talvez 34 27,6

Não sabe/ não tem resposta 45 36,6

Como se pode evitar zika Usar repelente de mosquito durante o dia 63 51,2

Remover água parada/estagnada 60 48,8

Cuidar das plantas com higiene não deixar água nos vasos 59 48,0

Cobrir caixa d’água 13 10,6

Limpar/Esfregar recipientes de armazenamento de água 10 8,1

Pulverizar ou vermifugar a casa 6 4,9

Usar vestuário que cubra o corpo 5 4,1

Usar mosquiteiro à noite 4 3,3

Usar tela nas janelas 3 2,4

Usar Larvicida 1 0,8

Evitar ir para mato e não ir a cachoeira 1 0,8

Imunidade boa e alimentação 1 0,8

Beber água potável 1 0,8

Não sabe/ não tem resposta 34 27,6

Qual é o tratamento para a zika? Repousar bastante 16 13,0 Tomar medicamentos para baixar a febre e aliviar as dores 57 46,3

Alimentação forte 1 0,8

Beber muito líquido 21 17,1

Não sabe/ não tem resposta 10 8,1

Tabela 2: Conhecimento sobre zika

6 30 24,4

7 4 3,3

8 1 0,8

Renda per capita estimada (em salários mínimos) 0,1-0,5 97 78,9

0,5-0,9 21 17,1

0,9-1,3 1 0,8

(8)

Riscos que uma mulher grávida corre se tem zika Pode adoecer 71 57,7

Correr risco de aborto espontâneo 1 0,8

Pode ter dificuldades no parto 36 29,2

Não sabe/não respondeu 34 27,6

Riscos para o feto/bebê se a gestante tem zika Não crescer ou não se desenvolver normalmente 92 74,8

Microcefalia 31 25,2

Deficiência 16 13,0

Aborto espontâneo 5 4,1

Nascimento prematuro 3 2,4

Nascer morto 2 1,6

Não sabe/não respondeu 26 21,1

O que é microcefalia Não sabe/não respondeu 76 61,8

Cabeça pequena 25 20,3

A cabeça não se desenvolve 6 4,1

Cérebro pequeno. 5 4,1

Cérebro não cresceu 2 1,6

Criança com má formação no cérebro 2 1,6

A cabeça diminui 1 0,8

Cabeça feia 1 0,8

Cabeça funda e pequena 1 0,8

Cabeça mal feita 1 0,8

Criança com problemas no cérebro. 1 0,8

Deficiência no cérebro 1 0,8

Pessoa doente 1 0,8

Acha que existe relação entre zika e Microcefalia Não sabe/ não respondeu 46 40,4

Não 8 6,5

Sim 37 30,1

Talvez 32 26,0

Em quem confia mais para lhe dar informação

rigorosa sobre zika? Família 8 6,5

Na igreja/por líder religioso 2 1,6

Agentes de saúde 86 69,9

Médico 21 17,1

Rádio/ Televisão/ Jornais 9 7,3

Internet 10 8,1

Enfermeiro 2 1,6

Escore FWC de conhecimento

sobre zika Classificação do conhecimento sobre zika

Global n=123

F %

EFWC=0,0 Nenhum conhecimento 2 1,6 0,0 < EFWC <=2,0 Conhecimento Muito Ruim 38 30,9 2,0 < EFWC <=4,0 Conhecimento Ruim 32 26,0 4,0 < EFWC <=6,0 Conhecimento Moderado 50 40,7 6,0 < EF WC<=8,0 Conhecimento Bom 1 1,6 8,0 < EFWC <10,0 Conhecimento Muito Bom 0 0,0 EFWC=10,0 Total Conhecimento 0 0,0 p-valor do teste de Kolmogorov Smirnov <0.001 ; p-valor do teste de Shapiro Wilk <0.001. Tabela 3: Distribuição de frequências do Escore FWC

(9)

Tabela 4: Matriz de correlação das variáveis quantitativas do estudo

Tabela 5: Distribuição de frequência das respostas sobre os problemas que podem acometer mulheres gestantes com zika Escore FWC Renda Per

Capita

Renda em

Salário Idade Escolaridade Escore FWC 1,00 0,32 0,33 0,50 0,45 Renda Per Capita 0,32 1,00 0,66 0,19 0,32 Renda Familiar 0,33 0,66 1,00 0,22 0,23 Idade 0,50 0,19 0,22 1,00 0,30 Escolaridade 0,45 0,32 0,23 0,30 1,00 QuestãoF Global N=123 F %

