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Projovem Campo Saberes da Terra: promovendo Educação do Campo ou Educação no Campo?

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Academic year: 2021

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Projovem Campo Saberes da Terra: promovendo Educação do Campo ou Educação no Campo?

Projovem Campo Saberes da Terra: promoting education field or education in the field ?

LIMA, Viviane Cristina Silva; SILVA, Vagner Viana2; SOUZA, Camila Guimarães de3.

1Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ, ufrrj49@yahoo.com.br; 2Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, Valença, RJ, silvaufrrj@gmail.com; 3Fundação Dom André Arcoverde, Valença, RJ, milarural@yahoo.com.br

Resumo: O Projovem Campo Saberes da Terra é um programa do Governo Federal, administrado pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, que visa oferecer escolarização para jovens de 18 a 29 anos. O programa adota a Pedagogia da Alternância e a pesquisa e o trabalho como princípios formativos. O objetivo do relato é descrever a experiência dos minicursos, palestras e oficinas realizadas em três módulos de formação do Projovem Campo – Saberes da Terra. Conclui-se que as políticas públicas voltadas para Educação do Campo devem mobilizar agentes quase identifiquem com a proposta, do contrário ocorrerá uma reprodução dos moldes da cidade no meio rural, caracterizando a Educação no Campo, que continua a não valorizar os atores locais, nem tão pouco sua cultura, seu capital territorial, sua identidade.

Palavras-chave: saber popular, formação continuada, empoderamento.

Abstract: The Projovem Earth Knowledge Field is a Federal Government program , administered by the Department of Continuing Education, Literacy , Diversity and Inclusion , which aims to provide education for young people 18-29 years. The program adopts the Pedagogy of Alternation and research and work as formative principles . The aim of the report is to describe the experience of short courses , lectures and workshops in three Projovem field training modules - Knowledge of the Earth. It concludes that public policies for Rural Education must mobilize agents almost identify with the proposal , otherwise there will be a reproduction of the town of mold in the countryside , featuring education in the field , which is still not adding value to local actors , or so little its culture, its territorial capital, its identity

Keywords: popular knowledge, continuing education , empowerment

Contexto

A proposta metodológica das Escolas Famílias Agrícola está apoiada na iniciativa francesa de aliar à profissionalização a permanência do jovem no meio rural. O movimento teve início em 1935 com as Maisons Familiales Rurales, mas se expandiu progressivamente por todos os continentes. Na Itália a experiência foi batizada de Escola Família Agrícola.

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Inicialmente a proposta francesa era de que o estudante ficasse uma semana sob a responsabilidade da escola e três semanas com a família. Atualmente, a organização das sessões escolares e sessões no meio sócio profissional variam de acordo com realidade de cada comunidade.

No Brasil a primeira escola foi fundada no final da década de 1960, no município de Anchieta, Espírito Santo, estado pioneiro na América Latina. As EFAs são, em muitas regiões, a única alternativa de escolarização e profissionalização no interior do país, contudo em virtude da carência de políticas públicas voltadas para a permanência do jovem no meio rural muitos deles têm migrado para os grandes centros urbanos em busca de emprego.

Os estudos de Calazans (1993) ressaltam que, historicamente, a implementação de projetos educacionais para o campo esteve sucessivamente conectados a projetos de desenvolvimento econômico, que objetivavam o fortalecimento do capital econômico, evidenciando o interesse do Estado em alavancar à economia e, não a condição social campesina.

No entanto, após um período de relativa imobilidade da sociedade civil, devido ao poder repressivo imposto pelo Estado, começaram a surgir movimentos sociais, cujo princípio era dissolver as práticas autoritárias e estabelecer uma nova ordem social mais igualitária, norteada pela legalidade e legitimidade. Bem como uma educação que, verdadeiramente, atendesse as necessidades dos estudantes. Assim, no que tange a Educação do Campo há uma demanda pela promoção de uma educação que valorize os saberes das comunidades tradicionais, que contemple todas as dimensões para o desenvolvimento humano e a formação cidadã urge no cenário brasileiro, muito embora nos últimos anos as escolas rurais tenham sido fechadas. Os estudantes são matriculados em escolas na cidade, onde o contexto sócio histórico é completamente diferente da zona rural. Por isto, a reivindicação dos movimentos sociais pelo reconhecimento da importância da promoção de uma educação do/no campo para os camponeses. Pensando sobre a magnitude das discussões a respeito da Educação do Campo e suas ferramentas didático-pedagógicas e do papel do educador na (re)construção dos saberes é que foram construídas as formações do Projovem Campo – Saberes da Terra do Estado do Rio de Janeiro, ocorridas na Universidade Estadual do Norte Fluminense – Campos dos Goytacazes (RJ).

