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DIÁLOGOS TEMÁTICOS 4 HISTÓRIA DA MATEMÁTICA

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DIÁLOGOS TEMÁTICOS 4

HISTÓRIA DA MATEMÁTICA

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SENSOS NUMÉRICO & GEOMÉTRICO

Manoel de Campos Almeida PUCPR manoel@pucpr.br

Resumo: Humanos possuem uma aptidão inata para lidar com numerosidades: o senso numérico, que compartilham com outras espécies. Possivelmente também têm outra competência inata capaz de lidar com relações espaciais, o senso geométrico. Este trabalho resume as pesquisas sobre a neurofisiologia destes sensos.

Palavras-chave: História da Matemática. Educação Matemática. Senso Numérico.

Abstract: Humans have a inborn ability to deal with numerosities: the number sense, that share with others species. Possibly also have another inborn ability to deal with spatial relations, the geometric sense. This work review the researches about the neurophysiology of the these senses.

Keywords: History of Mathematics. Mathematics Education. Number Sense.

Objetos matemáticos

O homem primitivo, ao se defrontar com noções primordiais como número, grandeza e forma, constatou que elas podiam estar relacionadas mais com contrastes do que com semelhanças: a diferença entre uma ovelha e muitas, a desigualdade de tamanho entre um elefante e um rato e a dessemelhança entre a forma redonda da lua e a retilínea de um bambu. Os próprios contrastes pareciam indicar semelhanças: a diferença entre uma hiena e muitas, entre uma ovelha e um rebanho, entre um árvore e uma floresta, sugerem que uma hiena, uma ovelha e uma árvore têm algo em comum: sua unicidade. O reconhecimento da distinção entre um e muitos originou a diferenciação entre singular e plural nas línguas.

O passo seguinte foi a percepção de uma propriedade abstrata que certos grupos têm em comum e que nós denominamos de número. Paulatinamente, o homem reconheceu a existência de analogias; dessa percepção crescente de semelhanças em número e forma brotou a ciência e a matemática.

Números e formas (tais como linhas retas, curvas, superfícies, volumes, esferas, cubos, etc.) são denominados de entes ou objetos matemáticos: o problema de sua natureza, se existem de modo independente do cérebro do homem, que então os descobre, ou se são apenas produto de sua atividade neuronal, que conseqüentemente os constrói, é tema central de investigação, desde a antiguidade grega, tanto da matemática como da ciência em geral.

As teorias sobre o problema mente-corpo podem ser divididas em duas categorias: as dualistas e as materialistas. Dualismo é uma filosofia acerca da mente que considera a mente como uma substância não física. Divide o que há no mundo em duas categorias: a mental e a física. O principal problema com o dualismo é que não consegue explicar a interação causal entre o mental e o físico.

Já nas materialistas o mental não é distinto do físico, ou seja, todos os estados mentais (incluindo aqui os objetos matemáticos), são idênticos a estados físicos. Reduzem o nível mental ao físico, daí serem

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denominadas de teorias reducionistas. Entre essas destacamos as neuronalistas, impulsionadas a partir de 1980 principalmente por Jean Pierre Changeux e Stanilas Dehaene.

Changeux (1985, p.144) assim resume suas concepções:

“O objeto mental é identificado com o estado físico criado pela entrada em ação (elétrica e química), correlacionada e transitória, de uma grande população ou “reunião” de neurônios distribuídos por diversas áreas corticais bem definidas. Este conjunto, que matematicamente se descreve por um grafo (mapa), é

“descontínuo”, fechado e autônomo mas não homogêneo. É constituído por neurônios que apresentam diferentes peculiaridades adquiridas durante o desenvolvimento embrionário e pós-natal. O bilhete de identidade da representação é inicialmente determinado pelo “mosaico)” (grafo) de peculiaridades e pelo estado de atividade (número, freqüência dos impulsos ).”

Como os objetos matemáticos corresponderiam assim a estados físicos do cérebro, seria possível visualizá-los externamente mediante técnicas de neuroimagem, como tomografia computadorizada (CT), ressonância magnética (MR), tomografia por emissão de pósitrons (PET) ou ressonância magnética funcional (fMRI). Com o crescente incremento na resolução dessas técnicas, elas hodiernamente vêm se tornando os principais instrumentos na pesquisa de como os objetos matemáticos são produzidos no cérebro.

Senso numérico

Brouwer, fundador do intuicionismo, asseverava que a matemática é uma atividade humana, que se origina e se desenvolve na mente humana, inexistindo fora dela, sendo independente do mundo real. A mente reconheceria certas intuições básicas, claras, distintas de intuições sensíveis ou empíricas, mas certezas imediatas acerca de alguns conceitos de matemática. Concebia o pensamento matemático como um processo de construção mental que edifica seu próprio universo. De certa forma, pode-se considerar o intuicionismo como precursor de teorias materialistas como o neuronalismo, desde que associemos a atividade mental humana com a atividade neuronal. Caberia, então, indagar sobre as características dessas intuições matemáticas básicas: quais seriam inatas, logo transmitidas filogeneticamente, através do processo evolucionário, quais seriam adquiridas e quais seriam desenvolvidas ou construídas pela mente.

Entre essas intuições inatas o senso numérico ou numerosidade vem presentemente recebendo especial atenção por parte dos pesquisadores. Essa intuição, ou faculdade, permite, segundo Dantzig, ao observador reconhecer que algo mudou em uma pequena coleção quando, sem seu conhecimento direto, um objeto foi adicionado ou retirado à coleção. É, portanto, uma propriedade de um estímulo que é definida pelo número de elementos discrimináveis que contém.

Faz parte do que nos permitiremos denominar de matemática animal, ou seja, de conceitos matemáticos comuns à algumas espécies do reino animal. Entre essas, que compartilham o senso numérico com o homem, citamos os insetos (vespas); aves (pombos, corvos, papagaios, periquitos, gralhas);

primatas, como os prossímios (lêmures) e antropóides (rhesus, chipanzé); ratos; golfinhos e mesmo salamandras. O senso numérico é, conseqüentemente, independente da linguagem e possui uma longa história evolucionária.

Somente nos últimos trinta anos a competência numérica dos bebês recém-nascidos humanos tem sido examinada empiricamente. Até recentemente a visão construtivista de Piaget, elaborada há uns sessenta anos, dominava esse campo. Ela afirmava que as habilidades matemáticas e lógicas são progressivamente construídas nas mentes dos bebês, pela observação, internação e abstração de regularidades do mundo exterior. Ao nascer o seu cérebro é uma página em branco, vazia de qualquer

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conhecimento conceitual. O conceito de número, para Piaget, deveria ser construído no curso de suas interações sensoriomotoras com o ambiente. Crianças nasceriam, então, sem qualquer idéia preconcebida sobre a aritmética.

As primeiras experiências que mostraram que bebês com seis meses de idade já mostravam competência para empregar certos aspectos do conceito de número, muito antes de que tivessem qualquer oportunidade de abstrai-lo do ambiente, contrariando assim Piaget, foram realizadas em 1980 na Universidade da Pensilvânia, por Starkey e Cooper. Mostraram que bebês entre 16 e 30 semanas de vida são capazes de discriminar numerosidades 2 e 3. Posteriormente, Antell e Keating, da Universidade de Maryland, evidenciaram que mesmo recém-nascidos podem discriminar números 2 e 3 poucos dias após o seu parto. Em 1992 Karen Wynn publicou na revista Nature um artigo sobre adições e subtrações simples realizadas por bebês com quatro e cinco meses de idade. Demonstrou que bebês sabem que 1+1 perfaz não 1 ou 3, mas exatamente 2.

Cabe ressalvar, contudo, que embora as habilidades numéricas de crianças de tenra idade sejam reais, elas estão limitadas à aritmética mais elementar. Sua habilidade para cálculo não parece se estender para além dos números 1,2,3 e talvez 4. Sempre que experimentos envolvem 2 ou 3 objetos, elas podem discriminá-los, porém, somente ocasionalmente revelaram-se capazes de diferenciar 3 do 4. Nunca um grupo de bebês com menos de um ano de idade distinguiu 4 pontos de 5 ou mesmo de 6. Sua competência, nesse domínio, pode talvez ser inferior a do chipanzé adulto, cuja capacidade se mostrou acima do acaso mesmo quando tem de escolher entre seis contra sete chocolates.