As mulheres devem evitar engravidar por

causa da zika Não 21 17,1

Sim 10 8,1

Talvez 90 73,2

Não tenho resposta 2 1,6

Por que motivo deve uma mulher evitar

engravidar por causa da zika Pode adoecer 6 4,9 Poderá ter dificuldades no parto 1 0,8 O bebê corre o risco de nascer com deficiência 4 3,3 Como deve uma mulher evitar engravidar Usando preservativo /pedir ao parceiro que use em todas as relações

sexuais 3 2,4

Usando pílulas anticoncepcionais 7 5,7 Usando contraceptivos Injetáveis 2 1,6

Não tenho resposta 1 0,8

Se uma mulher tiver um bebê com microcefalia ou outra deficiência é discriminada ou estigmatizada por causa da criança

Não 8 6,5

Sim 48 39,0

Talvez 19 15,4

Não tenho resposta 48 39,0

Discriminação que a criança com microcefalia

sofre Preconceito por ser diferente. 24 19,5

Maus tratos 15 12,2

Bullying 4 3,3

As pessoas olham diferente/ acham esquisito 3 2,4

As pessoas falam mal. 3 2,4

As pessoas são más/ruins 2 1,6

Família não aceitar. 2 1,6

Rejeição/exclusão da sociedade 2 1,6

(10)

Questão F % Desde que ouviu falar

do zika, tomou alguma medida para evitar contrair a doença?

Não 42 34,1

Sim 46 37,4

Não tem resposta 35 28,5

Quais medidas Uso de repelente de mosquitos no corpo 44 35,8

Remoção de água parada/estagnada 41 33,3

Limpeza com esfregaço da fonte de água / unidade de armazenagem / recipientes 8 6,5 Colocação de tampas sobre a fonte de água / unidade de armazenagem / recipientes 8 6,5 Pulverização ou fumigação da minha casa 4 3,3

Uso de larvicidas 2 1,6

Colocação de redes nas janelas ou portas 2 1,6

Limpeza da casa 3 2,4

Não tem resposta 2 1,6

Por que motivo não tomou medidas para evitar contrair zika?

Não estou em risco / a minha família não está em risco 3 2,4 Não tenho recursos nem acesso a medidas preventivas 4 3,3 Não tenho tempo para tomar medidas de prevenção 5 4,1 Não acredito que as medidas preventivas sejam eficazes 2 1,6 Não sei como evitar contrair o zika 36 29,3

Não é possível evitar o zika 3 2,4

Não tem resposta 5 4,1

O governo tomou alguma medida para o proteger/ à sua família / à sua comunidade contra zika?

Não 69 56,1

Sim 15 12,2

Talvez 10 8,1

Não tem resposta 29 23,6

Que medidas foram

tomadas? Não sabe/não tem resposta 111 90,2

Informação pela televisão 4 3,3

Depende da população cumprir as informações para evitar o mosquito 1 0,8

Divulgação e informação da doença 4 3,3

Pesquisas 1 0,8

Quando foi a última vez em que limpou/ esfregou a sua fonte de água / unidade de armazenagem / recipientes de água?

Há 1-7 dias 1 0,8

Há mais de uma semana 1 0,8

Há mais de um mês 1 0,8

Há 2-6 meses 14 11,4

Há 7-12 meses 12 9,8

Há mais de um ano 25 20,3

Nunca limpou/ esfregou a fonte de água / unidade de armazenagem/ recipientes 46 37,4

Não tem resposta 23 18,7

Como limpou e protegeu na última vez a sua fonte de água / unidade armazenagem / recipientes de água?

Esvaziou toda a água e voltou a encher 3 2,4 Esvaziou o recipiente e o esfregou com uma solução de sabão, antes de voltar a enchê-lo 45 36,6 Colocou tampas sobre a fonte de água / unidade de armazenagem / recipientes 7 5,7

Não tem resposta 22 17,9

Não se aplica 46 37,4

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zika. A prática de limpeza de unidades de armazenamento de água nunca foi realizada por 37,4% das entrevistadas, no entanto, mais de um terço realizam o procedimento adequadamente (tabela 6).

Discussão

O escore desenvolvido para o estudo mostrou que 1,6% das mulheres não tinha qualquer conhecimento prévio sobre zika e mais da metade da população tinha conheci-mento ruim ou muito ruim sobre zika. A situação epide-miológica recente do Brasil e a descoberta da associação entre zika e microcefalia [12,13,18], levaram à declaração da infeção como emergência de saúde pública internacio-nal pela OMS [14]. Este facto teve grande impacto e foi amplamente divulgado na mídia nacional e internacional no período 2016-2017. O conhecimento sobre a doença foi ampliado neste período, inclusive em países onde não há circulação do vírus [19,20]. Em nosso estudo, a maioria das entrevistadas desconhecia o que era “microcefalia” e sua relação com zika na gestação. Reconhecer a relação causal entre o vírus zika e microcefalia é de essencial importância para a indicação de tratamento e estimulação precoce das crianças que nascem com microcefalia e outras alterações neurológicas, em locais especializados, de modo a favo-recer o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças afetadas.