Descrição da Experiência

A experiência na formação do Projovem Campo – Saberes da Terra do RJ se deu em três momentos distintos. O primeiro contato com os professores em formação foi em 2013, quando ministramos a oficina Utilizando os Mecanismos de Registro da

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Pedagogia da Alternância. Posteriormente, nos encontramos em mais duas oportunidades. Em fevereiro de 2014, quando ministramos a palestra Pedagogia da Alternância e o minicurso Pedagogia da Alternância e Atividade de Campo e, por fim, no encerramento das formações onde tivemos a oportunidade de falar sobre a importância da avaliação e a utilização da matriz FOFA (fraquezas, as oportunidades, as fortalezas) como metodologia. No sentido de organizar as ideais e suavizar a leitura descreveremos as experiências dos módulos em tópicos diferentes.

A oficina Utilizando os Mecanismos de Registro da Pedagogia da Alternância

A Pedagogia da Alternância (PA) se caracteriza “por uma formação com períodos alternados de vivência e estudos na escola e na família e/ou meio sócio-profissional, onde o estudante é acompanhado pelos monitores, pais e membros da comunidade” (LIMA, 2012, p. 11). O objetivo da oficina foi operacionalizar e institucionalizar os instrumentos pedagógicos da Pedagogia da Alternância no dia a dia das atividades escolares. A oficina foi dividida em duas etapas. Na primeira, houve uma explanação a respeito da definição e importância de cada instrumento pedagógico e como registrar as atividades no diário de classe. Os instrumentos pedagógicos abordados na oficina foram: (1) Plano de Estudos e Folha de Observação; (2) Colocação em Comum (3) Caderno da Realidade; (4) Visitas e viagens de estudo; (5) Intervenção externa; (6) Atividade de Retorno; (7) Estágios; (8) Visitas as Famílias; (9) Práticas Agropecuárias; (10) Serões e (11) Avaliações.

O Plano de Estudos (PE) é a ferramenta pedagógica mais importante da PA. É ele que dita os rumos de todos os outros instrumentos. “O Plano de Estudos consiste num roteiro de perguntas formulado pelos estudantes, sobre temas pré-definidos, e que será aplicado na comunidade, a fim de trazer o ‘saber popular, empírico’ para ser trabalhado no ambiente escolar.” (LIMA, 2012, p. 12).

No PE são avaliados quatro momentos. O primeiro é a motivação, que consiste na apresentação do tema e discussão com os estudantes sobre o que eles sabem a respeito a partir das suas experiências na comunidade. Nesta etapa os estudantes se organizam em grupos e preparam apresentações artísticas como teatro, paródia, poesia e outras e; apresenta para os colegas e monitores. O segundo momento é a pesquisa feita na comunidade. O estudante leva para casa uma Folha de Observação que consiste nas seguintes partes: Chapéu (introdução), Roteiro de Observação (itens a serem observados pelo estudante na propriedade onde será realizada a pesquisa); Roteiro de Perguntas e Assinatura do Entrevistado. Posteriormente, as respostas são compiladas numa redação.

A terceira etapa de avaliação do PE é a Colocação em Comum que consiste na socialização das respostas dos estudantes. Esse momento é muito importante para que os estudantes conheçam outras realidades. Após essa etapa, os estudantes dividem-se em grupos por comunidade e constroem uma única redação, agregando as respostas de todos os integrantes do grupo. Na sequência, cada grupo lê a

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redação para os demais. E a Colocação em Comum termina com a Síntese Geral, que consiste em uma única redação com as respostas de todos os estudantes. O monitor escolhe um representante de cada grupo por comunidade para compilar as redações em uma só. A última etapa de avaliação do PE é a Noite Artística, onde os estudantes apresentam teatro, música, poesia e outros, sobre o que aprenderam com o Plano de Estudos. É uma espécie de sarau.