Chipanzés possuem igualmente senso numérico, semelhante ao do homem (cf. Dehaene, 1997).

Além disso, Woodruff e Premack, da Universidade da Pensilvânia, mostraram, em 1981, que eles conhecem frações simples e também são capazes de efetuar operações aritméticas com elas, demonstrando assim uma noção intuitiva de como essas frações podem se combinar. Esses animais sabem que um quarto de uma torta está para a torta inteira assim como um quarto de litro de leite está para um litro inteiro.

Outra linha de pesquisa questiona se crianças e primatas não-humanos têm uma compreensão inata da ordenação, ou seja, que 2>1, 3>2, 4>3 e assim por diante. É uma questão relevante, pois junto da habilidade de representar relações operacionais entre pequenas numerosidades (1+1=2, 2-1=1, etc.), animais deveriam ter também uma competência para compreender a “ordem” segundo a qual elas estão organizadas.

Em etologia, teorias de otimização de forrageação ou coleta predizem que animais “procuram por mais”, isto é, desenvolvem estratégias para forragear ou coletar que maximizem seu ganho líquido de energia quando nessa atividade (i.e., o ganho de energia excede a sua perda nessa atividade).

Feigenson em 2002 organizou um experimento com dois grupos de crianças com 10 e 12 meses de idade, onde eram-lhes mostrados dois recipientes que continham números diferentes de guloseimas, a saber 1x2, 2x3, 3x4 e 3x6. Os bebês eram colocados a um metro de distância dos recipientes e então liberados pela mãe para escolherem um recipiente. O resultado foi de que ambos os grupos de idade escolhiam o recipiente de maior numerosidade quando 1x2 e 2x3 eram confrontados, mas não quando 3x4.

Desse modo determinaram que crianças de tenra idade já estabelecem uma relação ordinal entre duas numerosidades, procurando pelo recipiente que continha “mais”.

Hauser em 2000 realizou o mesmo experimento com macacos rhesus. Manipulou também condições onde dois recipientes contendo números diferentes de guloseimas eram confrontados, nos quais 1x2;2x3;3x4;3x5;4x5;4x6;4x8;3x8 unidades foram cotejadas. Os macacos escolheram o recipiente com

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maior número nos testes onde 1x2;2x3;3x4;3x5 unidades foram apresentadas, mas não nos casos 4x5;4x6;4x8;3x8. Os resultados mostraram que os macacos apresentam uma habilidade espontânea de ordenação de pequenas numerosidades muito similar à das crianças recém-nascidas. Isso patenteia uma limitada capacidade de ordenação, de “procurar por mais”, que poderia eventualmente ser apenas uma característica dos primatas, talvez não compartilhada por outras espécies.

Porém, em 2003 Uller e outros mostraram que salamandras, anfíbios distantes na linha evolucionária dos primatas, também compartilham dessa aptidão. Apresentaram a esses anfíbios dois tubos contendo números diferentes de drosófilas, moscas de frutas, guloseimas apetitosas para essa espécie. Elas foram capazes de escolher a maior entre duas numerosidades quando se confrontaram 1x2 e 2x3 drosófilas, mas não nos testes onde se comparou 3x4 e 4x6. Como no caso dos macacos e dos bebês, a salamandras também têm uma limitada capacidade de ordenação, de “procurar por mais”. Isso indica que essa capacidade pode ser mais disseminada no reino animal do que se supunha anteriormente.

Resta, porém, buscar a explicação da natureza, do mecanismo dessas intuições ou sensos. O primeiro a estudar o impacto da atividade aritmética sobre o cérebro humano foi William G. Lennox que, em 1931, estudou o efeito da circulação cerebral no trabalho mental. No rastro dos trabalhos de Lennox, vários estudos mostraram que o cérebro é consumidor voraz de energia, absorvendo sozinho quase um quarto da energia total gasta pelo corpo inteiro. Sokoloff foi o pioneiro em mostrar a relação entre a circulação cerebral, o metabolismo local e a atividade das áreas cerebrais. Os mecanismos de regulação do fluxo sangüíneo têm sido explorados pela ciência nos último vinte anos com o intuito de mostrar quais regiões do cérebro estão ativas durante as várias atividades mentais.

Embora as primeiras neuroimagens do cérebro humano ativo datem de 1970, somente em 1985 Roland e Friberg publicaram as primeiras imagens da atividade cerebral durante cálculos mentais. Seus estudos evidenciaram que sujeitos efetuando subtrações repetidas demonstraram ativações bilaterais no córtex parietal inferior do cérebro, bem como em múltiplas regiões do córtex prefrontal. Na seqüência, Dehaene (1997) estudou como a atividade cerebral varia durante experimentos de comparação e multiplicação de números. Igualmente evidenciou-se que várias regiões do cérebro estavam ativas durante a comparação e multiplicação de números. Apontou-se o córtex parietal inferior como crucial para o senso quantitativo de número. Durante a multiplicação, a atividade cerebral era mais intensa no hemisfério esquerdo, que governa a linguagem, mas durante a comparação, estava igualmente distribuída nos dois hemisférios ou mesmo se verificava no direito. Isso está em concordância com a observação de que a multiplicação, mas não a comparação, em parte depende das habilidades lingüísticas do hemisfério esquerdo. Uma outra área subcortical, o núcleo lenticular esquerdo, também estava mais ativa durante a multiplicação do que durante a comparação.

Estudos mais recentes, melhorando a resolução, procuram delimitar essas áreas do cérebro, buscando identificar com mais precisão as áreas envolvidas nas capacidades numéricas. Nieder e Miller (2004), realizaram estudos com macacos rhesus, que parecem indicar que a informação sobre numerosidade flui do córtex posterior parietal para o córtex lateral parietal posterior. Também determinaram que o fundo do sulco intra parietal contém expressivo número de neurônios cuja atividade está envolvida com o processamento de numerosidade.

Essa é, hoje, a melhor indicação que a ciência possui para o locus da numerosidade. Os estudos neurofisiológicos mais recentes confirmam, portanto, que humanos e macacos possuem mecanismos similares no processamento de números.

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Senso geométrico

O senso numérico seria a intuição básica para o conceito de número, para a aritmética, porém cabe indagar se existiria um senso ou faculdade inato, responsável pelas intuições básicas da geometria, um senso geométrico?

Kant distinguiu dois tipos de conhecimento humano a priori : o analítico, que sabemos ser verdadeiro pela análise lógica, e o sintético, representado por nossas intuições de tempo e espaço. Nosso conhecimento de tempo seria sistematizado na aritmética, que se baseia na intuição de sucessão, e o nosso conhecimento do espaço seria sistematizado na geometria. Para Kant nossos sentidos não podem fazer seu trabalho sem ordenar suas percepções na estrutura de espaço e tempo.

Nosso conhecimento sobre o mundo externo depende principalmente das informações obtidas pela visão. Existem diferentes trajetórias neurais para o processamento de informações visuais sobre os objetos, tais como: forma, movimento, cor e profundidade.

Vários autores, como Gombrich, Bednarik, Halverson, Latto e Hudson, enfatizaram que os motivos primitivos, especialmente as formas geométricas, são esteticamente interessantes não apenas porque refletem características do mundo, mas sim porque estimulam propriedades do sistema visual humano.

Em 1980 HUBEL e WIESEL descobriram que células do córtex visual primário são organizadas para responder à orientações específicas de uma linha, e que a percepção de formas pode ser fabricada pela agregação de características selecionadas. Descreveram como o córtex pode funcionar como um estágio primário na análise da orientação de linhas, e como é um aspecto importante do processamento da informação visual, que se efetua por meio de uma hierarquia de células simples, complexas e hipercomplexas, através das quais a natureza da informação acerca da linha pode se tornar cada vez mais abstrata.

