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SOBRE A LIBERDADE: A INTERFERÊNCIA DA LIBERTAÇÃO NA POLÍTICA

SEGUNDO HANNAH ARENDT

Aline Soares Lopes (UEPG) (E-mail: aline_soareslopes@hotmail.com) Orientadora: Prof.ª Dra. Christina Miranda Ribas

Resumo: Em toda a tradição revolucionária, a revolução francesa é a que mais se

destaca, devido ao importantíssimo fato de ter rompido com inúmeros paradigmas, como o aparecimento do Estado de Direito, pode ser considerada inclusive berço do pensamento moderno. Muitos historiadores e filósofos desenvolveram brilhantes estudos sobre a revolução francesa, porém foi a filósofa política Hannah Arendt quem desenvolveu um raciocínio antes passado despercebido, Arendt não deixou passar a influência do social no pensamento revolucionário e no desenrolar da revolução. Tal pesquisa se propõe a compreender a diferenciação entre liberdade e libertação e a influência desses dois elementos não só sobre a revolução francesa, mas também na política moderna.

Palavras-chave: Revolução Francesa, Espaço Público, Liberdade Política.

Introdução

Este trabalho tem por objetivo a melhor compreensão de um tema apontado pela autora Hannah Arendt em seu livro “Sobre a Revolução”. A autora realiza um aprofundado estudo sobre a revolução francesa apontando questões que nos levam a um raciocínio muito apurado sobre política, e junto com este raciocínio ela nos traz a tona a influência que a questão social teve sobre o pensamento dos revolucionários, bem como o impacto que gerou no desenrolar da revolução. A autora como sempre com muita sobriedade chama atenção ao fato de estarmos cada dia mais com menos acesso ao espaço público - espaço destinado ao discurso e a ação – apropriando-se deste espaço para tratar de questões que deveriam ser dirimidas no âmbito privado - espaço onde o homem tem de satisfazer suas necessidades biológicas. O trabalho é realizado pela metodologia indutiva de modo que primeiramente será exposto os fatos e acontecimentos que levaram a autora a crer na inversão de dois conceitos precursores presentes na revolução francesa, o conceito de liberdade e o de libertação, após esse entendimento acompanharemos qual conclusão a autora pode retirar da reflexão sobre esta temática. O tema escolhido para este trabalho é de relevância filosófica, a apuração feita por Hannah Arendt de dois conceitos que recorrentemente estão presentes nos assuntos políticos nos permitirá uma melhor compreensão até mesmo da política atual. A

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atualidade do pensamento filosófico de Hannah Arendt chega a impressionar, mesmo tendo o fato estudado ocorrido no passado, uma vez que a revolução francesa teve muita influência sobre as revoluções seguintes e também no pensamento político da modernidade.

Objetivo

O presente trabalho tem como objetivo geral compreender os conceitos de liberdade e libertação, apresentados por Arendt em seu livro "Sobre a revolução". Para tanto, faz-se necessário, como objetivo específico, resgatar a diferenciação que a autora faz desses conceitos. Essa se faz necessária, na medida em que tais conceitos influenciaram o desenrolar da revolução francesa. A influência política de tais conceitos perduram até hoje, e a sua indistinção interfere de maneira agressiva no discurso político.

Método e Técnicas de Pesquisa

O método de pesquisa utilizado neste trabalho foi o de revisão teórica sobre o tema já exposto, com foco na análise das seguintes bibliografias: "Sobre a Revolução" e "A Condição Humana", ambas da autora Hannah Arendt. Outros artigos de revistas científicas também foram utilizados para melhor alcançar os objetivos pretendidos.

Resultados e Discussão

O livro "A condição humana" foi escrito por Hannah Arendt em 1958 e já em seu início a autora considera que sua intenção não foi criar qualquer teoria para a política na modernidade, e sim estabelecer uma reflexão sobre a humanidade, e em qual direção estamos caminhando. Embora a autora não utilize a palavra biopolítica, termo que foi muito desenvolvido e trabalhado por Foucault, no referido livro, ela explora claramente a influência da vida biológica sobre a política, também acredita que o fato de ter uma política afetada pelas necessidades biológicas foi até mesmo capaz de propiciar um terreno adequado para o totalitarismo.

Essa influência das necessidades biológicas nas decisões da vida pública acabou por diluir a fronteira existente entre espaço público e espaço privado, e também entre humanidade e animalidade. Arendt descreve as principais atividades da vida utilizando o termo vita activa, dentro da chamada vita activa encontram-se três

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principais atividades como o trabalho, a obra e a ação. O trabalho é o que os homens desenvolvem para suprirem suas necessidades; a obra tem um sentido de utilidade e não está totalmente ligada em suprir necessidades; e por último a ação que é a real condição especificamente humana. O homem diferencia-se do animal principalmente pela ação, a qual não é uma questão nem de necessidade e nem de utilidade e sim a questão do homem vir a exercer sua pluralidade. No ambito da ação o homem nasce como que uma segunda vez superando as questões naturais sentindo-se livre para agir e para estabelecer seu discurso, direcionar seu discurso e suas ações em um espaço público livre, onde ele poderá exercer sua pluralidade do mesmo modo que os outros homens igualmente livres.

