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Nº 48887 A Imagem da China na Literatura Portuguesa: Maria Ondina Braga " A China Fica ao Lado " Lu liu Dissertação Mestrado em Estudo Portugueses

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Nº 48887 A Imagem da China na Literatura Portuguesa:

Maria Ondina Braga"A China Fica ao Lado"

Lu liu

Dissertação Mestrado em Estudo Portugueses

Orientador: Paula Cristina Costa

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A Imagem da China na Literatura Portuguesa:

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RESUMO

Este estudo tem como objetivo estudar a imagem da China em alguns momentos da literatura portuguesa. Nomeadamente, na escritora Maria Ondina Braga, a partir da analise da obra "a China fica ao lado". Como metodologia serão usados alguns conceitos da literatura comparada, tais como o estudo de imagem, ou seja, a imagologia. Tentar se á compreender a imagem que os textos analisados desta autora reflete da cultura chinesa, particularmente, a imagem da mulher chinesa.

(4)

ABSTRACT

This research aims to study the image of China in some moments of Portuguese literature. Namely, from the analysis of the work " A China Fica ao Lado" written by Maria Ondina Braga, will be used some concepts of comparative literatures, for example, the study of image. Trying to understand the image of China described in texts of this author, the image of China reflects the Chinese culture, in particularly the image of the Chinese woman.

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ÍNDICE GERAL

Resumo ………2

Abstract ………3

Introdução a) Objetivo do Trabalho………6

b) Como o ocidental olha para a China ………8

c) Os métodos de estudo da imagem ………12

d) Maria Ondina Braga e a relação com a China………17

e) Portugal como país particular para observar a China. Orientalismo. Literatura Comparada e estudo de imagem………20

Parte Ι 1.O imaginário do Ocidente acerca do Oriente………26

2. A Imagem da China na Literatura Portuguesa do século XVI ao século XIX…31 2.1. Portugal começa a explorar o mar………31

2.2. Apresentação de alguns aspetos da imagem da China na Literatura Portuguesa do século XVI ao XX a) Aspetos iniciais……….40

b) Aspetos negativos………41

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Parte II

4. Apresentação da imagem da China descrita pela autora Maria Ondina Braga

4.1 Vida e Obra………55

4.2 A Experiência no Oriente………59

4.3 O resumo dos vários tipos de personagens………63

4.4 Analise dos vários tipos de personagens………65

5. Caraterísticas especiais a) A especificidade da personagem feminina e o do seu universo …………96

b) A intriga oriental de carácter místico e simbólico………98

6. Conclusão ………103

7. Bibliografia………105

(7)

Introdução

a) Objetivo do trabalho

Qual a imagem da China na literatura portuguesa contemporânea do século XX? Na área da literatura comparada a palavra imagem é utilizada frequentemente e à sua aprendizagem chama-se estudo de imagem,i.e.imagologia. Neste caso, é estudada a imagem de um país estrangeiro tal como foi descrita na literatura de outro país. O estudo da imagem, segundo a literatura comparada, é um conceito amplo, aborda diferentes áreas do conhecimento, tais como a política, a religião, a filosofia, a filologia, a antropologia e a psicologia, entre outras.

O século XX na China é um dos períodos mais tumultuosos de mudança social e de criatividade cultural na história humana. Em 1911, uma tradição de dinastias imperiais durante vários milhares de anos caiu para um grupo de jovens revolucionários que desejavam uma nova direção para o país. Após décadas de guerra, uma fação de revolucionários conhecidos como comunistas chineses, emergiram vitoriosos. No ano de 1949, estabeleceu-se uma “Nova China”, sob um governo que, embora altamente experimental, foi suficientemente estável para durar ao presente. Atualmente é a economia como crescimento mais rápido do mundo, com os valores, organizações e estruturas sociais em rápida mudança. O dinamismo da China continua a ser palpável.

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assim uma imagem da China, que foi naturalmente evoluindo. Este trabalho pretende apresentar de forma simplificada o reflexo da evolução desta imagem na história da literatura portuguesa, especialmente na literatura contemporânea portuguesa do século XX.

Na presente investigação, o trabalho de construção do objeto de estudo teve por base fundamentos teóricos resultantes da revisão do estado da arte através de leituras prévias efetuadas sobre a temática enunciada, pela reflexão das práticas em termos literários.

Pelas mais variadas causas, até hoje poucas pessoas abordaram a imagem da China na literatura portuguesa. Este trabalho pretende analisar esta imagem da China na literatura portuguesa contemporânea através da metodologia comparatista do estudo da imagem, tomando como referência o método do orientalismo e tendo por base a obra de ficção de Maria Ondina Braga intitulada “A China Fica ao Lado” (1967).

Serão analisados igualmente, os vários tipos de personagens desta obra, especialmente a personagem feminina e o seu universo, a intriga de carácter místico do oriente e a religiosidade oriental, entre outros aspetos, para tentar saber que imagem da China revela esta autora. Discutindo a perceção da autora quando ela como observadora descreve a China, e como a China encara esta perceção.

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b) Como o ocidental olha para a China

“Poema Chinês: Repartido

Tu estás na ponte a ver paisagem

Alguém na torre vê a paisagem e também a ti

Um raio de luar decora a sua janela

Mas és tu que decoras o sonho dele

Bian zhi lin”1

Vários europeus chegaram à China ao longo dos últimos séculos, tentando aproximar-se dela. Muitos deles tentaram conhecê-la mais profundamente, procuraram saber se correspondia à sua imagem, e procurando também novas realidades. Houve também aspetos que não se observaram, talvez por motivos culturais.

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fundo está a levar pedaços da sua cultura e a guardar outros desta cultura oriental que hão de colorir os seus sonhos.

Entretanto a China, no centro do mundo, confunde os seus limites com o limite do mundo. O seu céu é o céu do mundo. O território da China é vasto e não há interesse em olhar para além dele. A linha da costa é enorme, mas não é encarada como uma oportunidade de comunicação.

A partir do século XIII, os ocidentais começaram a chegar à China com muita curiosidade. Naquela altura, o conhecimento do mundo que a China tinha restringia-se aos restringia-seus vizinhos e continuava agarrada à tradição de permanecer na sua terra, não tendo interesse pelo resto do mundo.

Por outro lado, os ocidentais continuavam a chegar ininterruptamente trazendo histórias e costumes, e levando ideias utilizadas nos livros e crónicas que moldaram a imagem da China no Ocidente.

Nesses escritos há muitos elogios, mas também algumas críticas, por vezes violentas e injustas. A China reagiu construindo um "muro" de modo a continuar fechada no seu espaço e na sua cultura, bem como a preservar o mundo a que estava habituada.

Os novos conceitos vindos do exterior não alteram muito a cultura chinesa - são antes assimilados por ela.

Por esta razão, no processo de desenvolvimento mundial, os chineses não se habituaram a utilizar os conceitos já existentes noutras partes para explicar as novas descobertas e fenómenos sociais e foram perdendo ainda mais o interesse pelo mundo exterior.

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vemos muito poucas descrições sobre o que se passa do lado exterior, pois o interesse dos chineses é muito raro ou mesmo inexistente.

Stavrianos descreveu assim esta realidade: "Na verdade, os chineses não têm qualquer interesse no que se passa fora da China. De facto, eles não sabem a localização da Europa e raramente a perguntam. Sobre os povos europeus, eles confundem-nos sempre e geralmente trataram-nos por monstros de nariz comprido".2

Ultimamente a China começou a ler e a traduzir os documentos ocidentais que se referem a ela, com o intuito de "conhecer imagem da China na visão dos ocidentais"3.

No estudo da sinologia já há muitas traduções acerca das comparações culturais entre China e Europa.

No livro "Definição da China na visão dos Ocidentais "4, o autor comenta "que a

porta da China se abriu desde finais do século XIX, os ocidentais começaram a escrever sobre a política, a vida e espirito do povo, características da raça, etc. Mas ao mesmo tempo o autor explica que a imagem da China na visão dos ocidentais apresenta aspetos verdadeiros, mas também coisas menos corretas. "5

Sobre os estudiosos chineses na área da imagem da China na visão Ocidental, o melhor e também o mais importante livro é o intitulado A definição da China no Mundo (Publicado em 1992)6. Este livro descreveu a política, economia, sociedade,

religião, cultura, língua, filosofia e literatura da China na visão ocidental.

