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Paracoccidioidomicose aguda-subaguda : Paracoccidioidomicose aguda-subaguda = Acute-subacute paracoccidioidomycosis: a pediatric cohort of 141 patients, exploring clinical characteristics, laboratorial analysis, and identifying a mortality predictor

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Academic year: 2021

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FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

MARIANA TRESOLDI DAS NEVES ROMANELI

PARACOCCIDIOIDOMICOSE AGUDA-SUBAGUDA: CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS E LABORATORIAIS DE UMA COORTE PEDIÁTRICA DE 141 PACIENTES, COM

IDENTIFICAÇÃO DE UMA VARIÁVEL PREDITORA DE MORTALIDADE.

ACUTE-SUBACUTE PARACOCCIDIOIDOMYCOSIS: A PAEDIATRIC COHORT OF 141 PATIENTS, EXPLORING CLINICAL CHARACTERISTICS, LABORATORIAL ANALYSIS,

AND IDENTIFYING A MORTALITY PREDICTOR.

CAMPINAS 2020

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PARACOCCIDIOIDOMICOSE AGUDA-SUBAGUDA: CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS E LABORATORIAIS DE UMA COORTE PEDIÁTRICA DE 141 PACIENTES, COM

IDENTIFICAÇÃO DE UMA VARIÁVEL PREDITORA DE MORTALIDADE.

ACUTE-SUBACUTE PARACOCCIDIOIDOMYCOSIS: A PAEDIATRIC COHORT OF 141 PATIENTS, EXPLORING CLINICAL CHARACTERISTICS, LABORATORIAL ANALYSIS,

AND IDENTIFYING A MORTALITY PREDICTOR.

Tese apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutora em Ciências na área de concentração em Saúde da Criança e do Adolescente.

Thesis presented to the Faculty of Medical Sciences of the State University of Campinas as part of the requirements for obtaining the Doctor’s degree, in the Child and Adolescent Health program.

ORIENTADOR: PROFESSOR DOUTOR RICARDO MENDES PEREIRA

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA MARIANA TRESOLDI DAS NEVES ROMANELI, E ORIENTADA PELO PROF. DR. RICARDO MENDES PEREIRA.

CAMPINAS 2020

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COMISSÃO EXAMINADORA DA DEFESA DE

MESTRADO/DOUTORADO

MARIANA TRESOLDI DAS NEVES ROMANELI

ORIENTADOR: RICARDO MENDES PEREIRA

MEMBROS:

1. PROF. DR. RICARDO MENDES PEREIRA

2. PROF. DR. GABRIEL HESSEL

3. PROF. DR. PLÍNIO TRABASSO

4. PROF. DR. CARLOS MAGNO CASTELO BRANCO FORTALEZA

5. PROF. DR. GIL BENARD

Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da FCM.

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Ao Cristiano, pelo apoio.

Ao Bernardo, pela compreensão. Ao Eurico, companheiro nas correrias. À Dra. Teresinha, meu orgulho e exemplo. Ao Dr. Ricardo, pela confiança e liberdade.

Ao Dr. André, que torna claras as coisas mais complicadas.

Aos pacientes, que nos fazem enxergar a vida da perspectiva certa. A Deus, por me carregar nos braços nos dias em que foi difícil caminhar.

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Introdução

A paracoccidioidomicose (PCM) aguda-subaguda é uma micose sistêmica grave, que afeta crianças e adolescentes de regiões endêmicas, levando à linfadenite generalizada, febre, perda de peso, anemia, eosinofilia, hipoalbuminemia e hipergamaglobulinemia.

Objetivo

Descrever as características clínicas e laboratoriais da PCM aguda-subaguda, determinar fatores de risco de mortalidade, bem como propor um teste para variáveis preditores de evolução fatal relacionada à doença.

Sujeitos e Métodos

Crianças e adolescentes diagnosticadas com PCM aguda-subaguda com menos de 15 anos de idade foram incluídos no estudo. Os dados epidemiológicos, clínicos e laboratoriais foram obtidos a partir de seus prontuários médicos. Foram realizadas análise descritiva, comparação de médias, regressão logística univariada, regressão logística multivariada e uma curva ROC a fim de identificar informações significativas (p<0,05).

Resultados

Durante o período de 39 anos, 141 crianças e adolescentes receberam o diagnóstico de PCM aguda-subaguda. Os principais sinais e sintomas observados foram linfadenite generalizada, febre e perda ponderal. As alterações laboratoriais mais frequentes foram anemia, hipergamaglobulinemia, eosinofilia, leucocitose e hipoalbuminemia. O medicamento mais utilizado para o tratamento foi sulfametoxazol-trimetoprima (SMX-TMP). A taxa de complicação foi de 17%, a taxa de recidiva foi de 7,8% e a mortalidade foi de 5,7%. Uma dosagem sérica de albumina baixa à admissão foi identificada como fator preditivo de mortalidade. O ponto de corte na dosagem de albumina sérica foi de 2,18 g/dL, acima do qual, a taxa de sobrevida é de 99,1%.

Conclusões

A avaliação clínica detalhada, aliada a exames laboratoriais simples como hemograma e eletroforese de proteínas séricas, podem levar à suspeita diagnóstica de PCM

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Pacientes com dosagem sérica de albumina menores que 2,18 g/dL devem receber atenção especial, preferencialmente hospitalizados, durante as primeiras quatro semanas de tratamento, por apresentarem risco de mortalidade elevado.

Palavras-chave

Paracoccidioidomicose, Paracoccidioides brasiliensis, linfadenite, epidemiologia, mortalidade, albumina sérica, criança.

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Background

Acute-subacute paracoccidioidomycosis (PCM) is a severe systemic mycosis that affects children and adolescents from endemic regions, leading to generalized lymphadenopathy, fever, weight loss, anemia, eosinophilia, hypoalbuminemia, and hypergammaglobulinemia.

Objective

To describe the clinical and laboratorial characteristics of acute-subacute PCM, to determine mortality risk factors and to propose a test for mortality hazard related to the disease. Subjects and Methods

Children and adolescents diagnosed with PCM, under 15 years, were included in the study. Their epidemiological, clinical and laboratorial data were obtained from the hospital records. Descriptive analysis, comparison of means, univariate logistic regression, multivariate logistic regression and a ROC curve were performed in order to identify significant information (p<0.05).

Results

Through a period of 39 years, 141 children and adolescents were diagnosed with acute-subacute PCM. The most frequent clinical presentation were generalized lymphadenitis, fever and weight loss, and the main laboratorial findings were anemia, hypergammaglobulinemia, eosinophilia, leukocytosis, and hypoalbuminemia. The main antifungal agent used for their treatment was sulfamethoxazole-trimethoprim (SMX-TMP). The complication rate was 17%, the relapse rate was 7.8% and the mortality rate was 5.7%. A low albumin dosage was identified as a predictor factor for mortality. The cut-off for serum albumin was 2.18 g/dL, above which, the survival rate is 99.1%.

Conclusions

Simple clinical and laboratorial exams, such as blood count and serum protein electrophoresis may lead to the diagnosis of acute-subacute PCM, and the beginning of the treatment is encouraged even before the isolation of the fungus in biological samples,

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an elevated mortality hazard.

Key Words

Paracoccidioidomycosis, Paracoccidioides brasiliensis, lymphadenitis, epidemiology, mortality, serum albumin, child.

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1. INTRODUÇÃO...12 1.1. Epidemiologia...12 1.2. Agente Etiológico...12 1.3. Apresentação Clínica da PCM...13 1.3.1. Infecção Assintomática...13 1.3.2. Forma Crônica da PCM (FCP)...14

1.3.3. Forma Aguda-Subaguda da PCM (FASP)...14

1.3.3.1. Complicações da FASP...15

1.3.3.2. Alterações Laboratoriais na FASP...16

1.4. Aspectos Imunológicos...16

1.4.1. Interação entre Th1 e Th2...17

1.4.2. Resposta Imunológica na IA...17

1.4.3. Resposta Imunológica na FCP...18

1.4.4. Resposta Imunológica na FASP...18

1.5. Tratamento da PCM...20 1.6. Justificativa do Estudo...21 2. OBJETIVOS...22 2.1. Objetivo Geral...22 2.2. Objetivos Específicos...22 3. CASUÍSTICA...23 3.1. Seleção da Amostra...23 3.2. Critérios de Inclusão...23

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3.4. Aspectos Éticos...23

4. METODOLOGIA...25

4.1. Coleta dos Dados...25

4.2. Composição dos Grupos...25

4.3. Análise Estatística...25 5. RESULTADOS...27 6. DISCUSSÃO...35 7. CONCLUSÕES...39 7. REFERÊNCIAS...41 8. ANEXOS...48 8.1. Artigo Publicado...48

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Epidemiologia

A paracoccidioidomicose (PCM) é a micose sistêmica mais prevalente na América Latina, sobretudo no Brasil, onde se encontram cerca de 67% dos casos, com maior incidência na região sudeste. A doença também é considerada endêmica no México, Nicarágua, Belize, Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Chile, Argentina e Paraguai1-10. Acredita-se que cerca de 50% dos moradores de áreas endêmicas já tenham sido expostos aos agentes etiológicos da PCM, sendo que a incidência estimada da doença nesses locais varia de acordo com os estudos realizados, que relatam de 3 a 4 casos novos/ milhão e 0,71 a 9,4 casos novos por 100 mil habitantes/ ano, com mortalidade de cerca de 1,45 casos por milhão de habitantes1-9,11.

