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Aspectos Neuropsiquiátricos do CerebeloNeuropsychiatric Aspects of the Cerebellum

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*ServiçodePsiquiatria,HospitalProf.DoutorFernandoFonseca,EPE;salomexavier@hotmail.com

RESUMO:

Asfunçõesneurológicasdocerebelonaregu- lação do equilíbrio e do movimento são co- nhecidasdesdehálongadata.Noentanto,nas últimasdécadas,apartirdosestudosseminais deSchmahmann,temsidoprogressivamente reconhecidaasuaparticipaçãoemprocessos cognitivoseemocionaisenocomportamento.

Asautoraspretendemreverdeformasumária osprincipaisaspectosdafisiologia“clássica”

docerebelo.Serãodepoisrevistasmaisdeta- lhadamenteasfunçõesneuropsiquiátricasdo cerebeloeasalteraçõescerebelosasencontra- das nas principais patologias psiquiátricas – esquizofrenia,perturbaçãobipolareperturba- çãodepressivamajor.

Palavras-Chave: Cerebelo; Síndrome Cog- nitivo‑Afectiva do Cerebelo; Esquizofrenia;

Perturbação Bipolar; Perturbação Depressiva Major.

ABSTRACT:

The neurological functions of the cerebel- lum regarding the regulation of balance and movement have been known for a long time. In the last decades the cerebellum participation in cognition, emotional pro- cesses and behavior has been progressively

recognized specially due to Schmahmann’s studies.The authors of the current paper will briefly review the main aspects of the cere- bellum’s “classic” physiology. Afterwards, neuro-psychiatric functions and cerebellar alterations in the main psychiatric disorders - schizophrenia, bipolar disorder, major de- pressive disorder - will be reviewed in more detail.

Key-Words: Cerebellum; Cerebellar Cogniti- ve-Affective Syndrome; Schizophrenia; Bipo- lar Disorder; Major Depressive Disorder.

INTRODUÇÃO

O cerebelo tem sido objecto de estudo cien- tíficodesdeháváriosséculos,sendoVesalius um dos primeiros anatomistas a dedicar a sua atenção a este órgão, criticando as des- crições previamente elaboradas por Galeno1. Posteriormente, as descrições anatómicas do cerebelo foram‑se tornando mais finas e de- talhadas.NoiníciodoséculoXIX,experiências emanimaisabriramasportasparaumame- lhor compreensão da fisiologia deste órgão, tendoLuigiRolandoidentificadoossintomas motores específicos que surgem após lesão cerebelosa1.Desdeentão,ocerebelotemsido amplamentereconhecidopelasuafunçãona regulaçãodafunçãomotora.Noentanto,des-

Aspectos Neuropsiquiátricos do Cerebelo

Neuropsychiatric Aspects of the Cerebellum

SaloméXavier*,BertaFerreira*

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deháalgunsanos,têmvindoaserestudadas outras funções cerebelosas. Um conjunto de estudos crescente tem defendido que este ór- gão participa não só em funções cognitivas e afectivas, como também na regulação do comportamento,podendoaindaestarenvolvi- doemváriaspatologiaspsiquiátricas,comoa esquizofrenia,aperturbaçãobipolarouaper- turbaçãodepressivamajor.

FUNÇõES MOTORAS DO CEREBELO Anatomicamente2,ocerebeloestásituadona fossa craniana posterior, inferiormente ao lobooccipital(doqualestáseparadopeloten- torium cerebelli)eposteriormenteaoquarto ventrículo, protuberância emedulla oblon- gata. Macroscopicamente, é constituído por doishemisférios,unidosnalinhamédiapelo vérmis.Ocerebeloestáunidoàfaceposterior dotroncocerebralportrêsconjuntosdefeixes simétricos, os pedúnculos cerebelosos (supe- rior,médioeinferior).Ocerebeloestáainda divididoemtrêslobosprincipais:oanterior,o posterioreofloculo‑nodular.Podeaindacon- siderar‑seumasubdivisãodoshemisfériosem dezlóbulos(IaX),sendoqueoloboanterior engloba os lóbulos I a V, o lobo posterior os lóbulosVIaIXeolobofloculo‑nodularcor- respondeaolóbuloX9.Ovérmis,porsuavez, subdivide‑seemtrêsregiões(V1aV3).

