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O tabu da unidade jurisdicional

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Academic year: 2020

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0 Tabu da Unidade Jurisdicional

J . Pe r e i r a Lir a

(M inistro do Tribunal de Contas da U nião)

— Tribunal de Contas — órgão constitucional de julga­ mento.

— Só o S . T . F . tem competência, e originàriamente, para conhecer de mandado de segurança impetrados contra êle.

1. Os aplicadores da Constituição no Tribunal de Contas da União

têm externado opiniões, nem sempre coincidentes, sôbre a competência da Justiça para conhecer dos mandados de segurança impetrados contra o mesmo Tribunal.

Essas opiniões podem assim ser resumidas: l.a opinião

Há os que entendem que o Tribunal de Contas tem uma dupla face: é ór­ gão de cooperação do Poder Legislativo para a “administração financeira” e “execução do orçamento” (artigo 22 da Constituição); e órgão julgador para as restantes matérias a êle atribuídas pela Constituição, notadamente para

— “julgar as contas dos responsáveis por dinheiros e outros bens públicos e as dos administradores das entidades autárquicas”

(n.° II do art. 77 da Constituição)”,

— “julgar da legalidade dos contratos e das aposentadorias, reformas e pensões” (n.° I I I ) .

Nesse sentido é que a Lei 830, de 23 de setembro de 1949, na seção III, sob o Título “Jurisdição contenciosa” , do capítulo III do Título II, estatui no artigo 70 o que compete ao Tribunal de Contas “como Tribunal de Justiça” , e estabelece no

“art. 69. Quando funcionar como Tribunal de Justiça, as decisões definitivas do Tribunal de Contas têm fôrça de sentença judicial” . Para os partidários dessa primeira opinião, julgadas pelo Tribunal de Contas as matérias em que êle funciona como Tribunal de Justiça, — está feito em definitivo o pronunciamento da Justiça, e respeitada a competência constitucional dos ns. I l e III do art. 77.

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2.a opinião

Os partidários dessa segunda opinião sustentam que, mesmo como Tri­ bunal de Justiça, pode acontecer que o Tribunal de Contas contrarie à dispo­ sição da Constituição ou à letra de tratado ou lei iederal ou realize qualquer das hipóteses prefiguradas nas letras a, b, c e d do n.° III do artigo 101 da Constituição, e socorridas pelo remédio do recurso extraordinário para o Su­ premo Tribunal Federal.

Consumar-se-ia então, no entender dêsses respeitáveis intérpretes, aquilo que a Constituição previu, no artigo 101, ao estatuir para o Supremo Tribunal Federal a competência para

“julgar em recurso extraordinário as causas decididas em única ou última instância por outros tribunais ou juízos” (n.° III do art. 101).

3.a opinião

Se a segunda opinião advoga e preconiza o conhecimento das matérias julgadas pelo Tribunal de Contas em grau de recurso extraordinário pelo Su­ premo Tribunal Federal, a terceira opinião entende certo que o Supremo co­ nheça das mesmas matérias, mas originàriamente, sem dependência, portanto, . de recurso processual.

4.a opinião

Há quem entenda que é no Tribunal de Recursos, originàriamente, que se devem rejulgar as causas já julgadas no Tribunal de Contas.

Não mencionaremos a hipótese de serem os pronunciamentos do Tribu­ nal de Contas reexaminados nos juízos singulares, de primeira instância. Essa formulação do problema não resiste a uma análise cuidada e perde de inte- rêsse desde que fique demonstrado que nem mesmo ao Tribynal de Recursos é lícito deferir o reexame dos julgamentos, incluídos pela Constituição na com­ petência do Tribunal de Contas.

Nossa objeção

2 . Pedimos licença para objetar que se rejulguem as decisões do Tri­ bunal de Contas, seja no Tribunal de Recursos, seja na justiça de primeira instância.

A Constituição da República deu especial relêvo ao órgão imaginado, criado e estruturado pelo artífice máximo da Constituição de 1891.

Hoje, em face dos textos da Constituição promulgada em 1946, vemos repetida, em quase tôdas as suas linhas, a construção aperfeiçoada da Cons­ tituição de 1934. Aumentada foi, até, a competência.

Abandonemos êsses textos constitucionais pretéritos e fixemos as regras da Constituição vigente, de 1946.