Arendt, ao explicar como se configuram o espaço público e o espaço privado cita muitos exemplos da antiguidade clássica, onde se podia distinguir claramente a fronteira de espaço público e espaço privado. Para compreender o espaço público, basta entender como funcionava a pólis grega, o espaço público na Grécia antiga era aquele no qual os considerados cidadãos poderiam participar do governo livremente, podendo agir e discursar, o principal espaço utilizado por seus cidadãos era a ágora. A cada cidadão grego cabia a mesma parcela de poder, eles não eram coagidos nem pelas questões biológicas – as quais eram dirimidas no âmbito privado – nem por relações hierárquicas. Já para melhor entender o espaço privado, Arendt cita o exemplo romano do pater familis, o pater familis era soberano dentro de sua casa, a ele todos os demais moradores da residência deviam obediencia, o pater familis era a figura representativa de poder dentro do espaço privado, dentro de suas casas os romanos eram desiguais, havia uma relação hierarquica diferentemente do que foi observado no espaço público, no espaço privado se prioriza a sobrevivência da família atentando-se sempre as necessidades biológicas. Arendt utiliza-se dos exemplos grego e romano, já que na antiguidade podia-se definir bem o que era âmbito privado e o que era âmbito público, o que temos na modernidade é cada dia mais, uma hibridização destes dois espaços, o que o Professor Odílio Aguiar entende que Arendt pensa como esfera social – a hibridização do espaço público com o espaço privado.

A preocupação com o estar vivo e com as necessidades biológicas ficou evidentemente demonstrada na revolução francesa. No livro “Sobre a revolução” Hannah Arendt reflete sobre o impacto do social principalmente na revolução francesa. Inicialmente um dos ideais da revolução francesa era sim a liberdade política, acontece que esse ideal era um natimorto, pelo fato de que a miséria na França estava tão emergente que não houve escapatória e a liberdade política foi trocada pela libertação das necessidades biológicas.

Talvez seja um truísmo dizer que a libertação e a liberdade não se equivalem; que a libertação pode ser a condição da liberdade, mas de forma alguma conduz automaticamente a ela, que a noção de liberdade implícita na libertação só pode ser negativa e que, portanto, mesmo a intenção de libertar não é igual ao desejo de liberdade. Mas, se esses truísmos volta e meia são esquecidos, é porque a libertação sempre aparece como um todo,

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ao passo que a fundação da liberdade sempre é incerta, quando não completamente vã. Além disso, a liberdade desempenhou um papel importante e bastante controvertido na história do pensamento filosófico e também do pensamento religioso, e isso ao longo daqueles séculos -entre o declínio da era antiga e o nascimento do mundo moderno- em que não existia liberdade política e , por razões que aqui não vêm ao caso, os homens não se preocupavam com ela. (ARENDT, 2010, p.57)

A liberdade como fenômeno político nasceu com as cidades-estado gregas. Desde Heródoto, ela foi entendida como uma forma de organização política em que os cidadãos viviam juntos na condição de não domínio, sem divisão entre dominantes e dominados. (ARENDT, 2010, p. 58)

Arendt explica que o que se tinha na pólis grega era a isonomia e não uma democracia. A democracia seria o governo da maioria e não de todos, apenas neste caso, no caso da isonomia da pólis podemos observar a liberdade como sinônimo da igualdade. "Os gregos sustentavam que ninguém pode ser livre a não ser entre seus pares e, portanto, o tirano, o déspota e o chefe de família - mesmo que fossem totalmente libertos e não se sujeitassem a ninguém - não eram livres"(ARENDT, 2010, p. 59).

A máxima kantiana e sua teoria ética podem nos auxiliar de certa forma a realizar o raciocínio da liberdade entre os iguais. “É justa toda ação segundo a qual ou segundo cuja máxima a liberdade do arbítrio de cada um pode coexistir com a liberdade de qualquer um segundo uma lei universal” (KANT, 2009, p. 230). Para que a liberdade exista é necessário que todos a possuam de maneira igual. Neste caso é como se todos tivessem a mesma porcentagem de poder, e não um mais e outro menos, se isso ocorre estamos diante de desiguais onde a liberdade não prevalecerá.