Dopontodevistaanatomo‑funcional3,olobo floculo‑nodular corresponde ao arquicerebe- lo,aporçãofilogeneticamentemaisantigado cerebelo,queparticipanaregulaçãodoequi- líbrioatravésdassuasconexõescomosiste- mavestibular;opaleocerebelocorrespondeà porção anterior dos hemisférios cerebelosos

eaovérmis,eparticipanaregulaçãodemo- vimentos propulsivos e estereotipados, como a marcha. O restante cerebelo corresponde ao neocerebelo, a porção filogeneticamen- te mais recente, envolvida na coordenação dos movimentos finos. Portanto, o cerebelo desempenhaváriasfunçõeschavenaregula- ção motora, nomeadamente, a coordenação dos movimentos voluntários e a regulação doequilíbrioedotónusmuscularatravésdas suas conexões com o sistema vestibular e a espinhal medula. O cerebelo tem uma orga- nizaçãosomatotópica,emqueovérmisregula acoordençãoetónusmuscularaxialeoshe- misférios cerebelosos a musculatura apendi- cular,homolaterais.

Noqueserefereàsemiologianeurológica4,as afecções do cerebelo originam a“síndrome cerebelosa”,quecursacomataxiaehipoto- nia.Aataxiaéosintomafundamentaletem váriasexpressõessemiológicascomosejama disartria, a dismetria, o tremor intencional eaadiadococinésia.Deacordocomassub- divisõesdocerebeloatingidas,podemainda definir‑se subtipos da síndrome cerebelosa, comosejamasíndromevermianaposterior oudoloboflóculo‑nodular,quecursaessen- cialmentecomdesequilíbrioaxial;asíndro- me vermiana anterior ou do lobo anterior, queafectapredominantementeosmembros inferiores, manifestando‑se com marcha de basealargada;asíndromahemisférica,que causa ataxia dos membros, e a síndrome pancerebelosa,emqueossinaisdedisfunção cerebelosasãobilateraiseafectamamarcha, otroncoeosmembros,sendoaindaacom- panhadosdedisartriaealteraçõesdosmovi- mentosoculares.

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FUNÇõES NEUROPSIQUIÁTRICAS DO CEREBELO

A abordagem científica das funções afectivas ecomportamentaisdocerebelofoiessencial- mente desenvolvida com o estudo seminal de Schmahmann e Sherman5. Estes autores estudaram uma amostra de vinte doentes com lesões circunscritas ao cerebelo (AVCs do cerebelo, cerebelite pós‑infecciosa, atro- fia cortical cerebelosa e status pós excisão detumordalinhamédia),tendonotadoum padrão de alterações comportamentais clini- camente relevantes, diagnosticadas através de testes de cabeceira e depois confirmadas na avaliação neuropsicológica. Ao conjunto desintomasobservadoosautoresatribuíram adesignaçãode“síndrome cognitivo-afec- tiva do cerebelo”,quesecaracterizapor1) alteraçõesdafunçãoexecutiva,incluindode- feitosnoplaneamento,set-shifting, raciocínio abstracto, memória de trabalho e fluência verbal; 2) alterações da“cognição espacial”, incluindo “desorganização visuo‑espacial” e compromisso da memória visuo‑espacial; 3) alterações da personalidade, caracterizadas poraplanamentoouembotamentoafectivoe comportamento desinibido ou desadequado;

4)alteraçõesdodiscursoedalinguagem,com disprosódia,agramatismoeanomialigeira.Os autoresdefendemqueoconjuntodescritode alteraçõesexecutivas,espaciais,linguísticase afectivasquedefinemestasíndromeadistin- guemdeoutrassíndromesneurológicas,no- meadamente, dos estados confusionais e das demências,umavezqueavigília,amemória semânticaeremotaestãopreservadaseoutros sintomascorticais–afasia,apraxiaeagnosia

–estãoausentes,eaaprendizagemdenovos conteúdosestáapenasdiscretamenteafectada.

Defendemaindaqueestaconstelaçãoespecí- ficadesintomasétambémdistintadeoutras síndromes sub‑corticais. Observaram ainda que as apresentações neurocomportamentais descritaserammaispronunciadasegenerali- zadasnosdoentescompatologiaextensa,bi- lateral ou pancerebelar, particularmente na- quelescomquadrosclínicosdeinícioagudo, sendo menos evidente nas evoluções insidio- sas,nafasederecuperação(3‑4meses)após AVCsenosdoentescomatingimentodeáreas circunscritasdocerebelo.