3 . Além da fiscalização financeira, prevista no artigo 22, a Constituição deu ao Tribunal de Contas da União jurisdição nacional (art. 7 6 ),

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Di r e i t o e Ju r i s p r u d ê n c i a — Do u t r i n a 259 Quando a Constituição cuidou da escolha dos seus membros, adotou o mesmo processo da escolha dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Procurador Geral da República, dos Chefes de Missão Diplomática etc., isto é: aprovação prévia da escolha do Presidente da República, pelo Senado Fe­ deral, em votação secreta (arts. 63 e 7 6 ).

A Constituição deu ao Tribunal de Contas quadro próprio para o seu pessoal (art. 76, § 2.°) e direito de prover os cargos, concedendo aos seus titu­ lares licenciamento e férias (art. 9 7 ).

Cabe-lhe acompanhar e fiscalizar e execução do orçamento, ao mesmo passo que interpor o parecer prévia sôbre as contas que o Presidente da Re­ pública deverá prestar anualmente ao Congresso Nacional.

Assiste-lhe o direito de veto impeditivo a despesas por ventura imputadas a crédito impróprio ou já sem saldo.

Julga, como Tribunal de Justiça (arts. 69 e 70 da Lei 830, de 1949), as contas dos responsáveis por dinheiros e outros bens públicos e as dos admi­ nistradores das entidades autárquicas (art. 77 n.° II da Constituição).

Julga, igualmente da legalidade dos contratos e das aposentadorias, re­ formas e pensões (art. 77 n.° I I I ).

4. Por tôdas essas razões de prestígio constitucional ao órgão de Con­ tas, foram os seus membros equiparados aos Juizes do Tribunal Federal de Recursos, quanto a direito, vencimentos, garantias e prerrogativas.

Os Ministros do Tribunal de Contas não podem ser julgados em qualquer justiça de primeira instância, nem mesmo na que lhe é equiparada: o Tribu­ nal de Recursos.

Só o Supremo Tribunal Federal pode processar e julgar originàriamente os Ministros do Tribunal de Contas, como ao Presidente da República nos crimes comuns, como aos seus próprios Ministros e ao Procurador Geral, como aos Ministros de Estado e aos Juizes dos Tribunais Federais, e ainda ao& Chefes de Missões Diplomáticas (letra c, n.° I, do art. 101).

5. Perguntamos agora: se um, ou dois, se os nove Ministros do Tribu­ nal de Contas, individualmente ou mesmo coletivamente, só podem ser pro­ cessados e julgados originàriamente no Supremo Tribunal Federal (art. 101 da Constituição), — como é que um ato coletivo, um julgamento do Tribunal de Contas pode ser anulado, reformado, rejulgado perante um juízo singular :<u mesuio perante o Tribunal de Recursos ao qual é equiparado?

Êsse argumento parece suficiente para convencer de que é ao Supremo Tribunal Federal, só ao Supremo, que pode caber o julgamento dos mandados de segurança em que é dado como autoridade coatora o Tribunal de Contas da União.

6. Não queremos acrescentar mais nada. Não desejamos buscar na doutrina alienígena argumentos em favor da tese. Dir-se-á que a situação do

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Tribunal de Contas no aparelho institucional brasileiro não permite confrontos com o que existe aliunde. Seja.

S o c o r r a m o -n o s , p o is , n a p r a t a d e ca sa , t r a n s c r e v e n d o o c o n s t it u c io n a lis t a Po n t e s d e Mi r a n d a e, d a p a r c o m a d ê le , a o p in iã o d e o u t r o c o n s t it u c io n a ­ lis ta n ã o m e n o s e m in e n t e — o M in i s t r o Ca s t r o Nu n e s — q u e c o n s id e r o u o p r o b le m a c o m a e x p e r iê n c ia r e d o b r a d a d e M in is t r o d o T r ib u n a l d e C o n t a s e, a o d e p o is , d e M in i s t r o d o S u p r e m o T r i b u n a l .

Eis alguns tópicos magistrais em que se conceitua a “jurisdição” do Tri­ bunal de Contas, firmada inquestionàvelmente no artigo 76 da Constituição:

“Um tanto, como teremos, várias vêzes, ensejo de mostrar a luta entre o pensamento civilístico dos membros componentes da Alta Côrte e os princípios de direito público. Muito se falou então da unidade jurisdicional ...