1.2. Agente Etiológico

Duas espécies de fungos termodimórficos podem causar a PCM:

Paracoccidioides brasiliensis (P. brasiliensis) e Paracoccidioides lutzii (P. lutzii).

Ambas as espécies presentam crescimento na forma de leveduras, quando submetidos a temperaturas de cerca de 37ºC, e na forma de estruturas filamentosas contendo propágulos infectantes (conídios), quando submetidos a temperaturas inferiores1,5-6,8-14. Filamentos e conídios podem ser encontrados no solo, água e plantas, enquanto as leveduras parasitam os seres humanos e animais domésticos, como gatos, cachorros, galinhas, porcos, gado, cavalos, ovelhas, bodes e coelhos; e selvagens como tatus e macacos1,5,10-14. Os animais podem apresentar testes cutâneos e sorológicos positivos para P. brasiliensis, porém raramente desenvolvem alguma forma clínica de PCM1,5-6,8,13-15.

O contágio dos seres humanos ocorre por inalação dos conídios infectantes, que se transformam em leveduras e se multiplicam por gemulação no interior do organismo1,5-7,9-11. As leveduras adultas de Paracoccidioides spp. têm metabolismo muito ativo, demandando grande quantidade de oxigênio e nutrientes para seu crescimento. Diferentemente, as formas jovens são capazes de permanecer viáveis em estado latente por longos períodos. Esta propriedade das formas jovens das leveduras, associada ao

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padrão de resposta imunológica do hospedeiro, determina os diferentes períodos de latência observados entre o contato com o fungo e o desenvolvimento da PCM, bem como a forma clínica da doença1,5-7,9,11,16-17.

O diagnóstico da PCM geralmente é estabelecido através da identificação de leveduras do Paracoccidioides spp. nos materiais biológicos obtidos dos pacientes, sendo os mais frequentes o escarro, fragmento ou raspado de pele, amostra de mucosa, aspirado ou biopsia de linfonodo, amostra de tecido ósseo ou hepático. A coloração geralmente utilizada para identificação das leveduras é Gomori-Grocot ou PAS (Periodic Acid Schiff) 5,9-10.

Testes sorológicos específicos, como a imunodifusão dupla (ID), contraimunoeletroforese (CIE), imunofluorescência indireta (IFI), ensaio imunoenzimático (ELISA) e imunoblot (IB) para P. brasiliensis podem ser utilizados para identificar infecção pelo fungo, com 80% de sensibilidade e 95% especificidade5,9. Acredita-se que as formas disseminadas da doença tenham correlação com títulos elevados de anticorpos, com diluições maiores ou iguais a 1:64, e que os resultados seriados de titulação possam ser utilizados para acompanhamento do tratamento dos pacientes, considerando como critério de cura da doença a negativação da sorologia ou títulos que permanecem positivos na diluição de 1:2 ou 1:1. Até o momento, não existem testes sorológicos validados para P. lutzii5,7,9-10,17-20.

1.3. Apresentação Clínica da PCM

Os indivíduos que entram em contato com os propágulos infectantes do

Paracoccidioides spp. nem sempre desenvolvem formas clínicas de PCM, visto que a

maioria daqueles que residem em zonas endêmicas da doença nunca chegam a apresentar micose sistêmica6,19-20. Assim, os achados clínicos e laboratoriais dos indivíduos que já entraram em contato com Paracoccidioides spp. permitem agrupá-los em três categorias distintas, conforme descrito a seguir9-10,21-23.

1.3.1. Infecção Assintomática (IA)

A Infecção Assintomática por P. brasiliensis (IA) é observada em indivíduos saudáveis que residem em áreas endêmicas da doença, e que apresentam testes cutâneos

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reagentes, realizados com aplicação intradérmica de antígenos de P. brasiliensis (paracoccidioidina e 43-kDa glicoproteína purificada)4-6,9-10,21-22. Até o momento, testes cutâneos contendo antígenos de P. lutzii não estão disponíveis no mercado. Estudos realizados em áreas endêmicas demonstraram que esses indivíduos assintomáticos geralmente foram infectados pelo fungo na infância e adolescência, geralmente entre 10 e 20 anos, sem nunca desenvolver sintomatologia4-6,8-10,23.

1.3.2. Forma Crônica da PCM (FCP)

A forma crônica da PCM (FCP) é a apresentação clínica mais frequente e corresponde a cerca de 90% dos casos da doença5,9. Esta forma da micose ocorre em adultos, na proporção de 22 homens para 1 mulher, com pico de incidência entre 30 e 50 anos, especialmente em trabalhadores agrícolas que atuam no manejo do solo, sendo alcoolistas e tabagistas mais afetados que os demais1,5-11,14,20-21,23. Mulheres adultas geralmente são protegidas da FCP por ação do estrógeno endógeno, que inibe a transformação do conídio inalado em levedura5,9,20,24.

A forma de apresentação clínica é variável, desde lesão única na pele ou mucosa oral, até lesões múltiplas em ambos, sendo que 70 a 100% dos casos cursam com acometimento intersticial pulmonar difuso5,9,21. Diferentes locais do trato respiratório podem apresentar lesões concomitantes provocadas pelo Paracoccidioides spp., já que sua porta de entrada para organismo é a via inalatória. Em alguns casos, a apresentação da doença é multifocal, com dois ou mais órgãos (inclusive glândulas adrenais, fígado e sistema nervoso central) acometidos simultaneamente e com gravidade variável5,9,21,25-28.

1.3.3. Forma Aguda-Subaguda da PCM (FASP)

A forma aguda-subaguda da PCM (FASP) é observada em crianças, adolescentes e adultos jovens, não havendo relatos de pacientes com mais de 40 anos de idade acometidos por esta forma da doença, que corresponde a 2,1 a 12,7% dos casos de PCM, dependendo da região estudada5,9-10. A FASP tem como característica o envolvimento do sistema retículo-endotelial, cursando com febre, linfadenite generalizada, hepatomegalia, esplenomegalia e disfunção da medula óssea5,9-10,20-21,29. Os linfonodos acometidos apresentam-se, inicialmente, como nódulos hipertróficos e confluentes, associados à hiperemia cutânea, por vezes com aumento de temperatura e dor local, podendo evoluir com pontos de flutuação e fistulização5,7-10,20-21,29-31.

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Os pacientes apresentam lesões cutâneas ou mucosas provocadas pelo

Paracoccidioides spp. em 9,2 a 44,7% dos casos, associadas aos sintomas sistêmicos,

quando é feito o diagnóstico9-10,20,29,32. As lesões cutâneas podem ser ulceradas, crostosas, vegetantes, papulo-acneiformes ou moluscóides, enquanto que as lesões mucosas geralmente são erosivas e com pontilhado hemorrágico, acometendo principalmente a mucosa oral e nasal5-6,9-10,32-33.

O acometimento pulmonar é pouco frequente na FASP, ocorrendo em 10 a 20% dos casos, geralmente secundário à compressão extrínseca provocada pelo aumento dos linfonodos peri-hilares e para-traqueais9-10,20,32. Pode se manifestar como opacidade parenquimatosa difusa ou micronodular. Derrame pleural pode estar presente, geralmente unilateral, a partir do qual o Paracoccidioides spp. pode ser isolado10,20,32,34.

Lesões líticas ósteo-articulares causadas por invasão medular pelo

Paracoccidioides spp. são raras, e estão presentes em cerca de 6 a 36,4% dos casos de

FASP. Acometem preferencialmente clavícula, escápula, crânio e costelas, sendo que a artrite de grandes articulações causada pelo fungo é considerada um evento raro 10,29,32,34-36.

