• Nenhum resultado encontrado

Desatando os nós do currículo integrado no ensino médio no âmbito dos institutos federais

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Desatando os nós do currículo integrado no ensino médio no âmbito dos institutos federais"

Copied!
114
0
0

Texto

(1)

UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

MARCIA MARIA BRISCH SCHNEIDER

DESATANDO OS NÓS DO CURRÍCULO INTEGRADO NO ENSINO MÉDIO NO ÂMBITO DOS INSTITUTOS FEDERAIS

Ijuí (RS) 2013

(2)

MARCIA MARIA BRISCH SCHNEIDER

DESATANDO OS NÓS DO CURRÍCULO INTEGRADO NO ENSINO MÉDIO NO ÂMBITO DOS INSTITUTOS FEDERAIS

Dissertação apresentada à Banca de Qualificação do Curso de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação nas Ciências, do Departamento de Humanidades e Educação (DHE), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), como requisito para obtenção do título de Mestre em Educação nas Ciências

Orientadora: Drª Maria Cristina Pansera Araújo

Ijuí (RS) 2013

(3)

A comissão abaixo assinada aprova a presente dissertação

DESATANDO OS NÓS DO CURRÍCULO INTEGRADO NO ENSINO MÉDIO NO ÂMBITO DOS INSTITUTOS FEDERAIS

Elaborada pela mestranda

MARCIA MARIA BRISCH SCHNEIDER

Como requisito para obtenção do grau de MESTRE EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS

COMISSÃO EXAMINADORA

Profª Drª Maria Cristina Pansera Araújo (Orientadora)

Profª Drª Lenir Zanon

Profª Drª Nídia Heringer

(4)

A todas as pessoas que se implicam com a educação, inclusive aquelas que refletem e se encorajam a fazer algo que transforma e inova e, principalmente, aquelas que se afetam com...

“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado” (Rubem Alves)

(5)

AGRADECIMENTOS

Aos alunos, pela experiência. Aos familiares, pela tolerância. Aos amigos, pelo incentivo. Aos colegas, pelo apoio.

Aos mestrandos, pelo coleguismo. Aos professores, pelo conhecimento. À orientadora, pelo desafio.

À Banca Examinadora, pela perspicácia. Aos filhos amados, pela paciência.

Ao meu esposo, eterno namorado, companheiro e amante, pelo carinho, companheirismo e seu grande senso de humor.

(6)

Do novelo emaranhado da memória, da escuridão dos nós cegos, puxo um fio que me aparece solto. Devagar o liberto, de medo que se desfaça entre os dedos. É um fio longo, verde e azul, com cheiro de limos, e tem a macieza quente do lodo vivo. É um rio. Corre-me nas mãos, agora molhadas. Toda a água me passa entre as palmas abertas, e de repente não sei se as águas nascem de mim, ou para mim fluem. Continuo a puxar, não já memória apenas, mas o próprio corpo do rio. (Jose Saramago).

(7)

RESUMO

Este trabalho tem como tema o desenvolvimento do currículo integrado no ensino médio e técnico profissional no âmbito do Instituto Federal Farroupilha - campus Santo Augusto. Nessa perspectiva, apontamos a necessidade de discutir os nós que vem se apresentando nesse processo, considerando a urgência da educação atender a legislação, bem como alcançar o sucesso almejado nesse nível de escolaridade. Para tanto, esse estudo tem como objetivos: a) identificar a concepção de currículo que orienta as práticas escolares, apontando suas origens e trajetórias como um nó, que impõe limites e possibilidades a implementação do currículo integrado na escola; b) verificar a possibilidade de integração curricular para os cursos técnicos diante das proposições teóricas existentes; c) analisar as mediações necessárias para superar a estrutura curricular fragmentada, visando à constituição da integração curricular a partir das disciplinas; d) refletir sobre os saberes escolares, a partir de uma proposta curricular integrada entre o Ensino Médio e o Ensino Técnico. Constituiu-se uma pesquisa documental, fundamentada na análise textual discursiva, que as discussões teóricas sustentam a substituição do currículo fragmentado pelo integrado, numa construção história, que contribuí para a configuração do currículo no contexto escolar. Como parte essencial, aborda alguns nós do desenvolvimento de um currículo integrado, como a conjuntura econômica e a legislação pertinente, o conceito de currículo, a interação entre o trabalho, a ciência e a cultura, a dicotomia dos Decretos nos 2.208/1997 e 5.154/2004 e o desafio da formação docente. Esta proposta diz respeito aos Institutos Federais de Educação, e discute o que já foi feito e falta fazer para desenvolver um currículo integrado, desde as disciplinas curriculares. Nessa perspectiva, é necessária a construção de espaços de fomento em que a escola precisa reivindicar o diálogo entre professores das diferentes áreas, ouvir a comunidade, os alunos e atender às especificidades de formação desses sujeitos, promovendo o estudo e a reflexão das diferentes concepções que constituem a prática pedagógica de cada um e do coletivo, buscando, organizar projetos que levem em consideração os interesses dos alunos, e a contextualização da escola na realidade e cultura local.

(8)

ABSTRACT

This work has as its theme the development of integrated curriculum in secondary education and technical training in the Instituto Federal Farroupilha – Campus Santo Augusto. In this perspective, we point out the need for us to discuss the difficulties that have been presented during this process, considering the urgency of education meeting legislation and achieving the desired success it aims to reach. Therefore, this study aims: a) to identify the concept of curriculum that guides school practices, pointing their origins and trajectories as a node, which imposes limits and possibilities of the implementation of the integrated curriculum in school, b) to verify the possibility of integrating curriculum for technical courses based on the actual theories c) to analyze the necessary mediations to overcome the fragmented curriculum, aiming at the establishment of curriculum integration from the disciplines d) to reflect on the school knowledge from an integrated curriculum between high school and technical education. This work Consisted on a documentary research, based on textual discourse analysis, theoretical discussions that support the replacement of the fragmented curriculum integrated into a historical construction, which contributed to the configuration of the curriculum in the school context. As an essential part, we address the development of an integrated curriculum, pointing out, among others, the economic and law, the concept of curriculum, interaction between labor, science and culture, the dichotomy of Decrees 2208 / 1997 and 5.154/2004 and the challenge of teacher formation. This proposal concerns the Federal Institutes of Education, and discusses what has been done and what is still in development in an integrated curriculum, within the curriculum subjects. From this perspective, it is necessary to construct spaces that promote the school needs to claim the dialogue between teachers of different areas, listen to the community, students and to promote specific training of these individuals, promoting the study and reflection of the different concepts that constitute pedagogical practices of each and the collective, seeking to unify the disciplines, organize projects that take into account the interests of students, and the need of the school to contextualize itself in the local culture and its reality.

