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Vista do Ressignificações urbanas. A cidade e suas efervescências múltiplas

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Ressignificações urbanas: a cidade e suas efervescências

múltiplas

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Luana Jorge Aquino Aluna do Curso Técnico em Administração, da ETEC/Lorena-SP Caroline Oliveira Pil dos Santos Professora da Rede Estadual de Ensino, da cidade de Pindamonhangaba-SP Luiz Antonio Feliciano Professor do UniFATEA-Centro Universitário Teresa D’Ávila, em Lorena-SP

Resumo

O presente trabalho traz os resultados de uma pesquisa de iniciação científica (modalidade ensino médio) que teve como objetivo problematizar significações da cidade de Lorena (SP), a partir das fotografias de seus espaços urbanos realizadas pelos próprios habitantes. Intencionou-se também discutir a identidade dos sujeitos que dão vida à cidade, sob o olhar de jovens entre 15 e 18 anos. O projeto ancorou-se na importância de se discutir as identidades que se constroem na experiência efetiva do lugar e que são transportadas através da multiplicidade de suportes comunicacionais que aportam as relações humanas. Os passos que configuraram a investigação foram regados à luz de teóricos que percorrem esses itinerários com mais frequência e calçados pela abordagem sócio-histórica. A tríade – fotografia, identidade e cidade – procurou promover um encontro subjetivo entre as falas dos sujeitos que colaboraram com a pesquisa. Olhar para essas temáticas possibilitou reconhecer-se integrante de um espaço compartilhado pela diversidade e multiplicidade subjetiva, que se embatem, se interpolam, se completam e se constroem mutuamente.

Palavras-chave

Cidade; narrativa; fotografia; ressignificação; multiplicidade.

Abstract

This work is the result of a research of scientific initiation that had as objective to problematize the significations of the city of Lorena, SP, from the visual constructions of its urban spaces stamped in the photographs of its inhabitants. It was intended to discuss the identity of the subjects that give life to the city, under the gaze of young people between 15 and 18 years. The project was justified by the importance of discussing the identities built in the actual experience of the place and transported through multiple narratives. The steps taken to configure the research were watered in the light of theorists who travel these itineraries more frequently and based on the socio-historical approach. Photograph, identity and city formed the triad that tried to promote the subjective encounter between the lines of the collaborating subjects of the research. Looking at these themes allowed us to recognize ourselves as part of a space shared by diversity and subjective multiplicity, which is complete and mutually constructive.

Key words

City; narrative; photography; reassignment; multiplicity.

1 Uma versão reduzida desse trabalho foi apresentada no XVII Encontro Latino Americano de Pós-Graduação (XVII EPG), realizado na Universidade do Vale do Paraíba, nos dias 26 e 27 de outubro de 2017, com o título (Multipli)cidades: vivências e

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1. Introdução

Os espaços urbanos frequentemente aparecem nas produções imagéticas, sobretudo a fotográfica, dos sujeitos que vivenciam a dinamicidade inerente a toda urbanidade. Por esse viés, pode-se buscar nessas imagens produzidas problematizações que caracterizem o pertencimento do indivíduo à cidade e as relações que fomentam uma identificação com o local. Uma identidade construída na vivência intensa e constante do lugar, que é, também, fixada e conduzida pelas diversas linguagens que inscrevem as narrativas vivenciadas. Inscrições essas que auxiliam nas rememorações e recordações. A fotografia é um desses modos de armazenamento os resíduos dos momentos vividos. Os instantes fotográficos congelam o espaço e o tempo. Os lugares da cidade contribuem enormemente na construção das subjetividades, pois são os locais da experiência e da convivência múltipla. Públicos ou privados, nessas localizações acontecem o encontro altero entre as pessoas. Cada uma, do seu modo, se ressignifica a todo instante, a partir da sua vivência. A dinâmica da cidade possibilita essa ressignificação, pelo constante movimento múltiplo que lhe é inerente na contemporaneidade (CANEVACCI, 2007; 2004.).

