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Dias Quentes, Noites Longas: Educação Ambiental no Fórum Social Mundial 2002

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ESPAÇOS DA

EDUCAÇÃO

AMBIENTAL

DIAS QUENTES, NOITES LONGAS:

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO FÓRUM SOCIAL MUNDIAL 2002

Rodrigo Barchi 1

A identificação do inimigo, entretanto, não é fácil, levando -se em conta que a exploração não é propensa a ter lugar específico, e que estamos imersos num sistema de poder tão profundo e complexo que já não podemos determinar uma diferença ou medida específica. Sofremos a exploração, a alienação e o comando, como sofremos nossos inimigos, mas não sabemos localizar onde se produz a opressão. E apesar disso, ainda resistimos e lutamos. (Hardt; Negri ).

O jornal Zero Hora, do dia 3 de fevereiro de 2002, domingo, publicou na primeira página, uma fot o tirada do alto de um prédio localizado próximo ao Parque da Harmonia, ao lado do rio Guaíba.

A foto mostrava centenas de barracas que estavam armadas, aglomeradas uma ao lado da outra. E ram de estudantes (ou mesmo de ex -estudantes, ou até de não estudantes) que se abrigaram naquele local para participar do 2º Fórum Social Mundial.

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Cerc a de quinze mil campistas, que ali se alojaram por não ter achado vagas nos hotéis – não havia mais vagas em Porto Alegre e em muitas cidades próximas, como Gramado, já há um mês antes do Fórum – ou por optarem estar no próprio acampamento para participar das atividades que ali iriam acontecer.

E nesta foto, entre as centenas de barracas ali mostradas, consegui achar a minha. Isso devido à várias faixas e bandeiras que estavam expostas próximas ao lugar onde eu havia me alojado, e também às barracas que estavam vizinhas, todas maiores, com capacidade para quatro ou mais pessoas.

Na qual estava, mal cabíamos eu e minha bagagem. Aliás, metade dela.

A ida

A viagem de São Paulo à Porto Alegre dura geralmente cerc a de dezoito horas. O ônibus segue pela B R-116 até Curitiba, e durante a ida foi o único trajeto no qual pude observar e aproveit ar as paisagens da região sul do Estado de São Paulo.

Ao mesmo tempo no qual observa-se a exuberância do que resta da Mata Atlântica, misturada à cultura da banana, dava para ter uma pequena idéia do grau de pobreza que assola essa que é provavelmente a região paulista mais pobre, com as pequenas cidades que margeiam a estrada com humildes e desgastados casebres.

Saí de São Paulo às duas da tarde do dia 28 de janeiro, e cheguei à capital dos pampas às sete da manhã do outro dia.

Dia o qual foi o segundo da reunião preparatória para a Conferência sobre Meio Ambiente realizada em agosto de 2002, em Johannesburg, na África do S ul. Também chamada de RIO + 10, devido aos dez anos passados desde o evento ocorrido no Rio de Janeiro em junho de 1992.

Tendo como sede o prédio 40 da P ontifícia Universidade Católica de Porto Alegre, muitas das palestras e debates da reunião preparatória para a RIO + 10 estavam impossíveis de serem assistidas, como as de Vandana Shiva no dia 29, e a de Moacir Gadotti, Frei B etto e Leonardo Boff (o qual não estava escalado na programação) – no dia 28.

Como não estava animado a assistir as conferências por telão em uma out ra sala – pois preferia ver os debates ao vivo – fiquei visitando os estandes das ONG’s que ali estavam divulgando seu trabalho, sendo a grande maioria delas gaúchas, como a Coolméia, a qual está traduzindo e publicando a revista inglesa The Ecologist no Brasil.

Chegando

Ao chegar na rodoviária de Porto Alegre fui recebido pela Mariana, com quem já havia conversado várias vezes por telefone e e-mails antes da viagem. Ela iria encaminhar -me para ficar na casa de amigos seus em Porto Alegre at é que eu conseguisse me instalar.

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Fomos então até a casa do Frederico, um aposent ado professor de Geografia de ensino público que mora num conjunto de prédios junto ao Hipódromo Cristal, próximo à região sul da cidade, onde pude tomar um b anho e trocar de roupa após mais de vinte e quatro horas. O Felipe também iria receber um out ro amigo da Mariana, o Márcio, vindo da região do Vale do Paraíba, onde mora em um sítio do qual é proprietário.

Na hora do almoço, fomos almoçar em um restaurante no c entro da cidade. Durante a conversa – quando na verdade, em grande parte quem estava conversando eram os três, pois a fome com a qual estava quas e que me impedia de falar – ouvi muito sobre remédios, tratamentos e siglas, os quais fiquei sem entender.

Foi quando a Mariana percebeu o quanto eu estava fora da conversa e resolveu explicar-me do que tratava o assunto.

Os três haviam se conhecido durante as sessões de reuniões de soropositivos – portadores do HIV – mas tinham em comum o fato que haviam abandonado o tratamento por coquetéis e outros medicamentos “oficiais”, e estavam seguindo terapias alternativas. Devido a isso, eram considerados dissidentes dentro dos próprios gr upos de tratamento.

Eu não havia recusado a hospitalidade do Frederico nem da Mariana, mas eu havia ido à cidade de Porto Alegre com a intenç ão de me virar sozinho, tanto que na chegada já tinha comigo itinerários de ônibus, programação do Fórum, mapa da cidade – como todo bom geógrafo – e fui decidido a me hospedar no ac ampamento.