O sinologista americano Jonathan D. Spence publicou muitos obras sobre a China, tais como, a sua obra que se pode incluir como uma referência da imagem da China intitulada "A China na Visão do Ocidente"7 discute a imagem da China desde Marco

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Outro estudioso da sinologia, o alemão Hans Wolfgang Rubin, discursou numa palestra na universidade de Beijing em 1997, o assunto era o estudo da diferença. O autor abordou o estudo da diferença através do padrão ocidental, e também discutiu a imagem da China na literatura alemã em diferentes períodos.

(Notas de Rodapés da parte b)

1.卞之琳,断章,写于1935年(tradução:Bian zhi lin, Poeta Chinês, poema Duna Zhang(traduzido

em português por: repartido), foi escrito em editora ,1935, )

2.Leften Stavros Stavrianos, Man's Past and Present: A Global History (1971)(abridgement of World

to/since 1500, 2nd ed.),p39

3. Zhou Yi, "conhecer imagem da China na visão dos ocidentais",beiijing,1989,

4. Bai Ju ,"Definição da China na visão de Ocidentais ", the people of republica, 1978.

5.Bai Ju ,"Definição da China na visão de Ocidentais ", the people of republica, 1978. P.45

6.Huang Zhong, A definição da China no Mundo, beijing, 1992

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c) O método de estudo da imagem

Na área da cultura e da história, os termos imagem e conceção da China são ambos usados, visto que o seu significado é muito próximo. Um estudioso chinês chamado Zhou Ning, apontou pela primeira vez, a diferença entre os dois. De acordo com o autor, o termo conceção da China é usado especialmente pelos estudiosos ocidentais que estudaram a China. A conceção da China é uma metodologia empregue pelo sinologistas, e ainda um conhecimento profissional.

Não obstante, a imagem da China é popularmente usada na sociedade e refere-se a uma ideia alargada sobre a China, incluindo conhecimentos, imaginário, verdades e ilusões. A imagem da China é vulgarmente construída através de variados textos. A separação destes conceitos pelo Senhor Zhou é muito correta. Além disso, a imagem não surge apenas através dos textos, mas também através do movimento, das ações, das conversas, dos equipamentos, da arquitetura, do ambiente, das cores, do som, dos aromas, etc. Em conclusão, o ser humano consegue formar uma imagem acerca tudo. O estudo da imagem também pode ser analisado pela literatura comparada.

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Para dar uma resposta a essas interrogações, enveredou-se pelo caminho mais seguro, que é o da analise dos meios de conhecimento de que dispuseram os portugueses nas suas relações com a China, relações quer intelectuais, quer comerciais, ou políticas. Mas deverá notar-se que, em qualquer destes domínios, apenas se destaca as linhas-mestras desses meios de conhecimento. Com atenção às lições dos historiadores, tentar-se-á igualmente exprimir os diferentes ritmos da história das relações luso-chineses. Todavia, o que mais nos interessou foi compreender--em termos literários--as imagens, por vezes elementares (quer dizer, essenciais) com as quais os portugueses formaram uma ideia e tiveram uma experiência da China.

Ora, aqui, o estudo, não se limita a mergulhar em diferentes camadas de cultura, ao longo dos séculos, mergulha-se também, forçosamente, em nós próprios. Porquê? Porque o aparecimento de uma imagem, de uma interpretação do Outro, esta ou aquela "leitura" de Portugal, não podem deixar indiferente o investigador. A imagem, isolada, explicada, interpela, interroga, faz pressão sobre o investigador para que ele penetre fundo em si mesmo, para que ele analise as suas próprias formas de representação, as suas preferências, os seus entusiasmos, os seus silêncios. Assim, não é a objetividade que pretendemos atingir aqui, mas sim uma verdadeira análise autocrítica: diz-me como vês o Outro, dir-te-ei quem tu és…

Terrível regra do jogo, esta regra imposta pela imagética literária, ou como se diz na expressão comparativista francesa, a "imagologie". Todavia, esta regra é a razão de ser das nossas atividades universitárias a nível da Literatura Comparada, ainda considerada por alguns (que de fato a desconhecem) demasiado afastada do real e das suas preocupações....

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Assim, desde o início, a base fundamental da Literatura Comparada, o princípio dialógico (o famoso diálogo de culturas, frequentemente desigual), de que um dos fundadores foi Bakhtine, instala-se no próprio centro do espaço conhecido (o da cultura do investigador), retomando-o, revalorizando-o.

Edgar Morin disse: "todo o estudo de imagem é valioso quando dá atenção à cultura da imagem. Por isso, o estudo da imagem não é apenas obra de autores, mas também engloba as áreas da historia, sociedade e cultura, etc."8

Na área da literatura comparada o estudo da imagem é um estudo recente, com pouca história, proporcionado por um estudioso alemão, Jauss, e outro francês, Étiemble, nas décadas 60 e 70 do século XX. O estudo da imagem enquadra-se na literatura comparada e na respetiva metodologia do estudo de imagem da literatura.

Na China, o estudo de imagem inicia-se mais tarde e começa a chamar a atenção na década de 90 do século XX. "A lista da literatura Comparada da China"(1994.1) 9e

"Literatura Comparada Chinesa" (1995.1-2)10são livros publicados sobre o estudo de

imagem na literatura comparada, por Balou.

Posteriormente, Le-Daiyun publica "Cultura Transmitida e Imagem da literatura

"(1999) e Meng-Hua publica "literatura comparativa"(2001)11 sendo neste livro,

muito significativo para iniciar e indicar o caminho da literatura comparada.

Portugal foi o país ocidental que mais cedo teve contato com a China e os portugueses escreveram muitos textos sobre ela, muito embora estes não tenham tido muito peso na literatura europeia.

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C.R.Boxer ao comentar o livro do missionário português Gaspar daCruz Tratado das Coisas da China 12 afirma que este descreve melhor e mais claramente a China do

que o famoso viajante Marco Polo.

Há muitos estudiosos do Oriente que pensam que para além de Marco Polo, Mendoza e Ricci, não há mais livros na Europa que descrevam bem a China. Isso é um erro uma vez que infelizmente é ignorada a bibliografia portuguesa e espanhola.

Por outro lado, na China são poucas as pessoas que conseguiram obter proficiência na língua portuguesa, e ainda menos as que analisaram a imagem da China na literatura portuguesa.

Além disso os poucos estudiosos que estudaram a imagem da China, não consideraram os livros portugueses, por exemplo os livros intituladosA Imagem da China, A Lenda do Ocidental e A Listagem da Grande China13, são muito pouco discutidos.

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Notas de Rodapé de episódio c)

8..Edgar Morin,L'Homme et la Mort ("O Homem e a Morte"), lançado em1951.p34

9..Zhou Ning,A lista da literatura Comparada da China"(1994.1)

10..Zhou Ning,"Literatura Comparada Chinesa" (1995.1-2)

11.le-daiyun ,"Cultura Transmitida e Imagem da literatura "(1999),"literatura comparativa"(2001),

beijing

12.Daniel-Henri Pageaux imagem de Portugal na cultura Francesa, 1. Edição -1983,p23

13. Rodrigo Trespach, a imagem da China,1 Edição,1989,

14.os lusíadas(publicado em 1995 pela editora chinesa arte associação)

15.Viagem no Sul da China(publicado em 2002 e que parte da coleção da biblioteca da China)

16. imagem da China na literatura ibérica dos seculos XXVI e XXVII16 (publicada em 2003 pela

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d) Maria Ondina Braga e a relação com a China

Em Macau há muitas obras publicadas por autores portugueses residentes, das quais as principais foram publicadas em língua portuguesa e também traduzidas para chinês. Uma delas pertence à autora portuguesa Maria Ondina Braga, que descreve a China na sua obra.

A autora viveu em Macau três anos, e afirmou-se como ficcionista. Publicou livros sobre a China, tais como a China fica ao lado (1968), romances como Noturno em Macau (1991) e contos comoAngústia em Pequim (Lisboa Rolim - 1988). A China fica ao Lado ganhou o Prémio do Concurso de Manuscritos do SNI, Noturno em Macau

ganhou o Prémio Eça de Queirós.

Marina Ondina Braga foi uma autora portuguesa muito viajada. Teve experiências em Africa, na Europa e na Asia. Ela foi uma boa representante da literatura itinerante, e deu uma grande contribuição à literatura de viagem portuguesa. Depois da época dos descobrimentos de Portugal, a literatura de viagens começou a ser muito comum e ocupou um lugar muito importante na literatura portuguesa. Nos relatos históricos começou a aparecer com frequência esta vertente itinerante.