BARLOW propôs a teoria da detecção de características, pela qual as células corticais, que formam o nível inferior de uma hierarquia de células, respondem progressivamente às características geométricas cada vez mais abstratas das formas. Dessa maneira, células dos mais baixos níveis responderiam às linhas mais primitivas, enquanto que as dos níveis mais altos responderiam à características geométricas simples dessas linhas, como ângulos, paralelismo e perpendicularismo e, na seqüência, pelas combinações de atividades de células complexas e hipercomplexas particulares, surgiria a percepção de formas geométricas mais elaboradas, como retângulos, losangos e círculos, e assim por diante, até a percepção de figuras representacionais, que envolveriam centros de alta ordem do córtex cerebral e do cérebro.

Presentemente essa teoria está superada, pois várias pesquisas mais recentes demonstraram que o processamento visual é muito mais complicado do que se supunha. O processo todo é ainda desconhecido, embora se conheçam algumas pistas sobre o mesmo.

O olho humano capta a forma dos objetos e imprime na retina uma imagem bidimensional (2D) dos mesmos, registrando basicamente seus contornos. O mecanismo neural de como o cérebro reconstrói uma realidade tridimensional (3D) a partir dessa imagem 2D tem fascinado os cientistas. Muita pesquisa tem se focado na estereopse, onde se procura inferir a sensação de profundidade com base em pequenas disparidades de imagem entre os olhos direito e esquerdo.

Todavia, mesmo sem estereopse pode-se obter uma vívida sensação de profundidade, que depende de outras pistas como sombras, perspectivas, texturas, gradiente e paralaxe de movimento.

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Kourtzi e outros (2003), empregando fMRI, mostraram que a sub-região posterior do complexo lateral occipital (CLO), uma área envolvida na análise da forma visual, pode processar características 2D de objetos independentemente de transformações de imagem (pequenas rotações ou curvaturas), enquanto que a região anterior do mesmo complexo pode representar a forma 3D de objetos e sua posição em profundidade em cenas visuais. É possível, assim, que populações de neurônios no CLO posterior mediem a análise de formas baseadas em propriedades de imagens 2D, enquanto que populações de neurônios no CLO anterior mediem o reconhecimento de objetos baseados em representações 3D um tanto abstratas.

Essas representações 3D algo abstratas, uma espécie de senso geométrico inato rudimentar, podem desempenhar um papel importante quando necessitamos interpretar rapidamente cenas complexas ou reconhecer objetos independentemente de mudanças nas suas imagens.

Porém, ressaltamos novamente, o processo inteiro ainda é desconhecido, muito do qual resta ser determinado. É possível, todavia, dentro do atual estágio de conhecimento sobre a questão, que o homem possua um senso geométrico rudimentar, inato, responsável pelas suas intuições geométricas elementares.

Referências Bibliográficas

ALMEIDA, Manoel de Campos. Origens da Matemática. Curitiba, Champagnat, 1998.

----Origens dos Numerais. In: IV Seminário de História da Matemática. Anais. Natal: Editora da Sociedade Brasileira de História da Matemática-SBHM, 2001.

DEHAENE, Stanislas. The Number Sense. New York, Oxford University Press, 1997.

KLINE, Morris. Mathematics – The Loss of Certainty. New York, Oxford University Press, 1980.

KOEHLER, O. The Ability of Birds to “Count”. In: NEWMAN, James R. The World of Mathematics. New York, Simon and Schuster, 1956.

KOURTZI, Zoe; ERB, Michael; GRODD, Wolfang; BULTHOFF, Heinrich H. Representation of the Perceived 3D Object Shape in the Human Lateral Occipital Complex. In: Cerebral Cortex. Sep. 2003; 13:911-920.

NIEDER, Andreas; MILLER, Earl K. A parieto-frontal network for visual numerical information in the monkey.

In: PNAS, May 2004, vol. 101, no.19.

PIAGET, Jean; SZEMINSKA, A. A Gênese do Número na Criança. 3a ed. Rio de Janeiro, Zahar, 1981.

ULLER, Claudia; JAEGER, Robert; GUIDRY, Gena; MARTIN, Carolyn. Salamanders (Plethodon cinereus) go for more: rudiments of number in an amphibian. In: Animal Cognition (2003) 6:105-112.

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O MANUSCRITO DE ÁLGEBRA DE ANTONIO MONIZ (BAHIA, SÉCULO XIX)

Marcelo Duarte Dantas de Ávila . Professor Assistente do Departamento de Ciências Exatas e da Terra Universidade do Estado da Bahia – UNEB.

mddavila@terra.com.br

Resumo: Nesta comunicação pretendo analisar o manuscrito sobre Álgebra, escrito entre 1867 e 1874, por Antonio Ferrão Moniz de Aragão, intelectual baiano que viveu durante o século dezenove em Salvador, comparando-o com o livro Elementos de Álgebra, de Cristiano Ottoni, cuja primeira edição foi de1852, identificando, no documento de Antonio Moniz, algumas contribuições que este personagem e suas idéias trouxeram à história da educação matemática no Brasil, em particular à Bahia. Talvez, em função de que não fosse um documento matemático que valorizasse excessivamente o uso de técnicas, como comumente ocorria com outras obras, o manuscrito Álgebra apresentou alguns avanços em relação à maioria dos livros escritos no Brasil sobre o mesmo assunto naquela época. Em particular, dois aspectos foram salientados: o primeiro, foi a abordagem da matemática segundo um ponto de vista filosófico, e o segundo foi o estudo dos números negativos, tópico bastante controverso e ignorado pela maioria dos autores brasileiros de então.

Antonio Moniz, ao versar sobre tema tão complexo naquele momento, ou defender que se olhasse para a matemática segundo um ponto de vista filosófico, demonstrando mais preocupação na construção do raciocínio matemático do que no mero uso de técnicas, no mínimo estava contribuindo para ampliar e aprofundar a discussão sobre a matemática no Brasil na segunda metade do século dezenove.

1. Introdução

Antonio Ferrão Moniz de Aragão1 (1813 – 1887) foi um legítimo representante de uma elite intelectual que surgiu no Brasil ao longo do século XIX. Filho de uma das mais aristocráticas famílias baianas, após um período de estudos na Europa, onde cursou Filosofia Natural na Universidade de Londres, retornou a Salvador e produziu, ao longo de aproximadamente quarenta anos, várias dezenas de textos em diversas áreas do saber.

Tinha especial predileção pela Matemática, tendo publicado, em 1858, a obra Elementos de Matemáticas, considerado “o primeiro livro-texto de Matemática [publicado no Brasil] em que a Filosofia Positiva de Comte é extensivamente comentada”2. Além deste livro, Antonio Moniz escreveu os seguintes manuscritos matemáticos, ainda inéditos: Geometria e Mecânica Racional, Cerderística ou Aritmética Aplicada, Metrologia Geral ou Geometria e Mecânica Concreta, Álgebra e Cálculo Diferencial e Integral, que se encontram arquivados no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia.

Nesta comunicação, pretendo analisar o manuscrito de Álgebra, inclusive comparando-o com a terceira edição do livro Elementos de Álgebra de Cristiano Ottoni, publicado no Rio de Janeiro em 1872 e depositado no setor de obras raras da Biblioteca Pública do Estado da Bahia, identificando, no documento de Antonio Moniz, algumas contribuições que este personagem e as suas idéias trouxeram à história da educação matemática no Brasil, em particular à Bahia.

1 Para maiores informações sobre Antonio Ferrão Moniz de Aragão, ver: ÁVILA, Marcelo Duarte D. de. Antonio Ferrão Moniz de Aragão: Manuscritos Matemáticos e Filosóficos na cidade de Salvador – 1855 a 1886. Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBa, 2005 e SILVA, Circe Mary Silva da. A Matemática Positivista e sua Difusão no Brasil.Vitória: EDUFES, 1999, p 218 até 239.