Tanto não recusei a hospitalidade que pousei na casa do Frederi co durante a primeira noite, e onde deixei quase met ade da minha bagagem – algumas roupas e um cobertor – assim como o material que ganhei durante a RIO + 10.

Rumo à Johannesburg

No dia trinta de janeiro, já era muito grande o clima de Fórum Social Mundi al na PUC-RS e em toda Porto Alegre. Pela cidade estavam esp alhados cartazes e imensas faixas de “Bem-vindos!”, em vários idiomas, principalmente nas avenidas principais.

Mas ainda ocorria o Fórum P reparatório da RIO + 10, apesar do intens o movimento de delegados, ouvi ntes e jornalistas para o Fórum Social.

Talvez esse tivesse sido o motivo do relativo es vaziamento do último dia de debates do Fórum Preparatório. Melhor para mim, que pude ver e ouvir as palestras de Erminia Maricato (P rofessora do Depart ament o de Arquitetura e Estudos Urbanos da USP), R uvem Pesci (President e do Fórum Latino -Americano de Ciências Ambientais), e de Gers on de Almeida (Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre), no painel “Meio A mbiente, Pobreza e Cidades Sustentáveis”.

Melhor até do que as palestras – a palestra de Ermínia Maricato, a melhor do dia, tentou quebrar inúm eros mitos a respeito da s uposta sustentabilidade de Curitiba, mostrando o quanto as suas favelas

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prosperavam nas periferias da capital paranaense – eram os comentários do professor Marcos Reigota e de Nilson Moulin, o qual estava irritadíssimo, pois iria mediar os debat es durante o primeiro dia, mas foi “trocado” na última hora.

O grande momento do painel foi quando, durante o tempo no qual o público presente poderia faz er seus comentários e perguntas aos palestrantes, e o Gerson de Almeida respondia algumas questões, uma senhora, aparentando pouco mais de sessenta anos, levantou-se de sua cadeira e começ ou a repreender, de forma extremamente indignada, os integrantes da mesa.

Pelo pouco que pude ouvir – principalmente porque, quando grande parte da platéia se mostrava atônita, e outra parte se mostrava “indignada com a manifestação fora de hora”, o Nilson Moulin gritava em italiano: “Dá-lhe o microfone! Dá-lhe o microfone!” – ela parecia ser uma antiga militante do movimento ambientalista, e se mostrava irritada com o modo com que os ambientalistas anônimos estavam sendo tratados durante o Fórum Preparatório RIO+10.

Durante a tarde houve apresent ações art ísticas e uma plenária final, com a leitura, pela então senadora Marina Silva – a qual se mostrava muito emocionada – do Manifesto que foi elaborado durante os três dias de debates, será levado at é Joanhes burgo, do qual s eparei alguns trechos:

Apesar de alguns avanços, perduram as dificuldades de incorporação efetiva das questões ambientais nas agendas e nas políticas de desenvolvimento em todo o mundo. O crescente processo de globalização sob a hegemonia neoliberal e a não efetivação dos compromissos estabelecidos na Convenção de Mudanças Climáticas são símbolos desse contexto.

Rejeitamos a globalização que tem como centro a busca do lucro. A natureza é um valor fundamental em si mesma e a vida e sua proteção devem estar acima dos acordos comerciais internacionais. Defendemos a soberania dos povos e nações sobre o seu patrimônio genético e a criação de estratégias sustentáveis que viabilizem as condições de vida das populações e a preservação da biodivers idade. Rejeitamos a posição do governo dos Estados Unidos de não assinar o Protocolo de Kyoto, colocando seus interesses econômicos acima dos interesses coletivos de toda a humanidade. Defendemos a aplicação do princípio da precaução e a redução das emissões de carbono e demais substâncias poluentes que atentam contra a vida e a saúde dos povos.

O teor do manifesto foi uma prévia do ambiente de contestação que imperou durante os dias seguintes. As duras críticas contra os Estados Unidos e o seu governo, present es nessa carta, foram senso comum durante tod o o Fórum Social Mundial. Elas pareciam, em alguns moment os, chegar ao patamar de ódio gratuito, principalment e em muitas cam isas que continham a sigla EUA, com traços em forma de X s obre ela.

À espera da chuva...

Fazia quase dois meses que não caía uma chuva em Porto Alegre.

Mas estava formando um enorme temporal justamente na hora a qual eu estava na fila para fazer o meu credenciamento para poder montar minha barraca no Acampamento da Juventude “Carlo Giuliani”.

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A homenagem foi feita ao ativista italiano morto brutalmente pela polícia nas manifestações contra a reunião do G-8 – os representantes dos oito países hegemônicos: Estados Unidos, França, Grã-B retanha, Itália, Japão, Canadá, Alemanha e Rússia – em julho de 2001, na cidade de G ênova, na Itália. Manifestante cuja mãe estava presente em alguns seminários do Fórum Social. Eu mesmo a vi durante a palestra de Samir Amin, durante a manhã do dia 3 de fevereiro.

Na fila do cadastro, pude ter a oportunidade de conversar com os est udantes vindos em excursões da USP, Unicamp, Unesp dos mais variados cantos do Estado de São P aulo

(Botucatu, Araraquara, Rio Claro e outros ), os quais estavam reclamando da demora para abrir o cadastro para o acampamento, e fazendo planos para fugir da chuva.

Foi o momento no qual fiz rápidas amizades, mas lament ei um pouco por ter ido sozinho à Porto Alegre, já que nenhuma excursão havia saído de Sorocaba, e invejava um pouco os estudantes que vinham nos ônibus lotados de amigos e conhecidos...

