X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação SEPesq – 20 a 24 de outubro de 2014
JUSTIÇA CRIMINAL PREMIAL: INTRODUÇÃO À REGULAMENTAÇÃO JURÍDICA DA DELAÇÃO PREMIADA NO ORDENAMENTO BRASILEIRO E
ÀS ALTERAÇÕES DA LEI 12.850/13.
Vinicius Gomes de Vasconcellos Mestrando em Ciências Criminais PUCRS
vgomesv@gmail.com
Resumo: O presente artigo pretende analisar introdutoriamente o regramento legal acerca do instituto da delação (ou colaboração) premiada, regulado por diversas legislações no ordenamento brasileiro. Por certo, cada diploma e suas respectivas especificidades protestam por estudo próprio e aprofundado, o que vai além das pretensões desta pesquisa. Assim, justifica-se este trabalho a partir da necessidade de descrição da história legislativa acerca do mecanismo premial, a qual apresenta inúmeras características que necessitam de uma descrição introdutória prévia para posterior adensamento crítico. Por fim, apresentar-se-á os traços fundamentais das inovações implementadas pela Lei 12.850/13, a qual regulou importantes aspectos procedimentais da colaboração premiada.
1 Introdução
Inicialmente, pode-se afirmar que a delação premiada é “instituto de Direito Penal que garante ao investigado, indiciado, acusado ou condenado, um prêmio, redução podendo chegar até a liberação da pena, pela sua confissão e ajudar nos procedimentos persecutórios, prestada de forma voluntária” (BITTAR, 2011, p. 05). Conforme Eduardo Silva,
(...) a colaboração premiada, também denominada de cooperação processual (processo cooperativo), ocorre quando o acusado, ainda na fase de investigação criminal, além de confessar seus crimes para as autoridades, evita que outras infrações venham a se consumar (colaboração preventiva), assim como auxilia concretamente a polícia na sua atividade de recolher provas contra os demais coautores, possibilitando suas prisões (colaboração repressiva). (SILVA, 2014, p.
52).
Contudo, o autor limita a colaboração somente à fase de investigação criminal, o que
parece restringir a sua possibilidade à etapa pré-processual. Tal afirmação se mostra
inadequada, posto que a delação, conforme disposto na Lei 12.850/13 (e afirmado pelo
próprio autor posteriormente), pode se implementar na investigação, durante o processo ou
até na fase de execução da pena. Por outro lado, há quem enfoque à finalidade
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persecutória do referido instituto, no auxílio à instrução criminal, como uma “técnica de investigação sustentada na cooperação de pessoa suspeita” (PEREIRA, 2013, p. 35), o que, ressalta uma das principais críticas ao instituto em análise: o desvelamento da dependência estatal à colaboração do próprio acusado em razão de sua ineficiência na colheita de provas suficientes para o rompimento da presunção de inocência, ou seja, há uma indevida inversão das cargas processuais.
Pode-se dizer que, para o tema em questão, um dos principais marcos para a introdução do instituto no ordenamento pátrio foi a promulgação da Lei 8.072/90, de Crimes Hediondos. Devido ao grande número de diplomas legais promulgados posteriormente que, de uma forma ou de outra, possuem a previsão em suas normas do beneplácito, optou-se aqui pela realização de comentários individualizados sobre todos esses diplomas. Muitos apresentam a hipóteses em tudo ajustáveis a delação premiada, dando grande amplitude ao seu uso.
Quanto ao procedimento a ser adotado para a realização do acordo de colaboração premiada, anteriormente à Lei 12.850/13, apontava-se a insuficiência e a confusão do regramento legal acerca da matéria (PEREIRA, 2013, p. 107-108; BITTAR, 2011, p. 07).
Diversos diplomas legais abordaram o instituto (em resumo, Lei de Crimes Hediondos, Lei de Proteção à Vítima e à Testemunha e Lei de Entorpecentes), porém sempre de modo deficitário, sem atentar ao aspecto procedimental, mas sim às suas consequências penais.