O olhar dos jovens nascidos em determinada cidade é de suma importância para problematizar as apropriações dos espaços e as ressignificações que nascem desse estar lá. Esse modo de ver, particular de uma geração nascida sob as mudanças sócio-política-econômicas ocorridas nos últimos tempos, principalmente, sobre o paradigma da territorialidade, mediado pelo avanço das tecnologias da informação, oferece peculiaridades muitas vezes reverberadas nos discursos de outras gerações. José Saramago diz que “para conhecer uma coisa há que se dar-lhe uma volta, dar uma volta toda”2. Nesse sentido, ao problematizar a identificação do cidadão lorenense com a cidade de Lorena (SP) e as ressignificações dos espaços urbanos vividos, possibilita-se, igualmente, entender, um pouco mais, a importância do espaço vivenciado na construção subjetiva do indivíduo. Da mesma maneira, pode-se compreender a influência das pessoas nas mudanças ocorridas na cidade, sobretudo, nos seus espaços de socialidade. O presente trabalho procura apontar algumas dessas nuanças, com a certeza de que os apontamentos apresentam-se apenas com estopim para outras discussões mais pontuais e consistentes. Espera-se, assim, conseguir voltar o olhar para questões cotidianas que borbulham nos “quatro cantos” da cidade.

2. Referencial teórico

As reflexões sobre o olhar e o ver acontecem desde a geração grega, por diversos autores. O Padre Antônio Vieira já mostrava, no século XVII, a questão do olhar como uma representação, pois, para ele, o olho não vê coisas, mas imagens de coisas que significam outras coisas. Para Bosi (1988), existe também grande diferença entre o olho e o olhar. O olho é o órgão receptor e o olhar configura-se como uma ação interna do sujeito que busca informações e significações.

Ferrara (2008) afirma que a cidade é um meio de transmissão de cultura, que passa valores e histórias entre as gerações. Por isso, o pesquisador, ao olhar para a cidade, necessita disciplinar seu olhar, suficientemente, para atentar para os espaços urbanos, assim como para as ruas concentradas por pessoas que diariamente passam depressa e quase não se falam. Montoya Uriarte (2013) diz que a rotina é um fator que atrapalha olhar os lugares porque torna o espaço homogêneo. Portanto, a disciplina visual permite ao olho ver somente espaços vazios da cidade. Os espaços urbanos apresentam vários estímulos para o transeunte e o

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pesquisador: estímulos visuais, táteis, olfativos, sonoros etc. Esses estímulos acabam ocasionando um olhar disperso que estimula as pessoas a se desatentarem a olhar ao seu redor.

Nesse sentido, para aqueles que se propõem a observar a cidade, seja um pesquisador ou um observador comum, torna-se necessário obter um olhar sensibilizado para conseguir ver o espaço urbano urbanizado. Aquela vivência que transforma a polis (projeto) em urbs (urbanidade) (PAIS, 2005). Para Montoya Uriarte (2013), a rotina, a velocidade, a dispersão e a baixa definição das linguagens não verbais são as quatro dificuldades para ver a cidade na sua efervescência. É necessário, então, na realidade, algo oposto, pois olhar a cidade é um processo demorado, lento, que obriga o pesquisador a ver o espaço em inúmeras ocasiões, durante longo período de tempo, um dia após o outro. A autora acredita que o que os nossos olhos veem depende da forma como olhamos. Por isso, é preciso ver com paixão e não com indiferença, raiva ou desprezo, é preciso educar o olhar. E para que isso ocorra o pesquisador não pode falar com as pessoas deve apenas vê-las: seus gestos, seus percursos, seus ritmos (MONTOYA URIARTE, 2013).

O olhar sensível para ver a cidade identifica brechas, fissuras, desníveis, descontinuidades, vazios, passagens num espaço visto como homogêneo. Assim, o olhar preparado para ver a cidade – consciente, perseverante, sensível – é capaz de estranhar e detectar os microespaços que marcam os espaços, que os informam e os tornam legíveis e suscetíveis de serem apreendidos. O ambiente tem formas, materiais, tons, cheiros, luminosidade, imaginabilidade, memórias coletivas e individuais e presença de determinados equipamentos que, em seu conjunto, propiciam certos usos e desmotivam outros (MONTOYA URIARTE, 2013). Portanto, é necessário construir um olhar para ver a cidade, acima de tudo, que supere as formas de ver marcadas pela rotina, a velocidade, a dispersão e a baixa definição das linguagens não verbais dos espaços urbanos.