Geralmente, os portadores de FASP recebem o primeiro atendimento em um centro de referência após 4 a 12 semanas do início dos sintomas, sendo que a extensão deste período não parece ter correlação com a gravidade da condição clínica do paciente ou com a presença de complicações no momento da admissão29,32. Os órgãos e sistemas que podem ser acometidos por complicações relacionadas à doença serão descritos a seguir.

1.3.3.1. Complicações da FASP

Por acometer o sistema retículo-endotelial, a FASP pode provocar complicações em diversos órgãos e sistemas. Algumas dessas complicações são a icterícia obstrutiva e sub-oclusão intestinal provocadas por grandes massas compostas por linfonodos intra-abdominais confluentes que causam compressão extrínseca do ducto colédoco ou da luz intestinal; insuficiência hepática com lesão hepatocítica ou canalicular provocada pelo Paracoccidioides spp.; apendicite; abscessos fúngicos no fígado, baço e músculo psoas; síndrome da compressão da veia cava inferior; diarreia crônica e linfangiectasia intestinal provocadas pelo acometimento do tecido linfóide associado à mucosa10,20,29,32,37-43.

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Em alguns casos, as complicações podem surgir ao longo do tratamento, provocadas pela retração e fibrose de grandes massas compostas por linfonodos confluentes, tais como icterícia obstrutiva e sub-oclusão intestinal. Também pode ocorrer estenose de alças intestinais, provocada pela cicatrização de lesões de mucosa entérica, em resposta ao tratamento anti-fúngico29,32,37-38.

Outras complicações mais raras da FASP incluem hipercalciúria, que pode levar à nefrocalcinose, nefrolitíase e insuficiência renal aguda; insuficiência adrenal, por envolvimento das glândulas supra-renais; sepse fúngica com instabilidade hemodinâmica; meningite, encefalite e pseudo-tumor cerebral, por acometimento do sistema nervoso central9-10,29,44-45.

1.3.3.2. Alterações laboratoriais na FASP

Diferentemente das outras formas clínicas de PCM, na FASP, as alterações laboratoriais são frequentes5,9-10,29. Tais alterações têm relação direta com os órgãos e sistemas acometidos pelo Paracoccidioides spp. e incluem anemia, elevação das enzimas hepáticas aspartato-amino-transferase (AST), alanina-amino-transferase (ALT), fosfatase alcalina (FALC) e gama-glutamil-transferase (γ-GT), assim como da bilirrubinemia. Cerca de 50% dos casos também cursam com hipergamaglobulinemia, hipoalbuminemia e eosinofilia. Ocorre, ainda, alteração intensa das provas de atividade inflamatória, como velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR) e alfa-1-glicoproteína ácida (α-1-glico)5,9-10,29,41,43-44,46.

1.4. Aspectos Imunológicos

As diversas manifestações clínicas e complicações da PCM têm íntima correlação com o tipo de resposta imunológica predominante no hospedeiro, sendo que o observado nos portadores assintomáticos difere daquele observado nos pacientes com FCP e FASP6,10,22-24,31. O padrão de resposta imunológica desenvolvido pelo paciente com PCM é determinado pela ativação de subpopulações específicas de células T CD4+ efetoras, que podem ser classificadas como T helper 1 (Th1) e T helper 2 (Th2), de acordo com as citocinas produzidas em resposta à infecção pelo fungo4,10,24,47-48. A atuação de Th1 e Th2 na PCM, bem como os mecanismos regulatórios da resposta imunológica, serão descritos a seguir.

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1.4.1. Interação entre Th1 e Th2

As células T produtoras de interferon-gama (IFN-γ), interleucina 2 (IL-2) e fator de necrose tumoral-α (TNF-α) são chamadas de células T helper 1 (Th-1) e são características da resposta imunológica do tipo Th1. Já as células T CD4+ produtoras de interleucina 4 (IL-4), interleucina 5 (IL-5) e interleucina 13 (IL-13), são chamadas de células T helper 2 (Th2), sendo características da resposta imunológica do tipo Th2 22,47-48. As células T ativadas sofrem diferenciação para Th1 na presença de interleucina 12 (IL-12) e IFN-γ, e para Th2 na presença de IL-44,48. O predomínio de um padrão de resposta imunológica sobre o outro afeta a atividade dos macrófagos e monócitos, que são as células responsáveis pelo primeiro contato do sistema imunológico do hospedeiro com o conídio inalado, pela formação dos granulomas inflamatórios ao redor das leveduras e pela destruição das mesmas nos fagócitos, atividade que parece ser estimulada pela presença de interleucina 15 (IL-15) no microambiente celular21-22,49.

Assim, se o padrão de resposta imunológica predominante for do tipo Th1, macrófagos e monócitos eliminarão as leveduras de Paracoccidioides spp., levando à resolução da doença. Se, porém, o padrão predominante for Th2, macrófagos e monócitos transportarão leveduras viáveis através do sistema linfático do hospedeiro, disseminando a infecção48,50.

1.4.2. Resposta Imunológica na IA

A infecção assintomática pelo Paracoccidioides spp. está associada a uma resposta imunológica vigorosa do tipo Th1, com grande produção de IFN-γ, IL-2 e TNF-α, com manutenção dos níveis basais de IL-4, IL-5 e interleucina 10 (IL-10) 4,12,23-24,47-48,51-52. As elevadas concentrações de IFN-γ e TNF-α detectadas nestes pacientes ativam os macrófagos e aumentam seu poder oxidativo, o que induz à formação de granulomas compactos e bem organizados que controlam a replicação fúngica e promovem a destruição das leveduras do Paracoccidioides spp.4,6,22-24,31,47-48,52-53. Além disso, IFN-γ e TNF-α estimulam as células apresentadoras de antígenos a expressar os complexos de histocompatibilidade (MHCs) classe I e II e moléculas co-estimuladoras CD80 e CD86, importantes para a ativação de células T citotóxicas, que também atuam controle da PCM4,24,30,47-48,51-52.

Os indivíduos com IA apresentam, ainda, uma grande produção de linfócitos específicos para combate a antígenos fúngicos, bem como de quimiocinas que atuam

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como coadjuvantes no desencadeamento e manutenção da resposta do tipo Th1, como CXCL9 e CXCL104,47-48,52. Estas atuam através de um receptor comum expresso pelos linfócitos T de memória e pelas células natural killer (NK), atraindo mais linfócitos T ativados para o local da infecção47,54.

1.4.3. Resposta Imunológica na FCP

A FCP está associada ao predomínio da resposta imunológica do tipo Th2 sobre Th1, sendo o padrão de resposta bastante variável entre os portadores da doença, o que resulta em diferentes apresentações clínicas4,9,24,31,47-48. Ocorre, concomitantemente, produção de citocinas características da resposta imunológica do tipo Th1 (IFN-γ, TNF-α e IL-2) e produção variável de citocinas características da resposta imunológica do tipo Th2 (IL-4, IL-5 e IL-10), sendo que estas predominam sobre as primeiras4,22,24,31,47-48,52.

Além disso, pacientes com FCP apresentam produção de IL-12 maior que aquela apresentada pelas duas outras formas de infecção pelo Paracoccidioides spp. (IA e FASP), assim como maior concentração de células produtoras desta citocina31,47. As concentrações de linfócitos T CD8+ nos tecidos acometidos pela PCM também estão aumentadas, promovendo a quimiotaxia de linfócitos e recrutamento seletivo de outras células T CD8+ para o local45,55. A produção de anticorpos específicos encontra-se aumentada em relação aos casos de IA e diminuída em relação aos portadores de FASP, com predomínio da produção de imunoglobulina G, subclasse 1 (IgG1) e imunoglobulina G, subclasse 2 (IgG2), sobre as demais12,31,48,56.

Alguns autores demonstraram que outras subpopulações de células T participam da interação entre o Paracoccidioides spp. e o hospedeiro na FCP, como T helper 17 e 22 (Th17 e Th22), com produção de elevadas concentrações das interleucinas 17 e 22 (IL-17 e IL-22), que também podem ser identificadas nas lesões de pele e mucosas destes pacientes, diferentemente do que ocorre nos portadores de IA e FASP10,47-48,57.