A viagem, na sua especificidade, torna-se uma espécie de tema literário no qual é importante ver até que ponto pode estruturar um texto ou o imaginário de um escritor e quais serão os diversos aspetos e metamorfoses desse tema. O caso-limite dessa metamorfose cultural é o da viagem imóvel, a "mise en scène do eu"17num

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Aqui a viagem é um elemento profundamente revelador dos problemas do ser em si. Mas, antes de mais, a viagem é uma experiência do estrangeiro, vivido ou imaginado, ou ainda simultaneamente as duas coisas. O que, sobretudo no século XIX, a torna uma experiência essencialmente complexa.

De facto, de todas as experiências do país estrangeiro ou do indivíduo, a viagem é sem dúvida a mais complexa. Mas esta complexidade não deve de maneira nenhuma fazer recuar o estudioso da literatura, o qual tem, assim, a oportunidade de confrontar a análise textual com outras abordagens: histórica, artística, sociológica e antropológica. Porquê este último termo? A sua justificação é evidente quando se pensa. Todavia, desde já, queremos assinalar que para nós a viagem constitui também uma prática cultural, ao mesmo nível das outras, tais como a pintura, a dança ou a cozinha.

Assim, a viagem é, simultaneamente, uma experiência humana singular, única, inconfundível para aquele que a viveu, e um testemunho humano que se inscreve num momento preciso da história cultural de um país: o do viajante. Por seu turno, este conceito de uma cultura implica para o viajante-escritor a escolha de uma escrita, a forma literária, mais ou menos pessoal, da sua narrativa.

O percurso de Maria Ondina Braga, numa tradição cristã antiga é associado frequentemente à peregrinação, à travessia do mundo e da vida. A esta tradição responde um poeta moderno, como Fernando Pessoa, o seguinte, no seguinte poema datado de 1930:

Quando fui peregrino

Do meu próprio destino!

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universo. Aspeto como a intriga de carácter místico, misticismo e religiosidade, entre outros serão analisados para explicar e mostrar como a imagem da China é retratada de modo geral na literatura portuguesa contemporânea do século XX.

A análise vai debruçar-se também sobre a imagem da China na literatura portuguesa do século XVI ao XX. Sendo uma ajuda para acompanhar a evolução da imagem da China na literatura portuguesa.

O seculo XX vai ser especificamente analisado neste trabalho. Discutindo o imaginário e a aceitação de um observador (também autor) que descreve a China (a China como ele a observou) e ao mesmo tempo a reação de quem foi observado.

(Notas de Rodapé do episódio c)

17 Daniel-Henri Pageaux imagem de Portugal na cultura Francesa, 1. Edição -1983, p23

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e) Portugal como país particular para observar a China. Orientalismo. Literatura Comparada e estudo da imagem

Portugal pertence ao Ocidente ou não? Na geografia e na cultura Portugal pertence ao Ocidente, e contribui também para o conceito de Ocidente. O Ocidente constituiu-se como entidade social e cultural no início do século XVIII. Anteriormente existia apenas uma união de países cristãos. Mas o território do islão e a sua história foram nesta altura objetos da atenção dos ocidentais, pois eram já parte do Oriente e como tal enquadrados no orientalismo.

"Durante a luta e os encontros com os países islâmicos, a imagem do Islão é confusa, a barba como elemento identificador, as indecências, a sujidade, o mau feitio, tal qual monstros sem moral ou consciência." 19O crescimento da fé cristã e a

prosperidade de Omã faz evoluir o conceito de cristianismo para o conceito de Ocidente.

A exploração pós descobrimentos une a Europa ao redor do conceito de Ocidente. No século XIX, a colonização da Índia, de parte da China, e do Médio Oriente, tornou o Ocidente num importante protagonista.

Ao mesmo tempo, os Estado Unidos, como um mundo novo também eram vistos como fazendo parte do Ocidente e aparece o conceito de cultura ocidental. Portugal como um dos membros do Ocidente foi um pioneiro na exploração do mundo e na luta contra os islâmicos.

Portugal teve sempre uma relação próxima com os religiosos romanos. Perdeu, no entanto, o lugar de topo, alcançado nos descobrimentos, e o seu posicionamento no plano internacional ficou cada vez mais fraco, sendo mesmo menosprezado por outros países na Europa.

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sobreviver. Este aspeto também influenciou a sua atitude em relação à China. Ao mesmo tempo Portugal nivelou-se como Mundo Ocidental, onde continua, no entanto, a haver grandes diferenças entre os diferentes países. Neste ponto, surge a criticar Eduard Said 20que não aceita os ocidentais porque não têm outra intenção

que não seja a de dominar e controlar.

Para perceber a imagem da China no Ocidente temos de recorrer à teoria do estudo da imagem, e do orientalismo de Edward Said, onde este trabalho se inspirou. Edward Said aproveitou a teoria de Michel Foucault para discutir o estudo do orientalismo, ele apontou os orientais como “o outro” para os ocidentais, que assim aceitaram as suas próprias culturas, baseando-se no fato de cada cultura precisar de construir “o outro”.

Segundo a teoria de Edward Said o desenvolvimento e a preservação de cada cultura precisa de outra cultura para ser homogénea e competitiva (alter ego). A construção da identidade “eu próprio” (porque do próprio ponto de vista, quer do oriental, do ocidental, do francês ou do inglês, para além do conjunto de diferentes experiências, no final é tudo uma construção da identidade do “eu próprio”). A construção do “eu próprio” implica a construção do “outro” que é contrário de ti mesmo, assim nós temos diferentes personagens, e explicação, e reexplicação. Em cada nova época a sociedade cria “o outro” que é um oposto de si mesmo. Por isso, a identificação do “eu próprio” e do “outro” em oposição, são construções dinâmicas e não estáticas.

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Paralelamente, o investigador literário ficava condenado a não estudar mais a história das ideias, outra herança legada por F.Baldensperger e Paul Hazard, um dos prolongamentos mais importante de todo e qualquer estudo sobre as viagens e as imagens.

Temos de reconhecer que esta "imagologie" teve ilustres inimigos. Já em 1953, num artigo publicado no" Yearbook of Comparative and General Literature", René Wellek se manifestava frontalmente contra este tipo de estudos, por ele considerados representativos da famosa escola francesa da literatura comparada, quer dizer, a escola erudita, historicista, digamos mesmo neopositivista. Dez anos depois, Étiemble, em "Comparaison n'est pas raison," estigmatizava os trabalhos que, segundo ele, "regarder et historie, le sociologue ou l' homme d'etat», acrescentando também que esse género de estudo era, segundo parecia," prospere en France,presque autant que les études sur les voyageurs islandias à madagascar, malgaches au Kamtchatka, ou suédois à Bangkok!"21

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Repare-se, antes de mais, que toda e qualquer imagem procede de uma tomada de consciência. Por menor que ela seja, procede de um Eu em relação a um "algures". A imagem é, portanto, o resultado de uma distância significativa entre duas realidades culturais. Ou melhor, a imagem é a representação de uma realidade cultural estrangeira através da qual o indivíduo ou o grupo que a elabora (ou que a partilha ou propaga) revela e traduz o espaço ideológico no qual se situa.

A história e a área académica e política contribuem muito para esta construção que parece um concurso em que está envolvida cada instituição e unidade da sociedade. A atitude cultural Ocidental em relação ao Oriente tem a ver com a construção do “eu próprio”. O oriental, como oriental, existe apenas porque foi construído pelo ocidental, e então os termos de construção do conceito de oriental foram criadas pela teoria e pela prática, e os processos foram deixados ao longo de alguns séculos. Estes processos podem ser englobados num sistema denominado de "estudo do orientalismo", que é uma espécie de filtro aceite por toda a gente. O Ocidente usa esse filtro em relação aos orientais.

A imagem da China como um objetivo do Ocidente leva a que o processo para construir “o outro” ao contrário de "si", também passe por esse filtro. Por isso, a imagem da China, o imaginário da China, os conhecimentos sobre a China, as verdades acerca da China, as ficções e a mitologia chinesas são filtradas pelos ocidentais, levando em conta também as expectativas dos ocidentais, e as necessidades e os proveitos do “outro” para o Ocidente.

De fato, cada um tem o seu filtro, todas as coisas que vemos passam por esse filtro, e todos os sentimentos e valores são filtrados para entrar no nosso próprio mundo, portanto, o Oriente não existe. Não apenas ele não existe naturalmente, como de igual modo o Ocidente não existe naturalmente.