(9)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Objetivos e proposição metodológica do estudo... 12

Figura 2 : Mediação dos saberes ... 21

Figura 3: Reconhecimento das disciplinas isoladas como lugar de relação do currículo integrado... 25

Figura 4: As áreas como fatores de integração, diálogo e articulação de saberes na perspectiva da formação cidadã... 26

Figura 5: Problemas decorrentes da escola organizada em torno de saberes disciplinares... 27

Figura 6: A ponta do fio ... 30

Figura 7: Opções de currículo vigentes atualmente ... 31

Figura 8: Construção de espaço de reflexão... 40

Figura 9: Decretos nos2.208/1997 e 5.154/2004... 69

(10)

LISTA DE ABREVIATURAS

BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIRD - Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento CEFET- Centro de Educação Federal e Tecnológica

DCNs - Diretrizes Curriculares Nacionais

DNEM - Diretrizes Nacionais para o Ensino Médio ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio

EP - Educação Profissional

EPT - Educação Profissional e Tecnológica

GIPEC - Grupo Interdepartamental de Pesquisa sobre Educação em Ciências da Unijuí

IFF- Instituto Federal Farroupilha

IFs - Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC - Ministério de Educação e Cultura

PCNs - Parâmetros Curriculares Nacionais

UNESCO - United Nations Education Science and Culture Organization

(11)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 A TEIA CONSTRUÍDA NO PERCURSO METODOLÓGICO ... 15

2 AS TECEDURAS DO CONTEXTO HISTÓRICO NO DESENVOLVIMENTO DO CURRÍCULO INTEGRADO E OS NÓS ... 21

2.1 A ponta do fio ... 28

2.2 A fiação do Currículo, currículo integrado, integração curricular das disciplinas... 30

2.3 A conjuntura política e a legislação pertinente ao currículo integrado: uma amarra a ser desmanchada para novas costuras... 50

2.4 O nó da dualidade dos Decretos nos2.208/1997 e 5.154/2004 criadores do currículo integrado... 63

2.5 O alinhavo da integração conceitual de trabalho, ciência e cultura ... 70

2.6 O desafio docente frente a uma nova tecelagem: um currículo inovador... 78

3 A CRIAÇÃO DOS INSTITUTOS FEDERAIS: ESPAÇO DE DESENVOLVIMENTO DO CURRÍCULO INTEGRADO ... 85 3.1 O esperado... 87 3.2 O realizado ... 92 3.3 O possível ... 94 CONSIDERAÇÕES ... 104 REFERÊNCIAS... 108

(12)

INTRODUÇÃO

As reflexões que embasam os discursos na área de educação apontam para uma sociedade do conhecimento, que, além de exigir cada vez mais uma educação continuada, reclama por melhor qualidade. No entanto, o que observo é um aumento das desigualdades e dos processos de exclusão que exigem uma mudança do papel da escola. Essa mudança requerida começa a ser implantada a partir de políticas educacionais que indicam a necessidade, dentre outras, de desenvolvimento de um novo currículo. Daí pensar um novo professor, uma nova escola, um outro contexto, um outro Ensino Médio.

Nessa configuração real e não a ideal, em que, diante do velho, queremos o novo, é que surge o Ensino Médio integrado ao Ensino Técnico Profissional, não como opção mas como condição. Um ensino de qualidade que atenda às necessidades, que se apresentam nessa tão propagada sociedade do conhecimento. Ocorre que essa condição não se projeta no âmbito das escolas quando as várias tentativas de integrar as diferentes áreas do conhecimento, neste caso, as de formação geral e específica têm perpetuado a fragmentação do conhecimento.

No âmbito dos Institutos Federais, onde atuo como pedagoga, as dificuldades também permeiam esse processo, instigando os professores a pensar novas possibilidades diante de um contexto, que se instaura, não só por força legal da melhoria da qualidade, mas no cumprimento da função social pela qual o Instituto foi criado.

Esse fato não causa estranheza quando penso que toda mudança traz em seu princípio o conflito, tanto pelas nossas concepções como pelo desconhecimento do como fazer. Nesse sentido, cabe a cada um optar pela longa e sofrida resistência a um currículo integrado, tecedura cujos pontos não conhecemos, criando nós para atar, ou nos percebemos como parte dessa e começamos a desatar os nós dando o ponto e as cores que queremos.

Parece-me que ensinar nessa perspectiva no Instituto Federal de Farroupilha (IFF) de Campus Santo Augusto, no que tange à integração ensino médio e técnico tem sido intrínseco ao processo de construir caminhos, tecer alternativas, visto que, junto com sua criação, surgem os cursos e chegam profissionais das mais diversas áreas, que trazem não só a especificidade de sua formação disciplinar como

(13)

também culturas de outros recantos do país. E os alunos? Como pensar em tantas singularidades que formam um todo heterogêneo? Para qualificar a proposição de um currículo integrado, os objetivos a serem respondidos na elaboração da dissertação são os seguintes:

Figura 1: Objetivos e proposição metodológica do estudo

OBJETIVOS COMO

- Identificar a concepção de currículo que orienta as práticas escolares, apontando suas origens e trajetórias como um nó que impõe limites e possibilidades a implementação do currículo integrado na escola;

- Relações históricas x mundo do trabalho. - Definir conceitos.

- Teorias curriculares x momento histórico. - Eficientismo e Progressivismo

- Verificar a possibilidade de integração curricular para os cursos técnicos diante das proposições teóricas existentes;

- currículo global

- metodologia de projetos - currículo interdisciplinar - currículo transversal

- integração x disciplinaridade - Analisar as mediações necessárias, para

superar a estrutura curricular fragmentada, para a constituição da integração curricular a partir das disciplinas;

- implantação de um currículo integrado (como as disciplinas escolares formam os sujeitos, quais as inter-relações entre os saberes que são desenvolvidos nas escolas, bem como, quais os sentidos que as comunidades escolares atribuem ao currículo)

- Refletir sobre os saberes escolares, a partir de uma proposta curricular integrada entre o Ensino Médio e o Ensino Técnico, considerando o currículo disciplinar.

- Condições dos Institutos Federais criaram e o que precisam desenvolver no sentido de implantar essa proposta.

Fonte: SCHNEIDER, 2013.

Estes objetivos ainda geram outras questões: Como realizar a mediação didática dos saberes científicos organizados em torno de um currículo integrado para o Ensino Médio e Técnico? A realização dos objetivos pode significar a identificação de um conjunto de “nós”, que constituem a malha de informações e compreensões articuladoras das decisões a serem tomadas na produção do currículo integrado, a partir da contribuição de cada um dos aspectos formadores do todo. Responder a essas questões colabora para indicar o que é integrar. Integrar é considerar todos esses elementos, cada professor com sua disciplina, sua cultura, com cada aluno, suas especificidades, dificuldades e interesses, com a comunidade e suas expectativas, e constituir o que se chama escola, e esta garantir a sua função: a de ensinar. Não creio que seja tarefa simples, quando partimos de uma proposição que,

(14)

apesar de não ser nova, suscita outra forma de perceber a disciplina, a função, a escola, o aluno. Perceber um todo, a partir de uma parte, sendo nós próprios uma das partes, mas também um todo formado pelas nossas histórias de vida e de formação.

E nessa tecedura vamos atando nós para tentar esconder as falhas ao invés de tentar desatá-los. Surge um emaranhado: uma indefinição do que é currículo, uma alternativa de integração, uma exigência legal, uma conjuntura que ultrapassa os limites da escola, o trabalho com princípio educativo e um docente em construção. São os nós que surgem no desenvolvimento de um currículo integrado. E novamente, diante da autonomia para fazê-lo nos perguntamos: “O que é de fato necessário para acontecer o desenvolvimento do currículo integrado no ensino médio?”

O primeiro capítulo situa essa questão que constitui o tema deste estudo surge à medida que nos constituímos como promotores de tal discussão no âmbito do Instituto, e que tem sido, senão a principal, a mais incansável inquisição feita no processo de construção de tal proposta, que percorre os discursos formativos, embrenha-se pelos documentos oficiais, mas continua reclamando respostas. Precisa ser respondida à medida que o ensino médio e técnico reclama melhorias. São significativos os avanços quantitativos, mas poucos os avanços qualitativos. É a necessidade de comprometer-se com o estudo, a compreensão e a capacitação dos docentes que exige apontar caminhos que possam orientar e desenvolver com sucesso o currículo integrado.

Nessa tentativa, o texto vem trazendo as contribuições de alguns autores, os quais têm apresentado reflexões sobre cada um dos aspectos que, embora não sejam os únicos, considerei os mais importantes para o contexto da discussão. No segundo capítulo, parto da concepção de que é necessário compreender o contexto histórico de desenvolvimento do currículo integrado, observando como este, em seus mais diferentes momentos, percebe o conhecimento, buscando transformar os saberes científicos em saberes escolares. Nesse sentido, atento para os fatores que influenciaram e apontaram a necessidade de um novo currículo, o currículo integrado, em oposição ao currículo fragmentado.