1.4.4. Resposta Imunológica na FASP

Os portadores de FASP apresentam predomínio absoluto da resposta imunológica do tipo Th2, com produção aumentada de citocinas supressoras (IL-4, IL-5 e IL-10) e fator de transformação de crescimento β (TGF-β), em contraste com a diminuição da produção de IFN-γ e TNF-α4,24,31,47-48,51. Neste contexto, IL-4 e TGF- β inibem a resposta imunológica do tipo Th1, com queda dos níveis de células T CD4+

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efetoras e produção de quantidades elevadas de anticorpos específicos e ineficientes contra o fungo, predominantemente imunoglobulina G, subclasses 1 e 4 (IgG1 e IgG4), imunoglobulina E (IgE) e imunoglobulina A (IgA)4,9-10,12,31,47-48,53,58. A presença de IgG4, IgA e IgE específicas nos pacientes com FASP está associada à eosinofilia encontrada no sangue periférico dos mesmos. Juntos, estes fatores contribuem para a supressão da atividade das células T CD4+ efetoras, corroborando para o predomínio da resposta imunológica do tipo Th2 sobre o tipo Th124,31.

Os pacientes portadores de FASP possuem baixa produção de interleucina 8 (IL-8), o que contribui para a manutenção e disseminação da infecção, já que essa citocina poderia modular a produção de IgE e provocar quimiotaxia de neutrófilos para os tecidos acometidos pelo Paracoccidioides spp. Somando-se a isso, a elevada produção de IL-10 inibe a ativação e a função efetora dos linfócitos T, macrófagos e monócitos, limitando a resposta inflamatória à PCM, com formação de granulomas frouxos e ineficientes 22,47-48,57. O aumento de IL-10, associado a níveis elevados de TGF- β, inibe a produção de óxido nítrico (NO), ao qual se atribui um importante papel no controle de infecções fúngicas46,54. Concentrações elevadas de IL-5 estimulam o crescimento e a diferenciação dos eosinófilos, além de ativar eosinófilos maduros, o que justifica a grande concentração de eosinófilos no sangue periférico dos pacientes com FASP4,31,47-48,53,56.

Outras subpopulações de células T, as células T reguladoras (Treg) e T helper 9 (Th9), também atuam na interação entre o Paracoccidioides spp. e o hospedeiro. As células Treg controlam a intensidade da resposta inflamatória, a fim de reduzir a lesão tecidual associada à inflamação, inibindo a ativação, proliferação e função efetora de células T convencionais ativadas, diminuindo a expressão das moléculas co-estimuladoras CD80 e CD86 e produzindo IL-10 e TGF- β6,10,52,58-62. As células Th9 produzem interleucina 9 (IL-9), que inibe a produção de IFN- γ, promove o recrutamento de eosinófilos e regula a atividade de T-reg, corroborando para o predomínio de Th2 sobre Th1 nos pacientes com FASP48,63-64.

Alguns autores demonstraram que a atividade supressora das células Treg no sangue periférico é maior nos pacientes com PCM do que em controles saudáveis, e que a quantidade dessas células diminui ao longo do tratamento da infecção e a cura da doença, atingindo níveis semelhantes aos de controles saudáveis. Isso pode significar que a ativação das células Treg contribui para a imunossupressão observada nos pacientes

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com FASP58-59. Semelhantemente, a identificação de concentrações elevadas de células Treg em biópsias de tecidos acometidos pelo Paracoccidioides spp. sugere que a modulação local da resposta imunológica permite a permanência de leveduras viáveis nos tecidos do hospedeiro, possibilitando a cronificação da doença53-54. Assim, embora se saiba que a presença e atuação das células Treg na PCM, assim como em outras infecções, tem um papel benéfico por prevenir lesões teciduais extensas associadas ao processo inflamatório local, acredita-se a supressão da resposta imune efetora possa ser intensa a ponto de permitir a sobrevida do patógeno, levando à cronificação ou disseminação da infecção48,57-58,60.

1.5. Tratamento da PCM

Diversas medicações com ação antifúngica podem ser utilizadas no tratamento da PCM, sendo que, para cada uma das apresentações clínicas da doença, existe uma recomendação específica. A infecção assintomática pelo Paracoccidioides

spp. é considerada uma infecção resolvida, e não requer qualquer terapêutica. No caso da

FCP, a medicação recomendada como primeira escolha é o itraconazol por via oral, durante 9 a 18 meses, que pode ser substituído pela sulfametoxazol-trimetoprima (SMZ-TMP), medicação fornecida sem custo pela rede básica do Sistema Único de Saúde (SUS), o que facilita a adesão ao tratamento5,9.

Recomenda-se, para os casos de FASP, que a medicação de primeira escolha seja a SMZ-TMP, por seu baixo custo, boa eficácia contra o Paracoccidioides spp. e boa tolerabilidade pela maioria das crianças e adolescentes. As reações adversas são bem conhecidas e, na maioria dos casos, seu controle é simples9-10,20,29. A leucopenia, às custas de neutropenia, é a principal delas, e pode ser controlada com a introdução de ácido folínico no esquema terapêutico, sem necessidade de mudança da medicação antifúngica 9-10,29. Além disso, a SMX-TMP possui diversas apresentações farmacêuticas: para uso endovenoso, reservada para os casos em que a administração oral não é possível; solução oral, normalmente prescrita para crianças pequenas; e comprimidos, geralmente utilizados por adolescentes e adultos5,9.

A anfotericina B é a medicação alternativa para uso endovenoso no tratamento da PCM, porém, por possuir reações adversas potencialmente graves, com necessidade de controle rigoroso (tais como hipocalemia e insuficiência renal aguda),

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recomenda-se que seu uso seja restrito aos casos de doença disseminada nos quais ainda exista dúvida diagnóstica entre PCM e outras micoses sistêmicas, que não responderiam ao tratamento com SMX-TMP5,9-10.

O cetoconazol e o itraconazol são medicações alternativas à SMZ-TMP para o tratamento por via oral nos casos de FASP, com boa eficácia contra o Paracoccidioides

spp.. Entretanto, embora já tenha sido bastante utilizado no passado, o uso do cetoconazol

não tem sido recomendado nos estudos mais recentes por estar relacionado à ocorrência frequente de reações adversas e interações com outras medicações de uso concomitante pelo paciente10,32-33. Por outro lado, o itraconazol apresenta reações adversas e interações medicamentosas menos frequentes, mas tem custo mais elevado e fornecimento restrito pelo SUS, o que dificulta a adesão a tratamentos prolongados, como no caso da PCM. Além disso, a única forma farmacêutica disponível no mercado é a de cápsulas, o que limita a utilização em crianças pequenas, que precisariam fracionar as doses da medicação5,9.

A duração do tratamento da FASP depende da resposta clínica (melhora do estado geral e desaparecimento das lesões da PCM), laboratorial (retorno dos exames laboratoriais para as faixas de normalidade) e sorológica (negativação da sorologia ou manutenção de títulos inferiores a 1:2), sendo recomendada por um período mínimo de 12 meses5,9-10,29,32.

1.6. Justificativa do Estudo

A literatura apresenta poucas informações a respeito da FASP, quando comparada à FCP, sendo que os registros existentes, em sua maioria, são compostos por relatos de casos, estudos laboratoriais e imunológicos, baseados um único caso ou em pequenas coortes de pacientes pediátricos e adultos jovens, raramente correlacionando dados epidemiológicos, clínicos, laboratoriais e sorológicos com a evolução apresentada pelos pacientes. Este estudo pretende, através das informações obtidas da maior coorte pediátrica de FASP da América Latina, correlacionar todos os dados disponíveis nos registros hospitalares com a mortalidade relacionada à doença, determinando fatores preditivos de mortalidade capazes de selecionar os pacientes que possuem maior risco e que devem receber cuidados adequados com agilidade, a fim de aumentar suas chances de sobrevência.

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2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo Geral

Descrever a epidemiologia, apresentação clínica e exames laboratoriais de pacientes pediátricos portadores de FASP, correlacionando os dados obtidos com o desfecho dos casos, através da análise retrospectiva dos seus registros hospitalares.

2.2. Objetivos Específicos

2.2.1. Identificar a origem dos pacientes e correlacionar com o tempo decorrido até o atendimento no serviço de saúde especializado.

2.2.2. Descrever o acometimento de cada sexo pela FASP, segundo as faixas etárias. 2.2.3. Descrever a apresentação clínica dos casos de FASP.

2.2.4. Descrever as alterações laboratoriais identificadas e o tempo de tratamento até sua normalização.

2.2.5. Descrever o perfil sorológico dos pacientes com FASP. 2.2.6. Descrever a terapêutica instituída para o tratamento.

2.2.7. Descrever a taxa de recidiva de FASP, identificar fatores de risco para sua ocorrência e sua correlação com a mortalidade.

2.2.8. Comparar os dados obtidos dos pacientes atendidos de 1981 a 2001 com aqueles obtidos dos pacientes atendidos de 2002 a 2019.