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observadores. Por isso, a análise sobre a criação e a evolução da imagem da China tem muitos protagonistas.

A imagem da China inevitavelmente vai passar por um filtro, do ponto vista do estudo da imagem, para criar a imagem de outro país, o autor não apenas copia, ele filtra alguns tipos de personagens, as personagens que o autor pensa que convêm para explicar a imagem do outro país. Por isso, o estudo da imagem na literatura comparada não é apenas copiar e assemelhar diferentes realidades. A imagem da China é reconstruída e reescrita por cada observador, este mecanismo de reconstrução existe antes do estudo da imagem.

A imagem é a imagem do “outro”, mas também transmite a imagem do próprio. Em conclusão, quanto o ocidental está a criar a imagem da China, também está a discutir a sua própria, está à procura da aceitação da sua identidade e a tentar melhorá-la. Quando um observador está a olhar para a China, esta é o objeto observado, mas o observador também está a questionar-se a si próprio. É o que se passa com a contemplação de toda gente.

Há uma tese sobre é a relação entre China e Japão22, que a indica a imagem do

japonês na literatura chinesa e que analisa como a imagem do Japão foi interiorizada pelos chineses. O mais impressionante é a atitude da China face ao japão. O autor disse, o centralismo da cultura mostra uma prioridade ultrapassada, e essa prioridade fez mesmo a China permanecer muito fechada. À cultura da China ainda falta a capacidade de conhecer e analisar o mundo exterior.

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nunca conheceu realmente o japão. O conhecimento do Japão começou apenas na época contemporânea.

E também dá para pensar, como é que a China depois de milénios de proximidade ainda não conhecia o Japão. Também mostra quem foi o observado. O centralismo da China faz da sua cultura uma prioridade e também faz a China perder o desejo e o entusiamo de conhecer o mundo lá fora. Na verdade, não havendo um “outro” em contraposição, não dá para se conhecer a si mesmo.

Podemos pensar na metáfora da China como um espelho. Os conhecimentos acerca do Ocidente para os orientais são também como um espelho. Esse espelho, reflete os pensamentos lá fora acerca da China, e a evolução da sua imagem na história Ocidental, e vai ajudar a melhorar o saber e o conhecimento e as potencialidades do país e do povo. Hoje em dia, a modernização e a comunicação internacional, reforça a consciência e ajuda a obter um lugar melhor no posicionamento global.

Notas de Rodapé de e)

19 Edward wadie said, orientalismo, Editor, Good Hope, 1978, p45

20 Edward wadie said, orientalismo, Editor , Good Hope 1978, p25

21 Daniel-henri pageaux, imagem de portugal na cultura ,1 edição-1983,p 67

22 徐秦,论文,中国和日本的关系,写于1990(Tradução:Qu Qi, tese, a relação entre China e Japão, foi

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1. O Imaginário do Ocidente acerca do Oriente

Vimos o diferente céu e terra.

(Luís de Camões)

A história de um país e de uma raça pode ser a história da tentativa de definir e redefinir os seus próprios limites. O homem faz as fronteiras, mas não fica satisfeito com o mundo dentro dessas fronteiras, pois transpor uma fronteira é um desejo e uma atividade instintiva do ser humano. Passar as fronteiras geográficas está no imaginário do ser humano, que o faz tanto por via pacífica como violenta. Por isso, viajar para além das suas fronteiras é a procura do “outro”, é um caminho mais curto de se conhecer a si próprio, e a satisfação desse desejo. O Ocidental é um conceito geográfico, político e cultural, assente na mudança permanente das suas fronteiras.

Antes do século XIII, os habitantes do nosso planeta não se conheciam uns aos outros e sabia-se muito pouco sobre quem realmente seriam os seus habitantes. As pessoas viviam isoladas nas suas terras, pois não existiam meios de comunicação nem de transporte. A curiosidade levou-as a começar a viajar para além das suas fronteiras. Muitos viajavam também no seu imaginário através das lendas que foram surgindo.

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O clérigo Pian de Carpine, que foi missionário, e embaixador do papa na Mongólia em 1245, escreveu o livro "A História da Mongólia" baseado nas suas vivências e em 1253, o monge franciscano Guilherme de Rubruck foi enviado para a Mongólia para pregar a religião cristã. Os dois nunca estiveram na China, mas mesmo assim escreveram muitas coisas sobre a China, na maioria imaginadas.

A partir do século XIII a economia da Europa assim como o seu número de habitantes começou a ter um crescimento assinalável. Os comerciantes começaram a organizar-se melhor e as atividades comerciais tiveram um grande incremento.

Por causa da necessidade de ouro, de alimentos e de produtos de luxo, muitos negociantes começaram a viajar para lugares mais longínquos. Antes do caminho marítimo entre o Ocidente e o Oriente, já existia um caminho denominado de “rota da seda” por terra, através do qual se desenvolviam os negócios. Muitos produtos exóticos orientais já apareciam nas cidades ocidentais.

Chegavam também muitos relatos sobre essas viagens e sobre terras distantes. As dificuldades de transporte impediam a comunicação entre o Ocidente e o Oriente, e assim o conhecimento do Ocidente sobre o Oriente era muito escasso. Muitas coisas sobre o Oriente foram transmitidas boca a boca, e pelas lendas que se iam originando. Mas muitos delas eram exageros ou mal-entendidos.

Na verdade, a Europa só começou a conhecer melhor o Oriente depois do regresso de Marco Polo, pois foi quando conseguiu obter informações corretas acerca do Oriente. O viajante Marco Polo foi ao Oriente em 1271, chegou ao interior do continente asiático e encontrou-se com Kehan imperador da Mongólia. Kehan apreciou as suas capacidades e ofereceu-lhe trabalho no seu palácio. Portanto, ele teve oportunidade de viajar por muitas zonas da China.

Em 1295, Marco Polo regressou a Veneza, publicou o livromilhão21(0 que significava

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grande sensação na época, tendo tido várias edições e traduções espalhadas por toda a Europa.

A maior razão para o sucesso deste livro foi a garantia do autor de que todos os acontecimentos descritos no livro tinham sido presenciados por si próprio.

O livro contesta a existência de um país no Oriente em que os habitantes, riquezas, artigos de luxo e cidades eram enormes e ultrapassavam em muito o que existia na Europa.

O livro de Marco Polo descreveu pela primeira vez abundantemente a China e a dinastia Yuan. O autor descreveu um mundo novo cheio de surpresas, elogiou os tesouros, as cidades, os produtos, os caminhos, os palácios, etc. Estes relatos impressionaram muito os europeus e ficaram gravados nas suas memórias. Mesmo assim, a China continuou a ser um país misterioso.

Vinte anos depois do regresso de Marco Polo apareceram outros autores italianos a escrever sobre a China, por exemplo Odoric of Pordenone, com o seu livro a viagem de Odoric, e Bernard Mandeville com o livroO Visto e o Ouvido do Oriente22. O livro deOdoric 23descrevia corretamente o Oriente, mas não foi tão popular como o de

Mandeville. "O Visto e o Ouvido do oriente" foram escritos entre 1356 e 1357.

Bernard Mandeville escreveu também sobre a India e a China. A China foi descrita como um lugar paradisíaco. Este livro, do qual ainda hoje há duzentos manuscritos, teve mais sucesso do que o livro de Marco Polo, mas na verdade Mandeville nunca esteve na China nem tão pouco no oriente, ele apenas aproveitou as obras de outros autores. É uma obra imaginada e ficcional, de modo a satisfazer os desejos dos ocidentais.

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cidades, o facto de haver habitantes cristãos, a inexistência de pobres, a barba dos homens ser parecida com a dos gatos, e a beleza das mulheres, entre outros.

Os autores ocidentais que provavelmente nunca estiveram no Oriente são todos iguais na repetição destes elogios, descrevendo o Oriente como um lugar rico, próspero e de arquitetura magistral. Estas descrições repetem-se na história Ocidental, e também nas descrições de portugueses, mesmo as descrições dos portugueses originadas diretamente pela experiência, têm a ver com o seu enquadramento Ocidental. Por isso, parece um sistema rotineiro de metáforas, inicialmente a acompanhar o pensamento já existente para comentar a imagem da China, e apenas por acaso em diferentes períodos. Podemos dizer que se a imagem da China na época medieval era uma imagem colorida, então os portugueses puseram mais cor nessa imagem.

Na época medieval, o ocidental construiu o Oriente com base no seu imaginário e nas lendas.