O Caderno da Realidade “consiste em uma pasta (tipo arquivo) onde os estudantes guardam os Planos de Estudos que foram aplicados no decorrer do ano letivo, os relatórios de visitas e viagens de estudo e mais os relatórios das intervenções externas e atividades de retorno” (LIMA, 2012, p. 13).

De acordo com Caliari (2002, p. 20), o Caderno da Realidade representa os seguintes aspectos didáticos:

“a) uma tomada de consciência e uma particular concepção da vida cotidiana do aluno; b) ajuda a desenvolver a formação geral porque ali retrata a história do meio familiar, da localidade de moradia, da terra que trabalha (...) da vida profissional e social; c) representa um dos elementos de orientação profissional, porque as reflexões são frutos do trabalho do jovem e da vida profissional e social da família.”

As Visitas e Viagens de Estudo é o momento aprofundar o Plano de Estudos, conhecendo outras realidades, que pode ser realizada na comunidade de algum estudante ou em outro lugar como Cooperativas, Parques, Universidades, dentre outros. Estas atividades geram relatórios que devem compor o Caderno da Realidade.

Segundo Lima (2012, p.13) a Intervenção Externa é um: instrumento pedagógico que “objetiva estreitar laços entre a escola e a comunidade, bem como para promover a interação entre os conteúdos aprendidos na escola com os saberes de outros atores envolvidos nos processos formativos da Pedagogia da Alternância.” Após as discussões dos conteúdos em sala de aula e das visitas e viagens de estudos, a equipe de monitores pode convidar associações, líderes comunitários e outras entidades a ministrar palestras que explorem assuntos pertinentes ao Plano de Estudo, mas que não foram esgotados nos outros instrumentos pedagógicos. A Atividade de Retorno é uma forma de transferência dos conhecimentos construídos na escola para a comunidade. Ou seja, o estudante promove em sua comunidade uma atividade relativa ao que aprendeu na escola com o PE, podendo ser temas referentes a atividades agropecuárias, de saúde e higiene, de resgate das tradições culturais, dentre outros.

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O Estágio “enquanto ferramenta pedagógica funciona como extensão tecnológica da EFA, onde os estudantes expandem seus conhecimentos além das fronteiras da escola” (MONTEIRO et al., 2000). Bem como aprende outros novos e socializa na escola.

As Visitas ás Famílias “é um instrumento que tem por objetivo compartilhar as responsabilidades da formação do jovem com a família” (LIMA, 2012, p. 16). Também é um bom momento para os monitores conhecerem a realidade do estudante. Já as Práticas Agropecuárias é a operacionalização dos conhecimentos construídos em sala de aula e dos saberes populares, podendo ser realizada tanto na escola quanto em outra propriedade para fins didáticos.

O Serão pode ser definido como uma extensão lúdica dos conteúdos. De acordo com Lima (2012, p. 15) o serão “é uma ferramenta complementar a aprendizagem. Filmes, saraus, lual, roda de viola, fogueira, gincanas, palestras, e festividades para comemorar datas importantes como: dia das mães, dia do meio ambiente”, por exemplo. E por fim, a Avaliação. Em todos os espaços e em todos os momentos do dia a dia na escola são avaliados.

É importante destacar que os temas geradores nas EFAs proveem de uma demanda das famílias. No entanto, eles precisam dialogar com os conteúdos sugeridos pela matriz curricular do Ministério da Educação para cada nível escolar.

O monitor/professor deve seguir as indicações dos conteúdos do MEC, mas dando ênfase e aprofundando os temas que são demandados pelo Plano de Estudo, atendendo, tanto as necessidades das comunidades quanto a matriz curricular nacional. Com a prática essa transposição é mais facilmente operacionalizada pelos educadores.