Mas a chuva des viou do acampamento e não houve maiores problemas para eu montar minha pequena barraca. No entanto, demorei quase três horas para montá-la, e não por caus a da dificuldade em fazê-lo, mas devido ao meu cansaço, e também ao fato de ajudar dois “vizinhos” montar as suas.

Imaginei que, por volta das 22:00 horas, após terminar de montar a barraca e tomar um banho nos concorridos contêineres, ia dormir e guardar energias para o dia seguinte. Mas acabei sendo convidado pelos vizinhos de barraca, vindos do Mato Grosso do Sul, a dar uma pequena e rápida volta pelo acampamento. Voltei às duas da manhã, sendo que esse era apenas o meu segundo dia em Porto Alegre...

A Marcha

A Marcha de abertura do Fórum Social Mundial 2002 estava marcada para começar às 16:30, no dia 31 de janeiro, uma quinta feira. Eu não estava muito disposto a ir, mas mudei de opinião quando fui convidado por uma jornalista, a qual havia conhecido em meu primeiro dia em Porto Alegre.

A Daniela fazia poucos dias que estava morando na capital gaúcha, pois havia acabado de se formar em Comunicação Social (Jornalismo), em uma universidade particular em Passo Fundo, onde morava com a família. Saiu de lá devido à escassez de ofertas de emprego, e durante o Fórum estava trabalhando para o Ziraldo, no estande que anunciava a volta do Pasquim – o qual durante anos fez oposição à ditadura brasileira, e está tentando voltar com o mesmo tom crítico.

Durante a Marcha, íamos criticando inúmeros fatos que ocorriam durante o percurso. Um dos fatos é que o discurso durante toda a Marc ha não mudava, assim como em outros eventos marcados por algumas facções da esquerda brasileira. Entre outros, o

conhecido jargão: “Fora já, fora já daqui, o FHC e o FMI!”, e outros inúmeros discursos contra a globalização, as multinacionais, os órgãos internacionais reguladores do comércio, o Fórum de Davos – que estava ocorrendo em 2002 excepcionalmente em N ova York – o governo Bush e os países hegemônicos.

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Mas as críticas, durant e a Marcha, eram superficiais e contradit órias, nas quais os manifestantes que estavam sobre os carros de som ao mesmo tempo no qual criticavam órgãos como o FMI, e o Banco Mundial, não cansavam de pedir para as mesmas que liberassem mais dinheiro para o Brasil.

Um mendigo que tem seu pedido de esmola negado por alguém e amaldiçoa até a oitava geração de quem lhe negou a “ajuda”. Foi essa a sensação que senti ao ouvir os carros de som misturando palavras de ódio aos pedidos de “colaboração” financeira.

Pareciam manifestantes completamente alheios às inúmeras discussões que ocorreriam no Fórum, já que o tema central seria as diversas formas de desenvolvimento, alternativo à chamada globalização neoliberal, e não formas novas de pedir mais dinheiro a instituições internacionais.

Outro fato que considerei intrigante, e ao mesmo tempo hilário, foram alguns jornalistas e fotógrafos, de carona na part e traseira dos carros de som, quando pediam para que as pessoas que estavam na marcha se manifestassem com mais ênfase, com esperança de que suas fotos saíssem melhores.

Pareciam mais ativistas que os próprios manifestantes sobre os carros de som... Enquanto a Daniela e eu acompanhávamos a marcha, paramos em algumas lojas de discos usados que havia pelo caminho, nas quais não ficava por muito tempo, pois havia pouquíssimos discos de metal, e eu não estava com muita paciência de ficar vendo rock ’n roll e MPB.

Por isso fui chamado muitas vezes de radical extremista pela Daniela, a qual, ao me contar um pouco de sua história de vida, já havia participado e tinha muitas amizades com o pessoal do cenário underground, principalment e de Passo Fundo, incluindo integrantes de bandas até hoje na ativa no movimento gaúcho, como a banda Vômit o de splatter metal.

O Acampamento e as noite s

Agitadíssimas. É o mínimo que se pode dizer das noit es no Acampamento da Juventude “Carlo Giuliani”. Como já disse, na primeira noite não resisti ao agito e saí apenas para dar uma volta e saber o que estava acontecendo, e o que poderia vir a ocorrer.

Todas as noit es reuniam -se várias pessoas em torno da fogueira central do acampament o, para dançar, beber, fumar, cantar (infelizmente, para mim, MPB e rock ’n roll), olhar, namorar...

Havia também um grupo de acrobatas que formavam um grande círculo –

geralmente perto da fogueira – para brincar com tochas acesas. Círculos os quais geralmente começavam por volta de dez ou onze da noite, e duravam at é a aurora.

Também estava sempre cheio o espaço de alimentação natural instalado no acampament o. Com preços raz oavelmente acessíveis, os produtos que foram trazidos ao espaço vinham de cooperativas que os cultivavam sem nenhum aditivo químico.

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Agitado também era o barracão onde estava a rádio comunitária cent ral do

acampament o. Ela trazia informações a respeito do Fórum Social, das atividades que ocorriam dentro dele ou paralelas, das atividades do acampament o, seus debates, oficinas, re uniões e sobre transporte até a PUC-RS, ou outros lugares onde ocorriam os eventos.