A partir do século XVI os europeus começaram realmente a viajar. Empunhando espadas e transportando a cruz cristã, começaram a explorar com ambição. A história da Europa do autor Peter Rietbergen, indica que "por tradição os europeus sempre tiveram bom gosto para as viagens."24

Os motivos foram vários. Em primeiro lugar, o pensamento europeu era cada vez mais independente, seguindo-se depois os conhecimentos de astronomia árabe, experiências de viagem, mapas feitos por profissionais judeus que já tinham chegado à Europa. Mais do que o desenvolvimento da Europa, a escassez de território, leva os países a quererem alargar os seus domínios. Por isso, não interessavam os valores a gastar, viajar começou a tornar-se inevitável.

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indianos, hunos, árabes, entre outros povos. Os europeus defenderam-se e fizeram a vingança, muitas vezes armados e transportando a cruz."25

Por isso, a Europa tem uma tradição de exploração e esta exploração de alguma forma autoalimenta-se. O rancor religioso entre os cristãos e os islâmicos cria nesses dois mundos o ceticismo, a ganância, e as atitudes de vingança, e a vontade de cada um querer conquistar o outro, antes de explorar as suas riquezas.

Os islâmicos controlavam os caminhos para o Oriente. Por isso, a raiva dos cristãos era muito forte. Os europeus queriam chegar comercialmente ao Oriente, e por acaso havia uma lenda que dizia existir no Oriente um lugar cristão, e que o Papa também devia ser o seu chefe. Por isso, eles sonhavam um dia chegar ao Oriente e unir-se a estes cristãos com o fim de derrotar os islâmicos.

No fundo, a Europa começa a sonhar assim com o mundo: o ocidental representa a infância do homem, o Oriente o conhecimento arcaico do ser humano, a América o homem primitivo, e a China a sociedade perfeita e com muito esperança no futuro.

Desde a época de Marco Polo e dos descobrimentos que a Europa passou pelo imaginário e pelo ficcional, pela procura e pela conquista, o que mostra que a Europa precisava de um “outro” em contraste, para poder desenvolver-se a si mesma.

Os ocidentais eram sonhadores com muita paixão, viajantes com muita coragem, conquistadores ambiciosos e a sociedade Ocidental desenvolveu-se neste processo de civilização e guerra. Por outro lado, a China foi um objeto muito inspirador para a Europa, mas ao mesmo tempo foi também um objetivo a conquistar.

Notas de Rodapé de capitulo 1

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22 Mandeville,o visto e o ouvido do oriente,1945

23Odoric of Pordenone, Odoric,1956

24 Peter Rietbergen, A Culture history, psychology press, 1988, P.234

25 Leften Stavrianos,The World to 1500: A Global History (1970; 3rd ed. 1983; 7th ed. 1999)

2. A Imagem da China na Literatura Portuguesa do século XVI ao XIX

2.1Portugal começou a explorar o mar

O destino de Portugal era viajar para outros lugares. A situação geográfica teve consequências muito importantes na política, história e cultura de Portugal, sendo uma razão de peso para impulsionar Portugal a partir para a descoberta do mundo. A Espanha era mais forte e separava Portugal dos outros países da Europa. Portugal estava isolado, e podia apenas “alargar-se” para o lado do mar, e assim este entrou no coração dos portugueses. Mas, o que adianta, no entanto, o mar, se não houver nenhum caminho para alargar o pequeno território?

Por isso, as características dos portugueses foram-se formando com base no seu pequeno território e no vasto oceano. Os portugueses desenvolveram a capacidade e a coragem para viajar e para enfrentar o desafio do mar violento e misterioso, e por outro lado a sede de aventura tornou-os sonhadores, característica essa que deixou vestígios fundamentalmente na literatura e na cultura.

Adam Smith disse que" o descobrimento da América, através do "Cabo da Boa Esperança" e da India foi um evento majestoso e muito importante. "26. Este autor

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e mudou completamente. Nesta parte da história os portugueses foram os pioneiros, um país silencioso e uma raça fraca foram os registos nos livros de história.

O espírito de aventura e a paixão de descobrir novas coisas encorajaram os portugueses a entrar no mar, a exploração é o resultado do desejo, ou mesmo do entusiasmo de conhecer um novo mundo. A partir do século XIII, os portugueses começaram a descobrir e explorar o Oceano Atlântico e a Costa de África, naquela altura ainda não conheciam nada sobre o Oriente, nem tinham noção da sua localização. Os portugueses serviam-se de livros europeus para saber algo sobre o Oriente. Este ainda era um mistério para os portugueses e não há, nesta altura, descrições sobre o Oriente que se tenham refletido na literatura portuguesa.

No século XV, o livro de Marco Polo e o livro "Visto e o Ouvido do Oriente "(1945)

terão chegado a Portugal e incentivado a imaginação dos portugueses, proporcionando a inspiração para a exploração portuguesa.

As motivações da exploração dos portugueses foram as necessidades económicas e o fervor religioso. O historiador português José Hermano Saraiva comentou esta motivação indicando que, "no século XV, a sociedade portuguesa estava cheia de contradições, mas a exploração beneficiou pessoas de todos os estratos sociais. Para o povo, a exploração foi uma forma de emigrar, poder sair da pobreza e procurar uma vida melhor."27

Para os religiosos e nobres, a exploração serviu para pregar a religião, alargar as áreas do cristianismo e ocupar mais território. Ambas eram maneiras de servir a Deus e ao rei, pois serviam para obter mais terra, mais empregos e ofícios, e mais fiéis religiosos.

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Para o rei, foi uma oportunidade de aumentar a reputação e explorar novas maneiras de aumentar a riqueza do reino.

Foram sobretudo os motivos económicos que levaram os portugueses a explorar, e foi também uma oportunidade de resolver as contradições domésticas. Além disso, a paixão pela religião também foi um motivo. Os portugueses eram fiéis católicos, o comprometimento com a fé cristã, nesta época, proporcionava muito boas influências, daí Portugal mostrar, nesta fase, alguma debilidade.

O impulsionador dos descobrimentos foi o príncipe Infante D. Henrique, ele era um católico fiel, e viu que o poder cristão estava cada vez mais fraco, por isso pensou em usar o povo cristão para recuperar a força do cristianismo, e por isso ele também foi mandatado pelo papa na liderança deste grupo de cristãos.

Ele ajustou a atividade dos negociantes e dos nobres, que queriam obter benefícios durante o decurso das rotas comerciais, mas o príncipe regulou essa atividade de modo a seguir os interesses da nação e da religião católica. Por isso, a exploração em conjunto com a pregação da religião, foi uma oportunidade de lucrar mais e reforçar o poder da igreja católica.

Os portugueses empunhando a espada por um lado, e por outro pregando a fé cristã (As velas dos navios levavam a cruz cristã pintada) revelavam os dois princípios fundamentais da exploração portuguesa.

Apesar do uso de novas técnicas de navegação, a exploração com base na paixão religiosa e no desejo de deixar para trás séculos de muitas contradições, é acompanhada do espírito de cavaleiro medieval, com a cruz e a espada sempre presentes. Como assinalou o filósofo Eduardo Lourenço, "foi uma aventura com características tipicamente medievais, pelos seus objetivos e pelos processos utilizados."28

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exploração através dos soldados da cruz. A cruz cristã bordada não era apenas um símbolo, mas sim o verdadeiro espírito aglutinador.

Os Venezianos, já então com uma burguesia forte, sabiam que o símbolo da cruz, presente um pouco por todo o lado, não era muito conveniente para comunicar com outros povos, e com fiéis de outras religiões.

Os portugueses não eram negociantes e comerciantes aquando do início do capitalismo, mas o espirito economicista desta exploração foi uma escola e uma oportunidade de negócio para toda a gente, sem nunca faltar, é certo, o fundo religioso.

O professor universitário e ensaísta Jacinto do Prado Coelho disse com orgulho: "nós, os portugueses, fomos grandiosos viajantes, por vários motivos, como por exemplo o estado da economia, a ambição política, a paixão pela religião, e a ânsia pela aventura, que fizeram com que o nosso o espírito de cavaleiro andasse por todo mundo. Por isso, no decurso da experiência e da observação, fomos aprendendo ao longo dos anos, descobrimos os segredos do mundo, descrevemos muitas novidades, não apenas por regozijo, mas também para ajudar os outros. "29

Na verdade, os portugueses deixaram muitos escritos sobre a época dos descobrimentos. A literatura portuguesa tornou-se mais interessante e próspera, devido a estas narrações. Estas descrições, não apenas refletiam o espírito humano, ou proporcionavam conteúdos exóticos, ou argumento para os escritores, mas também, e fundamentalmente, mostravam a paixão pelo humanismo, a capacidade de sobrevivência e o êxito dos portugueses no mundo. Foram viajantes, idealistas, mas também tiveram "de lavar a cara com as próprias lágrimas."