Na segunda etapa da oficina com os professores em formação do Projovem Campo – Saberes da Terra do RJ foi proposto que eles simulassem a aplicação do Plano de Estudos em uma turma. Ou seja, os educadores tiveram que formularem um Plano de Estudos e realizarem todas as suas etapas e, propor atividades que dialogassem com os temas geradores.

Outra atividade desenvolvida nesta etapa foi à construção de um Mapa Conceitual. Este Mapa surge das perguntas feitas, pelos estudantes, na Colocação em Comum e norteará o caminho a ser seguido pelos conteúdos. A partir dele os monitores saberão os questionamentos a serem respondidos/trabalhados em sala de aula e no meio sócio profissional, servindo, desta forma, de elo entre o conteúdo vivencial e o conteúdo sequencial. O Mapa Conceitual serve, ainda, como ferramental para a interdisciplinaridade, pois através dele os monitores utilizam linguagens diferenciadas, para tratar dos mesmos temas sem, contudo, compartimentalizar/fragmentar o conhecimento.

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Ao término das duas etapas da oficina realizamos uma avaliação da mesma, elencando os pontos positivos e negativos e; as dúvidas dos professores na aplicação dos instrumentos pedagógicos em sala de aula.

No decorrer da Oficina circulamos entre os grupos, a fim de esclarecer dúvidas e acompanhar o desenvolvimento dos trabalhos. Observamos que alguns professores se mostram incrédulos em relação à aplicação e a eficiência dos instrumentos pedagógicos na construção do conhecimento. Outros foram resistentes, não se permitindo aprender “coisas novas” depois de tantos anos de magistério (afinal já houve a cristalização do método didático utilizado por muitos anos de magistério). Alguns professores anteviam as dificuldades de aplicação dos instrumentos dada as “deficiências” na formação dos alunos, tais como: dificuldade na leitura e na escrita, raciocínio desconexo e lento, falta de motivação, etc. Mas por outro lado, tiveram professores que se interessaram em aprender a dinâmica de cada um dos instrumentos pedagógicos para utilizarem em suas práticas docentes.

No entanto, o comportamento que mais nos chamou a atenção foi à atitude desafiadora de alguns, que nos questionavam, tentando nos convencer que a utilização dessa metodologia não poderia ser aplicada em outro lugar que não fosse uma Escola Família Agrícola. Avaliamos essa postura como falta de perfil profissional para trabalhar com os povos do campo. Pois, o professor não consegue se desapegar das suas convicções para aprender com seus alunos. É uma atitude típica do “professor detentor absoluto do saber”. Não ser possível uma Educação do Campo que desqualifique o saber empírico dos estudantes. É fato que nem só de empirismo se faz o conhecimento, por outro lado, sem considerá-lo o ensino está fadado a não aprendizagem, a desmotivação e, consequente, abandono da escola. Palestra Pedagogia da Alternância e o minicurso Pedagogia da Alternância e Atividade de Campo

Para o desenvolvimento destas duas atividades ficamos uma semana participando da formação. Mesmo que as nossas falas, enquanto formadores, tenham sido concentradas no fim da semana, o objetivo foi “avaliar” a evolução dos professores em formação em relação a Educação do Campo e a afinidade com os estudantes e o Projovem Campo – Saberes da Terra.

No decorrer das atividades observamos que a grande maioria dos professores elogiavam os estudantes, as atividades desenvolvidas por eles e a dimensão que o Projovem ocupou em suas vidas, em relação ao contato com novas experiências. Ficou evidente também a interação entre os professores de diferentes regiões do Estado do Rio de Janeiro e a animação para a Visita de Estudos no Assentamento Zumbi dos Palmares, localizado em Campos dos Goytacazes.

O assentamento foi fundado na década de 1990, após a desapropriação da Fazenda São José, sendo o primeiro assentamento no Movimento dos Sem Terra (MST) na

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região norte fluminense. A visita foi conduzida pela equipe de formadores e supervisores do Projovem. Num primeiro momento paramos em frente a sede da usina, onde houve uma explanação sobre a história de ocupação e da luta dos integrantes do MST no processo de desapropriação. Em seguida visitamos a Escola Municipal Carlos Chagas, no Zumbi II. E por fim, visitamos alguns agricultores assentados.