Às vezes, os locutores da rádio davam um “puxão de orelha” nos campistas, sobre a questão do lixo que começava a se acumular no acampamento – sendo que haviam cestas onde era possível separar os diversos tipos de lixo para a coleta seletiva – ou mesmo

criticavam os ambulantes, os quais, dentro do acampament o, vendiam cerveja e refrigerante a preços relativamente altos.

A rádio cedia espaç o para que os diferentes grupos políticos e sociais falassem ao público. Fato que foi vis ível principalmente durante a última noite antes do encerramento o Fórum Social, no dia 4 de fevereiro, no qual, durante a Marcha contra a ALCA (Associação de Livre Comércio entre as Américas), que juntou cerca de 30 mil pessoas – conforme as informaç ões oficiais do governo ga úcho – houve um tremendo “quebra-quebra” entre os manifestantes, e ent re esses e a polícia gaúcha.

Nesta noite, por coincidência, eu havia conhecido um pessoal do P T de Belém do Pará, e fiquei, durante a noite toda, acompanhando seus passos.

Estavam apreensivos, pois havia ocorrido um desentendim ento ent re manifestantes do P T, PSTU e PCdoB durante a marc ha. Alguns petistas haviam feito provoc ações contra representantes do PCdoB, que reagiram violentamente, provocando um tumulto. A polícia gaúcha interveio, “dispersando os agitadores” do PCdoB e prendendo alguns punks que haviam sido acusados de colaborar com a confusão e ter atirado pedras em lojas e bancos.

Na rádio, os integrantes do PCdoB chamavam o então governador gaúc ho Olívio Dutra (P T) e a pol ícia de autorit ários e fascistas, enquanto os petistas rebatiam com o argumento de “falta de entendimento e união entre as esquerdas brasileiras”.

Aliás, devo reconhecer que a polícia gaúcha estava sendo educada e atenciosa para com as pessoas, principalment e se comparada às polícias paulista e carioca.

Em primeiro lugar, se foi um Fórum para fazer oposição ao Fórum Econômico ou às outras reuniões dos chamados grandes líderes mundiais (reuniões de G -8, Organiz ação Mundial do Comércio etc.), a polícia gaúcha não poderia exercer o mesmo papel que exerceu a polícia americana em Seattle, em 1999, e em Washington, em 2000, a polícia tcheca, também em 2000, ou a italiana, em Gên ova, em julho de 2001.

A polícia gaúcha tinha a obrigação de defender os participantes do Fórum e os jovens que estavam acampados contra qualquer tipo de incômodo.

Foi o que ocorreu durant e a passagem do dia 02 para 03 de fevereiro, quando, durante um desfile de escolas de samba que ocorria no sambódromo – ao lado do

acampament o – a polícia fez um cordão de isolamento para defender os campistas contra alguma confusão que as pessoas, que não puderam entrar no sambódromo e queriam pular o muro – e eram muitas – pudessem causar.

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A educação e a cortesia da polícia gaúcha lembravam em muito à polícia

amapaense. A diferença crucial ent re as duas é a informação: enquanto os gaúchos sabiam informar sobre qualquer localização, evento ou atividade que estivesse ocorrendo, os amapaenses em muitos casos não sabem informar sobre algumas ruas principais da própria cidade.

Shows

Havia também dois espaços para shows.

O Anfiteatro Pôr-do-S ol foi o espaço para alguns grandes nomes da música latina, brasileira e gaúcha. Entre outros, passaram pelo palco Fito Paez e Hermeto Pascoal (muito alternativos!!!). E na última noit e – dia 4 de fevereiro – tocaram os “pseudopunks” Replicantes (algumas bandas terminam e muito tempo depois seus integrantes voltam a tocar junt os apenas visando a possibilidade de ter muit o lucro) e o Rappa (sucesso nas chamadas Rádios Rock, também muito alt ernativos!!!), o qual lotou o An fiteatro, sendo que havia, calculo eu, entre quarenta e cinqüenta mil pessoas.

O Caleidoscópio já fazia parte do Acampamento, no qual participou algumas bandas de menor proj eção nacional, dos mais diversificados estilos musicais: rap, punk rock , sk a,

reggae, rock 'n roll, e outros estilos. Apenas não tocaram bandas de metal.

Aliás, durant e todo o Fórum, o que menos tive a oportunidade de ver foi pessoas que gostassem de heavy, trash ou death metal. Vi poucas pessoas com camisas de bandas como Slayer – cujas camisas podem ser encontradas em qualquer shopping center – e de outras que não considero mais metal, como Iron Maiden, Sepultura ou Angra – cujas camisas e CD’s também podem ser enc ontrados em qualquer lugar.

Talvez devido a isso, a grande maioria das pessoas me olhou com certa estranhez a para quando andava com minhas camisas de bandas bem menos conhecidas, como

Malevolent Creation, Carcass, Napalm Death, Terrorizer e Sinister, ent re outras.

Não que no Rio Grande do Sul não haja headbangers ou bandas de heavy, trash ou

death metal. Aliás, o movimento gaúcho é um dos mais fortes no Brasil. Os shows geralmente

estão cheios e, ao cont rário do que ocorre na grande maioria do país, os shows de met al no Rio Grande do Sul – assim como em Santa Catarina – nos quais sempre vão muitas mulheres.

Sem contar o grande número de conjuntos que tem como berço os Estados da região Sul: Steel Warrior, Infernal, Rebaellium, Mental Horror, Steellord, Sarcastic, Flesh Grinder, Necro Cefallo, Necrose e o Krisiun, o qual é a banda brasileira que mais projeção tem no cenário int ernacional atualmente.