IMAGEM 1: Ipês colorindo a Av. Peixoto de Castro, em Lorena-SP. Foto: Liu Feliciano – 07/09/2015

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Por este motivo, propõe quatro ângulos de observação que permitem o desenvolvimento de quatro técnicas de apreensão do espaço urbano, porém, há uma quinta técnica: a fotografia. A fotografia é outro olhar que reconstrói, a sua maneira, o real, e que nos proporciona outra experiência perceptiva (MONTOYA URIARTE, 2013). E ainda pode ser empregada pelo usuário, como uma forma de falar daquilo que, pelo hábito, torna-se difícil ser verbalizada. Silva (2001, p.171) procura trazer para o âmbito do estudo da paisagem cultural, seja ela urbana ou rural, discussões tendo por base o uso da fotografia enquanto recurso tecnológico. E afirma que nos estudos de paisagem cultural, existe uma prioridade metodológica nas informações visuais (SILVA, 2001, p.172). Uma paisagem cultural revela a relação dos indivíduos com suas subculturas locais, como também com os valores dominantes nacionais e transnacionais. Penetrar neste universo da fotografia significa entender um pouco sobre a utilização que historicamente vem tendo esta técnica no Brasil, desde a segunda metade do século passado.

Com as transformações que ocorrem na paisagem urbana da cidade, desde construções às mudanças de nomes de ruas e inaugurações de praças e monumentos, pode-se dizer que os instantes fotográficos passam a ser o registro dessas mudanças. Segundo Silva (2001), a fotografia faz parte da intimidade familiar através dos álbuns de família, da burocracia estatal, dos registros pessoais e dos registros de obras públicas, além, ainda, dos acervos de fotógrafos profissionais e amadores. E estes registros acontecem por motivos afetivos e sentimentais, por prazer artístico, por consciência da importância do registro, por razões comerciais etc. O documento fotográfico revela a veracidade do que nele está expresso e isso ocorre independente da intencionalidade do fotógrafo, portanto, não se pode negar a relevância da fotografia na análise da paisagem urbana. Silva (2001) afirma que o texto fotográfico, difere dos demais documentos utilizados na pesquisa, cuja linguagem é predominantemente escrita. A fotografia para ser analisada precisa de um contexto para a sua interpretação, visto que enquanto fragmento da realidade, dos cenários e personagens, a fotografia é um documento visual para o estudo da memória urbana que revela informações e, ao mesmo tempo, emoções da narrativa fotografada (SILVA, 2001.).

Como linguagem, as imagens são “discursos”, “nos quais e pelos quais se efetua a reunião das representações coletivas”, tornando o imaginário social “inteligível e comunicável”. A organização da forma pela percepção origina um sentido imanente e tece

IMAGEM 2: Moradores de Lorena (SP) aguardam a passagem do trem, em cruzamento em nível existente no centro da cidade. Foto: Liu

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esse fio de costura, que mantem a cidade ligada às suas imagens. (TOMAZ, 2002, p.436). A fotografia suscita lembranças e emoções variadas servindo, então, como auxílio para recompor a memória individual e coletiva. Um recurso que contribui com a memória na tentativa de recompor o passado representado e vivido. Neste caso, o uso da imagem melhorou o processo de comunicação e de compreensão da realidade social e a fotografia uma vez registrada, possui vida própria e, enquanto documento, pode ser utilizada para diversos fins. Caberá, portanto, ao pesquisador, contextualizá-la conforme a sua própria orientação. A recomposição da memória urbana de uma cidade é fundamental para a apreensão de uma visão mais abrangente da realidade local, pois possibilita a captação e a identificação das singularidades locais. Isso contribui para um melhor encaminhamento das práticas e políticas urbanas locais.

Para Tomaz (2002), as fotografias como qualidade de testemunho e revelação atribuída às imagens do passado da cidade tornam-se especialmente fortes se forem fotografias ou cartões postais, que se tornaram populares, e sua circulação foi cada vez maior, sendo editados em almanaques, revistas, e em grande parte, remetido para o exterior. Atualmente, a internet dá conta de veicular esses vestígios do passado. Essa difusão formou um novo olhar, educado para a fotografia, redefinindo os valores estéticos do público. Na relação de percepção dessas imagens, agiriam também valores próprios às técnicas fotográficas e de reprodução mecânica que aumentam o valor de autenticidade do referente. Esse transitar por alguns teóricos procurou apontar o tópos por onde se pretendeu olhar e perscrutar o movimento dinâmico da cidade.