2.2.9. Determinar a taxa de complicações relacionadas à FASP e a existência de correlação das mesmas com os dados epidemiológicos dos pacientes.

2.2.10. Determinar a taxa de mortalidade por FASP e a existência de fatores preditivos de mortalidade.

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3. CASUÍSTICA

3.1. Seleção da Amostra

Estudo de Coorte longitudinal, ambispectivo não-concorrente, utilizando os dados encontrados nos prontuários de pacientes que foram diagnosticados com FASP e cujo tratamento foi conduzido no Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

3.2. Critérios de Inclusão

Foram incluídos os pacientes previamente hígidos, menores de 15 anos de idade, diagnosticados com FASP através da identificação do agente etiológico

Paracoccidioides spp. em amostras de material biológico, entre 1981 e 2019.

3.3. Critérios de Exclusão

Não foram incluídos no estudo os pacientes portadores co-morbidades, assim como os pacientes cujo diagnóstico de FASP não foi comprovado pela identificação do agente etiológico nas amostras de material biológico, e foram excluídos do estudo os pacientes portadores de outras doenças infecciosas e parasitárias diagnosticadas previamente à PCM.

3.4. Aspectos Éticos

Os dados epidemiológicos, clínicos e laboratoriais foram obtidos retrospectivamente a partir dos registros hospitalares dos pacientes pediátricos com FASP. Por tratar-se de análise retrospectiva, não ocorreu qualquer interferência no tratamento dos participantes, sem adição de riscos ou prejuízos ao bem-estar dos mesmos. Não foram utilizados materiais biológicos de qualquer tipo. Os dados obtidos dos prontuários foram analisados de forma anônima, não sendo possível identificar nenhum dos participantes da pesquisa a partir dos resultados apresentados pelo estudo, evitando a ocorrência de quebra de sigilo e confidencialidade. O estudo foi aprovado pelo Comitê

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de Ética da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp sob o SISNEP (CAEE – 80629317.9.0000.5404).

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4. METODOLOGIA

4.1. Coleta dos Dados

Os dados epidemiológicos, clínicos e laboratoriais dos pacientes portadores de FASP foram coletados a partir dos registros hospitalares disponíveis no HC da Unicamp. Foram considerados os seguintes dados, quando presentes: idade, sexo, área de origem (rural ou urbana), queixa principal e período de sintomas, sinais e sintomas, órgãos e sistemas acometidos pela PCM, complicações apresentadas, sorologia inicial, hemograma e eletroforese de proteínas séricas seriados (à admissão, e após 3, 6 e 12 meses de tratamento), medicação utilizada, tempo de tratamento, recorrência da doença e desfecho do caso. Os dados do hemograma e eletroforese de proteínas foram interpretados conforme os seguintes parâmetros: anemia se o nível de hemoglobina era inferior a 12g/dL; leucocitose se a contagem de leucócitos no sangue periférico era superior a 10.000 células/mm3, eosinofilia se a contagem de eosinófilos no sangue periférico era superior a 500 células/mm3; hipoalbuminemia se a dosagem sérica de albumina era inferior a 3,2 g/dL e hipergamaglobulinemia se a dosagem sérica de gamaglobulina era superior a 2,1 g/dL. Nos casos em que testes sorológicos foram realizados, o método utilizado foi a imunodifusão dupla.

4.2. Composição dos Grupos

Em 2004, um estudo que incluiu parte dos casos desta coorte foi publicado, analisando os dados de 63 pacientes admitidos no HC da Unicamp entre 1981 e 2001. No presente estudo, os dados obtidos dos registros hospitalares dos pacientes atendidos de 1981 a 2001 foram comparados aos dados dos pacientes admitidos de 2002 a 2019, sendo que os primeiros formaram o “grupo I” e os demais, o “grupo II”.

4.3. Análise Estatística

O programa estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences – SPSS

Inc., IL, USA) IBM para Windows foi utilizado para criar o banco de dados e processar

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qualitativas, bem como a média, desvio-padrão, amplitude interquartil e valores mínimo e máximo para as variáveis quantitativas. Os testes t de Student e Mann-Whitney foram utilizados para comparar a distribuição das variáveis quantitativas (médias e medianas, respectivamente) entre o grupo I e o grupo II. Os testes do Qui-Quadrado, exato de Fisher e de Fisher-Freeman-Halton foram utilizados para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas.

A incidência e o intervalo de confiança dos eventos ‘óbito’ e ‘complicação’ foram estabelecidos através do método exato. O Odds Ratio do evento ‘óbito’ foi estabelecido através da Regressão Logística Univariada, considerando os preditores ‘sexo’, ‘grupo I’, ‘grupo II’ e as variáveis ‘idade’, ‘período de sintomas’, ‘contagem de leucócitos’, ‘contagem de eosinófilos’, ‘dosagem de albumina sérica’ e ‘dosagem de gamaglobulina sérica’.

Finalmente, a fim de obter os valores ajustados do Odds Ratio, empregou-se a Regressão Logística Multivariada, não condicional, método stepwise forward (Wald), com p de inclusão de 0,05 e de exclusão de 0,10. Para a composição do modelo, foram selecionados os preditores que se mostraram associados ao evento ‘óbito’, assim como aqueles que poderiam gerar confundimento (0,05 < p < 0,20).

Uma curva ROC (Receiver Operating Characteristic) foi utilizada para determinar o melhor ponto de corte para a variável obtida pela Regressão Logística Multivariada, com o intuito de utilizá-lo como um teste. A sensibilidade e especificidade deste teste foi calculada, a fim de determinar seu poder preditivo.

Os resultados foram considerados significativos somente se os valores de “p” obtidos eram menores que 0,05.

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5. RESULTADOS

De 1981 a 2019, 159 episódios de FASP foram diagnosticados em 141 pacientes com menos de 15 anos de idade. Onze pacientes apresentaram recidivas, além do primeiro episódio de FASP: sete apresentaram 1 recidiva, dois apresentaram 2 recidivas, um apresentou 3 recidivas e um apresentou 4 recidivas. Esta taxa de recidivas de 7,8% foi interpretada como resultado de má adesão ao tratamento pelo paciente e seus familiares, por comparecerem esporadicamente às consultas médicas, por não administrarem regularmente as medicações e, em alguns casos, por abandonarem o tratamento após o desaparecimento dos sintomas.

Os 141 pacientes eram provenientes de dois estados brasileiros: 102 (72,3%) de São Paulo e 39 (27,7%) de Minas Gerais; quarenta e três pacientes (30,5%) eram provenientes de áreas rurais e noventa e dois pacientes (65,2%) eram provenientes de áreas urbanas. Esta informação não estava disponível nos registros de 6 pacientes (4,2%). Em relação ao sexo, 52 dos 141 pacientes (36,2%) eram meninas e 89 (63,1%) eram meninos, com diferentes padrões de acometimento entre os sexos dependendo da faixa etária, como demonstrado na tabela 1.

Tabela 1: Distribuição dos 141 pacientes com FASP entre os sexos, organizados por faixas etárias. Faixa etária Feminino Masculino Total

De 0 a 5 anos 7 9 16

De 5 anos e 1 dia a 8 anos 21 33 54 De 8 anos e 1 dia a 12 anos 22 33 55 De 12 anos e 1 dia a 15 anos 2 14 16

Total 52 89 141

Os sinais e sintomas referidos pelos pacientes e seus familiares antes da admissão no HC da Unicamp, assim como aqueles constatados pela equipe de assistência quando da confirmação do diagnóstico, foram listados na tabela 2, com as respectivas frequências de ocorrência.

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Tabela 2: Sinais e sintomas apresentados por 141 pacientes pediátricos com FASP, com as respectivas frequências, antes do início do tratamento.

Sinais e Sintomas Pacientes % Linfadenite generalizada 123 87,2 Febre (temperatura axilar > 37.8oC) 106 75,2

Perda de peso 91 64,5 Adinamia 48 34,0 Palidez 36 25,5 Anorexia 34 24,1 Hepatomegalia 33 23,4 Esplenomegalia 27 19,1 Lesões cutâneas 23 16,3 Dor ósteo-articular 22 15,6 Icterícia 12 8,5 Dor abdominal 7 4,9 Tosse 6 4,2

Fistulização dos linfonodos 5 3,5

Edema 4 2,8

Ascite 4 2,8

Petéquias e equimoses 4 2,8

Vinte e quatro pacientes (17%) apresentaram complicações da FASP durante os primeiros dias de internação hospitalar (tabela 3). A taxa de complicações foi de 31,7% para pacientes provenientes de áreas rurais (13/43) e 11,9% para pacientes de áreas urbanas (11/92). A comparação entre o período de sintomas antes da admissão no HC da Unicamp não revelou diferença significativa entre os pacientes de áreas rurais (15-356 dias, média 99,3, desvio-padrão 84,9) e os pacientes de áreas urbanas (15-547 dias, média 88,1, desvio-padrão 82,2), p=0,469. Semelhantemente, não houve diferença significativa no período de sintomas entre os pacientes que apresentaram complicações (20-240 dias, média 86,3, desvio-padrão 60,3) e os que não apresentaram complicações (15-547 dias, média 91,4, desvio-padrão 86) decorrentes da doença, p=0,782.