“Hoje, e desde 1934, a função de julgar as contas está, claríssi­ ma, no texto constitucional. Não haveremos de interpretar que o Tribunal de Contas julgue e outro juiz as re-julgue depois. Tra- tar-se-ia de absurdo bis in idem, cu o Tribunal de Contas julga ou não julga” .

( Po n t e s d e Mi r a n d a — Comentários à Constituição de 1946,

v o l. II, págs. 94 e 95) .

Vejamos agora a anunciada lição do Ministro Castro Nunes:

“Em 1940 examinei o assunto nos seguintes têrmos: Sempre combati, em vários escritos, a exageração do princípio da unidade iurisdicional.

“Creio mesmo ter sido entre nós quem mais demoradamente fixou êsse aspecto, sobretudo no estudo a que denonainei “Da juris­ dição no Regime”, onde mostrei, com a lição de expositores estran­ geiros, que jurisdição existe até mesmo na administração ativa, tôda vez que um agente público é provocado a aplicar certa norma a um fato.

“Aos juristas dominados pelo preconceito civilista da jurisdi­ ção como privilégio do Judiciário, escapava o fenômeno, que nesses últimos anos se desenvolveu ainda mais, documentando a expansão jurisdicional fora da órbita judiciária.

“Entretanto, não cheguei naqueles escritos a formar opinião sôbre a conclusividade das decisões da Côrte de Contas em face do Judiciário, onde se executam ou se prolongam nas conseqüências de ordem penal. Confesso mesmo que, não obstante reconhecer na tomada de contas uma verdadeira jurisdição, tendia para o ponto de vista da jurisprudência predominantemente orientada em sentido contrário a tal conclusividade.

“Entrando para o Tribunal de Contas, tive de reexaminar o as­ sunto para orientar-me nos votos que tenho proferido. E cheguei à conclusão, que pretendo expor aqui em ligeira síntese, de que as

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Di r e i t o e Ju r i s p r u d ê n c i a — ■ Do u t r i n a 261 decisões proferidas na jurisdição constitucional ds contas, que tem naquele Tribunal o seu órgão privativo, condicionam a instauração da ação penal e não podem ser revistas, quer no juízo penal, quer no juízo cível da execução.”

( Ca s t r o Nu n e s — Teoria e Prática do Poder Judiciário, pá­ ginas 22-23, ed. de 1943).

íjí ❖ ❖

7. Não resta, hoje, dúvida, em face da Constituição de 1946, que o tabu da unidade jurisdicional está superado. Ainda que seja certo impor a Constituição quase integralmente essa unidade jurisdicional para o controle da Administração Pública, — não é menos certo que, em casos estritamente previstos na própria Constituição, existem situações contenciosas, oriundas de atos da Administração Pública ou com ela relacionadas, as quais sofrem apre­ ciações de natureza jurisdicional, por fôrça de razões que não são enumeradas na descrição constitucional como ortodoxamente pertencentes ao Poder Ju­ diciário .

Todos os escritores da matéria ensina que, ao conhecer dos crimes de res­ ponsabilidade do Presidente da República, os mesmos, atribuíveis a Ministro, e os dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (também de responsabili­ dade) — exerce o Senado Federal função jurisdicional, expressamente dele­ gada pela Constituição (arts. 88, 92 e 9 3 ).

Diferente não é o caso da função atribuída ao Tribunal de Contas a pro­ pósito da legalidade de contratos, aposentadorias, reformas e pensões (arti­ go 77 n.° III) como ainda o caso do julgamento das contas dos responsáveis por dinheiros e outros bens públicos e as dos administradores das entidades autárquicas (art. 77 n.° I I ).

Aqui o Tribunal de Contas — com a dupla face de cooperação com o Legislativo, em matéria de administração financeira, e de órgão constitucional de julgamento para determinadas matérias, — aqui, o Tribunal de Contas exerce função judicante, como Tribunal de Justiça, a que foi equiparado, na sua constituição e no seu pronunciamento.

Ou isso, ou as palavras perderam a sua significação léxica e semântica. Veja-se o que diz a Constituição em os ns. II e III do art. 88:

“julgar as contas dos responsáveis ... “julgar da legalidade dos contratos e das aposentadorias, e tc .” (nú­ meros II e III do art. 7 7 ).