2 SILVA, Circe Mary Silva da. A Matemática Positivista e sua Difusão no Brasil.Vitória: EDUFES, 1999, p 218.

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2. O Manuscrito

O manuscrito de Álgebra é um documento de cento e oitenta e sete páginas, versando basicamente sobre a formação dos números, suas propriedades e combinações, segundo uma visão axiomática da álgebra, escrito entre 1867 e 1874, em Salvador, e contendo os seguintes assuntos: Formação dos números – o autor utilizou de construções elementares com diversos tipos de funções para obter os mais variados números, sistema de numeração posicional, tópicos de análise combinatória e polinômios.

Antonio Moniz iniciou o seu manuscrito com uma longa introdução de vinte e três páginas, onde abordou basicamente duas idéias principais: o primeiro ponto objeto de reflexão foi a diferença entre Aritmética e Álgebra. Na concepção de Antonio Moniz, a Álgebra era uma generalização dos resultados particulares obtidos através da Aritmética, isto é, enquanto a Aritmética tinha “por objeto a formação e comparação de números determinados”, a Álgebra tinha “por objeto as leis gerais da formação e comparação dos números”. O segundo ponto abordado na introdução foi a noção de quantidade, quando o autor dissecou detidamente cada aspecto deste conceito. Na concepção de Antonio Moniz, um corpo era dotado de propriedades universais, tais como, a extensão (espaço) e a duração (tempo). “Além destas duas propriedades universais existe ainda uma outra mais universal e abstrata do que elas que é a quantidade.

Esta propriedade pode ser considerada independentemente de todas as mais, e, entretanto nenhuma outra pode ser considerada sem a intervenção desta”. E continuou, por várias páginas, destacando o caráter universal das quantidades e sua independência em relação às demais propriedades.

Após a introdução, vem o capítulo um, denominado de Princípios Fundamentais, formado por três parágrafos: Noções Gerais, Nomenclatura Algébrica e Axiomas.

No primeiro parágrafo, Antonio Moniz apresentou as noções gerais, necessárias para a compreensão da Álgebra, onde destacou a importância da generalização, do estabelecimento de leis ou propriedades gerais, ou ainda do cálculo geral dos valores, como ele mesmo denominou, como característica básica da Álgebra.

No segundo parágrafo, o autor justificou o uso de uma linguagem algébrica como elemento essencial afim de que possamos compreender as generalizações propostas através das leis ou propriedades.

No terceiro parágrafo, o autor, adotando uma postura pouco usual para época, apresentou o seu manuscrito segundo um ponto de vista rigoroso, fazendo uso dos seguintes axiomas na Álgebra:

1º Axioma: Duas quantidades iguais a uma terceira são iguais entre si, isto é, se A = B e B = C então A = C.

2º Axioma: Quando duas quantidades são iguais todas as operações feitas sobre uma delas, e também sobre a outra, devem dar resultados iguais. Por exemplo, se A = B, então A + C = B + C, A – C = B – C, A × C = B × C, A ÷ C = B ÷ C, AC = BC, C A=CB.

No tópico denominado de “Formação dos Números”, o autor abordou as leis de formação ou construção dos números, mostrando uma forte identidade com a teoria matemática defendida por Auguste

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Comte3, e que admitia a existência de dez formações elementares de números. Essas dez formações eram agrupadas em cinco pares, sendo que cada par era formado por uma função e sua inversa, a saber:

Primeiro par:

⎩ ⎨

= +

=

diferença

função

x a y

soma função x a y

Segundo par:

⎪⎩

⎪ ⎨

=

=

quociente função

a y x

produto função

ax y

Terceiro par:

⎪⎩

⎪ ⎨

=

=

raiz função x y

potência função

x

y

a a

Quarto par:

⎪⎩

⎪ ⎨

=

=

logaritmo função

a l x y

expoente função

a

y

x

4

Quinto par:

⎩ ⎨

=

=

indireta circular

função ) x (sen arc y

direta circular função

x sen y

Antônio Moniz reconheceu na sua obra, que este número de funções não era definitivo, podendo ser ampliado com o passar do tempo: “Estas são todas as funções simples conhecidas hoje dos matemáticos. Não há razão, porém, nenhuma a priori para limitarmos este número. Novos elementos analíticos podem ser descobertos. Temos hoje mais do que tinha Descartes, até mais do que Newton e Leibniz, e nossos sucessores poderão ter ainda mais”. O que não deixa de ser uma visão interessante a medida que o nosso personagem reconhecia implicitamente que a matemática não era um conhecimento pronto e acabado.

Os três primeiros pares eram chamados de algébricos (e os dois últimos, denominados de derivados) e foi com esses pares que Antônio Moniz trabalhou detidamente, ao longo de aproximadamente cinqüenta páginas, as construções elementares dos números utilizando as funções algébricas. O que ele chamou de construção é, utilizando uma linguagem bastante atual, o estudo do valor numérico de uma função. Senão vejamos, o procedimento adotado pelo autor é o seguinte: dados os diversos tipos de funções, verificou-se em detalhes o que acontecia com a função a medida que o x, a variável independente, assumia todos os valores possíveis (números negativos, positivos, zero, frações, etc). Apesar de ainda não existir na forma sistematizada como hoje conhecemos, conceitos como os de domínio e imagem ou conjuntos numéricos permeavam insistentemente estas idéias desenvolvidas por Antônio Moniz.

Nesta parte de seu manuscrito, Antonio Moniz apresentou uma abordagem avançada para a época ao discorrer sobre os números negativos, admitindo clara e explicitamente a existência desses números:

Assim pois este primeiro par ⎥

⎢ ⎤

⎩⎨

= +

= x a y

x a

y de funções dá origem a

consideração de quantidades negativas, que desde logo tornam-se tão

3 Mesmo sendo um adepto da filosofia positivista preconizada por Comte, Antonio Moniz discordava dele em vários momentos. Por exemplo, para Antonio Moniz a Álgebra tinha por objeto as leis gerais de formação e comparação dos números, enquanto que para Comte o objeto de estudo da Álgebra era o cálculo com funções.

4 A função logarítmica está grafada como o autor grafou no texto.

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necessárias para o cálculo das relações quanto as positivas. Para melhor inteligência desta nova espécie de quantidades consideremos a formação y

= a – x em toda a sua generalidade como devendo dar sempre a formação de um número qualquer y, sejam quais forem os valores de a e x. Ora, y tem sempre um valor determinado enquanto x é menor que a, mas quando é maior não temos senão um valor negativo, por exemplo, suponhamos que x excede a da quantidade d, isto é, que x = a + d, portanto y = a –a – d, pois para tirar de a a quantidade x, é preciso tirar todas as partes de que se compõem x. Na igualdade, y = a – a – d, temos a – a = 0, logo y = – d.. [...]

Os números negativos devem ser considerados abstratamente e concretamente.

1o Abstratamente considerados, os números negativos são resultados necessários da fórmula y = a – x, em certos casos quando é considerado em toda a sua generalidade independentemente dos valores particulares de a e x.

Fazendo abstração de todo valor numérico e examinando somente o efeito produzido pelo número x nas duas fórmulas y = a + x, y = a – x, reconhecemos nos números independentemente de seus valores uma quantidade aumentativa ou diminutiva que se referem exclusivamente aos efeitos diversos que devem produzir os diferentes valores da quantidade x.

Assim, a idéia que devemos fazer da quantidade isolada – d na formula y = a – a – d é a de uma quantidade que tem um efeito diminutivo. Neste sentido abstrato nada há de mais fácil de que a idéia de quantidades negativas, que nada mais são do que resultados necessários da generalização da formação y = a – x, a todos os valores possíveis da variável independente x do que se segue que y toma o caráter de diminuição logo que x > a porque então tomando em x uma parte = a, o que é sempre possível na hipótese presente, teremos a – a = 0 e ficará sempre para subtrair o excedente de x sobre a e assim y vem a representar uma subtração a fazer-se. [...]

2o Concretamente consideradas, as quantidades negativas tem apresentado algumas dificuldades por muito tempo foram consideradas como não sendo susceptíveis de interpretação e por conseqüência eram desprezados como não respondendo as questões que a elas conduzia.