Contudo, com o advento da Lei 12.850/13 tal cenário foi modificado em razão dos novos dispositivos legais introduzidos, que, embora direcionados à persecução penal de delitos relacionados a organizações criminosas, podem ser utilizados às delações premiadas em geral por analogia.
2 Desenvolvimento
Diante de tal insuficiente regulamentação do instituto premial no ordenamento brasileiro, surge a Lei 12.850/2013, que define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) e revoga a Lei no 9.034, de 3 de maio de 1995. Em seu artigo 3º, inciso I, dispõe sobre a possibilidade de uso da colaboração premiada: Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da prova: I - colaboração premiada (...)”.
Para que o benefício de redução de pena seja aplicado, é importante destacar que a colaboração deve obrigatoriamente auxiliar nas investigações, esclarecendo além das infrações cometidas em organização criminosa, as circunstâncias do crime, a autoria das tais infrações, e a recuperação de objetos do crime. Após, o juiz, quando da fundamentação da sentença e fixação da pena, deverá avaliar o grau de colaboração prestada pelo delator, personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso, correlacionando-os com a pena a ser diminuída, dentro dos parâmetros legais.
Ademais, afirma-se a necessidade da autoincriminação, ou seja, impõe-se que “as
revelações do colaborador tenham relação com o crime específico pelo qual ele está sendo
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acusado, ou com a organização ou quadrilha de que fez parte ou tenha colaborado”
(PEREIRA, 2013, p. 36). Tal declaração deve ser realizada ou confirmada diante do juiz competente na fase processual da persecução penal. Desse modo, estabelece-se uma obrigação processual ao agente, “um dever de colaborar de forma permanente com as autoridades”, de modo que sua presença é obrigatória em todos os casos em que for solicitada pela autoridade policial ou judicial (SILVA, 2014, p. 57-58). Conforme o parágrafo 9
odo artigo 4
oda Lei 12.850/13: “Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo delegado de polícia responsável pelas investigações”. Além disso, o parágrafo 12
odo mesmo artigo atesta que: “Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial”. Isso se dá essencialmente a partir da renúncia ao direito ao silêncio ocasionada pela aceitação do acordo de delação, amplamente discutida pela doutrina (PEREIRA, 2013, p. 54-55; SILVA, 2014, p. 67-68), mas determinada pelo regramento da Lei 12.850/13. Conforme o parágrafo 14 do artigo 4
oda Lei 12.850/13: “Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.”
Por certo, um dos pontos de maior importância na regulamentação e concretização dos acordos de delação é a insuficiência da declaração para motivar isoladamente uma sentença condenatória. Trata-se de posição majoritária, ou até pacífica, da doutrina e da jurisprudência brasileira,
1ao passo que, semelhantemente à confissão regulamentada no Código de Processo Penal, sua valoração não pode ser determinante de modo exclusivo para a resolução do caso, sob pena de retorno a um sistema em que a palavra do acusado se torne “rainha das provas” (LOPES JR., 2012, p. 646).
Igualmente, a referida legislação vai bem ao impor a imprescindibilidade do acompanhamento de advogado ao réu em todos os atos, seja de negociação, confirmação ou execução (art. 4
o, §15, Lei 12.850/13) (SILVA, 2014, p. 69). Inquestionavelmente, tal assistência técnica se caracteriza como pressuposto de validade do acordo de colaboração, já que essencial ao esclarecimento e à consciência do ato de confissão pelo delator (BITTAR, 2011, p. 175-177). Em prol da proteção da imparcialidade do juiz, essencial é a imposição de seu afastamento das negociações acerca da eventual delação (PEREIRA, 2013, p. 129-130). Assim, vai bem o referido diploma legal ao inferir a não participação do magistrado, restringindo seu papel ao de garante da legalidade e do respeito aos direitos fundamentais do acusado através do controle acerca da homologação da colaboração.
Segundo o artigo 4
o, parágrafo 6
oda Lei 12.850/13: “O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor”.
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