3. Metodologia

Para que o desenvolvimento prático do trabalho se concretizasse foi pedido para um grupo de jovens, entre 15 e 18, fazerem algumas incursões sobre a cidade de Lorena (SP). Nessas andanças, a proposta era para que eles fotografassem os lugares que achassem importantes e, depois, que os classificassem em ordem decrescente. Em seguida, os jovens falaram sobre os critérios utilizados para as escolhas feitas. As histórias que as fotografias suscitaram tiveram relevância para promover um diálogo com os colaboradores que valorizasse as suas falas e suas inferências sobre a cidade. As entrevistas foram desenvolvidas a partir da ótica do método sócio-histórico. Para Maria Teresa Freitas:

IMAGEM 3: Estação e pátio nos anos 1930 (Autor desconhecido). Fonte: http://www.estacoesferroviarias.com.br/l/lorena.htm acesso em

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A entrevista se constitui como uma relação entre sujeitos, na qual se pesquisa

com os sujeitos as suas experiências sociais e culturais, compartilhadas com

as outras pessoas de seu ambiente. Assim pesquisador e pesquisado passam a ser parceiros de uma experiência dialógica conseguindo se transportarem da linguagem interna de sua percepção para a sua expressividade externa, entrelaçando-se num processo de mútua compreensão. (2003, p. 36. Grifo

da Autora.).

Esse tipo de abordagem privilegia uma valorização ainda maior às experiências vividas de cada participante da pesquisa. Uma abordagem da cidade ou na cidade que resulta intersecções e convergências pode ser classificada como socioantropológica (HOMOBONO MARTÍNEZ, 2003, p. 21). Antropologia e sociologia se tangenciam e se inter-relacionam nesse tipo de pesquisa. De toda maneira, uma abordagem nesses trâmites se caracteriza pela observação informal e pelo contato aberto e franco com os colaboradores. Isso se fez necessário para que a quimera de uma não-interferência não transformasse uma conversa entre duas pessoas em dois monólogos diferentes: um do entrevistado, no momento da entrevista, e outro do entrevistador, nas suas inferências, mais tarde, sobre o material recolhido. Para:

As relações intersubjetivas e as relações de saberes que se estabelecem entre pesquisador e pesquisado trazem trajetórias de vida e de experiências que revelam a complexidade das relações sociais e a totalidade da realidade social. (MOLON, 2008, p. 59.).

A partir das transcrições foram realizadas as análises das falas dos interlocutores, relacionadas ao olhar proposto nas fotografias para se abordar a cidade e à visão que alguns teóricos têm sobre essa temática. Uma construção balizada pelos saberes culturais construídos na trajetória de vida dos pesquisadores.

A pesquisa foi inscrita no SISNEP com o CAAE 59217416.0.0000.5431 e aprovada pelo Comitê de Ética com o Número de Parecer 1.714.745.

4. Resultados e discussões

Abordar esse objeto e deixar fluir a essência que emana da vicissitude inerente à cidade foi lançar-se ao mar com a certeza de que as ondas e o vento iriam conduzir para algum lugar, mesmo sem saber, ao certo, onde se iria chegar. A entrevista com quatro jovens contribuiu para mostrar a importância que o espaço ganha ao ser vivenciado. Nas permanências nos ambientes vai se construindo uma relação de pertencimento e tomando a forma do local. É o que fica evidente na fala de uma das entrevistadas, quando lhe foi perguntado sobre a importância dada ao local fotografado (imagem 04). “A importância é fundamental; foi lá que aprendi a valorizar a atividade física e descobrir o quanto meu corpo é capaz”. (Entrevistada 01 – 06/12/2016.).

Nesse espaço, transformado em lugar pela presença constante das relações humanas, sobretudo, àquelas voltadas ao esporte e à saúde física, a entrevistada encontra o seu “cantinho” de bem estar. Um estar bem consigo mesma proporcionado pela ressonância que o lugar oferece. A ressonância, como aponta Thibaud (2012), não permite que se permaneça apático ao seu redor. Ela impulsionada uma vibração com o lugar, no lugar e pelo lugar. Não dá pra dissociar o sujeito do objeto (SANSOT, 2004).

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Percebeu-se também como o lugar propicia as narrativas que constroem os sujeitos e ficam, desse modo, impregnadas em suas memórias. Isso se reforça com a fala de outro jovem colaborador: “este lugar é muito importante, pois eu moro aqui desde sempre e passei vários momentos da minha infância brincando aqui (entrevistado 04)”.