Schmahmann5,6desenvolveu o conceito de

“dismetria do pensamento” parailustraro mecanismopropostodesurgimentodesinto- masafectivosecognitivosresultantesdadis- funçãocerebelosa,defendendoque,damesma maneiraqueocerebeloregulaoritmo,força ecoordenaçãofinadosmovimentos,também podeestarenvolvidonaregulaçãodaveloci- dade, capacidade, consistência e adequação dos processos mentais ou cognitivos. Assim, poderia considerar‑se, duma forma lata, que afunçãodocerebeloseriapromoveraharmo- nizaçãodasacçõescomoobjectivoeocontex- toeaavaliaçãodasestratégiasseleccionadas antes e durante um dado comportamento.

Schmahmanncitaoutrosestudoscomoode Ito7queafirmaque,damesmaformaqueo cerebelo tem como função corrigir os erros motores,tambémpoderiaservirparaprevenir, detectarecorrigirerrosdopensamento.

Aindacombasenosresultadosdoseuestu- do5,Schmahmannobservouqueexistiauma relaçãoentreatopografiadaslesõeseascon- sequênciasclínicasobservadas.Assim,olobo

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anterior do cerebelo estaria envolvido no controlomotoreoloboposteriornasfunções nervosassuperiores.Dumaformamaisdeta- lhada, as porções laterais do lobo posterior estariamenvolvidasnasfunçõescognitivase ovérmisnasfunçõesafectivas,sendooequi- valenteaum“cerebelolímbico”.Stoodleye Schmahmann8 reviram as evidências cien- tíficas–estudosanatómicos,deneuro‑ima- gemeachadosclínicos–quesustentamesta

“especializaçãotopográfica”dasfunçõesdo cerebeloeadicotomiaentrefunçõesmoto- rasversusfunçõescognitivaseafectivas.De facto, estudos de neuro‑imagem funcional citados nesta revisão8 mostram que, em in- divíduossaudáveis,oloboanterioreoslobos VIeVIIIestãoenvolvidosemactividadesde processamento motor (movimentos repeti- dos rítmicos, articulação verbal), enquanto queoslóbulosVIeVIIsãoactivadosnalin- guagem, função executiva, tarefas visuais e processamentoafectivo.Estudosrevelam,se- gundoarevisãocitada8,queaespecialização funcionalestarásubjacenteaespecificidades doscircuitoscerebelosos,conformesugerido porestudosfuncionaisdeconectividade,que mostramqueaactividadedolóbuloanterior e parte do lóbulo VI adjacente está corre- lacionado com áreas sensitivo‑motoras do córtex cerebral, ao contrário da actividade do lóbulo VII do lobo posterior, que se cor- relacionacomáreasdeassociaçãodocórtex pré‑frontal, regiões parietais posteriores, girotemporalsuperioregirotemporalmé- dio. Num outro estudo, Schmahmann9 cita umconjuntodeestudosanatómicosdetract tracingquerevelamaexistênciadeviasner- vosasqueligamocerebeloaáreaslímbicas,

autonómicasearegiõesassociativasdocór- tex,oquepermiteaocerebelo“comunicar”

comasáreascerebraisassociadasaoscom- portamentos instintivos, humor e cognição.

Baillieux10, num estudo de revisão relativo ao papel do cerebelo em funções cognitivas específicas,ereferindo‑seàdisfunçãoexecu- tivaassociadaàlesãocerebelosa,citaestudos que evidenciaram importante conectividade fronto‑cerebelosa,subjacenteaansasfecha- dascortico‑cerebelosasqueconectamaface dorso‑lateral do córtex pré‑frontal ao cere- belo via núcleos pônticos. Paralelamente, o cerebeloconectacomocórtexpré‑frontalvia núcleodentadoetálamo.

Portanto,aliteraturarevista8dedadosrelati- vosadoentescompatologiadocerebelomos- tratambémqueasíndromecerebelosa(mo- tora)ocorreprincipalmenteemlesõesdolobo anterior, enquanto que os défices cognitivos sãoconsequênciaessencialmentededanosnos lobosposteriores.Aregiãoposteriordovérmis, porseulado,pareceserumsubstratocrítico paraasmanifestaçõesneuropsiquiátricas.

Recentemente, têm sido descritas alterações neuropsiquiátricas subjacentes à chamada síndrome da fossa posterior11. Trata‑se de uma condição clínica que surge, na maio- ria das vezes, após a ressecção de tumores dafossaposterior,emcrianças,descritopela primeiravezporDaly12.Cursacommutismo, mas pode estar associado a alterações neu- ropsiquiátricas, podendo estas últimas, in- clusive,surgirdeformaisolada11.Baillieuxet al11defendemqueocorremalteraçõescogni- tivaseafectivassignificativasalongoprazo, idênticas à síndrome cognitiva‑afectiva do cerebelonoadulto.