Partindo da necessidade de um currículo integrado, apresento cada um dos nós que têm permeado as dificuldades de seu desenvolvimento. O primeiro diz respeito ao conceito de currículo e às diferentes teorias curriculares que

(15)

influenciaram significativamente na forma como pensamos o conhecimento e, por consequência, discutimos e construímos o currículo. Nesse sentido, tornou-se fundamental pensar a conjuntura política como um nó, considerando que esta permeia as propostas voltadas à educação e ao currículo, apresentando-se como fundadora de um currículo, visto que ela se movimenta no sentido de promover as mudanças na educação que são pertinentes as mudanças no âmbito social, político e econômico.

A legislação, considerando seus Decretos 2.208/1997 e 5.154/2004, é desvelada no sentido de mostrar que ela, em função da dicotomia dos ordenamentos, trouxe implicações que sustentam ainda algumas formas de pensar a integração do ensino médio ao técnico. Outro nó aqui apresentado diz respeito à interação entre trabalho, ciência e cultura, visto que esses são aspectos que também trazem em suas concepções o significado que queremos dar ao mundo do trabalho, da vida e, portanto, do aluno, à medida que pensamos a sua formação. E para pensar como cada um desses nós pode ser pensado, partimos da necessidade de um novo perfil docente, considerando que estes são os responsáveis para dar início a esse processo de construção.

Assim, no terceiro capítulo considero a criação dos Institutos Federais, apontando o que ela traz em seu bojo, seus desdobramentos, o esperado, o que foi realizado e o que é possível a ser feito no sentido de desenvolver um currículo integrado.

(16)

1 A TEIA CONSTRUÍDA NO PERCURSO METODOLÓGICO

O currículo integrado tem se constituído em um desafio que perpassa as discussões nas escolas instigando os professores a pensar formas de implantá-lo desde o início de minha carreira como docente. Entre idas e vindas de propostas governamentais os termos que buscam contemplar um currículo integrado, tais como interdisciplinaridade, transversalidade, contextualização, temas geradores constituíram as formações continuadas de minhas vivências. Vivências que me constituíram docente e pesquisadora a medida que o cotidiano escolar nas séries iniciais se caracteriza como um espaço aberto de observação, construção e avaliação de cada uma dessas propostas. Essa vivência com as séries iniciais, constante e desafiante, permitia-me pensar inúmeras possibilidades indicando que a integração curricular dependia apenas de uma escolha individual que organizava e avançava para o coletivo, desatando os nós de cada proposição a medida que a dinamicidade do currículo lançava novos desafios.

Constituir-se como docente nas séries iniciais e por vezes na gestão escolar tinha como âmago das dificuldades a descoberta que a pedagogia não trazia o conhecimento especializado das diferentes áreas fazendo com que experiências, por exemplo, na área das ciências da natureza, não fossem significativas, pela falta ou não compreensão de conceitos sobre alguns fenômenos. Então, tornar interdisciplinar e contextualizado um conhecimento, mostrava nossas fraquezas na formação da educação básica que não havia promovido o aprendizado dos conceitos. Como contextualizar, integrar os conhecimentos, quando um tema se esgotava em apenas uma área do conhecimento, ou nos conteúdos e não nos conceitos? Aumentava a vontade de fazer diferente e melhor e faltava o conhecimento especializado sobre cada disciplina em particular, que a Educação Básica e a Educação Superior dada a sua especificidade, não havia possibilitado. Essa era uma reflexão feita considerando um momento particular de minha constituição docente.

Talvez ao ler esse percurso metodológico, algum leitor se questione sobre qual a importância dessa trajetória considerando que o tema em estudo remete a integração curricular do Ensino Médio ao técnico. Pondero esse fato, quando sustento que essa possibilidade de pensar e realizar um currículo integrado nas

(17)

séries iniciais me propiciou a visão que acredito faltar para a maioria dos docentes quando se especializam e passam a atuar em suas disciplinas isoladamente.

Aqui o processo se inverte, há o conhecimento especializado, faltoso ao pedagogo das séries iniciais, mas não há a visão do todo, tão habitual ao docente que atua tanto como docente quanto gestor nessa etapa de educação. É com essa visão que assumi a coordenação de um Instituto Federal, ao mesmo tempo em que vejo nesse novo espaço a concretização de aspectos tão desejados nas escolas de Ensino Fundamental: uma estrutura física nova, docentes com alto nível de formação, encontro também o desafio de começar de maneira diferente, com a criação de novas interações e integrações. Ideia esta que se intensifica a partir da leitura de Milton Santos, quando este fala no desafio e compromisso de pensarmos outra globalização, mais justa e que esta precisa embasar o compromisso social dos IFs.

Esqueci que embora cada docente nomeado trazia uma formação recente e de alto nível, possuía suas histórias de vida e a formação dentro de um contexto em que as disciplinas eram estanques e a experiência docente, a vivência com adolescentes era tão nova e desafiadora quanto o projeto de integração curricular imposto pela legislação de criação do IFs para seu funcionamento.

Coordenar esse processo que de antemão trazia uma diversidade de especializações, com culturas e expectativas diferentes, em um ambiente em que os alunos não eram como o ideal esperado, mas reais, instigou-me a reformular conceitos e opiniões sobre os outros e a considerar os grandes desafios a partir da inversão da experiência anterior com séries iniciais: se antes eu tinha o todo e me faltava as partes para compreender esse todo, agora eu tenho essas partes e como posso formar o todo? O pensamento de Edgar Morin constitui uma base teórica fundamental para pensar essa questão, pois demonstra a preocupação com a elaboração de um método capaz de aprender a complexidade do real, tecendo críticas à fragmentação do conhecimento. É ele que nos propõe uma reforma do pensamento por meio do ensino transdisciplinar capaz de formar cidadãos planetários, solidários e éticos.

Diante dessa questão, a pesquisa começa a embasar novas leituras e busca, mais árdua que a vivência anterior porque se sustenta em um percurso a ser construído em que tanto, eu Márcia, como cada novo docente precisa compartilhar conhecimentos e expectativas e construir interações e organizações curriculares que

(18)

permitam os diálogos exigidos.. É natural cada um de nós primeiro resistir ao desconhecido e sustentar nossa defesa num ideário comum, o da impossibilidade. E, nesse ideário, buscamos, nas entrelinhas das propostas e das vivências, argumentos para refutar o que nos assusta.

Não foi diferente no espaço do IFF - Campus Santo Augusto. Buscamos como sempre modelos a seguir ou analisar tentativas frustradas deixando muitas vezes de partir destas tentativas para inovar e pensar novas alternativas. Como surgiu o tema da pesquisa? Como desafio pessoal e profissional de sustentar que a organização disciplinar que constitui o IFF traz, em cada um de seus especialistas, mestres e doutores, o conhecimento e a condição necessária para efetivar realmente um diálogo entre as áreas do conhecimento. Quem domina um saber pode se propor a discuti-lo com o outro e a identificar os conceitos estruturantes da área. E, essa discussão constituirá o espaço de diálogo, sob a coordenação pedagógica dos IFs para promover a inovação necessária à implementação da organização curricular. Dessa forma, aqui me constituo pesquisadora e promotora de um tema que requer muito mais que uma leitura da realidade, pois implica em voltar para cada apontamento feito no sentido de buscar soluções. As leituras iniciam-se obviamente pelos documentos que embasam a proposta da integração curricular ensino médio e técnico. Houve em certo momento a vontade e a reflexão de tornar o IFF o espaço de pesquisa, analisando como esse processo tem sido permeado. No entanto, justifico a pesquisa documental como fundamento.

Como pedagoga do IFF - Campus Santo Augusto analiso e reflito constantemente com o grupo de professores sobre os registros, as mudanças, os planos de ensino e a pesquisa subsidiaria os estudos ao colocar a compreensão dos documentos oficiais como tema. Por que o currículo integrado não aconteceu ainda? Porque a proposição deste no âmbito dos IFs ainda é recente, tanto quanto, a constituição do coletivo de professores, que apesar de especialistas em suas áreas, carecem da vivência docente, da compreensão da legislação e dos fins e objetivos dos Institutos Federais.