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Tabela 3: Complicações observadas em 24 de 141 pacientes com FASP durante as 4 primeiras semanas de internação hospitalar.

Complicações número % de pacientes

Insuficiência renal 11 8,3

Distúrbios eletrolíticos 10 7,6

Insuficiência hepática 7 5,3

Coagulação intravascular disseminada 6 4,5

Choque séptico 6 4,5 Diarréia 4 3 Pancitopenia 4 3 Insuficiência respiratória 3 2,2 Suboclusão intestinal 2 1,5 Insuficiência cardíaca 1 0,7 Fratura patológica 1 0,7

Os pacientes apresentaram múltiplos órgãos acometidos pelas leveduras de

Paracoccidioides spp., com manifestações clínicas diversas, sendo as principais: dor

local, lesões visíveis ou palpáveis, aumento de volume do local acometido, alterações de exames laboratoriais, perda de função do órgão acometido ou invasão fúngica comprovada por análise microscópica de amostras de tecidos. Os órgãos e sistemas mais frequentemente afetados foram os linfonodos (93,6%), fígado (36,9%), baço (29,8%), pele (21,3%), ossos e articulações (20,6%). Em alguns casos, nos quais a hipótese diagnóstica inicial era neoplasia hematológica (5 pacientes) ou naqueles que morreram e foram submetidos a necropsia (8 pacientes), foi possível demonstrar a presença de leveduras de Paracoccidioides spp. em amostras de medula óssea (10 de 13 pacientes), pulmões (7 de 8 pacientes), intestino delgado (6 de 8 pacientes), rins (4 de 8 pacientes), miocárdio (4 de 8 pacientes), língua, epiglote, tonsilas, pâncreas, testículos e glândulas adrenais (1 de 8 pacientes, cada).

Os exames laboratoriais de hemograma e eletroforese de proteínas séricas realizados por ocasião da admissão dos pacientes, revelou 87,9% de anemia (124/141), 67,3% de leucocitose (95/140), 77,6% de eosinofilia (108/139), 65% de hipoalbuminemia (89/137) e 81,1% de hipergamaglobulinemia (99/122). A normalização destes parâmetros

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laboratoriais foi documentada após 3 meses de tratamento, no caso da dosagem de albumina sérica e contagem de leucócitos e eosinófilos no sangue periférico, e após 6 meses de tratamento no caso dos níveis de hemoglobina e gamaglobulina no sangue periférico, como demonstrado na tabela 4 .

Tabela 4: Comparação das medianas dos parâmetros laboratoriais avaliados ao longo do tratamento dos pacientes dom FASP.

Parâmetro laboratorial Admissão 3 meses 6 meses Hemoglobina (g/dL) 9,5 11,4 12,2 Gamaglobulinemia (g/dL) 3,1 2,2 1,4 Eosinófilos (células/mm3) 1.240 500 380 Leucócitos (células/mm3) 12.805 7.410 6.000

Albumina (g/dL) 2,8 3,8 4,0

Apenas 60 (42,5%) dos 141 pacientes desta coorte foram submetidos a testes sorológicos para PCM antes do início do tratamento. Seis resultados (10%) foram negativos, 5 (8,3%) tiveram titulação de reatividade de anticorpos de 1:2, 7 (11,6%) de 1:8, 10 (16,7%) de 1:16, 11 (18,3%) de 1:32, 10 (16,7%) de 1:64, 6 (10%) de 1:128, 4 (6,7%) de 1:256 e 1 (1,7%) de 1:512. Não foram realizadas sorologias seriadas durante o tratamento ou ao final dele.

Os dados clínicos, epidemiológicos e laboratoriais obtidos dos pacientes com FASP diagnosticados de 1981 a 2001 (grupo I) foram comparados aos obtidos dos pacientes diagnosticados de 2002 a 2019 (grupo II), e não foi encontrada diferença significativa entre eles, como demonstrado na tabela 5.

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Tabela 5: Comparação dos dados clínicos e laboratoriais dos pacientes com FASP do grupo I (1981 – 2001) e do grupo II (2002 – 2019).

N média DP min max AIQ p

Idade (meses)

Grupo I 63 100 32,8 24 156 57

0,538 Grupo II 78 103,8 37,6 29 202 58

Período de sintomas (dias)

Grupo I 63 91,7 85,8 15 360 90

0,884 Grupo II 78 89,7 79,5 15 547 80

Contagem de leucócitos (células/mm3)

Grupo I 63 13517,7 7933,8 3960 45900 6500

0,103 Grupo II 77 15841,7 8665,2 3590 48200 9045

Contagem de Eosinófilos (células/mm3)

Grupo I 63 2852 2635,1 0 15846 1413 0,073 Grupo II 76 2883,1 3849,8 0 24610 2742,5 Dosagem de Hemoglobina (g/dL) Grupo I 63 9,4 1,9 4,3 15 3,2 0,477 Grupo II 78 9,6 2,0 5 14,1 3,1 Dosagem de albumina (g/dL) Grupo I 62 2,9 0,7 1,3 4,4 1,1 0,428 Grupo II 75 2,8 0,7 1,5 4,6 0,9 Dosagem de gamaglobulina (g/dL) Grupo I 53 3,15 1,0 0,98 5,19 1,57 0,686 Grupo II 69 3,07 1,2 0,85 5,90 1,40

N: número de pacientes; DP: desvio-padrão; AIQ: amplitude interquartil.

Oito pacientes (5,7%) desta coorte morreram durante as primeiras quatro semanas de internação hospitalar devido à gravidade das complicações apresentadas quando o diagnóstico de FASP foi estabelecido. Todos estes apresentavam seu primeiro episódio de PCM. Seis mortes ocorreram entre 1981 e 2001 (grupo I) e duas ocorreram entre 2002 e 2019 (grupo II). A comparação da incidência de complicações e de mortalidade entre os grupos I e II revelou que não existe diferença significativa entre eles, como demonstrado na tabela 6.

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Tabela 6: Comparação das incidências de complicações e mortalidade entre o grupo I (pacientes de 1981 a 2001) e o grupo II (pacientes de 2002 a 2019).

número/ total incidência IC 95% p Complicação Grupo I 12/63 19,0 13,4 – 36,6 0,282 Grupo II 12/78 15,4 8,6 – 24,7 Mortalidade Grupo I 6/63 9,5 3,95 – 18,76 0,139 Grupo II 2/78 2,6 0,43 – 8,21

Foi realizada a análise da tendência linear de óbito, agrupando os pacientes da casuística em 8 categorias, cada uma correspondendo à incidência de casos novos e de óbitos a cada 5 anos, como ilustrado pelo gráfico da figura 1. A análise de probabilidade pelo teste do qui-quadrado para tendência linear mostrou que não existe tendência de redução ou de aumento na mortalidade associada à FASP ao longo do tempo (p=0,072).

Figura 1: Agrupamento do número total de pacientes da casuística em 8 períodos de 5 anos cada, contendo a incidência de casos novos e de óbitos em cada período.

A regressão logística univariada demonstrou que não existe associação entre o óbito e as variáveis ‘sexo’, ‘grupo I’ e ‘grupo II’, ‘idade’, ‘período de sintomas’, ‘contagem de leucócitos no sangue periférico’ e ‘contagem de eosinófilos no sangue

0 5 10 15 20 25 30 80 a 84 85 a 89 90 a 94 95 a 99 00 a 04 05 a 09 10 a 14 15 a 18 óbito sobrevida

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periférico’; contudo, mostrou que existe associação entre os valores de ‘albumina sérica’ (p=0,003) e ‘gamaglobulina sérica’ (p=0,045) com a ocorrência de óbito.