A única referência que tive a algum show de metal que iria oc orrer na cidade durante os dias de minha estadia foram alguns poucos cartaz es com apresentação de bandas cover – as quais tocam apenas músicas de uma determinada conjunto mais conhecido, como por exemplo, Helloween Cover, Iron Maiden Cover – que ocorreria no sábado, dia dois, na região central de Porto Alegre, no qual não pude comparecer.

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Brigando com a New Age

Assistir por inteiro a oficina “Educação Ambiental Contínua: uma proposta educativa para comunidades sustentáveis”, promovida pela gaúcha Fundação Gaia, seria um esforço, no meu caso, desum ano.

O meu interesse em participar de tal oficina foi devido à curiosidade de conhecer o trabalho da referida entidade, a qual desde o começo dos anos 90 tem cons eguido boa projeção na mídia devido os trabalhos de Educ ação Ambiental.

A oficina foi ministrada por duas funcionárias da fundação e uma representante da Secretaria do Meio Ambiente da cidade de Porto Alegre.

No início, as moças se apresentaram, pediram para que todos se apresentassem, serviram chimarrão e explic aram o trabalho conjunto que a fundação e a secretaria estavam realizando em relação à educaç ão am bient al nas escolas da capital gaúcha, o qual considerei interessante.

Depois elas prepararam algumas atividades para realizarmos durante a oficina. Foi quando eu comecei a não gostar muito do que poderia vir, já que não seria a primeira vez que, em uma oficina de educação ambiental nas escolas, participaria de um evento relacionado à educação de crianças e que envolvesse ex pressão corporal e dinâmica. Dito e feito...

Elas começaram a primeira atividade colocando no toca-fitas que haviam trazido uma música “suave”, “para relaxamento” – coisas tipo Enya e Auro Corrá – apagando as luzes da sala, pedindo para que todos se levant assem, relaxassem e se quisessem, tirassem o tênis. Enquanto isso, dizia para mim mesmo: “Tenho que sair daqui!”.

Foi quando realmente não pude ficar.

Quem estava ministrando essa parte da oficina era a representante da S ecretaria do Meio Ambiente de Porto Alegre. Ao ouví-la começar a falar – “vamos fazer com que as crianças finjam que são sementinhas, jogadas na terra, para ir depois brotando e crescendo e se

transformando em uma árvore” – e fazer seu trabalho de expressão corporal, saí e apenas voltei quando vi que as luzes da sala estavam acesas.

Ao voltar, misturei um pouco de sarcasmo e grosseria, quando me perguntaram porque não tinha ficado: “Porque não sou hippie!”, em tom irônico. Depois esclareci para todos os motivos do meu incômodo.

O meu desconforto em relação às atividades propostas foi, em primeiro lugar, à minha não-identificação com elas, devido ao teor New Age (Nova Era) da oficina. Por isso, minha ironia em rel ação aos hippies.

Apesar ainda ser muito forte a tendência de “Era de Aquário” em atividades e escritos relacionados à educaç ão ambient al, ela se mostra, em muitos casos, incapaz de lidar com a situação de crianças e adolescentes, alunos do ensino público brasileiro, principalmente em grandes centros urbanos, devido à distância que há entre a realidade e o cotidiano dos alunos, e a necessidade de preservação da Terra devido a essa ser um “espírito vivo”.

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Em segundo lugar, as propostas com as quais venho estudando a ecologia e a educação ambiental não tem muito em comum com a proposta da oficina. Ao trabalhar com bandas de Deat h Metal e Grindcore, sua crítica furiosa e violenta à sociedade atual, e qualquer espécie de espiritualidade, torna-se impossível lidar com o tema ao som de Enya, Auro Corrá, ou qualquer outro tipo da ch amada música ambiente, devido a essa “facilitar o contato com a natureza”.

Mas provavelmente quem estava no lugar errado era eu, apesar de não saber o que iria ocorrer na oficina. Todas as out ras pessoas presentes ali gostaram das atividades e participaram de todas. Após a atividade de expressão corporal, foram feitas camisas com mensagens ecológicas, com as quais depois saíram cant ando e bat endo palmas pelos corredores da P UC-RS.

Participando

Sentia-me mais à vontade durante a oficina “Conscientização socioambiental Global”, do Instituto Ambiental Vidágua.

Conheci o Vidágua quando a revista “Os Caminhos da Terra”, de abril de

várias denúncias e estava organizando uma ONG na cidade de Bauru (SP ), além de promover ali diversas atividades relaci onadas ao meio ambient e.

Hoje, o Instituto Ambiental Vidágua, entre outros projetos, é um dos colaboradores do Projeto Clickarvore, no qual pode-se “doar” uma muda de espécie nativa de Mata Atlântica para o replantio através da Internet.

Conheci o Rodrigo A ntonio Agostinho – o jovem citado na reportagem e conselheiro do Instituto – um dia antes da abertura do Fórum Social Mundial, no salão no qual estava sendo feito o credenciamento dos jornalistas e delegados, ou seja, em meio a um mar de pessoas transitando.

Durante nossa rápida conversa, já que tínhamos inúmeras coisas a fazer e a ver, ele me deu alguns folhetos a respeito do Instituto, enquanto eu lhe fornecia um exemplar do catálogo que o professor Marcos Reigota e eu estávamos organizando com material a respeito de educação ambiental para a Universidade de Soroc aba.