“Julgar” , diz a Constituição, num e noutro caso. Logo, não é possível distinguir o n.° II do n.° III, para considerar que, no primeiro, há jurisdição e, no segundo, tal jurisdição não existe.

E ’ regra imposta ao intérprete que êle dê às palavras o seu sentido na­ tural, não se lhe permitindo, sobretudo no mesmo artigo de lei, dar aqui ao verbo “julgar” um sentido, e outro sentido, na alínea abaixo, do mesmo ar­ tigo 77.

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Insistir em fazê-lo é violentar as regras eternas da ciência da interpre­ tação, e partir para ela com uma intenção preconcebida que não animou o espírito do Constituinte,

Nos casos de aposentadoria, reformas e pensões, em verdade, o julga­ mento do Tribunal de Contas é dado, na Constituição, como definitivo, nêles não havendo ingerência do Congresso. Nos casos de contrato não é assim, argumentou conhecido escritor de matéria administrativa.

Observe-se, em primeiro lugar, que nos casos de aposentadoria, como para pensões ou reformas, — a Constituição criou o “julgamento” pelo Tri­ bunal de Contas (n.° III do art. 77) e não criou qualquer recurso para o Congresso.

Figuremos o caso de contrato, ou seja de julgamento da legalidade de contrato.

Nega-se frontalmente, e com sólido fundamento, que, do julgamento que reconhece a legalidade do contrato, haja qualquer recurso. Também não o há quando o julgamento é pela recusa de registro do contrato, isto é, quando o Tribunal de Contas prolata que o contrato celebrado não tem o requisito da legalidade.

Ainda, nesse caso, não há recurso para o Congresso; o que há é a afeta­ ção da espécie ao conhecimento do Congresso, para que o mesmo se pronuncie. E, pronunciar-se pela fatura de uma resolução, de um ato legislativo, que manda arquivar a matéria ou cria, para a espécie, um texto novo, mandando executar o contrato, muito embora lhe possam faltar elementos substanciais.

Abra-se a Constituição no § 1.° do art. 77 e ver-se-á que ali não se fala em recurso. Muitas vêzes, a própria Administração pede a devolução dos pa­ péis para feitura de um novo contrato, satisfazendo as objeções resultantes do julgamento do Tribunal de Contas.

Onde há recurso para o Congresso não é aqui. Aqui há é um pronuncia­ mento político do Congresso que faz uma lei para reger o cáfco.

Onde há recurso é na hipótese do § 3.° do artigo 77, in-tine: isto é, no caso de despesa recusada, matéria, não de julgamento, mas de fiscalização fi­ nanceira, na qual o Congresso é o Juiz e o Tribunal de Contas mero aparelho de cooperação (art. 2 2 ).

Assim, não falece dúvida que, na hipótese do § 1.° do art. 77, não há recurso para o Congresso. Êste existe, unicamente e limitadamente, na hipó­ tese do § 3.° do mesmo art. 77.

❖ í!i ❖

8. Finalmente, abandonando a espécie dos contratos, é tempo de obser­ var que, no tocante a aposentadorias, reformas e pensões, a Constituição deu caráter de definitividade aos julgamentos do Tribunal de Contas.

* i> *

9. Se, contudo, houve “lesão de direito individual”, ou se houve “lesão de patrimônio da União” , sugere a Constituição a apreciação do Poder Judi­ ciário que não pode ser excluída.

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Di r e i t o e Ju r i s p r u d ê n c i a — Do u t r i n a 263

Não resta dúvida que, fora da órbita da administração financeira (arti­ go 22 da Constituição), é o Tribunal de Contas um “Tribunal de Justiça”, poder judiciário, portanto, por sinal que equiparado ao Tribunal de Recursos

(art. 70 da Lei 830, de 1949; e art. 76 § 1.° da Constituição).

Em matéria de aposentadorias, reformas e pensões, — foi à Constituição que ao Tribunal de Ccntas reconheceu jurisdição (art. 77 n.° III da Consti­ tuição e art. 7 6 ).

A Lei 830, de 1949, repetiu a regra constitucional do “julgamento” nessas espécies, estabelecendo:

‘‘Art. 69. Quando funcionar como Tribunal de Justiça, as decisões definitivas do Tribunal de Contas têm fôrça de Sentença Judicial.”