A regressão logística multivariada, não condicional, com dois preditores categóricos (‘período de sintomas’ e ‘sexo’) e quatro co-variáveis (‘idade’, ‘contagem de leucócitos’, ‘contagem de eosinófilos’, ‘albumina sérica’ e ‘gamaglobulina sérica’) revelou que, a cada aumento de 1 g/dL na dosagem sérica de albumina, o risco de mortalidade é reduzido em 99,7%. Neste modelo, a variável ‘gamaglobulina sérica’ não se mostrou associada ao óbito. Os valores de Odds Ratio ajustados pelo mesmo modelo indicaram que cada aumento de 1 g/dL na dosagem sérica de albumina está associado a uma chance de sobrevida 335 vezes maior.

Uma curva ROC foi utilizada para identificar os possíveis pontos de corte no valor da dosagem sérica de albumina, com as respectivas sensibilidades, onde o eixo ‘y’ representa a sensibilidade (proporção de verdadeiros positivos) e o eixo ‘x’ representa 1 - especificidade (proporção de falsos positivos). O melhor ponto de corte está mais próximo do canto superior esquerdo do gráfico da figura 2, que representa uma dosagem sérica de albumina de 2,18, com boa sensibilidade e especificidade.

Figura 2: Curva ROC para sobrevivência. Os níveis de albumina aumentam significativamente a área sob a curva.

Curva ROC

1 - Especificidade Área Sob a Curva=0,84 (DP=0,003)

Sensi

bi

li

d

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Utilizando o ponto de corte da dosagem sérica de albumina de 2,18 g/dL obtido a partir do gráfico da curva ROC como um teste, este demonstra sensibilidade de 85,7% (IC95%: 48 – 97,4), especificidade de 85,4% (IC95%: 78,3 – 90,4), valor preditivo positivo de 24% (IC95%: 11,5 – 43,4), valor preditivo negativo de 99,11 (IC95%: 95,1 – 99,8) e acurácia de 85,4% (IC95%: 78,52 – 90,35), para determinar os pacientes com maior risco de mortalidade, como mostra a tabela 7.

Tabela 7: Sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo, valor preditivo negativo e acurácia do ponto de corte da dosagem sérica de albumina de 2,18 g/dL, baseados nos 137 casos em que esta foi realizada na admissão do paciente.

Óbito Total Sim Não Albumina < 2,18 N % 6 85,7% 19 14,6% 25 18,2% > 2,18 N % 1 14,3% 111 85,4% 112 81,8% Total N % 7 100% 130 100% 137 100%

Os 141 pacientes com FASP receberam diferentes combinações de medicamentos durante seu tratamento. SMX-TMP foi utilizado como principal medicação em 138 pacientes (97,8%). Treze deles (9,4%) apresentaram leucopenia induzida pelo SMX-TMP, sendo controlada em 10 pacientes com a adição de ácido folínico ao esquema terapêutico, sem necessidade de troca da medicação anti-fúngica. Para três pacientes que apresentaram leucopenia e para dois que apresentaram reações adversas graves ao SMX-TMP (Síndrome de Steven-Johnson e Drug reaction with

eosinophilia and systemic symptoms - DRESS), o medicamento foi trocado por

cetoconazol (2 pacientes) ou itraconazol (3 pacientes), dependendo da disponibilidade de drogas com ação anti-fúngica pelo SUS.

A duração do tratamento variou de 4 dias a 26 meses, com média de 15,9 meses. Os pacientes que foram tratados apenas por alguns dias foram aqueles que apresentaram evolução fatal antes que pudessem concluir o tratamento. Os grupos I e II apresentaram períodos de tratamento semelhantes, de 4 dias a 24 meses (média de 16,9

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meses e DP de 6,1) e de 5 dias a 26 meses (média de 15,5 meses e DP de 6,6), respectivamente (p=0,108). Os 133 pacientes que sobreviveram à doença receberam acompanhamento médico ambulatorial durante a maior parte do tratamento. A internação hospitalar foi restrita aos casos que apresentavam complicações com necessidade de cuidados 24 horas por dia, em regime de terapia intensiva ou enfermaria, dependendo da gravidade das complicações de cada um. Nestes casos, as drogas com ação anti-fúngica utilizadas foram SMX-TMP endovenosa ou anfotericina B, sendo que a escolha de uma ou outra medicação foi baseada na experiência clínica do profissional responsável pelo paciente. Todos os pacientes que não apresentavam complicações da FASP com necessidade de internação hospitalar, receberam acompanhamento exclusivamente ambulatorial com consultas inicialmente semanais, e após, quinzenais e mensais, até o término do tratamento.

Quatro pacientes (2,8%) ainda estão em seguimento ambulatorial em uso de medicação, com a doença controlada; 116 pacientes (82,2%) foram curados; 3 pacientes (2.1%) foram transferidos para outros serviços de saúde a pedido dos seus familiares; e 10 (7,1%) abandonaram o tratamento após o desaparecimento dos sintomas.

(36)

6. DISCUSSÃO

A região sudeste do Brasil, especialmente os estados de São Paulo e Minas Gerais, são áreas endêmicas de PCM, com elevada incidência de casos crônicos e agudo-subagudos da doença quando comparada a outras localidades, fato que justifica o grande número de pacientes incluídos neste estudo, mesmo sendo a FASP a forma mais rara da PCM2,8-9. As recidivas da doença observadas em alguns pacientes são consideradas eventos raros, embora previsíveis. Como as leveduras de Paracoccidioides spp. podem permanecer quiescentes no organismo quando a medicação antifúngica é precocemente interrompida, a má adesão ao tratamento pode fazer com que algumas permaneçam viáveis e voltem a proliferar assim que o ambiente se torna favorável5,9-10,16,22.

A distribuição dos 141 pacientes, divididos por sexo e agrupados por faixas etárias, (tabela 1) confirma o fato descrito por outros autores de que, à medida que as meninas se aproximam da puberdade, desenvolvem proteção endógena contra a PCM1,5,7,9,20. Na tabela 1, a faixa etária que vai dos 12 aos 15 anos mostra o claro predomínio da doença nos adolescentes do sexo masculino em relação às adolescentes do sexo feminino. Este fenômeno se deve à produção do hormônio estrógeno durante a puberdade das meninas e, posteriormente, durante a vida adulta. Como demonstrado por estudos anteriores, o estrógeno é capaz de inibir a transformação do conídio inalado em leveduras infectantes, impedindo a progressão da PCM e conferindo proteção contra formas graves e disseminadas da doença1,4-5,7,9,20,24.

A maioria dos pacientes apresentou sinais e sintomas relacionados ao sistema retículo-endotelial, em concordância com os achados de outros autores5,9,32,38,43. Entretanto, casos graves e letais de infecção fúngica disseminada afetando outros órgãos e tecidos, mesmo sem evidência clínica, também foram observados neste estudo, confirmando que as leveduras do Paracoccidioides spp. têm capacidade de invadir todos os tecidos do corpo humano29,33-43.

Este estudo demonstrou que a extensão do tempo decorrido entre o surgimento dos primeiros sinais e sintomas de PCM e a admissão no serviço de referência não teve relação com o desenvolvimento de complicações relacionadas à doença. Demonstrou, ainda, que os pacientes de áreas rurais, que supostamente teriam menos acesso aos serviços de saúde, apesar de terem apresentado um maior número de

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complicações, não levaram mais tempo que os de áreas urbanas para alcançarem o serviço de referência. Consequentemente, pode-se inferir que fatores imunológicos inerentes ao hospedeiro devem exercer maior influência no desenvolvimento de complicações relacionadas à FASP do que o tempo de doença. Estudos anteriores já haviam demonstrado que o padrão de resposta imunológica predominante no hospedeiro determina não só a forma clínica da doença (crônica ou aguda-subaguda), mas também a extensão e intensidade dos sinais e sintomas apresentados6,9,22,52,59. O fato de que o tempo decorrido entre o surgimento dos primeiros sinais e sintomas e a admissão no serviço de referência não foi diferente entre os pacientes que apresentaram e os que não apresentaram complicações, reforça esta hipótese. Infelizmente, por ser este um estudo retrospectivo e por não ter sido possível recuperar amostras do material biológico colhido dos pacientes, os aspectos imunológicos não puderam ser analisados a fim de esclarecer estes aspectos.

As alterações nos exames laboratoriais dos pacientes (anemia, leucocitose, eosinofilia, hipoalbuminemia e hipergamaglobulinemia) são frequentemente observadas na FASP, e o período de tratamento necessário até a normalização desses parâmetros (entre 3 e 6 meses) confirma as conclusões obtidas por outros autores, baseados em coortes menores20,29,46.