Mas, como diz Cirodde concebemos, com um pouco de reflexão, que temos constantemente a considerar nas quantidades da mesma espécie não somente os seus valores absolutos, mas também o seu modo de existência.

Por exemplo, se um relógio adianta cada dia de 12 segundos e um outro atrasa de 12’’, se um acontecimento teve lugar 200 AC e outro 200 anos depois de Cristo. Concebe-se muito bem que 12’’, 200 anos, são tomados em sentidos diretamente contrários. A ciência das quantidades não

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preencheriam pois senão uma parte do seu fim, se se limitasse a as considerar somente quanto a seus valores absolutos.

[...]

De fato não é possível que uma quantidade seja senão, real ou imaginária e no caso de ser real, racional ou irracional, isto é, susceptível de ser comparado exatamente com a unidade ou não; depois sendo racional deverá ser inteiro ou fracionário, isto é, comparando com a unidade contida uma ou mais vezes, ou pelo contrário, ser nela contida umas poucas de vezes. Enfim, todos estes devem ser considerados como positivos e negativos.

Antônio Moniz iniciou o segundo capitulo abordando um tópico denominado “Da Numeração e das Combinações”, dividido em dois parágrafos. No primeiro parágrafo, o autor tratou da ‘numeração’, isto é, apresentou de modo bem circunstanciado, os diversos sistemas de numeração, afirmando que “o fim da numeração é dar a formação completa de um número, não empregando para a sua construção senão uma quantidade limitada de outros números” e, partindo desta idéia, desenvolveu todo um estudo do sistema de numeração posicional, independente da base adotada.

No segundo parágrafo do segundo capítulo, Antônio Moniz, abordou os problemas de contagem e desenvolveu o estudo do que hoje denominamos de Análise Combinatória. Iniciou esta passagem do seu manuscrito com a definição do conceito de permutação: “Chamam-se permutações os diferentes resultados que se obtém dispondo uns depois de outros e em todas as ordens possíveis um número determinado de objetos (de letras, por exemplo) de modo que todos entrem em cada resultado, e que cada um não entre senão uma vez.”. O conceito seguinte apresentado por Antônio Moniz foi o de arranjo: “chamam-se arranjos, os resultados que se obtém dispondo uma depois das outras e em todas as ordens possíveis 2 a 2, 3 a 3, 4 a 4 e n a n um número m de letras sendo m > n, isto é, o número de letras que entram em cada resultado sendo menor que o número total de letras”. Finalizando o capítulo, o autor abordou a idéia de Combinação, dando a sua definição: “Chamamos Combinações todos os grupos que se obtém dispondo uns após os outros e em todas as ordens possíveis 2 a 2, 3 a 3, 4 a 4,...

um número dado de objetos, de modo que o mesmo objeto entre só uma vez em cada grupo e que dois quaisquer desses grupos diferem pelo menos por um dos objetos que neles entram”.

No terceiro capítulo, o autor mostrou “como se executam as operações aritméticas com quantidades algébricas”. Para ele, as quantidades podiam ser dividas em dois tipos: as numéricas e as algébricas. As primeiras eram representadas por algarismos e tinham um valor “determinado e particular”

e as segundas eram representadas por letras ou letras e números e indicavam um valor desconhecido.

Segundo Antônio Moniz, as quantidades algébricas “são representadas por expressões ou fórmulas, que consistem num complexo de letras ou algarismos reunidos entre si por meio das operações elementares da aritmética e são simples ou derivadas”. Considerava expressões simples as representadas por uma letra, pelo produto ou quociente de duas letras e pelas potências ou raízes de uma letra e expressões derivadas ou compostas as formadas pela combinação de expressões simples. Definiu os monômios como sendo “quantidades apresentadas por uma ou mais letras com seus coeficientes e expoentes” e os

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polinômios como a reunião de dois ou mais monômios não semelhantes5. Após estas definições, trabalhou as operações entre monômios e entre polinômios, encerrando o seu manuscrito.

Escolhi, para efeito de comparação, o compêndio Elementos de Álgebra de Cristiano Ottoni6, cuja primeira edição foi publicada no Rio de Janeiro em 1852 e utilizado, como livro-texto, durante vários anos na Academia de Marinha e no Colégio D. Pedro II. Os conteúdos do livro de Ottoni são: monômios e polinômios, equações e problemas do primeiro grau, equações e problemas do segundo grau, potências e raízes de todos os graus, binômio de Newton, progressões e logaritmos.

Para Ottoni a “Álgebra é a parte das matemáticas em que se empregam sinais próprios para abreviar e generalizar os raciocínios que exige a solução das questões relativas aos números”. Para ele, existiam duas espécies de questões numéricas bem distintas: o teorema, “que tem [tinha] por objeto demonstrar certas propriedades de que gozam os números” e o problema, “cujo fim é [era] determinar o valor de certos números, por meio de outros conhecidos, com os quais conservam aquelas relações definidas pelo enunciado da questão”. Assim como Antonio Moniz, Ottoni também via a Álgebra como uma generalização dos resultados particulares obtidos através da Aritmética porém, além desta vertente, Ottoni via na Álgebra um excelente instrumento para resolver “problemas” diversos com o uso de tiversos tipos de equações.

As obras de Moniz e Ottoni apresentam mais diferenças do que semelhanças em relação aos conteúdos. Enquanto que Ottoni dedicou metade de sua obra ao estudo das equações e problemas do primeiro e segundo graus, Antonio Moniz não dedicou uma linha sequer a este tema na sua obra. Por outro lado, Moniz dedicou metade de sua obra a estudar a formação dos números, segundo o ponto de vista adotado por Comte.

Entretanto, merece destaque a visão de Ottoni relativa aos números negativos, completamente oposta à de Antonio Moniz. Vejamos:

Em um problema do primeiro grau todo o valor negativo da incógnita indica um vicio na expressão das condições, ou na equação que as representa.

[...]

Toda a solução negativa resulta sempre de que o problema e sua equação nos conduzirão a subtrair um número maior de outro menor, operação inexeqüível. A questão pois que dela depende, tal qual foi proposta, não tem solução possível7. [grifo nosso]

Em relação à abordagem, Moniz e Ottoni divergiram. Moniz optou por uma abordagem mais filosófica na sua obra, fazendo uso de axiomas e teoremas, enquanto que Ottoni adotou uma abordagem essencialmente técnica, sem nenhuma ênfase em temas filosóficos.

3. Conclusão

5 Para Antônio Moniz monômios semelhantes são aqueles que tem as mesmas letras, afetados dos mesmos expoentes e que só diferem uns dos outros pelos coeficientes e pelo sinal.

6 Cristiano Benedito Ottoni (1811-1896) é mineiro de Serro. Foi professor de matemática na Academia de Marinha e considerado por Vagner Valente, a página 131 da obra citada na nota n. 7, “um personagem fundamental para a organização e estruturação da matemática escolar no Brasil, durante quase meio século”.

7 OTTONI, Cristiano. Elementos de Álgebra. 3ª ed. Rio de Janeiro: Typographia PERSEVERANÇA. 1872, p. 70-71.

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Talvez, em função de que não fosse um documento matemático que valorizasse excessivamente o uso de técnicas, como comumente ocorria com outras obras, o manuscrito Álgebra apresentou alguns avanços em relação à maioria dos livros escritos no Brasil sobre o mesmo assunto naquela época. Este manuscrito apareceu num momento em que “as matemáticas vão deixando de representar um saber técnico, específico das Academias Militares e vão passar a fazer parte da cultura escolar geral de formação do candidato ao ensino superior” 8 e o livro de Antonio Moniz retratou bem essa situação, reforçando esta mudança de atitude. O seu interesse era no conhecimento matemático como elemento necessário ao bem pensar, ao raciocínio preciso e claro. Ver a matemática segundo um ponto de vista filosófico, inclusive fazendo uso da axiomatização representou um passo à frente naquele momento. No mesmo período na Europa, as discussões a cerca da utilização da axiomática na matemática estavam ganhando corpo, mas nada de definitivo tinha ainda sido estabelecido a respeito deste ponto de vista.