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Esta história brilhante podia constituir um modelo para a atitude do presente. As pessoas conservaram muitos símbolos dos descobrimentos em Portugal, visíveis em monumentos, museus, estandartes, livros, e nomes de ruas e de lugares. Comemoram regularmente estes feitos do passado. Para comemorar esta parte brilhante da sua história, Portugal organiza através da associação dos descobrimentos, palestras, conferências e edições de livros entre outras manifestações, para que as pessoas não esqueçam a história.

Os descobrimentos contribuíram para o desenvolvimento da civilização. É de salientar que os portugueses levaram as ciências humanas aos quatro cantos do mundo. Eles conquistaram o mundo com o conhecimento, com a cultura e com a organização e não só com as espadas e a artilharia.

Os descobrimentos dos portugueses foram uma atividade majestosa. Antes da chegada dos portugueses aos continentes asiático, americano ou à India, já existiam civilizações, com milhares de anos e em alguns casos mais avançadas do que a própria civilização europeia. Há estudiosos que duvidam que os europeus estivessem convencidos do centralismo da Europa.

Portugal teve um grande sucesso com os descobrimentos, mas há custa de muitas dificuldades e sofrimento. Há muitos escritos sobre o naufrágio de barcos, guerras, separações, lágrimas, mortes etc. Mas mesmo assim, os portugueses também acham que foi um feito glorioso, como o poeta Fernando Pessoa que escreveu o seguinte poema, de «Mensagem»:

"Ó mar salgado, quanto do teu sal.

São lágrimas de Portugal!

Por te cruzarmos, quantas mães choraram, quantos filhos em vão rezaram!

Quantas noivas ficaram por casar.

(37)

Valeu a pena? Tudo vale a pena. Se a alma não é pequena.

Quem quer passar além do bojador, tem que passar além da dor.

Deus ao mar o perigo e abismo deu, mas nele é que espelhou o céu."30

Outro poeta, Manuel Alegre, criticou os descobrimentos, ele acha que os portugueses receberam do mar apenas um fruto amargo, que andaram por todo mundo, e no fim descobriram que o seu lugar era mesmo em Portugal. No seu poema sobre Portugal, “Chegar aqui” lê-se:

"Portugal

O teu destino é nunca haver chegada

O teu destino é outra índia e outro mar

E a nova nau lusíada apontada

A um país que só há no verbo achar"31

No entanto, a prosperidade de Portugal foi temporária. No final do século XVI, Portugal começou de repente a perder fulgor. A exploração de outros continentes exigia muita mão-de-obra, energia e outros recursos e as capacidades de Portugal eram limitadas.

Não havia grande apoio financeiro à exploração, mas mais importante foi não haver igualmente consciência comercial para apoiar. Felizmente, o espírito de cavaleiro, o espírito de aventura, a localização geográfica e as novas técnicas de navegação, em conjunto, deram o primeiro lugar aos portugueses na aventura das descobertas.

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poucos recebimentos. José Saramago pensava que "Portugal não ganhou nada de bom com a exploração."32

O esplendor de Portugal esfumou-se com a morte de el Rei D. Sebastião na batalha de Alcácer-Quibir. D. Sebastião era um rei jovem, corajoso e sonhador, e apercebendo-se do enfraquecimento da nação, decidiu, em 1578, partir com o seu exército para Marrocos, para fortalecer a presença portuguesa no norte de África.

Como nenhum dos sobreviventes presenciou a sua morte, os portugueses conservaram a esperança de que ele não tivesse realmente morrido. Acreditavam também que ele iria voltar a Portugal para continuar a construção do país.

Na literatura portuguesa existem inúmeras referências a esta lenda que assume uma natureza mitológica.

No imaginário do povo, D. Sebastião havia de regressar a Portugal e o povo esperou por ele. Muitos portugueses acreditavam que o rei regressaria numa manhã de nevoeiro, o que tinha a ver com o forte lado nefelibata e saudosista dos portugueses.

Este pensamento prova que os portuguese tinham consciência do enfraquecimento do país. O regresso de D. Sebastião nunca se concretizou. A única verdade foi o desejo geral do seu regresso. Esta consciência coletiva tornou os portugueses mais tristes e sentimentais, eles gostam de acreditar na mitologia e de ter esperança em coisas irreais. Este pensamento também tem uma grande influência na literatura portuguesa.

Fernando Pessoa na sua obra também falou sobre o regresso de D. Sebastião para construir um novo Portugal capaz de controlar o mundo.33

(39)

Depois da morte de D. Sebastião Portugal foi ocupado pelos espanhóis até 1 de dezembro de 1640, altura em que houve um golpe de estado que deu origem à restauração da Independência.

A proeminência de Portugal desapareceu e nos lugares cimeiros dos descobrimentos no mundo foi substituído pelo Reino Unido e a Holanda.

Portugal "desapareceu "do mapa do mundo como se fosse um barco naufragado na vastidão do oceano. No palco do mundo, já não há lugar para Portugal, a sua voz tornou-se muito fraca na cena internacional; não há coisas novas para mostrar.

Na época dos descobrimentos, viveu o majestoso poeta Luís Vaz de Camões que na sua obra-prima “Os Lusíadas “descreveu em rima a epopeia dos descobrimentos.

Eduardo Lourenço expressou o seguinte: "em todas as atividades da nossa cultura, o que é mais permanente é a fusão do nosso mundo, eventualmente a relação de harmonia com a natureza e ao mesmo tempo com os nossos defeitos e fracassos, a consciência de ser feliz na tristeza, ou de estar triste na felicidade. " 34 Os

portugueses inventaram uma palavra especial para expressar essa maneira especial de sobreviver: a saudade.

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Notas de Rodapé de capitulo 2.1

21 Marco Polo, milhão, 1º edição,1999

22 Mandeville,o visto e o ouvido do oriente,1945

23Odoric of Pordenone, Odoric,1956

24 Peter Rietbergen, A Culture history, psychology press, 1988, P.234

25 Leften Stavrianos,The World to 1500: A Global History (1970; 3rd ed. 1983; 7th ed. 1999)

26 Adam Smith,the Theory of Moral Sentiments(1759), P45

27 José Hermano Saraiva,Uma carta do Infante D. Henrique (1948),p 56

28 Eduardo Lourenço,O Comércio do Porto (1960), P32

29 Jacinto do Prado Coelho,Dicionário de Literatura, 1969, P55

30 Fernando Pessoa,Mar Português, Mensagem,lisboa(1934)

31 Maunel Alegre,Atlântico, em 1981, lisboa

32 José Saramago ,As Pequenas Memórias, 2006, P 57

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2.2 Apresentação de alguns aspetos da imagem da China na literatura portuguesa do século XVI ao XX.

A. Aspetos inicias

No início do século XVI, os portugueses apenas sabiam que havia na Ásia um lugar chamado Qinren, e ainda não sabiam a localização da China.

Para os portugueses do século XVI, a Índia não era apenas a península índica, era o oriente inteiro, que começava no cabo boa esperança e ia até ao japão e às ilhas do oceano pacífico.

Ainda antes de 1548, os portugueses começaram a explorar a costa da China (mas não contataram o Qindan como foi descrito no livro de Marco Polo) e a fazer negócio ao longo desta costa.

Do mesmo modo, ao lugar da China, eles seguiram a designação dos indianos e chamaram-no de chins (o lugar de chins). Esta palavra é a transliteração de Qin(ren).

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barba fraca e sempre cortada, olhos pequenos, ossos malares afastados do nariz, cabelo comprido e a cara muito plana.

Este livro também contava que o capitão do barco chinês convidou os portuguese para jantar na sua embarcação, e também que os chineses comeram muito, mas não beberam muito vinho, que a refeição tinha muitos temperos e alho e que tinham sido usados faca e garfo para comer. A comida para o jantar era frango e porco cozido, e a sobremesa era mel, doce e várias frutas. Foram usados talheres de prata, e o vinho era branco e servido em copos de porcelana.

Os dois povos conheceram-se assim inicialmente apenas por hábitos de vida e aparência exterior. De qualquer maneira, o primeiro contato foi favorável - os chineses deixaram boa imagem na memória dos portugueses.