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O PAPEL DO CEREBELO NA PATOLOGIA PSIQUIÁTRICA

Esquizofrenia

Com base na hipótese de que doentes com esquizofrenia manifestavam alterações sub- jacentesa“dismetriacognitiva”,poranoma- lias do cerebelo e outros circuitos cerebrais associados,Andreasen13comparouodesem- penho de amostras de indivíduos saudáveis com indivíduos afectos de esquizofrenia numa tarefa que envolvia a evocação e ex- pressão verbal de informação previamente aprendida(dadoque,segundoosestudosci- tados14,ocórtexpré‑frontaleocerebeloeram activadosduranteessastarefas).Verificou‑se queosdoentescomesquizofreniaapresenta- vam diminuição do fluxo nas regiões fron- to‑talamico‑cerebelosas, bem como na área motora do hemisfério esquerdo, concluindo queodéficedestecircuitoeraumaspectore- levantenaesquizofrenia.Assim,a“dismetria cognitiva”,definidacomumadificuldadeem coordenaremonitorizaroprocessoderecep- ção,processamento,evocaçãoeexpressãoda informação,poderiaexplicarváriossintomas daesquizofrenia13.

Paralelamente,umconjuntocrescentedees- tudos de neuro‑imagiologia estrutural14, foi evidenciandoapresençadeatrofiadocerebelo naesquizofrenia,comalgunsdelesamostrar atrofialimitadaaovérmis,outrosdiminuição global do volume do cerebelo (que estaria especificamente associada a danos cerebrais peri‑natais, esquizofrenia no homem, esqui- zofreniacominícionainfância,esquizofrenia deiníciotardioeesquizofreniacrónica).Ape- sardeexistiremestudosquenãocorroborama

existênciadeatrofiacerebelosanaesquizofre- nia,amaioriadosestudosépositivoaesteres- peito14.Grasbyet al15mostraramquemesmo familiaresemprimeirograudedoentescom esquizofrenia, sem manifestações clínicas da doença, apresentavam reduções do volume cerebeloso. Venkatasubramanian16, recorren- do a técnicas devoxel-based morphometry, demonstroutambémqueadiminuiçãodovo- lumedesubstânciacinzentadocerebelo(bem comodaregiãofrontalegirocingulado)apre- sentava uma significativa correlação inversa comossintomasnegativosdaesquizofrenia.

Vários estudos de neuro‑imagiologia funcio- nal17têmmostradoumadiminuiçãorelativa dofluxosanguíneonocerebelonumamplole- quedetarefascognitivas–memória,atenção, cogniçãosocial,emoção.Alteraçõesaníveldo vérmissãomaisfrequentementenotadasem tarefasassociadasàestimulaçãoderegiõesdo sistemalímbico,enquantoqueasregiõesmais externasdoneocerebeloapresentamumafun- çãoanormalemtarefasassociadasàestimu- laçãoderegiõesneocorticais(porexemplo,a memória)17.

Estão descritas também várias alterações ce- lulares a nível do cerebelo na esquizofrenia, desde alterações da cito‑arquitectura até al- teraçõessubcelulares,quetraduzemdeficente formaçãodesinapses14.

Finalmente, há a destacar que vários dos si- nais neurológicos minor frequentemente presentesnaesquizofrenia–ligeiraataxiada marcha,dificuldadesnacoordenaçãofinados movimentos,disdiadococinésia,tremorinten- cionalligeiro,dismetriadosmovimentosocu- laressacádicos–sãotambémelessugestivos dedisfunçãocerebelosa18.

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Perturbação Bipolar

Vários estudos têm evidenciado atrofia do cerebelo e redução da substância cinzenta cerebelosa na perturbação bipolar19. Del Belloet al20 não demonstraram diferenças morfológicasgrosseirasemindivíduoscom perturbação bipolar quando comparados com voluntários saudáveis. No entanto, ao subdividir a amostra de doentes com per- turbação bipolar em doentes com episódio maníacoinauguraledoentescomepisódios maníacosmúltiplos,osinvestigadoresveri- ficaram que a subregião V3 do vérmis era significativamente menor nos indivíduos commúltiplosepisódios,sendoonúmerode episódiosdepressivospréviosenãooconsu- modesubstânciascomórbidoouaduração da terapêutica com lítio a contribuir para essa diferença. Mills21 replicou estes acha- dosedescobriuqueasubregiãoV2dovér- mistambémapresentavaumvolumemenor em indivíduos com múltiplos episódios de doença. Estes dados sugerem que o vérmis sofreatrofiacomaevoluçãodaperturbação bipolar22.Numestudorecente,Baldaçaraet al19avaliaramporRMovolumecerebeloso numaamostradedoentescomperturbação bipolartipoIemeutimiaesemoutrasco‑

morbilidades, tendo confirmado a redução do volume do cerebelo nestes doentes. Os autoresnãoencontraramqualquercorrela- çãoentreovolumedocerebeloenúmerode tentativasdesuicídioprévias.