Outro fator de destaque do manuscrito sobre Álgebra, foi o estudo dos números negativos, tópico ignorado pela maioria dos autores brasileiros daquela época, possivelmente em função da complexidade e das dúvidas existentes a respeito de tal conceito. Utilizando uma abordagem parecida com a de Euler, Antonio Moniz expôs o tema considerando as quantidades negativas como uma generalização da idéia de subtração9. Porém, independente de qual seja a sua visão a respeito dos números relativos, as hesitações presentes no seu livro nada mais são do que o retrato de um momento, afinal só no fim do século XIX é que são superadas as controvérsias em torno da existência e sobre as propriedades destes números. Ao abordar um tema controverso em sua obra, Antonio Moniz estava, no mínimo, contribuindo para ampliar a discussão a respeito deste conceito em Salvador. No manuscrito Álgebra, o estudo desenvolvido envolvendo números negativos, frações, números irracionais e números complexos foi muito atual para a época e denotava uma atitude do autor francamente favorável a uma visão mais moderna e filosófica da matemática.

4. Referências Bibliográficas

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4. COMTE, A. Os Pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1978.

5. DIAS, André Luís Mattedi. Engenheiros, Mulheres, Matemáticos: Interesses e disputas na profissionalização da matemática na Bahia (1896 – 1968). Tese de doutoramento, USP, 2002.

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7. OTTONI, Cristiano. Elementos de Álgebra. 3ª ed. Rio de Janeiro: Typographia PERSEVERANÇA. 1872.

8. SILVA, Circe Mary Silva da. A Matemática positivista e sua difusão no Brasil. Vitória: EDUFES, 1999.

9. VALENTE, Vagner Rodrigues. Uma história da Matemática escolar no Brasil, 1730 –1930 .2ª ed. São Paulo: Annablume, 1999.

8 VALENTE, Vagner Rodrigues. Uma História da Matemática Escolar no Brasil (1730-1930). 2ª ed. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2002, p. 119.

9 SILVA, Circe Mary Silva da. A Matemática Positivista e sua difusão no Brasil. EDUFES, Vitória, 1999, p.227.

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A ESTRUTURA DE GRUPO E O ENSINO DA ÁLGEBRA:

INFLUÊNCIAS NO ENSINO DA MATEMÁTICA NO BRASIL NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

João Cláudio Brandemberg Depto. de Matemática/ UFPA brand@ufpa.br Iran Abreu Mendes PPGEd; PPGECIM/ UFRN Iamendes@natal.digi.com.br

Resumo: Neste trabalho apresentamos uma proposta de pesquisa acerca do uso conjunto da história da matemática com a resolução de problemas numa perspectiva de superação das dificuldades encontradas por professores e estudantes de graduação em matemática (licenciatura e bacharelado) no ensino- aprendizagem da Teoria dos Grupos. Acreditamos que um maior conhecimento acerca da origem e desenvolvimento conceitual das estruturas algébricas, como a de Grupo, que hoje é sem dúvida, um dos conceitos fundamentais em matemática, devido sua ligação com a Teoria dos números e com a Geometria (Wussing, 2000), certamente contribuirá para o ensino-aprendizagem da álgebra abordada nesses cursos de graduação. Nosso estudo tem como objetivo buscar alternativas didáticas centradas no uso pedagógico de situações-problema extraídas da história da matemática. Esta abordagem metodológica tem como finalidade principal indicar ao graduando em matemática uma possível contextualização significativa da estrutura de Grupo, além de servir como elemento motivador, diminuindo o impacto do primeiro contato dos estudantes com estas estruturas abstratas.

Apresentação

Hoje, mais do que nunca, vivemos em uma época em que comunicar-se é condição de sobrevivência. Dominar linguagens e conhecer diferentes formas de troca de informações são grandes desafios para a sociedade e, em especial, para a educação. De acordo com as experiências vivenciadas por nós enquanto professores de matemática, observamos que, em geral, a comunicação de conteúdos a serem aprendidos é feita somente pela leitura, escrita e algumas representações específicas (como tabelas e gráficos). Pretendemos discutir este desafio em uma perspectiva construtivista, tendo a história da matemática e a resolução de problemas (problema como ponto de partida) como alternativas para melhorar esta comunicação. Para isso precisamos conhecer a linguagem.

Acreditamos que um maior conhecimento acerca da origem e desenvolvimento conceitual das estruturas algébricas, como a de Grupo, que hoje é sem dúvida, um dos conceitos fundamentais em matemática, devido sua ligação com a Teoria dos números e com a Geometria (Wussing, 2000), certamente facilitará, de forma abrangente e significativa, o processo de ensino-aprendizagem da álgebra abordada nos cursos de licenciatura e bacharelado em matemática.

O objetivo desse estudo é buscar alternativas didáticas que possam minimizar a as dificuldades encontradas no ensino-aprendizagem desse tópico da matemática em turmas de graduação, com o desenvolvimento do conceito da estrutura de Grupo, a partir do uso pedagógico de situações-problema extraídas da história da matemática. Esta abordagem metodológica tem como finalidade principal indicar ao graduando em matemática uma possível contextualização significativa da estrutura de Grupo, além de servir

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como elemento motivador, diminuindo o impacto do primeiro contato dos estudantes com estas estruturas abstratas.

Sobre o estudo e ensino do conceito de estrutura de grupo

A investigação de estruturas não está restrita a matemática. Ela tem conduzido os trabalhos de inúmeros pesquisadores das ciências físicas, naturais e humanas. Na Álgebra, “Estrutura” tem sido um termo familiar. A Estrutura algébrica é definida como um conjunto com uma ou mais operações. Nesta linha temos definições técnicas como a de Tarski (apud SANTANNA, 2004), didáticas como em Van der Waerden (1956) e Herstein (1986) e as de caráter geral como em Piaget (2003).

Definition. A nonempty set G is Said to be a group if in G there is defined an operation * such that:

(a) a,b e G implies that a * b e G. (We describle this by saying that G is closed under * )

(b) Given a, b, c e G, then a * ( b * c ) = ( a * b ) * c. ( This is described by saying that the associative law holds in G.)

(c) There exists a special element e e G such that a * e = e * a = a for all a e G. ( e is called identity or unit element of G).

(d) For every a e G there exists an element b e G such that a * b = b * a = e. ( We write this element b as a-1 and call it the inverse of a in G.) (HERSTEIN, 1986, p.46).

Em todos os textos modernos, a estrutura de Grupo é utilizada para esclarecer e exemplificar a idéia de uma estrutura algébrica; apesar do apelo aos números inteiros ter influenciado alguns autores a trabalhar inicialmente com a estrutura de Anel. Esta nova concepção, estabelecida no século XX, associada a nomes como E. Noether, E. Artin, H. Hasse e Van der Waerden entre outros, foi baseada na identificação de estruturas fundamentais (Wussing, 2000). É a chamada “Álgebra Moderna”, uma nova corrente de estudo e desenvolvimento da Álgebra. De acordo como em Fuchs (1970), foi em seus “Elementos”, na parte referente a Geometria que Euclides começou seu sistema pela formulação de proposições simples dotadas de conteúdo concreto – os axiomas, enquanto Bourbaki em seu elementos de Álgebra, ao contrário, usou as “estruturas básicas”, com características e formulações muito mais abstratas, porém muito mais exatas.

O conceito de Grupo, uma abstração dos chamados “Grupos de permutação” que derivou do desenvolvimento das teorias de E. Galois e da teoria das equações algébricas, principalmente com N. H.

Abel, A. Vandermonde e J. L. Lagrange é trabalhado por Van der Waerden e Hasse como um processo metodológico para o estudo e ensino da Álgebra.

Estudado no final do século XVIII e início do século XIX, com base em casos particulares, somente no final do século XIX é que a noção de Grupo Abstrato foi introduzida e, a partir da primeira metade do século XX, chegou aos livros textos de forma estruturada visando atingir um maior número de iniciantes.