As partes que configuram o lugar tornam-se uma extensão dos sujeitos que ali passam parte da sua vida. Acontece com a casa, a escola, o trabalho. Constrói-se uma memória que por mais individual que possa parecer é sempre a composição de uma memória coletiva (HALBWACHS, 1990), construída das relações que se configuraram no tempo e no espaço. Recorda-se do ambiente em que se viveu e das pessoas que fez parte daquela convivência. Novamente, o entrevistado 04 ajuda a reforçar essa ideia quando fala da rua retratada em sua

IMAGEM 4: Fotografia do arquivo pessoal da entrevistada que mostra sua atividade física, no Centro Social Urbano (CSU).

IMAGEM 5: Fotografia do arquivo pessoal do entrevistado 04 que mostra a rua onde ele cresceu.

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IMAGEM 6 - Fotografia do arquivo pessoal da entrevistada que mostra o espaço abandonado da antiga Fábrica GA.

fotografia (imagem 05) e da importância que esse lugar tem em sua vida: “tudo, pois aqui eu brincava com meus amigos, eu brincava com minha vó, que tenho muita saudade, e, como eu disse, nasci aqui”.

A cidade é esse todo que comporta as diversas nuanças que variam pela efervescência da multiplicidade de situações que a dinamiza. Uns espaços mais vívidos que outros, em determinado tempo. Noutros momentos, o movimento oscilatório dos nódulos humanos vai mudando o foco e outros espaços tornam-se mais evidentes e mais borbulhantes. Uma mobilidade vivaz, porém, arrítmica. Na contemporaneidade, a urbanidade torna a cidade mais cinésica, que, por sua vez, retroalimenta essa motilidade. As relações no grupo e entre os grupos contribuem para que nada seja estático. Nesse ponto, a comunicação desempenha o seu papel. Suas diversas formas de linguagem contribuem para a pulverização das experiências. Assim, compartilha-se uma vivência que se multiplica exponencialmente e corrobora para dar visibilidade aos espaços da cidade. E desses espaços compartilhados criam-se os lugares e suas eventualidades do aqui e agora. Como salienta Massey (2008, p. 201), “não será o mesmo ‘aqui’, quando não for o ‘agora’”. Outra jovem (entrevistada 02) cita o G. A. (antiga fábrica abandona, no Bairro Santa Edwirges) como lugar que ela mais gosta. Ela sempre ouviu falar do local. Que os amigos iam lá pra tirar fotos. Ela acabou indo lá pelo mesmo motivo: fazer algumas fotos. A partir daí, e com a proximidade com a sua casa, a jovem começou a frequentar mais o local. “Sempre que posso, eu vou lá. É tipo um "santuário" sabe? Não sei explicar...” Esses não-sei-explicar é que cimenta a relação entre as pessoas e potencializa as reconfigurações dos espaços da cidade. Uma fábrica abandonada torna-se um santuário pela vivência diferenciada do lugar. Um reaproveitamento do espaço (SOLÀ-MORALES, 1996) que dá vida a um local que possibilitava cair no esquecimento, pois as memórias morrem, sobretudo, aquelas que não viraram mito.

Conclusão

Olhar a cidade é um exercício tão rotineiro que a torna quase sempre invisível. Somente um olhar atento pode identificar rupturas dessa cotidianidade sem se deixar influenciar pela pressão que a mecanicidade instaura. Nesse sentido, o presente trabalhou procurou problematizar a cidade a partir do olhar fotográficos de jovens que a vivenciam cotidianamente. Desse modo, a fotografia foi utilizada para pontuar a percepção que as jovens e os jovens entrevistados têm da cidade. De toda maneira, essa abordagem pode contribuir

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para reforçar a necessidade de se abrir os olhos para as reconfigurações que a cidade se submete, sobretudo, a partir das novas tecnologias de imagem.

É com a câmera na mão que os jovens produzem parte dos seus discursos que reverberam nas redes sociais online. Nas imagens da cidade reforçam-se as memórias individuais e coletivas inscritas nos espaços urbanos. Por vezes, essas fotografias acabam se tornando a própria cidade, dada a força referencial que a imagem fotográfica adquiriu. É importante estar atento a essas construções visuais e, como contraponto, é importante continuar fotografando a cidade. Espera-se, contudo, que o trabalho tenha contribuído para uma visão mais substancial sobre as ressignificações que a cidade sofre, principalmente, a partir da juventude e as suas apropriações urbanas.

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