Os resultados dos testes sorológicos obtidos neste estudo, todavia, apresentaram discordância evidente com os achados de outros autores. Muitos acreditam que títulos elevados de anticorpos deveriam ser obtidos dos portadores de FASP antes do início do tratamento da doença5,9-10. Entretanto, 18,3% dos pacientes desta coorte que foram submetidos a testes sorológicos apresentavam títulos menores que 1:4, considerados critério sorológico de cura da FASP, antes mesmo do início do tratamento da doença5,9. Na realidade, 64,9% dos pacientes submetidos a testes sorológicos apresentavam títulos menores ou iguais a 1:32, embora, por se tratarem de casos de FASP disseminada, fossem esperados títulos superiores a 1:64, inviabilizando a realização de sorologias seriadas para acompanhamento do tratamento, como é recomendado por alguns autores9-10,17. Resultados discordantes como estes já haviam sido descritos em estudos anteriores e algumas hipóteses foram feitas na tentativa de explicar a aparente contradição, mas ainda não há consenso sobre o motivo de sorologias tão divergentes serem obtidas de pacientes com a mesma forma de doença, tempos de queixa equivalentes e quadros clínicos semelhantes10,18-19. Portanto, este resultado demonstra que os testes

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sorológicos disponíveis atualmente não são a forma mais adequada para diagnóstico ou avaliação da resposta terapêutica de pacientes pediátricos com FASP.

Muitos autores consideram que a mortalidade relacionada à FASP seja elevada, porém a heterogeneidade da forma como este dado é descrito em cada população estudada dificulta a comparação com os resultados deste estudo1,5,9,29. Todavia, a comparação das taxas de mortalidade obtidas para cada um dos dois grupos, representando dois períodos de tempo, foi possível, e demonstrou que, apesar da expectativa de que a queda de 9,5% para 2,6% indicasse que as melhorias no acesso e nos recursos dos serviços de saúde ocorridas nas últimas décadas tivessem resultado em um melhor prognóstico para os casos da doença, as análises estatísticas de comparação da incidência e de tendência linear de óbito, não confirmaram tal hipótese.

Semelhantemente à análise das taxas de mortalidade, a comparação de cada um dos exames laboratoriais entre os grupos estudados não revela diferenças significativas entre eles, podendo-se inferir que, mais importante do que os recursos assistenciais disponíveis em cada um dos períodos estudados, as alterações laboratoriais encontradas nos portadores de FASP se devem ao padrão de resposta imunológica desenvolvido pelo hospedeiro em contato com o Paracoccidioides spp. Diversos estudos realizados a partir de análises in vitro são utilizados para inferir a importância da resposta imunológica desenvolvida in vivo contra a PCM4,6,16,22,24,31,48,58-59. Contudo, este assunto ainda requer outras modalidades de estudos, incluindo ensaios clínicos prospectivos, a fim de esclarecer melhor a interação entre o Paracoccidioides spp. e a resposta imunológica desenvolvida pelo hospedeiro, bem como o desenvolvimento de complicações relacionadas à doença.

Por outro lado, independentemente do contexto imunológico no qual a FASP se desenvolve, este estudo revelou que o ponto de corte de 2,18 g/dL no valor da albumina sérica pode ser utilizado como um teste com bom poder preditivo para avaliar o risco de mortalidade e a chance de sobrevivência dos pacientes pediátricos com a doença, aliando o teste ao exame clínico criterioso. Semelhantemente, outros estudos demonstraram que a dosagem sérica de albumina possui valor prognóstico para outras doenças infecciosas, como a pneumonia adquirida na comunidade, sepse grave e bacteremia, embora ainda não tenham sido completamente elucidados os mecanismos fisiopatológicos que justificam tal associação65-66. Embora não fosse o objetivo deste estudo analisar a

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correlação entre a dosagem sérica inicial de albumina e a incidência de mortalidade relacionada à FASP, a utilização rotineira do referido parâmetro laboratorial como controle de resposta ao tratamento dos pacientes desta casuística, permitiu que a correlação fosse feita e que um teste de triagem de necessidade de internação fosse criado, ainda com necessidade de validação.

O principal medicamento com ação antifúngica utilizado no tratamento dos casos de FASP foi a SMX-TMP. Esta tem sido a droga mais recomendada para este propósito, já que possui boa eficácia contra o Paracoccidioides spp. e efeitos adversos bem conhecidos e de manejo acessível. Os bons resultados obtidos nesta coorte com o uso de SMX-TMP são similares aos obtidos por outros estudos2,5,9-10,20,29,43. As reações adversas graves ao uso da SMX-TMP observadas em dois pacientes (Síndrome de Stevens-Johnson e DRESS) são eventos raros, idiossincráticos e HLA mediados que podem ser desencadeados por uma grande variedade de medicamentos, vacinas e infecções virais, não justificando a indicação de outra medicação como primeira escolha no tratamento da FASP67,68.

Os resultados deste estudo reforçam que o diagnóstico de FASP deve sempre ser lembrado nos casos de crianças oriundas de áreas endêmicas de PCM, com quadro de febre e linfadenite generalizada. A avaliação clínica criteriosa, aliada a exames laboratoriais simples, como o hemograma e a eletroforese de proteínas séricas podem corroborar para o diagnóstico, revelando anemia, leucocitose, eosinofilia, hipoalbuminemia e hipergamaglobulinemia. Nas situações em que a identificação do

Paracoccidioides spp. não é possível, seja por limitação dos recursos disponíveis ou por

serem necessárias medidas invasivas, possivelmente desproporcionais à condição clínica do paciente, os dados epidemiológicos, clínicos e alterações laboratoriais podem ser suficientes para que se recomende o início do tratamento medicamentoso, a fim de evitar desfechos desfavoráveis. O ponto de corte na dosagem sérica de albumina, de 2,18 g/dL, pode ser utilizado como um teste com boa sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo, acurácia, e de baixo custo para risco de mortalidade relacionada à FASP, auxiliando os profissionais de saúde a identificar os casos com necessidade de internação hospitalar e início imediato de tratamento.

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7. CONCLUSÕES

7.1. A maioria dos pacientes com diagnóstico de FASP era oriunda de áreas urbanas (65,2%) e não houve diferença significativa entre do tempo decorrido desde o início da doença e o atendimento em serviço especializado entre os pacientes de áreas urbanas e rurais.

7.2. O acometimento de cada sexo pela FASP foi variável entre as faixas etárias, sendo equivalente entre meninos e meninas de 0 a 5 anos e tornando-se cada vez mais prevalente nos meninos nas faixas etárias subsequentes, atingindo a proporção de 1 menina : 7 meninos de 12 a 15 anos.

7.3. As principais manifestações clínicas de FASP foram a linfadenite generalizada (87,2%), febre (75,2%) e perda de peso (64,5%).

7.4. As principais alterações laboratoriais encontradas foram: anemia (87,9%), hipergamaglobulinemia (81,1%), eosinofilia (77,6%), leucocitose (67,3%), hipoalbuminemia (65%). A normalização da albumina sérica, da contagem de leucócitos e de eosinófilos ocorreu após 3 meses, enquanto a normalização dos níveis de hemoglobina e gamaglobulina ocorreu após 6 meses de tratamento.

7.5. A maioria (65%) dos pacientes que foram submetidos a testes sorológicos apresentaram títulos inferiores ao esperado, menores ou iguais a 1:32, o que indica que este não foi um método confiável para diagnóstico de FASP nos pacientes pediátricos desta casuística.

7.6. A SMX-TMP foi utilizada como principal medicação (97,8%) para o tratamento da FASP, cuja duração média foi de 15,9 meses.

7.7. A taxa de recidivas foi de 7,8%, e todos os casos tinham relação com má adesão ao tratamento proposto. Nenhum destes pacientes foi a óbito pela PCM.

7.8. A comparação dos dados obtidos dos pacientes atendidos de 1981 a 2001 com os dados dos pacientes de 2002 a 2019 mostrou que não houve diferença estatisticamente significativa na idade, período de sintomas, exames laboratoriais e taxa de complicações entre os grupos.

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7.9. A taxa de complicação relacionada à FASP foi de 17% para toda a coorte, sendo 31,7% para os pacientes oriundos de áreas rurais e de 11,9% para os pacientes de áreas urbanas, embora não tenha sido possível identificar um motivo para a diferença observada.

7.10. A taxa de mortalidade foi de 5,7% para toda a coorte, sendo maior (9,5%) para o grupo de pacientes atendidos de 1981 a 2001 em relação à taxa dos pacientes atendidos de 2002 a 2019 (2,6%), embora sem diferença estatisticamente significativa entre os grupos. Constatou-se que o valor de albumina sérica igual ou inferior a 2,18 g/dL é fator de risco para a mortalidade relacionada à FASP.

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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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