Em 1513, Jorge Álvares orientou um grupo de barcos que chegou à de ilha de Tamão, perto de GuangZhou. Naquela altura da dinastia Ming, foi implementada a estratégia de proibir os negócios pelo mar, ficando assim os barcos estrangeiros proibidos de entrar nos portos chineses, por isso o barco de Jorge Álvares apenas estacionou nas ilhas ao largo da China. Esta viagem fez chegar a Lisboa muitas notícias da China.

Em 1515, Rafael Perestrelo35comandou a frota em que os portugueses chegaram à

China pela segunda vez. O objetivo dele também era o comércio e obteve muito dinheiro, e também muita informação acerca dos chineses (Os chineses são gente boa e simpática que gosta de paz e amizade).

B. Aspetos negativos

Os portugueses que mais cedo chegaram à China podem dividir-se em três tipos:

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O segundo tipo foram os missionários e pregadores. Eles chegaram com muito boa preparação e o seu objetivo era pregar o catolicismo no Oriente. Ajudaram muito na comunicação entre as culturas Ocidental e Oriental.

O terceiro tipo foram os negociantes, os aventureiros e os piratas. Estes viajaram para fora do seu país motivados por sonhos de riqueza.

Provinham de diferentes classes sociais e tinham diferentes propósitos ao chegar à China, mas cada um deles à sua maneira descreveu, esclareceu, melhorou, ou inverteu a imagem da China que inicialmente existia na Europa e que foi descrita como muito imaginária e algo falsa.

Viajando por estes novos caminhos marítimos, foram os portugueses que trouxeram notícias da China para a Europa. Os portugueses contactaram os chineses diplomaticamente. Estes contactos foram impressionantes e sem nada de bom ou de poético para contar, e no final acabaram por ser trágicos.

Os portugueses não foram bem tratados como Marco Polo, quando esteve na China, o destino deles foi uma cela escura, em vez do palácio majestoso.

Depois da ocupação da Índia e de Malaca, seguiu-se a exploração ambiciosa do Oriente, e por isso, foi dada muita atenção à recolha de informações dos países da Ásia, como reportam os livros deixados pelos portugueses. A China e a Índia foram os dois países que despertaram mais atenção.

Utilizando informações recolhidas em Malaca e nas duas viagens até à zona costeira chinesa, houve dois autores portugueses, que tinham vivido no Oriente, que escreveram livros sobre a China. Foi a primeira vez que a imagem da China foi descrita na literatura portuguesa. Estes dois autores foram Tomé Pires e Duarte Barbosa.

(44)

oriental"36, o primeiro livro, completamente sobre o Oriente, e entregou-o ao rei

para ser utilizado na estratégia de conquista do Oriente.

A China era há muito conhecida no sudeste asiático como um lugar vasto e rico, e o seu povo era admirado e respeitado. Tomé Pires não concordava com esta apreciação e escreveu sobre esta avaliação dos países orientais.

O autor duvidou e isso surpreendeu todas as pessoas, o autor não descreveu uma China melhor do que o país real.

O historiador Rui Loureiro analisou esta posição que explicou do seguinte modo: "Tomé Pires tinha esta opinião porque antes de 1515, os conhecimentos dos portugueses sobre a China eram ainda muito limitados, e o que já era conhecido sobre a China não correspondia às expectativas.".37

Tomé Pires estava muito desapontado por o imaginário sobre este país não corresponder à realidade então conhecida. Tomé Pires descreveu a aparência dos chineses, a roupa e a comida: Os chineses têm pele branca como a nossa. A maioria usa roupa comprida preta parecida com a nossa, apenas mais comprida. No inverno cobrem as pernas com mantas e calçam botas requintadas. Vestem roupa de pele de cabrito, borrego ou de outros animais. Usam o cabelo despenteado e envolto numa rede de metal fino, do tipo da utilizada pelos pescadores. Os chineses comem carne de porco, vaca e de outros animais.

Eles gostam de beber qualquer bebida mesmo com mau sabor e elogiam os nossos vinhos, que gostam de beber sem moderação38. Naquela altura, os principais

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desonestos e ladrões e isso é o que se chama de defeitos humanos.39Tomé Pires

referiu que a China era rica, mas não era forte.

Esta conclusão foi igual à de outros portugueses que regressaram a Portugal. Tomé Pires achou que" não era difícil para o Governador de Malaca conquistar a China, porque as pessoas eram débeis e era muito fácil derrotá-las. "40"Ele achou também

que a China ao implementar as regras de proibição no mar e ao não deixar os estrangeiros entrar em Guangzhou revelava medo de mostrar as próprias fraquezas."41

Os chineses não queriam viajar para Guangzhou por terem medo dos javaneses e dos malaios, e na verdade, em batalha naval, estes países já tinham derrotado uma frota de vinte barcos chineses.

Eles são débeis e temem os javaneses e os malaios. Na realidade um barco de quatrocentas toneladas conseguiu destruir a cidade de Guangzhou, o que representou uma grande perca para a China. Marco Polo tinha criado uma imagem da china poderosa, mas do ponto de vista de Tomé Pires, a China era frágil.

Tomé Pires também escreveu que tanto o imperador da China, como o povo chinês não acreditavam na religião católica. Para os portugueses isso era motivo de preocupação pois um objetivo da exploração dos portugueses era espalhar a fé católica, e por isso davam muita atenção aos fiéis religiosos.

Tomé Pires também achou que ser imperador da China não era um cargo hereditário, mas sim objeto de eleição pela “corte” ou pela associação dos funcionários públicos. No entanto esta descrição era incorreta. Na China o imperador é que escolhia o diretor da associação, e não o contrário. Tomé Pires fantasiou uma China democrática há 500 anos atrás.

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O autor entregou este livro ao rei de Portugal com propósitos políticos, com o fim de ser lido pelo monarca e pelos chefes da exploração no Oriente. Tomé Pires ao escrever este livro, teve, pois, o cuidado de respeitar as informações que recebeu, e não cair em exageros, como aconteceria provavelmente se o livro se destinasse a outros públicos mais ávidos de fábulas coloridas.

Duarte Barbosa, contemporâneo de Tomé Pires, foi um navegador que escreveu uma série de manuscritos reunidos no "Livro de Duarte Barbosa".42

Num desses manuscritos fez a relação do que viu e ouviu no Oriente. O conteúdo é semelhante ao de "Suma Oriente". Também descreveu o imperador da China como pagão, a pele dos chineses como branca e os seus olhos como pequenos.

Revelou que os chineses tinham muita dificuldade em entrar no mar e que não eram um povo bélico, sendo, no entanto, muito bons negociantes. Através das descrições comuns às duas obras conseguiu-se perceber com mais certeza alguns aspetos da realidade chinesa.

Quanto Tomé Pires visitou a China, no seu grupo expedicionário, viajava igualmente Cristóvão Vieira que após uma malograda tentativa de entrevista com o imperador da China foi enviado para uma prisão em Guangzhou.

Cristóvão Vieira encontrou nesta prisão um negociante português chamado Vasco Calvo. Na prisão os dois escreveram cartas que alguém, a pedido, entregou à representação portuguesa em Malaca. Estas cartas descreviam as suas observações e a imagem que tinham da China.

Desde a viagem de Marco Polo até às cartas destes prisoneiros portugueses, passou-se um período de cerca de 250 anos, nos quais a Europa não soube mais nada sobre a China.

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partir daquela altura, a China já não tinha a imagem poderosa transmitida pelo livro de Marco Polo.

As cartas dos dois prisoneiros portugueses divulgaram muitas novas informações sobre a China, revelando uma imagem completamente diferente da anterior.

Antes os portugueses tinham tido contactos com a China apenas em alguns lugares, principalmente na ilha do delta do rio das Pérolas (ao largo de Guangzhou) onde se situam Hong Kong e Macau.

Do interior da China, por detrás de Guangzhou, os estrangeiros nada mais sabiam. O tipo de chineses que contactaram com os portugueses também foi muito limitado. A maioria eram negociantes com estatuto social baixo, que não representavam corretamente a sua região e muito menos a China na sua globalidade.

Os dois prisoneiros portugueses de Guangzhou estavam na China há quase sete anos. As suas deslocações começaram em Guangzhou, depois Nanjing e Pequim (acabaram por atravessar a China). A partir do momento em que se tornaram prisoneiros, tiveram a oportunidade de conhecer bem a China.