Esse último apontamento é que define a opção pela análise dos documentos. A compreensão de como a legislação vem instituindo e percebendo o currículo integrado, buscando entender o momento histórico em que cada uma se instituiu e qual o significado disso para hoje e o currículo a ser implantando. Esse entendimento leva a acreditar que a opção curricular e metodológica do IFF –

(19)

Campus Santo Augusto ocorrerá a medida em que o coletivo de diálogo compreender que a legislação sobre currículo integrado desde suas exigências, contradições e possibilidades de realização. Ela é e precisa ser uma opção política, não partidária, mas institucional, pois precisa atender aos fins e objetivos da criação dos Institutos Federais.

Para tanto, optei pela análise dos documentos propostos em diferentes momentos históricos, buscando entender em que conjuntura política, social e econômica foi definida esta opção de educação que garante a manutenção ou não de determinadas estruturas. Além de outros documentos, me inclino para a dicotomia dos Decretos 2.208/1997 e 5.154/2004, trazendo as leituras da legislação anterior que já contempla alguns dos princípios que regem o novo Ensino Médio no Brasil, tais como o relatório Delors. Nesse sentido, a opção de integração curricular dos IFs busca atender uma política pública de formação dos adolescentes dos cursos propostos. O docente não é um mero especialista, mas sim um agente que precisa atender a essas políticas públicas que embasam a criação dos IFs. É uma opção pelo projeto. Como as discussões que permeiam esse projeto, trazem principalmente as mudanças na legislação em relação ao Ensino Médio Integrado ao Ensino Técnico, é salutar compreender porque há diferentes interpretações. Optei então pela análise documental, porque é ela que permite uma leitura das possibilidades e dos entraves que surgem a medida que se instituem leis e propostas a partir de decretos e diretrizes. Considero que teriam inúmeros outros documentos a serem analisados, mas que diante da delimitação do tema, a análise da dicotomia dos Decretos representa um entrave.

Surge assim diante da delimitação do estudo, a necessidade de apontar outros entraves ao processo observados enquanto coordenação, os quais por opção pessoal são denominados de nós ao processo, que ao mesmo tempo que garantem a existência da rede, podem funcionar como obstáculos a serem rearticulados. Essa metáfora me sugere uma, comparação com o processo artesanal e de maior compreensão visto que o currículo integrado se constitui em uma rede, uma construção ou confecção de um todo que pode ser representada por uma colcha. Nem todos sabem fazer uma colcha de crochet, por exemplo, por mais artesanal e simples que pareça. Mas confeccioná-la envolve vários conhecimentos e requer uma criatividade e uma compreensão de como esse processo ocorrerá, à medida que escolho cores, linhas e pontos. Mesmo quando existe um modelo, é necessária uma

(20)

leitura criteriosa de quais caminhos percorrer. Além de tudo isso, por vezes, no fazer e desmanchar, a linha enreda-se formando nós. Esses podem ser os nós do nosso currículo integrado.

A metáfora indica que o currículo é essa colcha que vai sendo construída a partir de referências e de leituras, que exigem um cuidado especial, pois quando não é possível desatar os nós, arrebenta-se a linha. É isso que ocorre, no processo de integração curricular. Temos as várias disciplinas, com suas cores e texturas, que precisam formar um todo complexo. Se pensarmos em um todo feito de quadrados, quantos nós a atar e desatar no sentido de integrar essas disciplinas. Daí pensar que o currículo integrado apresenta vários nós, que no decorrer do processo dificultam o trabalho, mas que escondem-se no projeto final, onde diferentes cores, linhas e teceduras mostram que é possível formar um todo harmônico.

Quando me refiro a desatar os nós, como pedagoga do IFF não me proponho trazer essa tecedura pronta, pois esta depende exclusivamente do diálogo e do enfrentamento de cada disciplina, não no sentido de esquecer sua especificidade, mas o de compreendê-la integrada a um todo. Esse todo, que se amplia e se estende não para particularidades, mas para o que cada realidade tem em comum. Esse é o desafio como pesquisadora, propor a reflexão desses nós, como possibilidade de, ao compreendê-los, encontrar caminhos para desatá-los. Nessa perspectiva, o IFF - Campus Santo Augusto constitui o locus de estudo, não como objeto de estudo na pesquisa, mas como indicador nas reflexões já realizadas dentro e sobre ele, dos nós que aqui analiso. Mário Osório Marques nos fala do mundo como contexto do conhecimento, e diz que cada disciplina se constituiu a partir de uma totalidade. No entanto, cada docente percebe o mundo a partir da sua especificidade considerando sua área de atuação.

Há um caminho percorrido, que se instituiu à medida que o IFF- Campus Santo Augusto foi criado. O projeto partiu da comunidade e passou para a federalização como possibilidade de construção e manutenção. Então posso afirmar que enquanto escola ele surge de uma luta comunitária municipal, mas se concretiza como proposta do governo federal. O esperado, a metáfora que aqui utilizo para referenciar os fins e objetivos que embasaram a criação do mesmo, traduz uma política pública de educação que já nasce com uma proposta diferenciada de educação integrada, pensada para um público, mas que se estrutura ainda na perspectiva da organização disciplinar.

(21)

Considero que pensar uma estrutura curricular integrada entre ensino médio e técnico, mas organizá-la e mantê-la disciplinar, pauta-se apenas no que se espera e não no que se propõe concretamente para realizá-la. Assim, o esperado aqui corresponde a um projeto pensado numa perspectiva integradora do conhecimento, na contextualização curricular, na inclusão dos alunos das camadas populares, mas construído no cotidiano. O esperado, portanto, indica uma possibilidade em que os nós parecem estar todos resolvidos e que pelo fato de se instituir sob a égide de uma nova proposta estes não existem.

Parto então, nesse percurso para a observação do realizado. Este se concretiza diante dos pressupostos do esperado e das condições reais que a criação do IF apresentou no decorrer de sua criação. O realizado ultrapassa é claro, a estrutura física, formação do corpo docente e o processo de ensino aprendizagem. Destaco esse fato, porque uma proposição não se sustenta apenas pela legislação ou a constituição de um grupo de docentes. O realizado mostra que esses aspectos e a constante reflexão do como fazer no enfrentamento diário com novos desafios, tem apontado para novas questões.

Essas questões, ou nós desse processo de implantação de um currículo integrado indicam o possível a ser feito. O possível que aqui proponho como sendo a implantação de um currículo integrado na perspectiva da organização curricular disciplinar. Portanto, o percurso metodológico que indica uma reflexão dos nós para a implantação de um currículo integrado, aponta para a construção de um coletivo comum, em que as disciplinas, mantendo cada uma suas especificidades, possam abranger o diálogo como o possível de ser realizado. Percorrer esse caminho, esgota a discussão da impossibilidade do currículo integrado, dada a dificuldade de reorganização estrutural dos IFs, tanto em termos de formação docente, como de organização curricular. Parte para o pressuposto que a integração ocorre na reflexão de quais fins e objetivos os IFs precisam atender, como cada disciplina pode contribuir para a formação integral desses adolescentes, indicando a análise de situações comuns de seu cotidiano relacionadas a um contexto maior.

O possível implica na metáfora do que podemos fazer, considerando todas as possibilidades da especialização, das condições físicas, da autonomia nos projetos curriculares e na grande capacidade que cada docente apresenta em função da formação existente. Michel Young traz em sua produção uma importante análise que promove essa possibilidade.