O momento mais importante da Visita de Estudos, para nós formadores, foi na praça do Zumbi IV. Na oportunidade encontramos um agricultor que relatou como é o dia a dia, os conflitos e a violência que ainda está presente no assentamento. Destaca-se que em sua fala o mesmo descreveu a importância de práticas menos impactantes ao meio ambiente e do seu orgulho de ser agricultor. Os professores em formação se mostraram muito interessados na explanação do assentado, estimulando-o no detalhamento de suas experiências.

Ao término da visita adquirimos um rico material para a construção da palestra, a fim de, efetivamente, iniciarmos nossas contribuições para o módulo. Primeiramente, realizamos a mística de abertura com a leitura da música Vaca Estrela e Boi Fubá interpretada por Fagner, que conta a estória de um sertanejo que perde o gado por causa da seca – realidade do Sertão brasileiro e de muitos agricultores, inclusive campistas.

Em seguida, abordamos a necessidade de ouvirmos mais e falarmos menos, a fim de aprendermos e não apenas propagarmos as “verdades” dos anos de magistério; a dupla função educador/extensionistas que, muitas vezes, o professor assume por estar em uma escola do campo; e as arenas de poder envolvidas na relação professor-aluno-agricultor. Julgamos não ser possível uma Educação do Campo sem diálogo e respeito às diferenças.

A diferença entre Educação do Campo e Educação no Campo; a reprodução dos discursos hegemônicos; as políticas públicas voltadas para o meio rural e a nova abordagem territorial dessas políticas; o desenvolvimento territorial endógeno e as diferenças entre os governos, principalmente, no que concerne ao reconhecimento da Agricultura familiar como categoria social, compôs o arcabouço teórico da palestra. A ideia era correlacionar esses temas a Educação do Campo e as contribuições que o Projovem Campo no processo de empoderamento das populações tradicionais1.

Antes de tudo é importante que os professores em formação compreendessem a diferença entre Educação do Campo e Educação no Campo. É preciso discutir essa diferenciação a luz dos aspectos socioeconômicos e geopolíticos, pois milhares de

1 Nesse caso não nos referimos apenas aos agricultores familiares, mas também aos caiçaras,

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agricultores e estudantes são estigmatizados pela ideologia dominante, que desqualifica, subjuga, ridiculariza e “desinstitui” as populações tradicionais.

Assim, a Educação do Campo busca valorizar os saberes do campo para o homem do campo, respeitando seu capital territorial. A Educação do Campo se refere à reprodução dos moldes da educação da cidade para os estudantes do campo, descontextualizando a educação e promovendo desinteresse e abandono da escola. Ao adotar a abordagem territorial as políticas públicas brasileiras deram um salto rumo à reafirmação/reconhecimento dos povos do campo. Abandonando uma perspectiva setorial que reconhecia o agricultor como único ator social e a agricultura como única prática. A nova abordagem valoriza o capital territorial e as potencialidades dos atores sociais do campo, oportunizando o desenvolvimento socioeconômico a partir dos ativos locais. Outro tema abordado na palestra foi à importância de práticas agroecológicas no manejo sustentável dos agroecossistemas e a relação dessas práticas com os saberes populares.

Por todo este contexto o Projovem Campo foi uma boa iniciativa no resgate, valorização e empoderamento dos estudantes do meio rural. Mas a pergunta que nos inquietou desde o primeiro contato com os professores em formação é: Quais foram os critérios adotados para a escolha e alocação dos profissionais? Isso nos intriga, porque a falta de perfil e de identificação com o meio rural está presente na grande maioria dos professores em formação.

Algumas falas e comportamentos chamaram bastante a atenção tanto na Visita de Estudos quanto na palestra. Por exemplo, referindo-se a um agricultor uma professora em formação disse: “Ele é tão sem cultura, mas fala direitinho.” Isso é um contra senso para uma pessoa que diz valorizar o agricultor e gostar de trabalhar no Projovem Campo. Essa é a típica reprodução do discurso hegemônico, que o meio rural é o lugar do atraso, dos ignorantes e dos sem cultura. É lugar do “Jeca Tatu”. Por outro lado, o estigma está tão arraigado no homem do campo, que, por muitas vezes, ele internaliza o discurso hegemônico e o reproduz, mesmo sendo uma inverdade. Exemplo disso foi a fala de um agricultor: “Eu sou só um agricultor”, referindo-se a sua profissão.