A razão dessa insistência sobre vínculo entre liberdade e igualdade no pensamento político grego repousava no fato de que a liberdade era entendida como um traço que se manifestava apenas em algumas atividades humanas, e não, de maneira alguma, em todas elas, e que essas atividades apareceriam e seriam reais somente quando fossem vistas, julgadas e lembradas por outros. A vida de um homem livre exigia a presença dos outros. A própria liberdade, portanto, exigia um lugar onde as pessoas pudessem se reunir- a ágora, a praça ou a pólis, o espaço político propriamente dito. (ARENDT, 2010, p.59)

Segundo a autora, ao se pensar em liberdade política como pensava Condorcet e outros homens das revoluções, não é apenas pensar nas liberdades constitucionais, a liberdade política é algo maior do que a garantia de direitos civis. Para Arendt, as liberdades encontradas nas Constituições tratam-se de liberdades negativas e resultam da libertação, mas não são a liberdade em si; assim, a liberdade é a participação nos assuntos públicos ou a admissão na esfera pública. "Se a revolução visasse apenas à garantia dos direitos civis, estaria visando não à liberdade, e sim à libertação de governos que haviam abusado de seus poderes e violado direitos sólidos e consagrados" (ARENDT, 2010, p.61). E é exatamente este tipo de governo

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pelo qual era governada a França; em decorrência deste, boa parte da população estava em situação de plena miséria, e a maioria já estava indignada com o governo de Luis XVI e a decadente aristocracia - esse quadro social, junto às ideias iluministas, levou à queda da Bastilha.

A própria autora vê a dificuldade em compreender separadamente liberdade e libertação, visto que para atingir a liberdade é necessária a libertação. Um governo monárquico poderia ter garantido a libertação, porém não a liberdade. Para que a liberdade fosse atingida era necessária outra forma de governo, como a república. Na época da Revolução Francesa, os homens que participaram ativamente da revolução não poderiam fazer a diferenciação com clareza, porém, na atualidade, a diferenciação dos conceitos é possível e necessária.

"a dificuldade é que a revolução, tal como a conhecemos na era moderna, sempre esteve relacionada com a libertação e com a liberdade. E, como a libertação, cujos frutos são a ausência de restrição e a posse do "poder de locomoção", é de fato uma condição de liberdade - ninguém jamais poderia chegar a um lugar onde impera a liberdade se não pudesse se locomover sem restrição -, frequentemente fica muito difícil dizer onde termina o simples desejo de libertação, de estar livre da opressão, e onde começa o desejo de liberdade como modo político de vida."(ARENDT, 2010, p.61)

Mesmo havendo tal confusão de conceitos na revolução francesa a possibilidade surgiu, algo novo como a participação política mesmo que de alguns se fez, e estes tiveram o prazer do gozo do agir, ao menos para alguns homens revolucionários a liberdade política se apresentou, a autora entende que justamente por essa novidade pode-se dizer que o ocorrido em 1789 trata-se de uma revolução. O entendimento da autora é de que "quando a libertação da opressão visa pelo menos à constituição da liberdade, é que se pode falar em revolução” (ARENDT, 2010, p. 64).

Considerações Finais

O fato de a liberdade ter sido trocada pela libertação influenciou não apenas o desenrolar da revolução francesa, mas ainda afeta a política moderna. A maioria das Constituições se direcionam a garantir os direitos civis – entre estes a liberdade -, porém nenhuma Constituição se preocupou em garantir um espaço público onde a liberdade política pudesse ser exercida, restando-nos apenas as urnas eleitorais como espaço para ação. Tendo em conta que a revolução francesa foi uma precursora importante do pensamento político moderno, podemos observar que a confusão de ideais e de elementos sobrevive. Na política moderna observamos a cada dia o aumento da influência do privado no público, o social reina de modo que prejudica a atividade política livre. Destaque-se que a liberdade se faz necessária para que a condição humana da ação se apresente plena. Segundo os próprios

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ensinamentos da autora, o que nos diferencia em termos humanos, é o pensamento e a ação, se deixamos tanto de pensar como de agir ficamos reduzidos apenas ao animal humano.

Referências

AGUIAR, Odilio Alves. A questão social em Hannah Arendt. Trans/Form/Ação, São Paulo, v. 27, n. 2, p.7-20. 2004

ARENDT, Hannah. A condição humana. 11. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.

ARENDT, Hannah. Sobre a revolução. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. CORREIA, Adriano. A vitória da vida sobre a política. Revista Brasileira de Cultura-CULT, São Paulo: Editora Bregantini, n. 129, p.61-63, outubro. 2008.

RIBAS, Christina Miranda. Justiça em tempos sombrio: a justiça no pensamento de Hannah Arendt. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2010.

KANT, I. Metafísica dos Costumes. Princípios metafísicos da Doutrina do Direito. Trad. Joãosinho Beckenkamp, s/d. . Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Trad. Guido Antônio de Almeida. São Paulo: Discurso Editorial/ Barcarolla, 2009.

Referências

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