(22)

2 AS TECEDURAS DO CONTEXTO HISTÓRICO NO DESENVOLVIMENTO DO CURRÍCULO INTEGRADO E OS NÓS

No decorrer da história da escola, na mediação didática dos saberes científicos, em saberes escolares, diversas possibilidades de planejar o ensino têm sido sugeridas. Esses saberes vêm sendo organizados a partir de um modelo linear, ou seja, um conjunto de disciplinas justapostas, na maioria das vezes de forma bastante arbitrária, os quais correspondem a uma lista de conteúdos a serem propostos aos estudantes por séries ou anos de estudo.

Em função das constantes reflexões em torno da educação e da necessidade de redimensionamento das ações docentes e ressignificação dos conteúdos, muito tem se falado nas escolas sobre a constituição do currículo integrado, que otimize as aprendizagens, já que vários conceitos são comuns aos diferentes componentes curriculares. Pretende-se com isso superar a visão fragmentada do conhecimento considerando a imagem abaixo:

Figura 2: Mediação dos saberes

Fonte: SCHNEIDER, 2013.

Nesse sentido, emergem as questões: Como o currículo integrado pode constituir uma proposta capaz de propiciar condições de interação compreensiva dinâmica e relacional das disciplinas escolares de modo a qualificar a formação do educando como cidadão e profissional? O currículo integrado é capaz de promover a inter-relação teórico-prática no processo de formação tornando cada disciplina uma parte do todo que se complementa, integra e contextualiza? Será que permite a

Mediação didática dos saberes científicos em saberes escolares

Como é. Como deveria

ser? Como integrar o currículo na perspectiva das disciplinas? Disciplinar instrumentalista Disciplinar

(23)

elaboração do pensamento reflexivo, tornando a construção do conhecimento algo significativo para o sujeito?

Nesse sentido, pretendo pensar como o currículo integrado vem sendo proposto para articular o ensino médio ao técnico, no sentido de dinamizar o aprendizado e o aproveitamento escolar. Acredito que é necessário promover o diálogo entre a atual proposta de trabalho das escolas, visando a um ensino de excelência.

É importante lembrar que vivemos um momento de crise e transição no campo da educação. A crise do paradigma da ciência moderna atinge as diferentes áreas do conhecimento, perpassa também o discurso e as práticas pedagógicas que constroem e constituem o cotidiano educacional nas escolas. As novas tendências epistemológicas, emergentes no estudo das ciências, afetam a compreensão do conhecimento e do processo ensino e aprendizagem. “A ciência clássica privilegiava a ordem, a estabilidade, ao passo que em todos os níveis de observação reconhecemos agora o papel primordial das flutuações e da instabilidade” (PRIGOGINE, 1996, p.12).

Percebo que as práticas culturais, políticas, econômicas e estéticas vêm sofrendo mudanças rápidas e radicais. Essas mudanças vinculam-se às novas maneiras pelas quais experimentamos o tempo e o espaço. O acelerado processo de encurtamento das distâncias promove a substituição dos deslocamentos humanos pela transferência de arquivos digitais que integram todos num mesmo tempo, mas em espaços diferentes.

Diante desses fatos, a especialização, que até a metade do século XX era usada como forma de conhecimento, agora precisa dar lugar à recomposição do todo, construindo uma relação com o contexto a partir do que o indivíduo sabe sobre o mundo.

Nessa perspectiva, opto por acolher o ponto de vista de Marques (2000), segundo o qual o contexto de todo o conhecimento político, econômico, antropológico e ecológico é o próprio mundo. Esse conhecimento tornou-se uma necessidade ao mesmo tempo intelectual e vital. Trata-se de um problema que se apresenta a todo cidadão: ter acesso às informações sobre o mundo e conseguir articulá-las e organizá-las. Para isso é fundamental um diálogo ecumênico também entre as várias disciplinas científicas. Esse diálogo pode promover a interação e a interpenetração entre elas, indo desde a simples comunicação das ideias até a

(24)

integração mútua dos princípios, conceitos e metodologias. Essa proposição norteia as considerações no desatar dos nós para a implantação do currículo integrado na perspectiva das disciplinas.

Para tal, o autor destaca que se exige muita criatividade, pois lidar com o plural é sempre difícil, requer que as várias partes abdiquem de posições fechadas e passem a se ouvir e a se entender mutuamente. Assim, é preciso que todos busquem, no universo da linguagem, a possibilidade de comunicação, de lidar com o outro e com ele partilhar as suas reflexões.

As escolas, no entanto, principalmente as de Ensino Médio e Técnico, apesar de fundamentarem suas propostas na perspectiva de Marques (2000), estão estruturadas não só a partir de um currículo disciplinar como ainda precisam incorporar as disciplinas técnicas profissionais. Nesse contexto, promover o diálogo como forma de integrar requer primeiramente a construção de espaço que agregue os docentes em torno dessas discussões. Os princípios e conceitos têm permeado algumas tentativas no campo das ideias, sem, no entanto, apresentar uma metodologia. Essa pluralidade de ideias e da própria formação dos docentes impede que estes participem e promovam uma nova configuração para o currículo disciplinar.

Quando Marques (2003) fala do mundo como contexto do conhecimento, traz a ideia de que cada disciplina organizou-se a partir de uma totalidade. No entanto, cada docente percebe o mundo a partir da sua especificidade considerando sua área de atuação.

Outra questão em pauta, quando abordo o currículo integrado, diz respeito à convivência com a complexidade levantada por Morin (2010). O dogma do determinismo universal foi superado. O universo não está mais submetido à soberania da ordem; ele é campo de uma relação dialógica (ao mesmo tempo antagônica, concorrente e complementar) entre a ordem, a desordem e a organização. Esses três elementos estão constantemente em ação e oferecem diferentes caminhos, soluções e recursos para resolver os problemas que se apresentam. Entretanto, assim como o autor, considero que as respostas serão parciais, pois vários elementos mutáveis estarão envolvidos nas soluções encontradas.

(25)

Nessa perspectiva, é fundamental que as disciplinas possam interagir e encontrar formas de estabelecer essa relação dialógica na qual possam ser consideradas as relações pessoais entre os estudantes e professores. Isso pode parecer pouco importante, dada a superespecialização a que todos estão submetidos no mundo do trabalho. No entanto, é preciso pensar esse fato na perspectiva daquele que começa a aprender. Na tentativa de explicitar essa realidade, podemos pensar em um quebra-cabeça, o qual só passa a adquirir sentido quando se vê a imagem em sua totalidade. Da mesma forma, os alunos recebem todos os anos novas peças (disciplinas) sem que a figura da realidade da qual essas peças fazem parte lhes seja mostrada, dando como certo que serão úteis por si sós.

A incerteza, nessa perspectiva, pauta também os discursos dos docentes que percebem essa nova dinâmica do conhecimento, e, muitas vezes, em função de formação em níveis de mestrado e doutorado, têm a compreensão dessa totalidade. No entanto, a compreensão não referencia a prática, quando ainda estA se constitui e pensa como peça desse quebra-cabeça olhando para todas as demais peças soltas. O docente busca encaixar-se com as peças ao lado ou mais próximas de sua área de conhecimento, ou por série a partir de temas.

(26)

Figura 3: Reconhecimento das disciplinas isoladas como lugar de relação do currículo integrado

(27)

Figura 4: As áreas como fatores de integração, diálogo e articulação de saberes na perspectiva da formação cidadã

Fonte: SCHNEIDER, 2013.