Dopontodevistafuncional,váriosestudos14 têmevidenciadoumadiminuiçãorelativado fluxosanguíneocerebeloso,comparativamen- te a indivíduos saudáveis, sendo o vérmis a regiãomaisafectada.Curiosamente,segundo

Loebneret al23, sob medicação com antipsi- cóticos atípicos, parece existir uma reversão destepadrão.

Dada a heterogeneidade clínica da pertur- bação bipolar, a existência de estudos com resultados potencialmente contraditórios e a elevadacomorbilidadecomoabusoedepen- dência de álcool na perturbação bipolar14,17, osachadosrelativosàsalteraçõesdocerebelo nestapatologiadevemserinterpretadoscom cautela.Poroutrolado,ocerebelotemsidojá integrado em modelos científicos que defen- demqueasperturbaçõesdohumorsecorrela- cionamcomadisfunçãodecircuitoscerebrais que envolvem o córtex pré‑frontal, gânglios basais,osistemalímbicoeocerebelo,sendo atribuída ao cerebelo, em conjunto com o córtexpré‑frontal,umainfluênciaregulatória sobreohumor24.

Perturbação Depressiva Major

Adiminuiçãodovolumedocerebelotemsido descrita, embora não de uma forma consis- tente15. No entanto, segundo Pillayet al25, a atrofia cerebelar está presente em doentes comformasdedepressãomaisseveraecom pior resposta à terapêutica. Já Penget al26 demonstraram, num estudo com técnicas de voxel-based morfometry, uma diminuição da substância cinzenta do córtex cerebeloso, àesquerda.

Liottiet al27,numestudofuncional,demons- trou que na depressão major ocorria uma menor activação do cerebelo, comparativa- menteaindivíduossemdoença,faceaestí- mulos emocionais. Mesmo indivíduos com história prévia de depressão major, mas já emremissão,exibiamumamenoractivação

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cerebelosa face à antecipação de estímu- los nocivos, o que sugere uma perturbação permanente e irreversível da função do ce- rebelonaperturbaçãodepressivamajor28. A diminuiçãodaactivaçãodocerebeloparece coexistircomumaumentotónicodaactivi- dade14.

Éderealçarqueosestudosrelativosàsalte- rações estruturais e funcionais do cerebelo nadepressãomajorsãoaindaescassos,oque obriga a reserva nas interpretações14. No en- tanto,ocerebelotemsidoreconhecidocomo tendo uma função importante na regulação dohumor,dadasassuasconexõesestratégicas aáreascorticaiselímbicas,eprovavelmente desempenhará um papel importante na per- cepçãodosestímulosemocionais29.

CONCLUSõES

Ocerebelotemsidoalvorecentedeestudos queilustrameexploramoseupapelnaregu- laçãodosafectos,cogniçãoecomportamen- to.Àsemelhançadoqueseverificounopas- sado relativamente ao estudo da patologia dosgângliosdabase,estáaassistir‑seàcria- çãodumnovoparadigmaneuropsiquiátrico, em detrimento do paradigma puramente neurológico,clássico.Assim,nãosótemsido expandida a constelação de sintomas asso- ciados a patologia cerebelosa, como se tem verificado a existência de anomalias do ce- rebelo em várias das principais patologias psiquiátricas.Assim,podemosconsiderarque os desafios futuros colocados por este novo paradigmaconsistemnãosónoaprofunda- mentodoconhecimentocientíficomastam-

bém,eemgrandemedida,nasuaaplicação napráticaclínicaquotidiana.

Conflitos de Interesse / Conflicting Interests:

Osautoresdeclaramnãoternenhumconflitode interessesrelativamenteaopresenteartigo.

The authors have declared no competing inter- ests exist.

Fontes de Financiamento / Funding:

Não existiram fontes externas de financiamento paraarealizaçãodesteartigo.

The author have declared no external funding was received for this study.

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Referências

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