Na oficina realizada no dia dois de fevereiro – um sábado à tarde – tanto o Rodrigo quanto os outros integrantes do Vidágua mostravam o trabalho realizado pelo instituto em Bauru, abrindo depois um debate a respeit o do tema da oficina, no caso, a consc ientização socioambiental global.

Arrisco dizer que foram mais de duas horas de discussões acaloradas sobre vários assuntos que iam encaixando-se conforme corria o debate. Muitos falavam a respeito de experiência que haviam tido com educação ambiental em pequenas comunidades, enquanto outros conversavam sobre a situação de guerras e violência na qual se encontrava o mundo e como as questões ecológicas poderiam se encaix ar nesse contexto, entre outros assuntos.

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Estendeu-se tanto o debate e as conversas, que o pessoal do instituto não achou tempo para mostrar uma fit a de vídeo que haviam trazido para explicitar melhor o seu trabalho em Bauru e em todo o Estado de São Paulo. E também porque tinham que arrumar um espaç o para fazer seu marketing, com a venda de bonés e camisas (aliás, muito bonitas).

As salas nas quais ocorriam oficinas do Fórum Social Mundial eram as salas de aula da PUC-RS, e a oficina do grupo Vidágua estavam sempre lotadas. Mesmo com o “entra e sai” dos ouvintes – o que ocorria em todas as oficinas – esta se mantinha com cerc a de 35

pessoas, sendo que quase todas puderam falar e debater.

Nem por isso chegou a ser tedioso ou chato, pois havia pessoas de to do o Brasil, com diferentes pont os de vista sobre diversos assuntos que iam se modificando conforme corria o debate.

Contingência

Aliás, essa foi a grande diferença entre os seminários e as oficinas. As últimas permitiam uma participação maior, por serem menores e menos concorridas, enquant o que os seminários eram praticamente monólogos, com algumas perguntas do público caso s obrasse tempo.

E uma dos seminários mais concorridos foi o produzido pelo Instituto Paulo Freire, no qual participariam alguns nomes conhecidos dentro do debate das questões ambientais

brasileiras, como Leonardo Boff, Moema Viezzer, Frei Betto e Moacir Gadotti. Seminário intitulado “Ética e Educação para uma outra globalização”.

Minha maior curiosidade foi saber como seriam encaminhados os debates, já que não me identificava muito com os palestrantes, os quais em seus livros e textos não haviam me acrescentado muito a respeito de educação e/ou meio ambiente.

Quem mediou os debates foi Moacir Gadotti, o qual apresentou os palestrantes e anunciou que, tanto Frei Betto, como Leonardo Boff, não poderiam comparecer no dia devido a razões pessoais.

A primeira a falar foi então Moema Viezzer, cujo começo de palestra foi suficiente para que eu me levantasse e saísse. Explico.

Em primeiro lugar, ela fez com que todos se levantassem, dessem a mão para o companheiro do lado e repetissem com ela (para mim, um desagradável exerc ício de

contingência) algo como: “Eu aprendo, tu aprendes, ele aprende...”, o que me fez sair do lugar e ir para o fundo antes que eu desse a mão para alguém.

Depois – o “golpe de misericórdia” – pediu para que todos cantassem uma música conhecida do Gonzaguinha – da qual não me recordo o nome, mas que começa com: “viver, e não ter a vergonha de ser feliz...” – em um outro desagradável exercício de contingência, o qual me fez sair do salão, frustrado com o caminho pelos quais certos setores estão levando o debate ambiental, e irritado com a superficialidade do encontro.

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Naquele momento me senti completamente excluído do seminário. Se ela pedisse todo o tempo para que os ouvintes cantassem músicas de MPB, estariam excluindo alguns setores culturais e musicais brasileiros, para os quais a chamada “Música Popular Brasileira” hoje não é mais que produto para o consumo das massas, extremamente atrelado às exigências de grandes gravadoras.

É evidente que foi uma “proposta” de atividade, “aceita por todos”, ou pela maioria, e eu estar sendo radical. Mas, ao propor apenas uma música, arriscaram-se a desagradar uma minoria e eu fiquei com profundo sentimento de excluído. Sem contar o risco de serem acusados de homogeneizaç ão cultural. Não é devido ao fato da grande maioria ali ser de brasileiros, todos ficarem obrigados a aceitar MPB a sua música oficial.

Não que eu desejasse que tocassem “Burden of Evil”, da banda americana de Death Metal Monstrosity, ou “Foul”, da banda belga de Grindcore Agathocles – já que ambas falam sobre problemas ambientais, apesar do modo um tanto quant o ruidoso – mas pedir para que todos cantassem uma mesma música, onde seria constrangedor para a palestrante que os ouvintes ali presentes (cerca de mil pessoas) negar-se a cantar, foi uma demonstração de grave descuido, para com toda uma multiplicidade de opiniões e propostas, tanto culturais como musicais, que provavelmente ali estavam.

Apresentar uma canção como forma de ampliar e contribuir para com o debate a respeito de meio ambiente e educação é uma proposta rec onhecidamente válida por todos os setores que trabalham na área. Tratar o público ouvint e de um Fóru m Social Mundial como auditório de programas de televisão dominicais é algo inadmissível, principalmente quando são chamados de maiores adversários dos participantes do evento o controle e a alienação

promovida pelas multinacionais e pelos orgãos regulador es internacionais de economia e política.

Saí muito desconte ao ver que talvez pudesse ser taxado de inconveniente e mal-humorado por não cantar uma música da qual não tenho a menor simpatia lírica e harmônica, de um artista do qual nunca apreciei o trabalho, e de perc eber que algumas pessoas,

respeitadas no mundo acadêmico, tratam a educação ambiental como uma proposta bonitinha e idiotizada, a qual serve para “deixar todos felizes com o futuro b onito que teremos se amarmos e sermos frat ernos um com os outros”.