Considerando essa organização que tem se constituído como um exemplo na maioria das escolas, cada uma das disciplinas busca vincular conteúdos em torno de um tema e relacioná-los, sem, no entanto, promover um diálogo entre eles no sentido de formar um todo que se relaciona. A consequência de tudo isso é algo que todo profissional do ensino conhece muito bem, como expresso no quadro abaixo:

(28)

Figura 5: Problemas decorrentes da escola organizada em torno de saberes disciplinares

PROBLEMAS DECORRENTES DA ESCOLA ORGANIZADA EM TORNO DE SABERES DISCIPLINARES

- não tem conseguido tornar as aprendizagens funcionais - não se constitui como relevante para nossos alunos

- saberes oferecem apenas uma visão fracionada de uma realidade que é global e complexa - dificuldades de aprendizagem decorrentes da constante mudança de enfoque de uma matéria para outra, tanto pela falta de nexo entre as disciplinas como pelo decorrente esforço de memorização que tal fato acarreta

- incapacidade de ajustar ao currículo questões práticas, interdisciplinares, atuais e vitais - inflexibilidade de organização do tempo, espaço e recursos humanos para viabilizar visitas, excursões, experiências diferenciadas, tanto no recinto escolar, quanto fora dele

- garantir pesquisa, estudo autônomo, atividades críticas e curiosidade intelectual, aos professores como pesquisadores capazes de diagnosticar, propor e avaliar projetos e currículos

Fonte: Santomé (1998, p. 110-111).

Não quero desconsiderar o saber disciplinar, nem mesmo sua organização em torno de temas. É importante destacar que essa tem sido a forma como as escolas têm tentado se organizar com a intenção de atender às demandas de um novo currículo. No entanto, tanto os temas como os conteúdos, muitas vezes “sugados” do tema, não garantem a sua funcionalidade. Além disso, o conteúdo continua preso a sua especificidade disciplinar sem apresentar o tema em sua totalidade, em seu significado no contexto. As relações são de conteúdo e tema, apresentando na culminância um quebra-cabeça, em que peças se encaixam para formar o todo, mas não interagem entre si.

O que sugere um currículo integrado na perspectiva das disciplinas parece indicar, ao invés de um organograma, uma espiral em que interagem as disciplinas entre si, com o tema e com os conteúdos, criando um todo dinâmico de metodologias, princípios e conteúdos.

Sacristan (1995) considera que é vital a inovação do referencial teórico e a mudança de paradigma, o que implica um movimento de superação da fragmentação e reprodução curricular. Nesta perspectiva, afirma que a escola não pode ser confundida com a sua natureza educativa, ou com o espaço físico que ocupa, ou com sua equipe diretiva, professores e funcionários, bem como, não pode ser resumida apenas ao seu projeto pedagógico. Entendo, como o autor, que por

(29)

mais brilhante que tenha sido o seu passado, a escola não pode ser confundida ainda com a sua história. Quero dizer com isso que nenhuma das funções da escola pode ser considerada de forma isolada, pois, se assim o fizermos, o movimento de fragmentação, que envolve os processos de organização, não dará espaço para um currículo integrado. No entanto, esse pressuposto não é suficiente para mudar e superar as práticas de fragmentação.

É possível observar que os professores, ao refletirem sobre a prática escolar e traçar metas para o trabalho pedagógico, reconhecem que este precisa estar voltado para a formação da cidadania e da integração curricular, no entanto, apesar de tentativas, a partir de temas geradores entre outros, o planejamento ainda estabelece objetivos para cada disciplina, desconsiderando a importância crucial do contexto e da integração curricular para a construção de conceitos e suas significações, e das devidas conexões entre as áreas de estudo e a vida.

Libâneo (2004, p. 13), ao refletir sobre esses aspectos, destaca que:

A organização é um espaço de aprendizagem profissional, na medida em que os professores participam ativamente da organização do trabalho escolar, formando com os demais colegas uma equipe de trabalho, aprendendo novos saberes e competências, assim como um modo de agir coletivo, em favor da formação dos alunos.

Contudo, observo que os professores, quando realizam a prática propriamente dita, desenvolvem um ensino ainda centrado em instruções para o desenvolvimento de procedimentos e técnicas. Essa condição difere de uma proposta voltada à elaboração própria, à pesquisa, investigação, argumentação coerente, formulação de hipóteses, interpretação e testagem de resultados, habilidades tão necessárias à inserção de qualquer indivíduo no mundo do trabalho, no universo cultural e no espaço das relações sociais.

2.1 A ponta do fio

Não julgo possível a mudança dos currículos na perspectiva da integração curricular se não houver, por parte de todos os envolvidos nesse processo, a compreensão das mudanças que perpassam o conceito de conhecimento. Esse conjunto de ideias encontra sustentação em Santos (2010), quando enfatiza que a mudança na educação requer a compreensão do novo conceito de conhecimento,

(30)

que se estabelece não mais como algo estático, universal e imutável, adquirível mediante a memorização, mas sim como algo dinâmico e provisório. O conhecimento nunca é definitivo.

Logo, um currículo integrado que perceba o homem em sua totalidade deverá permitir a implantação de um modelo econômico, social e político que, a partir de uma nova distribuição dos bens e serviços, conduza à realização de uma vida coletiva solidária, passando da escala do lugar à do planeta, assegure uma reforma do mundo, por intermédio de outra maneira de realizar a globalização.

Neste caso, teríamos que considerar esse desafio como também um nó à proposta de currículo integrado, mas que pode ser pensado na perspectiva que o próprio autor apresenta: entender a concepção que orienta as práticas escolares, bem como perceber a possibilidade de uma nova mediação, em uma estrutura que se encontra ainda organizada de forma fragmentada, sem diálogo entre as disciplinas em termos de produção de saberes e sujeita a uma globalização perversa. Para tanto, foi realizada uma pesquisa que se constitui em uma análise textual discursiva, a qual possibilitou a identificação das fundamentações teóricas dos documentos. Ou seja, uma pesquisa documental no diálogo com a literatura. De acordo com Moraes e Galiazzi (2006, p. 118), a análise textual discursiva é descrita como um

[...] processo que se inicia com uma unitarização em que os textos são separados por unidades de significado. Estas unidades podem gerar outros conjuntos de unidades oriundas da interlocução empírica, da interlocução teórica e das interpretações do pesquisador.

Isso significa que o texto traz a leitura de autores que propõem o currículo integrado, bem como as considerações em torno dessa proposta a partir de um contexto que se apresenta. Como esse contexto é amplo, a pesquisa delimita-se a partir da análise de alguns elementos, aqui entendidos como principais nós ao desenvolvimento de um currículo integrado disciplinar.

Por isso, para constituir o currículo integrado, pressuponho a compreensão de currículo, currículo integrado e integração curricular, além da definição do grau de ensino em que será desenvolvida a proposta de integração.

Identificar os nós que atravessam o desenvolvimento de um currículo integrado no ensino médio e técnico consiste em discutir conceitos que perpassam e

(31)

constroem a sua identidade. Diante desse fato, neste capítulo não tenho a pretensão de desatar esses nós, mas trazê-los para o contexto da discussão, identificando a rede de relações entre o conceito de currículo, a conjuntura política, a legislação e os saberes docentes. Isto por que considero que todos esses aspectos trazem em sua concepção premissas que não têm sido consideradas na implantação de um currículo integrado. É necessário, nesse sentido, pensar quais são os saberes escolares e cotidianos que serão integrados.

Figura 6: A ponta do fio

Fonte: SCHNEIDER, 2013.

2.2 A fiação do Currículo, currículo integrado, integração curricular das disciplinas

O quadro abaixo sintetiza alguns dos conceitos que nortearão as discussões no referencial teórico.

(32)

Figura 7: Opções de currículo vigentes atualmente

CURRÍCULO CURRÍCULO

INTEGRADO

INTEGRAÇÃO CURRICULAR

Lopes e Macedo: novos sentidos para o termo

Sacristan: currículo são processos de natureza...

Dewey-Tyler: a construção curricular é um processo do qual professores, alunos devem participar... mas há um nível de decisão curricular anterior...

Lopes e Macedo: maior integração dos saberes escolares com os saberes cotidianos dos alunos, de maneira a combater a visão hierárquica e dogmática do conhecimento. - currículo global - metodologia de projetos - currículo interdisciplinar currículo transversal

Cada uma dessas indica uma forma de integrar: Integração pelas competências e habilidades; Integração de conceitos das disciplinas mantendo a lógica dos saberes disciplinares; Integração via interesse dos alunos, buscando referência nas demandas sociais

Marques: concepção dinâmica em que o conhecimento é visto como produção histórica...