Nenhuma das mulheres entrevistadas citou a possibilidade de transmissão sexual do vírus, o que aponta para o limi-tado conhecimento sobre esta forma de transmissão como observado em outros estudos [21,22]. Esta é uma ques-tão especialmente importante, já que envolve a ampliação do risco para áreas sem a presença do vetor, relacionado a viajantes regressando de áreas endêmicas. Ademais, dentre as participantes que afirmaram que as mulheres deveriam evitar a gravidez, a maioria indicou a pílula anticoncepcio-nal e não o uso de preservativos como método contracep-tivo mais importante. O uso de preservacontracep-tivos como prática para prevenção contra a doença também foi pouco citado em outros estudos [21-23].

O perfil socioeconómico das mulheres foi tipicamente de uma população de maioria jovem, da cor preta, com ensi-no fundamental incompleto, que não trabalha, tem renda familiar de 1 a 2 salários mínimos e 4 membros na família, com renda per capita de 0,1 a 0,5 salários mínimos. Um dado conflitante diz respeito ao abastecimento de água, re-ferido como presente, porém com interrupções frequen-tes, o que leva a necessidade de armazenamento de água. A despeito da situação de vulnerabilidade social observada,

não foi observada correlação entre renda, escolaridade ou idade da população deste estudo ao conhecimento sobre zika medido pelo escore. Isto pode ser parcialmente expli-cado pelo facto de ser uma amostra homogénea quanto ao nível socio ecónomico, não sendo representativa de toda a população do estado do Rio de Janeiro, com diferentes estratos socio-económicos.

As mulheres responderam corretamente que todas as pes-soas podem contrair zika e a causa de zika mais lembrada foi o mosquito, também lembrado como modo de trans-missão da doença. Embora tenha sido restrito o conheci-mento da população quanto à etiologia viral da doença, foi observado o conhecimento do vetor como implicado na transmissão, o que é essencial quanto às medidas de pre-venção das arboviroses em geral. As práticas mais lembra-das pelas mulheres foram relacionalembra-das ao vetor, como re-mover água parada, cuidar das plantas. Em contrapartida, mais de um terço das mulheres declararam nunca ter lim-pado ou esfregado a fonte de água, a unidade de armazena-gem e recipientes de água e mesmo dentre as que fizeram não foram observados tempo e procedimentos adequados. O uso de repelente tem sido apontado como um impor-tante fator de proteção das gesimpor-tantes no sentido de evitar a doença [24]; neste estudo foi citado em pouco mais da metade das respostas da amostra.

O sintoma da zika mais citado pelas participantes foi febre, seguido de cefaléia e exantema. A literatura tem demons-trado que a doença pode cursar sem febre ou com febre baixa, sendo um importante sinal o exantema, muitas ve-zes presente sem febre [4]. A maior parte das gestantes e puérperas julgou insuficiente a informação que possui so-bre zika, o que também foi observado em outros estudos [21,23]. Quanto aos riscos na gestação as respostas foram pouco específicas como “pode adoecer” e “dificuldades no parto” e o risco mais apontado para o feto foi o de “não crescer ou não se desenvolver normalmente”, porém mais da metade relatou desconhecer os riscos. Mais da metade das mulheres não tomou qualquer medida para evitar con-trair a doença ou não respondeu. Quando indagadas sobre o motivo de não tomarem medidas para evitar contrair zika, a falta de conhecimento sobre como evitar contrair zika foi o motivo mais citado.

Portanto, além das lacunas na informação, parece não haver clareza no sentido de gerar atitudes e práticas de prevenção e mitigação dos riscos. Pelo menos metade das mulheres entende que o governo não tomou qualquer medida para proteger a população contra zika e quase todas as mulheres não sabem citar ações do governo contra a doença. Considera-se, entretanto, que mesmo com um nível de co-nhecimento baixo sobre o assunto a maioria das mulheres