São de acentuar os capítulos da referida Lei Orgânica (Lei 830, de 1949) em que se versa a competência e jurisdição do Tribunal de Contas, notada- mente os artigos 34 n.° III e os artigcs 39 e 40, êste último marcando, de maneira insofismável, competência exclusiva do Tribunal de Contas e sua jurisdição decisória.

O artigo 56 dá competência ao Tribunal para decidir, em matéria finan­ ceira, da procedência ou improcedência dos fundamentos da exposição minis­

terial dirigida ao Presidente da República.

No artigo 57, prevê o recurso para os casos de denegação de registro de contrato ou de concessão de aposentadoria, estabelecendo a permissibilidade de um único pedido de reconsideração, e, em caso excepcional que especifica, de um segunda e último pedido de reconsideração.

Nos artigos 69 e 76, cuida a Lei Orgânica (Lei 830, de 1949) da jurisdi­ ção contenciosa, inclusive prisão e seqüestro. Nesta seção cogita (art. 7 0 ): dos julgamentos originários ou em grau de recurso, apreciação de provas e (n.° X I ) de

“julgar os embargos opostos às sentenças proferidas pelo Tribunal e a revisão do processo de tomada de contas, em razão de recurso da parte ou do representante do Ministério Público” .

Ainda de recurso trata o artigo 32 n.° V II no qual se prevê a interposi- ção dos recursos permitidos por lei; oposição de embargos; e requerimento de revisão de tomada de contas.

No capítulo de tomada de contas dos responsáveis reafirma (art. 77 a 79) que o “julgamento é da competência privativa do Tribunal de Contas” , com aplicação de multas, etc.

O artigo 91 estatui que, com a remessa do processo ao Tribunal de Con­ tas, é “o responsável considerado em Juízo para todo sos efeitos de direito” , sujeito à instrução e preparo dos processos, com citação e demais tramitações, inclusive defesa oral ou escrita.

Os artigos 101 a 115 cuidam dos “recursos”, inclusive de embargos in- fringentes e revisão dentro de cinco anos, etc., etc.

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Os artigos 116 a 126 cuidam da execução das sentenças, estabelecendo no

“art. 126. Os embargos opostos na execução, quando infringentes ou modificativos de acórdão, serão julgados pelo Tribunal, ao qual será devolvido o processo. Qnando referentes ao processo executivo^ julgá-lo-á o juiz da execução” .

* % #

10. E’ mostrado, assim, que o Tribunal de Contas tem dois campos de atuação: 1.°) coopera com o Poder Legislativo na administração financeira e especialmente na fiscalização orçamentária (art. 22); 2.°) “julga” contas dos responsáveis e “julga” da legalidade dos contratos, das aposentadorias, re­ formas e pensões (art. 77, ns. II e I I I ).

Tem, pois, jurisdição (art. 76 da Constituição e 34 a 40 da Lei Orgânica — Lei 830, de 1949).

Aliás, a história das Constituições da República demonstra o crescimento constante da jurisdição do Tribunal de Contas.

A Constituição de 1891, no seu artigo 89, instituirá um Tribunal de Con­ tas “para liquidar as contas da receita e despesa e verificar a sua legalidade, antes de serem prestadas ao Congresso” .

A Constituição de 1934, no seu artigo 99, acrescentou à matéria da exe­ cução orçamentária a de julgamento das contas dos responsáveis por dinheiros os bens públicos.

E’ que havia sido averbada de inconstitucional a atribuição conferida, nesta última matéria, ao Tribunal de Contas, pela legislatura ordinária. Cor- rigiu-se a falha e tornou-se, indisputàvelmente, constitucional aquilo que des­ pertara dúvidas.

Foi mais longe o Constituinte de 1934, pois que, no artigo 101 da Magna Carta, introduziu na órbita constitucioinal a competência sôbre matéria de contrato.

Mais expressiva ainda foi a Carta Constitucional de 1937, embora ma­ drasta tivesse sido a legislação dela decorrente para com o Tribunal de Con­ tas. E ’ que o Constituinte outorgante de 1937, no artigo 114, deu expressa­ mente ao Órgão das Contas competência constitucional referente à execução orçamentária, ao julgamento das contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos, e ainda atinentes à legalidade dos contratos celebrados pela União.