Nos clássicos como Herstein (1970) e Van der Waerden (1956) a definição Grupo é apresentada através do conjunto de todas as aplicações sobre um conjunto não-vazio S, o que por si só, é bastante complicado, independentemente de ser uma das primeiras formas de caracterização do chamado grupo de permutações (simetrias) e determinar com a lei de composição interna a propriedade universal de uma

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estrutura algébrica, no caso Grupo, via isomorfismos de Grupos, diferenciando-se apenas pela forma de representação dos objetos (Sintaxe).

Segundo Herstein (1970), nem a beleza e nem o significado do exemplo escolhido para esta discussão (introdução) de grupos são disputados entre os matemáticos, pois se trata, apenas, de um atributo pedagógico. Um outro recurso é a abordagem finitista dos conceitos envolvidos.

Uma edificação inteiramente ‘ finitista ’ da Álgebra, evitando todas as demonstrações de existência não construtivas é impossível sem grande sacrifício.

Dever-se-ia amputar partes essenciais da Álgebra ou então formular os teoremas com tantas limitações que a exposição se tornaria intragável e certamente inutilizável por principiantes. (VAN DER WAERDEN, 1956, p. vii).

Com relação a este aspecto, o tratamento dado à teoria dos grupos não é finitista, mas, talvez devido ao caráter geral de teoremas fundamentais como o de Lagrange (1736-1813) e os de Sylow (1832- 1918) ou pela “simplicidade“ da estrutura. No entanto, são trabalhados inúmeros exemplos com conjuntos finitos, para evitar a princípio a teoria dos cardinais. Deste modo, a abordagem introdutória da teoria de conjuntos restringe-se às operações elementares.

Para Lins (2001), um tratamento altamente simbólico é dado ao estudo das estruturas algébricas inicialmente com Evariste Galois (1811-1832) e Niels Abel (1802-1829), de forma “implícita”, até Bourbaki (a partir de 1940), quando entramos no domínio do chamado “Cálculo Literal”, mas num sentido bem mais sofisticado, o da sintaxe: um cálculo com regras próprias e ignorantes de qualquer sistema particular que funcione com elas (números, por exemplo). Um mundo, enfim, completamente “abstrato” é estabelecido.

Cria-se um mito de uma matemática no qual o significado é irrelevante e a mesma passa a ser concebida como objeto de estudo, e não mais como ferramenta, perdendo o vínculo com as aplicações e tornando-se pouco compreensível aos alunos. É esta matemática que é introduzida, sobre forte influência da escola francesa, na segunda metade do século XX, nas universidades e em seguida nas escolas brasileiras.

Constitui-se, assim, o modismo da Álgebra.

Para Pais (2001), esta é uma questão de transposição didática no ensino de matemática que não atingiu as metas desejadas, e ampliou alguns problemas do processo ensino-aprendizagem, em particular no caso brasileiro, pois

o movimento da Matemática moderna é um exemplo de transposição didática lato sensu. O contexto inicial desse movimento era muito diferente do que prevaleceu na proposta curricular. O resultado da reforma foi muito diferente da proposta do plano intencional. Acreditava-se que era possível uma abordagem estruturalista para o ensino da Matemática, sendo esta tentativa incrementada com o uso de novas técnicas de ensino, esperando que fosse possível obter uma aprendizagem mais fácil do que a tradicional. Diversas criações didáticas surgiram para tentar viabilizar essa proposta. Este é o caso, dos diagramas de Venn, que de recurso para representação gráfica, passaram a ser ensinados como conteúdo em si mesmo. Nesse caso, as diversas reformulações ocorridas resultaram em

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inversões tão fortes que contribuíram para o fracasso do movimento, conforme análise descrita por Kline (1976).(PAIS, 2001, p 20-21).

A busca por novas alternativas de transposição didática para o ensino da álgebra moderna sugere que tomemos a história da matemática como uma aliada. A aliança didática pode apoiar-se aos problemas contextuais nos quais ocorreu o desenvolvimento histórico da álgebra com vistas a localizar possibilidades pedagógicas que superem as dificuldades encontradas por professores e estudantes de graduação em matemática.

Uma breve história da álgebra

Para seguimos uma linha de desenvolvimento histórico da Álgebra voltada para as mudanças nas

“notações algébricas”, recorremos à Boyer (1993), Eves (2002) e Lins (2001) entre outros. Começando com os babilônios (c. 1700 a. C.), que desenvolveram regras eficientes para a resolução de problemas, embora não tendo desenvolvido notação alguma. Estas notações algébricas aparecem em Diofanto (c. de 250 d.

C.), com a introdução de uma notação para a incógnita e um sinal especial para a igualdade, é a primeira escrita geral de uma equação (notação Sincopada). A sistematização do uso de letras para representar os dados (valores conhecidos) começa com o francês François Viète (1540-1603) com seu trabalho intitulado In artem analyticam isagoge (em1591), em um cálculo em que as letras representam quantidades ou grandezas geométricas que possuem regras próprias, compatíveis com as noções usuais de Aritmética e Geometria. Tendo, supostamente, como último estágio a gênese da noção de Estrutura Algébrica, criada por Evariste Galois (1811-1832) e Niels Abel (1802-1829) e divulgada pelo grupo Bourbaki (a partir de 1940) (Cálculo Literal).

Em seu artigo Ghosts of Diofhantus, de 1987, Eon Harper (apud LINS, 2001) toma a idéia, apresentada por Nesselman em 1842, segundo a qual poderíamos classificar a Álgebra nos seus vários momentos históricos, em Retórica (apenas palavras), Sincopada (alguma notação especial, abreviações) e Simbólica (manipulação de símbolos). Enquanto para Nesselman essa era simplesmente uma postura descritiva, Harper argumenta que de retórico a sincopado e a simbólico haveria um correspondente desenvolvimento intelectual.

O movimento da Matemática Moderna e o ensino da Álgebra no Brasil

Para Miorin (1998), O movimento da Matemática moderna, apresentou uma proposta com base exclusivamente na moderna Matemática em sua forma axiomática desenvolvida pelo grupo Bourbaki, na qual os elementos essenciais eram os conjuntos, as relações e as estruturas. O qual se espalhou, com exceção da Itália e União Soviética, por todo o mundo.

Durante a década de 50, no Brasil as questões relativas ao ensino da Matemática, foram discutidas de forma mais intensa. Em um congresso realizado em 1955, em Salvador-BA, com a participação de instituições de ensino de vários estados brasileiros, ainda estavam presentes algumas das idéias propostas pelo movimento de modernização do início do século. A busca da articulação entre as várias áreas da Matemática entre a Matemática e as outras ciências e a importância de se considerarem elementos da história da Matemática em seu ensino foram algumas delas. Além disso, nomes como Félix Klein (1849- 1925) e outros representantes do movimento foram amplamente citados. Com relação ao conteúdo programático, foi aprovada uma proposta de articulação de várias áreas e eliminação de temas considerados irrelevantes. Um desafio era aprovar um programa “novo”, moldado nas novas tendências,

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mas próximo ao programa em vigor evitando as graves dificuldades, para o processo ensino- aprendizagem, que surgem de mudanças radicais. Foi dessa forma que chegaram inúmeros conceitos matemáticos reformulados as universidades e escolas brasileiras, via sudeste, na segunda metade da década de 70.

Considerações finais

A utilização de textos como Bourbaki (década de 60), Van der Waerden (década de 70) e Herstein (década de 80) garantem e mantém este caráter abstrato da álgebra influenciando os autores nacionais das décadas seguintes, como L. H. Jacy Monteiro, H. Domingues, A . Jones e E. de Alencar Filho entre outros. O excesso de simbolismo e a ausência de significado (aplicações) apresentados nos livros textos (clássicos ou elementares) e, conseqüentemente, nas aulas têm nos levado a respostas incompletas (ou nenhuma), constituindo um dos principais problemas no ensino de graduação em Matemática que é o alto índice de evasão em cursos iniciais de Álgebra. Não devemos esquecer que a Álgebra Simbólica dos textos tem menos de 400 anos.