James Beane e Michael Young : atualizam as concepções de Dewey – concepção de formar para uma sociedade democrática.

Fonte: SCHNEIDER, 2013.

Para identificar a concepção de currículo vigente, é fundamental analisar os referenciais com o objetivo de refletir sobre a trajetória e o processo de fragmentação, suas consequências e formas de superação via currículo integrado. Penso que, para compreender as condições atuais do currículo, é necessário explicitar as relações históricas do mesmo com o mundo do trabalho.

Nesse sentido, Santomé (1998) destaca que, no início do século passado, ocorreu uma revolução no funcionamento dos sistemas de produção e distribuição no âmbito empresarial que gerou processos de maior acumulação de capital e de meios de produção nas mãos de poucos, com o barateamento da mão-de-obra e desapropriação dos conhecimentos acumulados pelos trabalhadores. Esta desapropriação os impediu de ter domínio dos processos de produção em operações elementares, simples e automáticas. A garantia para a validação dessa ordem ocorreu pela proposição de medidas científicas de controle, implantando uma modalidade de gestão e produção empresarial que evitava a participação dos trabalhadores nas tomadas de decisão.

(33)

Diante do tema em análise, destaco que essa política de fragmentação dos empregos, da produção e do conhecimento retirou dos trabalhadores a compreensão do processo realizado por eles, colocando nas mãos dos empresários todo o controle da produção e da comercialização.

A ideia de formação integrada sugere a superação desse processo fragmentador do conhecimento humano, que desconsidera a sua totalidade. Para tanto, a premissa que orienta este estudo insere-se na proposição de Santomé (1998) quando diz que o currículo precisa estar imbuído de uma utilidade social, que permita a compreensão da sociedade em que vivemos, favorecendo o desenvolvimento de aptidões, tanto técnicas como sociais, que ajudem a situar-nos na comunidade de forma autônoma, crítica e solidária. Isto por que também não julgo possível a realização de um currículo sem essas características: conteúdos relevantes e objeto de atenção em várias áreas do conhecimento; hábitos intelectuais de levar em consideração diferentes possibilidades e pontos de vista; trabalho colegiado das escolas, resgatando a ideia de “corpo docente”; preparação para mobilidade profissional futura; a análise de problemas concretos e reais e o consequente surgimento de pessoas criativas e inovadoras.

Assim, defendo a necessidade de implementação de um currículo capaz de atender às proposições das políticas educacionais que emergem como possibilidade de melhoria para o ensino médio e técnico, pensando estratégias de definição e articulação de políticas, ações e papéis do Estado, da escola e da sala de aula. Isso requer que os processos de planejamento e gestão do projeto curricular das escolas de ensino médio e técnico integrem conhecimento e reflexão sobre a realidade, a teoria e a transposição desses elementos, no sentido de orientar a prática pedagógica que efetive uma intencionalidade educativa.

(34)

A reflexão sobre os significados e as concepções que transitam no campo de estudo do currículo ainda instiga a busca por um conceito. É necessário esclarecer que a minha opção relacionada ao termo currículo indica que não o concebo simplesmente como um conjunto de disciplinas ou o detalhamento de seus conteúdos, nem como simples relação de objetivos, atividades de ensino aprendizagem ou da grade curricular. Minha acepção indica que currículo não é só isso, é tudo isso em interação com os sujeitos sociais e históricos que nele projetam seus anseios e interesses e lhe dão vida e significado. Essa posição, no entanto, apresenta uma amplitude com um grau de abstração que nem sempre traduz nossas práticas, ou vice-versa, nossas práticas não conseguem traduzir esse conceito. Esse processo de indefinição do termo currículo é passível de compreensão à medida que observamos a trajetória do mesmo.

Lopes e Macedo (2011) afirmam que não é possível conceituar o que é currículo, porque, desde o final do século XIX, os estudos o definem de diferentes maneiras. Assim, além dos guias curriculares propostos pelas redes de ensino, o currículo tem significado tudo que acontece em sala de aula, grade curricular com disciplinas, cargas horárias, ementas, planos de ensino até as experiências que são propostas e vivenciadas pelos alunos. Comum entre essas concepções está a ideia de organização, prévia ou não, de todos os processos de ensino e aprendizagem que acontecem na escola e que têm um fim educativo.

Com base nas considerações aqui apresentadas, acredito que não seja possível aprisionar um processo dinâmico e em movimento, como é o currículo, em uma única definição, corroborando com a premissa de Lopes e Macedo (2011, p. 19) de que: “não é possível responder o que é currículo apontando para algo que lhe é intrinsicamente característico, mas apenas para acordos sobre os sentidos de tal termo, sempre parciais e localizados historicamente”. Isso significa que toda nova definição de currículo parte sempre de um argumento mais amplo no qual a própria definição se insere e se posiciona, visto que se mostra radicalmente contra, demonstrando suas insuficiências, ou mantém-se na mesma direção teórica, o que, para Lopes e Macedo (2011, p. 20) indica que esse movimento “de novos sentidos para o termo currículo, sempre remete a sentidos prévios para de alguma forma negá-los ou reconfigurá-los”.

Diante disso, acredito que não podemos simplificar e assim empobrecer a riqueza de análise desse campo de estudo. A proposição de definir currículo implica

(35)

descrever as funções da escola e com isso adotar uma forma particular de enfocá-las em um momento histórico-social determinado.

Diante dessa perspectiva, os Institutos Federais precisam explicitar as condições em que foram criados considerando suas funções no atual momento histórico-social. Nesse sentido, destaco o que diz Saviani (2005, p. 2): “currículo diz respeito à seleção, à sequenciação e à dosagem de conteúdos da cultura a serem desenvolvidos em situações de ensino-aprendizagem”, considerando, portanto, que a história do currículo tem se confundido com a da própria escola. Desse modo, reafirmando a complexidade do termo, apresento alguns dos sentidos que têm embasado a trajetória do currículo, buscando contextualizá-lo em seus momentos histórico-sociais.

Lopes e Macedo (2011) apontam para a necessidade da seleção e organização do que vale a pena ensinar, considerando que currículo envolve planejamento. É sabido que o artigo 14 da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que trata da Gestão democrática, popularizou os Projetos Políticos-pedagógicos nas escolas (BRASIL, 1996). No entanto, isso tem representado muitos equívocos, distorções, confusões que não colaboram para uma ação mais eficaz da escola. Apesar do Projeto Político-pedagógico remeter muitas vezes ao currículo escolar, não há clareza no que se refere a essa temática, nem tampouco do que é importante ensinar. A trajetória histórica do currículo mostra que nossas propostas se inspiram em abordagens de cada momento, sobre o que era necessário ensinar.

Com base nessa trajetória, Lopes e Macedo (2011) descrevem que, na segunda metade do século XIX, o ensino tradicional jesuítico tinha como princípios que as especificidades próprias de cada um é que promoviam o desenvolvimento de certas faculdades da mente. Nesse sentido, defendiam que algumas disciplinas facilitavam o raciocínio lógico e ampliavam a memória. Contudo, com o início da industrialização e o movimento da Escola Nova no Brasil, observa-se cada vez mais a necessidade de decidir o que ensinar, o que para muitos autores indica o início dos estudos curriculares. Pautada nas demandas da industrialização, a escola recebe novas incumbências, entre elas a solução dos problemas sociais gerados pelas mudanças econômicas, indicando que “correspondendo ou não a campos instituídos do saber, os conteúdos aprendidos ou as experiências vividas na escola precisam ser úteis” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 22).

(36)

Penso que definir o que é útil, como ordenar temporalmente e por onde começar, constitui o primeiro nó do currículo e o de maior importância, pois é um desafio que se perpetua nas discussões teóricas, mas que não tem apresentado significativos resultados na prática. A proposição de integrar os saberes científicos às experiências empíricas dos alunos como saberes escolares úteis percorre a compreensão e as possibilidades que a escola tem, considerando que esse diálogo se dá no campo das políticas públicas, instituídas por um momento histórico, que pode ou não considerar as necessidades dos sujeitos que ela forma.