Mais completa, mais perfeita, mais ampla, revelou-se a Constituição de 1946, nos artigos 76 e 77, acrescentando mais um capítulo de jurisdição nacio­ nal: a do julgamento das aposentadorias, rsiormas e pensões.

11. Não caberia entrar em maiores minúcias, mostrando que esta úl­ tima é uma das poucas e restritas exceções que admite a Constituição de 1946 ao monopólio jurisdicional ordinário, criando assim em face dos artigos 802 e 146 do Código do Processo Civil, um problema de técnica de direito adje­

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Di r e i t o e Ju r i s p r u d ê n c i a — Do u t r i n a 2 6 5 tivo, focalizado por ensaio recente sôbre a res judicata no plano das relações jurisdicionais.

Cabe, aqui o conceito de Po n t e s d e Mi r a n d a, comentando, já, a Consti­

tuição de 1946 (v ol. II, pág. 101):

“Seja como fôr, a lei ordinária não pode considerar atribuição de outro corpo judiciário ou administrativo, qualquer das funções dadas ao Tribunal de Contas.”

Ainda escrevendo no regime da Constituição de 1937, doutrinava o emi­ nente Ca s t r o Nu n e s (Teoria e Prática do Poder Judiciário):

“Novos aspectos sobrevieram, exigindo uma revisão do conceito mesmo da jurisdição, que se ampliou, estendendo-se a outros seto­ res do Estado, sendo necessário articular com essas vias administra­ tivas o Poder Judiciário, ainda que mantido o princípio republicano da terminação nas vias judiciárias de tôdas as controvérsias deci­ didas contenciosamente na Administração.”

E ’ de notar que o Tribunal de Contas não é parte da Administração: é órgão sui generis, colocado dentre os Poderes, para fiscalizar a Administração e julgar determinadas matérias constitucionais.

E a d ia n t e o m e s m o Ca s t r o Nu n e s r e m o s t r a ( p á g . 4 ) q u e as v ia s j u d i ­ c iá r ia s não e x g o t a m t ô d a a f u n ç ã o ju r is d ic io n a l d o E s t a d o .

12. E tratando da espécie, ainda no regime de 1937, acrescenta o nosso mais eminente jurisdicionalista:

“Na exageração do princípio judiciário nem se reparou que mui­ tas hipóteses suscitadas por aplicação da lei nas retortas da admi­ nistração encontram, aí mesmo, o seu desfecho, em regra, definitivo. Só esporadicamente vão aos Tribunais. Tal o caso dos processos de montepio, meio sôldo, aposentadorias, etc., que fazem o seu curso normal nas vias administrativas e terminam numa jurisdição admi­ nistrativa superior, que é o Tribunal de Contas.”

Hoje, com maior razão, o conceito se impõe, à vista da nova Constituição (art. 77, n.° I I I ).

E’ assim que Te m i s t c c l e s Ca v a l c a n t i, nos seus Comentários à Consti­ tuição de 1946 (v ol. II, pág. 212), escreve:

“A função jurisdicional é sempre ampla e irrestrita, quando de origem constitucional, não podendo rer limitzdá pela lei ordinária” .

“Assim, quando a Constituição diz “julgar” , atribuiu ao órgão mencionado a função peculiar a essa manifestação do poder juris­ dicional, usando em relação ao Tribunal de Contas do mesmo sen­ tido que atribui essa função ao Poder Judiciário, quando diz “julgar originàriamente” , “julgar em grau de recurso” , “julgar” .

13. Não é nossa intenção excluir da apreciação do Poder Judiciário as deliberações do Tribunal de Contas.

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Concordamos em que se possa pleitear perante o Poder Judiciário pro­ priamente dito a anulação cu a declaração de nulidade de atos lesivos do pa­ trimônio da União, se decorrentes de decisão do Tribunal de Contas, mediante a ação popular do § 38 do art. 141 da Constituição.

Concordamos em que, se houve lesão de direito individual, possa restau­ rá-lo a apreciação judicial (§ 4.° do art. 141).

O com que não concordamos é que essa apreciação judicial possa com­ petir a um juízo de primeira instância ou mesmo ao Tribunal Federal de R e­ cursos que, pela Constituição, é equiparado ao Tribunal de Contas.