Ser agricultor não é pouco! Não é uma profissão menos importante que qualquer outra. Afinal quem produz os nossos alimentos? A Agricultura Familiar é a responsável pelo abastecimento interno no país.

Quando socializamos nossas impressões na palestra, tivemos apoio de uns, indiferença de outros e indignação da maioria, talvez por perceberem o contra senso entre o comportamento no decorrer da semana, com o discurso de valorização dos atores sociais do campo e; a postura adotada na Visita de Estudos. É oportuno destacar que para muitos não se tratava da aplicação de um instrumento

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pedagógico – a Visita de Estudos – mas de um passeio pelo Assentamento Zumbi dos Palmares. Por isso, voltamos a chamar a atenção para a falta de identificação com o meio rural e a reprodução do discurso hegemônico.

Toda essa discussão serviu de subsídio para o minicurso Pedagogia da Alternância e Atividade de Campo.

Previamente foi realizada uma revisão dos instrumentos pedagógicos da Pedagogia da Alternância, a fim de facilitar a compreensão das atividades propostas no minicurso.

A metodologia utilizada foi a divisão dos professores em formação em grupos de 6 integrantes para a responder o Plano de Estudos, fazendo uma conexão entre o que foi visto na Visita de Estudos, o dia a dia deles nas aulas do Projovem Campo e suas opiniões pessoais. Como os grupos eram bastante heterogêneos instruimos que não havia a necessidade de chegaram a um consenso nas respostas, assim a opinião de cada integrante do grupo seria considerada. Os grupos deveriam seguir todas as etapas do Plano de Estudos. E ao final entregariam uma cópia dos textos para que formulássemos uma síntese geral. As respostas deveriam compor uma redação por grupo, devendo ser lida em plenária para os demais grupos, ou seja, a Colocação em Comum.

No que se refere à avaliação do minicurso, observamos muitos aspectos positivos, dentre os quais destacamos: a troca de experiência entre os professores em formação; a discussão sobre assuntos polêmicos, o que é bom para a formação de opinião e a desmistificação de certos preconceitos; a interação e cooperação para realização da oficina; o contato com outras realidades; a (re)construção de novos conhecimentos; a interação entre os formadores e supervisores e os professores; o interesse em realizar a atividades propostas; o respeito a opinião do outro e o trabalho em equipe. Entretanto, aspectos negativos devem ser destacados: a resistência em aprender novas metodologias; a necessidade de mostrar superioridade em relação ao aluno e ao agricultor; a não aceitação de críticas que melhorem o trabalho docente e a falta de compromisso com os horários.

O minicurso foi encerrado com a leitura da Carta 2070 que prevê os danos causados ao Planeta Terra e seus habitantes, em virtude da falta de respeito do ser humano com o meio ambiente.

Oficina: A importância da Avaliação e a Matriz FOFA

A nossa última participação no Projovem Campo – Saberes da Terra foi no módulo de encerramento do projeto. A mística de abertura consistiu na leitura de Coríntios 13 versículos 1-13, que trata da importância do amor. O objetivo da nossa participação neste módulo foi discutir com os professores em formação a importância da avaliação no dia a dia das atividades pedagógicas e formativas e; as nossas percepções a respeito do projeto. Como ferramenta para identificar pontos

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positivos e negativos sugeriu-se a utilização da matriz FOFA. Utilizou-se a matriz para avaliar a participação dos professores em formação no Projovem Campo. No que se refere à Avaliação do Projovem Campo – Saberes da Terra iniciamos a oficina resgatando a diferenciação entre Educação do Campo e Educação no Campo, discutindo o significado e o contexto em que está apoiado o nome do projeto “Projovem Campo – Saberes da Terra”.