A definição dos conteúdos e sua utilidade, na maioria das vezes, estão centradas nos saberes científicos instituídos por cada disciplina. Já os saberes da experiência trazem em si as condições e as vivências culturais, sociais e econômicas de cada sujeito. A escola é um espaço em que essas interações acontecem de forma diferenciada, em níveis e situações divergentes, que se traduzem na própria forma de priorizar uma disciplina sobre a outra. Passa desde a carga horária de cada disciplina. Quando se organiza um currículo com maior ou menor número de aulas, desta ou daquela disciplina, já estamos fazendo uma opção pela importância ou utilidade de determinados conhecimentos sobre outros. Integrá-los entre si e com as experiências, ou necessidades dos alunos requer um diálogo que ultrapasse o instituído pela legislação e pela escola. Esta visão também é compartilhada por Sacristan (1995) quando afirma que:

A educação, o ensino e o currículo são processos de natureza social que permitem ser orientados por ideias e intenções, mas que não podem ser totalmente previstos antes de sua realização. Portanto, desde sua posição epistemológica inicial qualquer proposta é aberta, flexível por necessidade porque não determina nunca totalmente a prática (SACRISTÁN, 1995, p. 236).

O autor enfatiza com essa definição a dificuldade de responder às questões que têm permeado o surgimento das teorias no campo do currículo. No entanto, todas têm algo em comum, de que o currículo diz respeito ao processo educativo e, portanto, ao planejamento no âmbito das políticas da escola e da sala de aula (SACRISTAN, 1995).

Considero que no âmbito das políticas há uma clareza maior em relação ao que é currículo e a que ele deve atender. A legislação, embora controversa em alguns momentos, corrobora essa explicitação. No entanto, no âmbito das escolas e

(37)

da sala de aula, estamos longe de chegar a uma proposta coerente com os princípios de um currículo integrado. Como destaquei, é fundamental que as escolas compreendam o que é currículo, a que ele se propõe, trazendo para o âmbito das discussões essas teorias, com vistas a conquistar a autoria de ações efetivas na prática pedagógica.

Nesse sentido, os dois movimentos surgidos nos EUA: o eficientismo social e o progressivismo, trazido para o Brasil pela Escola Nova. O eficientismo é considerado um movimento com várias nuanças, mas que se resumem na defesa de um currículo científico, explicitamente associado à administração escolar e baseado em conceitos como eficácia, eficiência e economia. Sendo assim, o eficientismo tem como objetivo racionalizar o processo de construção, desenvolvimento e testagem do Currículo. Quando Lopes e Macedo (2011) se referem a essa corrente, fica clara a relação da mesma com a preparação do aluno para a vida adulta economicamente ativa. Nessa proposição, destacam-se os estudos de Bobbitt (1918 apud SILVA 2005), o qual propõe o currículo a partir de dois conjuntos de atividades que deveriam ser consideradas pela escola: o currículo direto e as de experiências indiretas.

Sob esse ponto de vista, o responsável pela elaboração do currículo deveria organizar as “grandes áreas da atividade humana, que se encontram na sociedade e subdividi-las em atividades menores – os objetivos do curso” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 22). Como essa não era uma tarefa simples, houve a necessidade de reunir especialistas em um fórum democrático, objetivando identificar “as tarefas desejáveis e por seu agrupamento em categorias”. Destaco a importância desses pressupostos para o ensino vocacional, que, na visão das autoras, se tornou o mais influente princípio curricular da primeira metade do século passado, com fragmentos até hoje visíveis na prática curricular.

Nessa perspectiva, evidencia-se para as autoras que o eficientismo social não propunha conteúdo nem a discussão sobre a importância de uma disciplina para a formação dos alunos. Isto por que, para os eficientistas, centralidade está nas tarefas e nos objetivos que estruturam o currículo. Seguido a isso, ocorre o “programa de treinamento a partir de objetivos selecionados por seu valor funcional, sua capacidade de resolver problemas práticos” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 22).

Contrapondo as ideias do eficientismo, surge o progressivismo, que, apesar de apresentar mecanismos de “controle social menos coercitivos”, também percebe

(38)

a educação como possibilidade de diminuir as desigualdades sociais geradas pela sociedade. Sob este ponto de vista, reconhecem em níveis diferenciados, dependendo dos autores:

Que a distribuição desigual do poder na sociedade não é um fenômeno natural, mas uma construção social passível de mudança pela ação humana. A educação poderia, portanto, ser um instrumento para formar indivíduos capazes de atuar na busca dessas mudanças (LOPES; MACEDO, 2011, p. 23).

Ligado à burguesia e às classes médias, o nome mais conhecido do progressivismo é o de John Dewey. Os princípios da elaboração curricular residem nos conceitos de inteligência social e mudança, cujo foco é a experiência direta da criança como forma de superar a lacuna que parece existir entre a escola e o interesse dos alunos. A aprendizagem não é uma preparação para a vida, mas um processo contínuo, que requer uma organização curricular com foco na resolução de problemas sociais, o que implica um ambiente escolar organizado.

O foco central do currículo para Dewey está na resolução de problemas sociais. Isso significa que o ambiente escolar é organizado de modo que os problemas presentes na sociedade possam ser resolvidos em sala de aula, a partir de situações em que a criança possa adquirir habilidades e estimular sua criatividade de forma democrática e cooperativa. O currículo compreende três núcleos: as ocupações sociais, os estudos naturais e a língua. Os conteúdos assuntos que se relacionam a problemas de saúde, cidadania e meios de comunicação deixam de ser o foco de formulação curricular, tornando-se uma fonte através da qual os alunos podem resolver os problemas que o social lhes coloca (LOPES; MACEDO, 2011, p. 23).

Assim, as ideias de Jonh Dewey, trazidas pelas autoras, culminam com o que conhecemos como Pedagogia Nova, uma corrente que dá ênfase aos métodos ativos de ensino e aprendizagem, ao interesse do educando, trabalhos em grupo, atividades manuais, considerando a criança como centro do processo educacional.

Os princípios de Dewey estão na base das reformas educacionais ocorridas a partir de 1920, em alguns estados do Brasil, levadas a cabo por educadores conhecidos como escolanovistas, e que se perpetuam até hoje na organização curricular. A sua contribuição mais significativa para o desenvolvimento do currículo está na proposição de valorizar a capacidade de pensar dos alunos, de prepará-los para questionar a realidade, unir teoria e prática, de problematizar, ou seja, da atividade prática e a democracia constituírem-se como importantes ingredientes da

Referências

Documentos relacionados

ADMINISTRADOR, de plena diligência e da boa prática de gestão de fundos de investimento em títulos e valores mobiliários, e de estrita observância da política de

c) Atividades de enriquecimento curricular no 1.º ciclo do ensino básico; d) Gestão do parque escolar nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico; e) Ação social escolar nos 2.º

Na seleção profissional, o teste palográfico é valioso pelos dados que oferece, quer na qualidade do trabalho, quer na medida da atividade laooral do candidato,

Por meio de uma pesquisa documental nos 47 artigos sobre o tema apresentados em todas as edições do CBC, os resultados revelam que: a maioria dos trabalhos

Se optar pela Retirada na Bilheteria e em pontos de retirada credenciados, o fã poderá retirar seus ingressos antecipadamente nos pontos de venda listados no

Como forma de atenuar esse problema, para determinar os custos dos produtos fabricados podem ser empregados métodos de custeio como o Custeio Baseado em

Você deve assinalar a última opção: (x) The one-year balance carried out by the Ministry shows that the campaign has managed to avoid the use of about 800 million plastic bags

Caso você julgue não ter elementos para avaliar a assertiva, assinale a opção não sei responder: A instituição oferece oportunidades para os