Digo isso por ver o es forço retórico feito por Moacir Gadotti em tratar a educaç ão ambiental como simples ato de solidariedade, fraternidade e amor, desconsiderando todas as problemáticas históricas, econômicas e sociais que devem ser incluídas no d ebate ecológico, mas não são, devido a insistência de alguns teóric os que não querem abordar a abrangência do assunto.

Espelhos decorados

As atividades oficiais do II Fórum Social Mundial não estavam ocorrendo apenas dentro das dependências da P UC-RS. Assim como as não-oficiais não estavam oc orrendo apenas fora da referida universidade.

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Para assistir o seminário “Geopolítica e Geocultura: visões de uma nova ordem imperial”, tive de sair da PUC-RS, e ir até a região central da capital gaúcha, na rua dos Andradas, onde fica o Centro do Comércio de Porto Alegre. O referido seminário estava sendo promovido pelo grupo Zero à Esquerda, organizad ora de uma coleção de livros

“antineoliberais”, e cujo nome já informa sobre suas tendências.

Seminário que também foi promovido em conjunto ao grupo francês A TTAC. O folheto disponível nos estandes apresenta as intenções dessa organização:

O Attac é um movimento incomum também na forma de se organizar. Não lutamos pelos interesses de um grupo ou por uma causa específica. Nosso poder é mobilizar a sociedade para discutir as conseqüências da

globalização, debater as alternativas, em especial, lutar por elas.

Para fazer parte do Attac, basta estar disposto a participar desse es forç o, de preferência em conjunto com mais pessoas em núcleos. Eles podem ser formados numa escola, uma rua, um acampamento, um sindicato, junto a uma posse de hip-hop, uma ONG em defesa do meio ambiente, um grupo feminista – em qualquer parte onde haja gente disposta a refletir e a transformar o mundo e o Brasil.

O grupo Attac promoveu dezenas de seminários e oficinas durante o II Fórum Social Mundial, e este sobre Geopolítica e Geocultura reuniu Maria Elisa Cevasco, José Luis Fiori (que não compareceu, mas deixou o texto da palestra para ser lido), Micha el Hardt – literato norte-americano que vem ganhando notoriedade no Brasil devido ao livro “Império” (Ed. Record, 2001) escrito junto com o filósofo italiano Antonio Negri – e Paulo Arantes, um dos organizadores do Grupo Zero à Esquerda, cuja palestra e debat e com Michael Hardt agradaram-me bastante.

Aliás, Hardt em sua palestra abordou principalmente os conceitos de povo e multidão, resumindo o que ele e Negri desenvolvem principalmente na segunda parte de “Império”, quando eles relacionam as questões ligadas à ascens ão e decadência dos Estados-Nação.

Paulo Arantes também falou a respeito de questões ligadas à soberania dos Estados, quando trouxe ao debate o fato de orgãos internacionais intervirem sobre certos países e povos que não podem exercer mais sua cidadania – sendo que são esses Estados que pedem a intervenção internacional – e depois debateu com Hardt algumas idéias a respeito do livro “Império”.

Foi provavelmente o melhor seminário que pude assistir.

Isso porque o seu início foi um tanto quanto turbulento, pois, no mesmo horário, haveria um outro debate, envolvendo Marta Suplicy, Luis Inácio “Lula” da Silva, e José Dirceu.

Uma grande confusão, já que os dois seminários seriam no mesmo andar, que possui dois salões de conferência, e apenas um possuía serviço de tradução. Depois de uns quinze minutos de indecisão, foi resolvido que a palestra do PT seria na sala menor, e o evento do grupo Attac e do Zero à Esquerda ocorreria no salão principal (o qual possuía serviço de tradução e era muito bonito, com grandes lustres e espelhos decor ados por todos os lugares).

Isso tudo sem contar que o serviço de tradução quase foi interrompido, devido ao fato de que os tradutores não iriam trabalhar durante todo o seminário, pois seu horário de

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serviço se encerraria as quatro e o Fórum não lhes iria pagar hora extra. Portanto, foi feita uma “sacolinha” para arrecadar dinheiro para o pagamento aos tradutores. Como havia cerc a de duzentas pessoas no local, todas contribuindo, nunca menos com menos de um real, deve ter dado um bom dinheiro a arrecadação.

Zapati sta s, palestinos, ambientalistas e PT

Por falar em PT e petistas, os próprios não me deixaram assistir direito o seminário sobre os zapatistas e os problemas da terra em Chiapas, no México.

Um ciclo de palestras foi organizado pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, pela Cent ral Única dos Trabalhadores gaúcha e pelo Cent ro Latino Americano de Ciências Sociais (CLACSO), intitulado “Um Mundo Sem Guerras é Possível”.

A abertura desse ciclo, que também foi considerada a abertura das atividades oficiais relacionadas a conferências e seminários, foi feita pelo lingüista nort e-americano Noam

Chomsky, que proferiu a palestra “As Guerras e a Paz no Mundo”. Eu pude assistir apenas pelo telão instalado no salão ao lado, já que o espaço onde ocorreu a conferência foi reservado apenas aos delegados.