Po n t e s d e M i r a n d a focalizou, superiormente, a ângulo da questão neste passo:

“Na sistemática da Constituição de 1946, sempre que a auto­ ridade é federal, há competência originária ou recurso ordinário em matéria de habeas-corpus ( aliter, de mandado de segurança):

a) Competência originária do Supremo Tribunal Federal, se coator ou paciente é Tribunal, funcionário ou autoridade cujos atos estejam diretamente sujeitos à jurisdição do Supremo Tribunal (Presidente da República, Presidente do Supremo Tribunal Fe­ deral, Procurador Geral da República, Ministro do Supremo Tri­ bunal Federal, Tribunal Federal de Recursos, Superior Tribunal Militar, Superior Tribunal Eleitoral, Tribunais de Justiça, Tribunal de Contas, Chefes de Missão Diplomática em caráter permanente);

Concluir de maneira diversa seria o mesmo que admitir o paradoxo de ler na Constituição que esta deu maiores garantias, pessoalmente, aos Minis­ tros do Tribunal de Contes do que ao próprio Tribunal de Contas.

14. Objetar-se-á que em regra, a competência é expressa. Mas é de não esquecer a regra constitucional do

“art. 144. A especificação des direitos e garantias expressas nesta Constituição não exclui outros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios que ela adota” .

15. Ademais, são recentes os julgados pioneiros do Supremo Tribunal Federal, em mandado de segurança, no caso da publicação do inquérito do Banco do Brasil e no caso do habeas-corpus a Samuel Wainer.

16. Cabem aqui as palavras dos grandes juizes Nelson Hungria e Luiz Gallottí, respectivamente:

. não se compreende que um Tribunal local interfira na atuação de uma autoridade federal, a projetar-se na dimensão na­ cional”

" . . . há casos de competência implícita ou por fôrça de com­ preensão, conforme muitas vézes admitiu o Supremo Tribunal . . . .

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Di r e i t o e Ju r i s p r u d ê n c i a — Do u t r i n a 2 6 7

17. Esta tese tem importância excepcional, na vida do regime, para o bom entendimento e interpretação da Constituição da República. ( * )

S U M M A R Y

1. D ivergence oi opinion with respect to the application o l the Conslitution on the com peten ce ol the Judiciary to decide upon writs a&ainst the Audit C ou rt.

2 . S cm e jurists consider the Audit Court both as an organ that cooperates with the Legislative in matters o f financial administration and budget execution and as court that decides cases according to com petence entrusted to it b y the Constitution. T he pronoun- cem ent o l the Audit Court is final.

3 . Other jurists maintain that even as a judicial court the Audit Court may infringe a prcvision o f the Constitution or the letter o f a treaty or, zgain, a federal law; in such cases, the Suprem e Court is com petent to decide, in final instance, ipon the cases origi- nally judged b y the Audit Court

4 . A third school o f thouQht claims that the Tribunal de Recursos is com petent to re-examine cases decided upon b y the Audit Court.

5 . T he Author objects to the opinions summarized in Item s 2, C/3, and 4 above, and Cives his reasons to conclude for the com petence o f the Supreme Court to decide upon writs conceded against the Audit C cu rt. PONTES de Mi r a n d a, Comentários à Constituição de 1946, p p . 22, 23 ) queted b y the A u h o r in support o f his opinion.

6. T h e tabou o f the unity of jurisdiction super sede d b y the Constitution o f 1946. Instances o f the jurisdictional functions exercised b y cther organs nct belonging to the Judiciary, such as the Federal Senate, and the Audit C ourt.

7. T h e Audit Court as a judicial court with respect to financial administration. T he twofold field o f the Audit Court, v iz. (1 ) cooperation with the Legislative in matters ol financial administration and budgetary supervision, ar.d (2 ) decisions. o f a judicial charac- ter, on aceounts, legality o f contracts,. retirements, pensions, etc.

S. C om petence o l the Supreme court to decide upon cases originally subm ittei to the Audit Court again discussed and em phasized.

( * ) O Supremo Tribunal Federal acolheu a doutrina oa sua competência originária

para conhecer dos mandados de segurança impetrados contra o Tribunal de Contas da União. Vide julgado pioneiro, no Mandado de Segurança n.° 2.2 7 8 em que os Egrégios Ministros tomaram conhecimento do remédio (D iário da Justiça de 31-12-1953, pagina n.° 1 6 .0 9 7 ).

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