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VAN DER WAERDEN, B. L. Álgebra moderna .Tradução: Hugo Baptista Ribeiro. Lisboa: 1956.

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QUEM FOI LEWIS CARROL?

*Enio Freire de Paula

*eniodepaula@yahoo.com.br

**Profª Dra. Rita Filomena Januário Bettini

**bettini@prudente.unesp.br Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, SP

Resumo: Poucos conhecem a vida e a obra do matemático inglês Charles Lutwidge (1832-1898), que através dos tempos imortalizou-se por seu pseudônimo: Lewis Carroll. Isso mesmo, Lewis Carroll, o autor de um dos livros infantis mais lidos do mundo, “Alice no país das maravilhas” (1865), sucesso na literatura e no cinema, era matemático. Criou vários jogos (com destaque para a Lógica), além de ser escritor, como ficou mundialmente conhecido. De cunho histórico, este trabalho tem por objetivo apresentar e discutir temas referentes a Carroll. Apresentará-se a criatividade e as contribuições de Lewis Carroll para o mundo dos Enigmas Lógicos. Pode-se considerá-lo como um dos precursores dos jogos envolvendo palavras, conhecidos hoje como palavras cruzadas. Enfatiza-se, porém neste texto uma das criações de Carroll: os

“doublets”. Este ano (2005), marca o centésimo septuagésimo terceiro aniversário de nascimento de Lewis Carroll, e ainda hoje são raras as pessoas que conhecem, sua importância no campo da Lógica aplicada à Educação. Os jogos desenvolvidos por Carroll há mais de um século, exploram o desenvolvimento do raciocínio lógico utilizando-se apenas a linguagem literal. Paradoxos e problemas de lógica matemática (utiliza-se essa linguagem para a referência aos problemas aritméticos), podem ser oferecidos aos alunos em todos os níveis de escolaridade, com seu grau de dificuldade adequado à seriação em questão. Assim os objetivos deste trabalho resumem-se à apresentação e apreciação da vida de Charles Lutwidge Dogdson, nome verdadeiro de Carroll, bem como à discussão de suas obras e por fim oferecendo sugestões para a utilização de seus enigmas lógicos no processo de ensino-aprendizagem da Matemática.

O Legado Carroliano

Durante séculos os educadores ensinaram seus alunos através de estórias e desafios, isto é um fato. Uma prova simples é o Papiro Rhind, datado cerca de 2800 a.C., com mais de 5 metros de comprimento expõe dezenas de problemas matemáticos. Em diversos momentos da história da humanidade a matemática foi abordada através de problemas e desafios, estes eram apresentados de maneira graciosa: o matemático transformava-se em poeta e seus enigmas aritméticos tornavam-se enunciados românticos.

Com o passar dos séculos esta tradição foi esquecida, e os desafios completamente enterrados. O ensino de matemática privou-se das artimanhas dos enigmas lógicos, e os mistérios desconcertantes são pouco discutidos entre alunos e professores. Entretanto, é de extrema importância estimular o cultivo da arte de resolver problemas e despertar o interesse pela Matemática.

Embora apresente um passado um quanto perturbador, Carroll foi um exímio matemático, principalmente no ramo da lógica. Seus trabalhos, talhados à uma linguagem cativante para o público jovem e refinados com doses de humor, renderam-lhe os sucessos de seus livros de enigmas e as diversas colaborações em revistas especializadas, das quais era colunista. Apresentara-se ao, no delinear desta

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obra, os enigmas, tão queridos por Carroll, bem a seu modo: linguagem simples, cativante e objetiva, com sutis toques de humor.

Um dos objetivos deste projeto é proporcionar ao público a oportunidade de inteirar-se de estórias que podem não lhes ter sido contadas, suscitando-lhes, vez ou outra, a pergunta: Por que coisas assim tão belas não me foram contadas antes? Apresenta-se ao leitor alguns dos mais belos (e eternizados) enigmas aritméticos e lógicos, tendo como ferramenta principal de análise o raciocínio lógico. Os problemas a serem abordados aqui, rumam do nível iniciante, passam pelo intermediário até alcançarem um nível de dificuldade maior.

Dará-se início com os jogos de autoria de Lewis Carroll: o doublets, e os criptaritmos. Entre esses jogos apresentar-se-á alguns enigmas lógicos desenvolvidos pelo lógico e matemático contemporâneo Smullyan, conhecido como o “novo Carroll”, envolvendo as estórias de Alice. Espera-se que através desta leitura, dificilmente alguém permaneça indiferente à matemática e seus problemas. Ao invés da aversão inicial, desperte um profundo prazer, dedicando-se ao deleite da satisfação intelectual.

Os Doublets

No início do séc. XVII, os passatempos eram considerados “coisas de mulher”. No século seguinte eram aclamados como “coisas de crianças e adolescentes”. A partir do final do séc. XIX, os adultos passaram a constituir o novo público para os passatempos de lógica, o qual viria a se consolidar no século XX. Parte desta crendice sustentou-se devido às colunas de passatempos publicadas na revista Womans Home Companion (O Companheiro da Mulher do Lar) de autoria do também lógico Loyd.

Carroll desde a infância foi um aficionado pela lógica. Charles Dodgson foi um dos mais distintos professores de Lógica da Universidade de Oxford. Escreveu diversos livros, panfletos e pequenos textos para estudantes sobre Matemática e Lógica dos quais se destacam:

A Syllabus of Plane Algebraic Geometry (1860) ,

The Fifth Book of Euclid Treated Algebraically (1865/1868) Euclid and His Modern Rivals, (1879)

The Game of Logic (1887) Curiosa Mathematica, (1888)

Como autor de passatempos, seu maior sucesso foi o Doublets. Ainda hoje encontrado em revistas de passatempos, na Internet e em livros de matemática, este jogo foi publicado em 29 de março de 1879, nas páginas da revista Vanity Fair. A brincadeira consiste em a partir de uma palavra dada – PONTE, por exemplo – e chegar até uma outra palavra dada como objetivo do jogo – CERCO por exemplo. A regra permite a alteração de apenas uma letra de cada vez na palavra disponível, de modo que esta nova palavra tenha sentido literal

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PONTE PONTO PORTO PERTO CERTO CERTA CERCA

A idéia é simples e preserva traços da lógica formal. Inicialmente tem-se o axioma, o ponto de partida que neste caso é a palavra PONTE. Logo após tem-se as regras que permitem trabalhar o axioma para produzir um resultado lógico, neste caso a mudança de uma letra. Além disso, a noção de prova ou derivação: uma proposição é provada em um sistema axiomático se ela puder ser derivada a partir dos axiomas usando-se as regras da lógica, ou seja, uma fórmula é derivada se esta pode ser obtida por sucessivas aplicações das regras.

Nota-se que neste jogo o significado das palavras é irrelevante. O que importa é o processo de construção para atingir a palavra – objetivo.

Por exemplo, seja o axioma SOL/LUA, qual o melhor caminho?

SOL SOL SAL SUL SUL SUA SUA LUA LUA

É evidente que o caminho melhor, ou seja, a solução mais elegante é à da direita.

Sobre o Ensino de Aritmética

O ensino da aritmética, bem como o ensino da álgebra nas escolas, ocorre através da resolução de várias equações, privadas na maioria das vezes de “um bom enunciado”, ou melhor, de um enunciado

“carroliano”. Carroll propunha o ensino valendo-se de argumentos lógicos e enunciados que cativassem o questionado. São os famosos desafios, muitas vezes acompanhados de uma estória mirabolante, cujo objetivo é entreter enquanto se ensina.

Contudo, no entanto é necessário frisar: o ensino de Matemática não deve restringir-se a jogos.

Estes são apenas mais um dos artifícios para o ensino desta ciência. Seguem alguns enigmas para exemplificar seu uso na Matemática.

Problema 1: O Caso do Joalheiro

“Certo dia, um homem trouxe cinqüenta e nove pedras preciosas para vender ao joalheiro. Algumas delas eram esmeraldas (verdes) e as outras eram rubis (vermelhas). As pedras vinham guardadas em

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