O resgate da cultura e das territorialidades; a conciliação entre os interesses do Estado, dos estudantes e dos professores; a falta de participação no momento das palestras; a identificação do professor com o meio rural e o perfil dos estudantes são os entraves do Projovem Campo. Já a abertura e novos mercados; a valorização dos produtos orgânicos e da agroecologia; a “marca” do território; os novos conhecimentos construídos; a interação e a capacidade de diálogo com a diferença e; a formação inclusiva são as potencialidades do projeto.

O Programa é inteiramente importante para os agricultores familiares, porque as pequenas propriedades familiares apresentam características que contribuem para o desenvolvimento rural sustentável.

Sobre a importância da avaliação destaca-se: a mudança de rumos; o aperfeiçoamento do processo educativo; a verificação do desempenho de educadores e educandos; diagnosticar as dificuldades; verificar as oportunidades e traçar novas estratégias. A avaliação deve ser constante, a fim de aprimorar as atividades ludo-pedagógicas. A matriz FOFA é uma ferramenta que contribui para avaliação de ações, projetos, programas e atividades escolares. As influências externas (oportunidades e ameaças) e as internas (pontos fortes e pontos fracos) devem ser consideradas na avaliação.

Oportunidades Ameaças

Pontos fortes Explorar Enfrentar

Pontos fracos Melhorar Abandonar ou

modificar Fig 1: Esquema da matriz FOFA

Os professores em formação utilizaram esta ferramenta para avaliar as formações e as atividades desenvolvidas com os estudantes do Projovem Campo – Saberes da Terra. Destacamos que a divulgação dos resultados foi realizada em outro momento, em que não estive presente. A nossa participação foi encerrada com a leitura do Manifesto das Organizações Sociais do Campo.

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A participação no Projovem Campo – Saberes da Terra foi de extrema relevância pessoal e profissional. Primeiro, porque tivemos a oportunidade de conhecer os formadores e supervisores do programa, trocar experiências e criar laços de amizade. Segundo, porque conhecemos um pouco da história e do dia a dia do Assentamento Zumbi dos Palmares. Destacamos ainda a gratificante oportunidade de conhecer professores em formação de várias regiões fluminense, o que nos permitiu compartilhar nossas experiências sobre a Educação do Campo, bem como ouvir os entraves e possibilidades do Projovem em várias regiões do Estado.

Enfim, foi uma experiência valiosa. Mas, gostaríamos de chamar a atenção para uma situação, que muito nos incomodou ao longo dos módulos: a falta de identificação com as questões agrárias e com os povos do campo da maioria dos professores em formação. Voltamos a citar o contra senso entre a prática, o respeito a cultura campesina, o empoderamento dos povos do campo e; a reprodução do discurso hegemônico, que qualifica o rural como o local do atrasado, do “sem cultura”, do ignorante, do “Jeca Tatu” mal vestido e que fala errado.

A fim de que as políticas públicas voltadas para Educação do Campo sejam bem sucedidas é preciso que os agentes envolvidos tenham identidade com a proposta, do contrário ocorrerá uma reprodução dos moldes da cidade no meio rural, caracterizando a Educação no Campo, que continua a não valorizar os atores locais, nem tão pouco sua cultura, seu capital territorial, sua identidade. Por tudo isto, sugerimos que as próximas políticas estaduais de Educação do Campo envolvam profissionais verdadeiramente comprometidos com uma formação cidadã e libertadora das populações tradicionais.

Referências

CALAZANS, M.J.C. Para compreender a educação do Estado no meio rural. Campinas: Papirus: 1993.

CALIARI, R. O. Pedagogia da Alternância e desenvolvimento local. Lavras: UFLA, 2002.

LIMA, V. C. S. Avaliação de processo de transferência de tecnologia de automação de baixo custo para irrigação: estudo de caso na Escola Família Agrícola de Jacaré – Itinga (MG). 64 f. Dissertação (Mestrado em Agricultura Orgânica). Instituto de Agronomia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ, 2012.

MONTEIRO, M. A.; CHAVES, A. P. P.; VIEIRA, J. V.; DUARTE, L. P. Retrato falado da alternância: sustentando o desenvolvimento rural através da educação. CEETEPS, São Paulo: p. 180. 2000.

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