(12)

declarou saber que ao suspeitar de zika, a pessoa deve ir a um centro de saúde ou procurar um médico particular. A referência à procura de um centro de saúde parece es-tar alinhada à indicação dos agentes comunitários de saúde (ACS) como aqueles em quem mais confiam para obten-ção de informações rigorosas sobre zika. O ACS é um pro-fissional de nível médio que integra a equipa da Estratégia de Saúde da Família (ESF) que compõe a atenção primária à saúde do país. Sua atuação consiste em exercer mediação entre a equipe profissional da ESF e a comunidade, sendo fundamental para a prestação de serviços em saúde e para a qualidade do atendimento, assim como para lidar com as potencialidades e limitações da rede de assistência25 . Uma vez que os agentes comunitários moram na mesma comunidade em que atuam, os moradores têm mais proxi-midade, confiança e maior facilidade de comunicação com tais profissionais, que têm condições de conjugar o saber técnico à educação popular em saúde [26].

Quarenta por cento das mulheres acham que podem ser discriminadas ou estigmatizadas por causa da criança com microcefalia ou outra deficiência. As formas de discrimi-nação mais citadas foram preconceito e maus tratos. Esta é uma situação relatada no cotidiano das mães que, diante da necessidade de acompanhamento do desenvolvimento das crianças, enfrentam dificuldades de acesso aos serviços de saúde, transporte e passam a vivenciar a curiosidade públi-ca e a discriminação pela síndrome do zika [27].

Uma relevante contribuição deste trabalho foi o desenvol-vimento do escore para mensurar o conhecimento de um indivíduo sobre o zika. O uso deste escore, ao mostrar o nível de conhecimento de um indivíduo, grupo social ou de uma população específica, pode auxiliar a dinamizar e orientar as operações de prevenção, controle e combate ao zika vírus em diversas áreas, principalmente as endê-micas. Uma vez definido, o EFWC pode ser aplicado para outras populações, de diferentes localizações geográficas de risco, a grupos específicos como viajantes, profissionais e estudantes da área de saúde, dentre outros. Ressalta-se que a definição da escala do escore será aprimorada, revista e atualizada pelos autores à medida que mais descobertas sobre zika forem obtidas pela comunidade científica, já que o conhecimento sobre a infeção e sua dinâmica vêm sendo atualizados.

As limitações do estudo se relacionam ao facto deste abor-dar uma dada população, com características específicas e em território delimitado, sendo característico dessa reali-dade. Portanto, sugere-se para estudos futuros, amostras maiores e que envolvam maior abrangência geográfica, ou mesmo outros territórios, de forma randômica, para

sus-citar outras análises. Os dados obtidos podem ser usados para estudos, assim como pesquisas estratégicas em diver-sas populações para futuras análises comparativas. A identificação de um novo vírus capaz de causar malfor-mações congênitas, e o conhecimento já produzido, prin-cipalmente ao longo dos últimos quatro anos, são suficien-tes para direcionar o foco da atenção para as gestansuficien-tes e população em idade fértil.

Conclusões

O estado do Rio de Janeiro, local deste estudo, é o segun-do estasegun-do com a maior densidade populacional segun-do Brasil, possui atributos importantes para a reprodução dos veto-res, como temperatura, umidade, topografia e urbanização desordenada, além de ser um local de grande circulação de pessoas por ser uma cidade turística. Localiza-se na região sudeste do país, tendo como limites os estados de Minas Gerais, na parte norte e noroeste, com o Espírito Santo na parte nordeste, e São Paulo na parte sudoeste, além de fazer fronteira com o Oceano Atlântico na parte leste e sul, proporcionando fácil acesso de entrada de pessoas, bens e mercadorias. Medidas de prevenção, informação e cuidado frente a epidemias, combate às zoonoses, com informação da população, são fatores importantes, bem como o inves-timento na qualificação de recursos humanos e na estrutu-ra paestrutu-ra manter os sistemas de vigilância epidemiológica em pleno funcionamento.

Verifica-se a necessidade de desenvolver e ativar políticas públicas que proporcionem informação, conhecimento e direcionem corretamente atitudes e práticas da população na prevenção e controle de zika. Fica evidente a necessi-dade de repensar técnicas, modelos e formas de ampliar a comunicação com a população no intuito de disseminar o conhecimento sobre a doença e medidas de prevenção diante da situação de risco em uma região endêmica. Ini-ciativas de ampliação do acesso ao conhecimento científico devem ser estimuladas no sentido de traduzir as evidências e comunicar os resultados à sociedade.

Agradecimentos

À equipe de saúde da Maternidade do Hospital Adão Pe-reira Nunes pelo acolhimento e apoio para a realização do trabalho de campo. A Fabio Neves pelo apoio na formata-ção dos dados.

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Conflitos de interesses:

Os autores declaram que não existem conflitos de interesses.

Referências

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