Do ponto de vista de Cristóvão Vieira, a China não era possante, mas sim instável e perigosa, os povos eram submissos e não tinham coragem para falar. Toda a China era assim, podendo haver zonas ainda piores, por isso toda gente podia achar bem que os portugueses entrassem pela China adentro.

Vasco Calvo escreveu que os assaltantes se matavam entre si, porque não havia nenhuma autoridade a controlar. Os funcionários eram assaltados se não fugissem. O povo era pobre e bem controlado pelos funcionários. Vieira e Calvo achavam que Portugal podia ser a salvação da China. Também eles pensavam, tal com Tomé Pires que a China era fraca.

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soldados chineses também eram débeis. Quer Vieira, quer Mendoza, Mateu Ricci, Defoe, ou o chefe da armada inglesa George Anson, menosprezavam os chineses e os seus soldados, devido à sua fragilidade. Este tipo de imagem foi-se avolumando cada vez mais, especialmente através das opiniões de Mateu Ricci e Defoe, tendo-se fixado na memória coletiva dos ocidentais.

Said referiu no livro dedicado ao estudo do orientalismo: quando o ocidental está a descrever “o outro”, as relações entre o Ocidente e o Oriente são vistas na perspetiva do observador e do objeto observado.

Os Orientais sempre foram o sujeito observado, e sempre foi descrito como feio, fraco, efeminado e menosprezado pelos ocidentais.

Os ocidentais eram compradores, usavam o seu discernimento melhor do que os orientais para observar o Oriente. O poder dos ocidentais era maior e a perceção das prioridades era diversa. A imagem da China foi criada pelos ocidentais de acordo com estes critérios.

Estas duas cartas foram escritas por Cristóvão Vieira e Vasco Calvo, eram muito valiosas, pois continham descrições muito detalhadas sobre a geografia, defesa, produções e meios de comunicação da China.

Proporcionavam informações estratégicas sobre como conquistar a China. Indicavam ao rei de Portugal que a China era muito grande, tinha muitos habitantes, mas não era muito forte. O envio de dez ou quinze barcos era suficiente para a sua conquista, e para as revoltas do povo a seguir à conquista.

Entretanto, o rei de Portugal e o governador português de Malaca não levaram a sério estas cartas, porque ninguém acreditava que a China pudesse ser assim tão fraca.

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exigia muita força para romper com a imagem já estabelecida. A China, ainda era uma grande esperança para os portugueses.

Naquela altura em Portugal e na Europa, estas cartas não foram vistas por muita gente, porque provinham de dois prisioneiros, e existia então um ambiente propício ao elogiar da China.

Embora a imagem que eles descreveram estivesse fora do admissível para a China naquela altura, estas descrições foram provadas posteriormente pela história, e são semelhantes a outras já no século XIX.

Uma imagem fixada na mente, vem se calhar de muitas memórias, e também de muitas confrontações, das viagens do corpo e do espírito, demarcadas pelo tempo, local, entendimento, psicologia, distâncias, luz e muitos elementos. Tudo pesa na formação da imagem. Para Vieira havia apenas sombra, a sombra que vinha da grande China, mas também do interior da prisão.

C) Aspetos Positivos

Outro português que também foi feito prisioneiro na China, teve mais sorte. As causas desta foram os elogios que formulou sobre a China e que deram início ao enaltecimento da China pelos europeus. Este homem era Galiote Pereira.

A exploração de Portugal não era apenas um objetivo estratégico do país, mas também o sonho de todos os portugueses que queriam mudar de vida e que chegaram à China com diferentes objetivos. Galiote Pereira foi um dos deles. Em 1539, ele chegou à India em busca do seu sonho, como tantos outros portugueses.

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foi tratado com imparcialidade e de forma justa, o que evitou a sua sentença de morte.

Este desfecho foi bom para alterar a relação de equilíbrio entre observador e observado, tendo sido uma forte razão para elogiar a China.

O juiz chinês não foi vicioso no julgamento em tribunal, e a impressão de Galiote Pereira em relação aos chineses começou a tornar-se muito positiva. Estes elogios aos juízes chineses significavam, ao mesmo tempo, uma crítica em relação aos congéneres portugueses. A posição social daqueles juízes era muito alta em relação ao resto da sociedade, mesmo assim, eles não tinham a desconfiança de ninguém.

Os juízes chineses tinham ainda uma outra qualidade digna de elogios: eram respeitados pelos monarcas, mas ao mesmo tempo, também tinham muita paciência ao receberem o povo. Enquanto em Portugal os estrangeiros que eram levados a julgamento, dissessem eles o que dissessem, os juízes consideravam apenas aquilo que lhes aprouvesse e o resto catalogavam-no como mentiras dos réus.

Galiote Pereira disse que "Nós seguimos os costumes chineses para nos defendermos no tribunal, e eles trataram-nos com tanta paciência que ficamos surpreendidos, sentimos que no nosso país, os juízes não nos iriam tratar com tanta paciência. " 43 Galiote Pereira utilizou a sua experiência na China para criticar a

realidade do seu próprio país. Comparou a imagem que, entretanto, formara da China para questionar e criticar a imagem que tinha do seu próprio país, não utilizou simplesmente esta para avaliar “o outro”.

A equidade da justiça também se manifestava nas regras que exigiam que as provas e os interrogatórios fossem feitos em público. Ao passo que no seu país, os interrogatórios e a apresentação de provas eram feitas somente em presença do juiz, o que deixava uma grande margem para a corrupção, através do poder do dinheiro.

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devia ser público e transparente. Havia muito receio do imperador chinês, porque este era muito poderoso.

Jonha acha que "Galiote Pereira ao usar este processo de comparação para analisar a cultura chinesa deu origem a um modo de pensamento muito importante no mundo ocidental"44

Ao contrário do mundo trágico descrito por Tomé Vieira e por Vasco Calvo, aos olhos de Galiote Pereira a China era cheia de maravilhas e surpresas.

"Eles têm uma coisa muito boa que nos deixa maravilhados, principalmente por se tratar de um povo pagão. Em todas as cidades há um hospital onde há sempre muitas pessoas.

Nunca vimos pessoas na rua a pedir e por isso perguntamos qual a explicação. A resposta era simples, em cada cidade há um lar com as edificações necessárias para alojar os pobres, os cegos, os deficientes, os idosos e outras pessoas que não tivessem capacidade de sobreviver sozinhas. Neste lar nunca faltava arroz para comerem.

As pessoas eram recebidas e a seguir conforme a sua fragilidade: doença, cegueira, deficiência ou outra pediam em tribunal um comprovativo para provar a sua condição. Feito isto podiam permanecer no lar mencionado até ao seu falecimento. Também tinham condições para criar porcos ou galinhas, de modo a que os pobres não tivessem de pedir para conseguir viver."45

Esta descrição de Galiote Pereira tornou-se simbólica para a imagem da China no Ocidente e posteriormente apareceu muitas vezes em diversos textos.

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"Os propósitos são dois: Primeiro, por mais doentes que haja, eles não precisam de ficar todos juntos por ser constrangedor e desconfortável. Segundo, os pacientes com doenças infeciosas podiam ficar separados, os materiais infetados não eram desenvolvidos. Além disso, os tratamentos eram feitos com muita atenção, e os médicos tratavam diretamente as doenças para as quais estavam melhor habilitados. Os habitantes só recorriam ao hospital quanto estavam realmente doentes. Num livro em chinês antigo, também já havia descrições sobre a utopia. "46

Os hospitais apareceram em Portugal no século XIII, no entanto surgiram muito tarde na China, ninguém sabe qual o hospital a que Galiote Pereira se refere, mas a sua descrição mostrou a esperança dos portugueses numa sociedade justa e

abastada.

A exploração trouxe muitos tesouros para Portugal, mas apenas para o rei do país, e para os religiosos católicos, pois o povo não recebeu nada.

O Povo para além disso, sofreu também com o mau resultado da exploração; 1521 foi um período de fome em grande extensão de Portugal, houve muitas pessoas que morreram à fome. Pedir comida na rua tornou-se uma situação comum nessa altura. Mas na china, com base no sistema de esmolas, os deficientes levavam as suas vidas com alguma independência, enquanto estivessem vivos tinham sempre arroz.

Quer a viagem do Marco Polo, quer nas descrições dos portugueses no século XVI, sempre foram descritas cidades e casas bonitas, pontes sólidas e caminhos planos. Foram utilizadas muitas palavras elogiosas. Com Galiote Pereira também foi assim.

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