Durante sua palestra – na qual Chomsky deu suas opiniões à respeito do

bombardeio americano ao Afeganistão, out ros conflitos internacionais e sobre a indiferença da população norte-americana para com a escolha do presidente durante a eleição em 2000 – houve muitos protestos fora do salão, devido a muitas pessoas terem ficado do lado de fora por causa da lotação.

Eu mesmo fui obrigado a sentar no chão. Mas depois – assim como fizeram outras pessoas presentes – usei minha mochila como travesseiro e deitei. E seguindo o exemplo de alguns, em muitos moment os, cochilei...

No segundo dia desse ciclo, ocorreram as palestras sobre as situações do País Basco e depois, sobre os conflitos e problemas agrários e indígenas em Chiapas.

No entanto, foi praticamente impossível assistir e prestar atenção no “debate zapatista” – o qual era o que mais eu queria ver – devido a uma palestra do Lula e de outros “chefes” petistas no salão ao lado.

Era mais fácil ouvir o que era dito no outro salão do que ouvir os palestrantes

“mexicanos”. A cada frase proferida pelo Lula, um coro muito alto começava: “Brasil, prá frente, Lula presidente!”, chegando até a causar o encerramento antes da hora do seminário sobre Chiapas.

No dia três de fevereiro, ocorreram os seminários a respeito da questão palestina e sobre a Colômbia, as quais não pude assistir, pois coincidia com o Seminário “Geopolítica e Geocultura”.

Mas pude ter a oport unidade de assistir o ato de solid ariedade à causa palestina ocorrida na PUC-RS. As escadas e o saguão estavam tomados por palestinos, árabes,

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iraquianos, brasileiros e out ros estrangeiros simpatizantes à causa, sem contar os inúm eros jornalistas e fotógrafos.

Eram dez enas de bandeiras e um coro de milhares de vozes que pediam à

comunidade internacional para que int erviessem no conflito e fizessem com que Israel deixasse em paz os territórios palestinos ocupados. Enquanto termino de escrever esse texto (abril / 2002), os tanques israelenses tomam conta de Ramallah, de Belém – onde cercam a Igreja da Natividade – e circundam o prédio onde está refugiado o líder palestino Yasser Arafat. Toda vez que vejo as imagens do conflito pela televisão, e as fotos nos jornais, lembro daq uela manifestação impressionant e.

Na mesma hora, um lance de escadas acima estava ocorrendo o ato da Rede de ONGs da Mata Atlântica.

Devido ao ato palestino, o evento dos ambientalistas dava a impressão de ser bem menor. Enquanto centenas de pessoas assistiam os palestinos, apenas umas trinta pessoas viam a animada e barulhenta manifestação dos “verdes” brasileiros. Mas logo depois, os dois eventos se misturavam.

Essa convergência de movimentos era vis ível principalmente por causa de um homem que estava usando pernas-de-pau, pintado e vestido como um duende azul e verde, com um globo representando o planeta na mão, se desloc ando entre a manifestação ecologista e a palestina, mostrando e explicando a todos que pudesse, a necessidade de preservação do planeta Terra.

Não-oficialidade

Foram em todos os dias que ocorreram manifestações desse gênero nos saguões do prédio 40 da PUC-RS e fora dele. Quando não eram ecologistas e palestinos, eram

movimentos paraguaios, chilenos, zapatistas, anarquistas, bascos, sem-terra, sem-teto, feministas, negros, homossexuais, e muitos outros, os quais, quando não tiveram espaço para falar durante as conferências, seminários e oficinas, encontraram ali um lugar para ter suas vozes ouvidas.

Também ocorriam inúmeras manifestações artísticas, culturais e musicais: teatros de bonecos, grupos de capoeira, saltimbancos, artistas de rua, engolidores de fogo, músicos, artistas com rostos pintados e brincando com todos os transeuntes do Fórum, e os inúmeros protestos silenciosos em formas de camisas e faixas usadas pela grande maioria dos participantes do Fórum.

A não-oficialidade também estava present e nas inúmeras conversas e debates que ocorriam nos ônibus, entre os “vizinhos temporários” nas barracas do Acampamento da Juventude, nas escadarias e nos elevadores da PUC-RS, e dos outros estabelecimentos onde ocorreram os atos oficiais, nas plat éias dos event os artísticos oficiais e não-oficiais daqueles animados seis dias de Port o Alegre.

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Quase três quilos mais magro (comia apenas quando lembrava da fome), com grandes olheiras (dormir foi o que menos fiz), e carregando quase dez quilos a mais na minha bagagem (devido à grande quantidade de livros, revistas, fanzines, folhetos, cartazes, cartões e camisas que adquiri durante o Fórum), iniciei minha volta a Sorocaba.

Embarquei no ônibus para São Paulo às 13:00 em Porto Alegre, e tive como companhia durante a viagem de volta, as belas paisagens do lit oral da região sul – a Serra do Tabuleiro em Santa Catarina e os lagos do norte do Rio G rande do Sul – e, durante a noite, em meu walk man, o som de Malevolent Creation, Monstrosity, Suffocation, e para dormir, Blind

Guardian.

Ao chegar às 7:30 da manhã na rodoviária do Tietê, sabia que iria enfrentar uma guerra no metrô, pois teria que fazer baldeação na estação da Sé, para chegar à Barra Funda para pegar o ônibus para Sorocaba.

Tive que esperar passar quase seis trens para poder ent rar em algum, pois, além das minhas três mochilas gigantescas que carregava, estava em horário no qual milhões de

pessoas estavam indo trabalhar.

Cheguei em casa às dez e meia da manhã do dia 6 de fevereiro, onde comi e dormi muito...

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