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ARBITRAGEM E JURISDIÇÃO E SEU PAPEL NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO — BREVES CONSIDERAÇÕES

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A R B I T R A G E M E JURISDIÇÃO E S E U PAPEL N O C O N T E X T O D A G L O B A L I Z A Ç Ã O —

B R E V E S C O N S I D E R A Ç Õ E S

C L Á U D I A D A L L ’A N T O N I A n

I. I N T R O D U Ç Ã O

0 objetivo do presente estudo não é a análise exaustiva d o f e n ô m e n o c h a m a d o globalização, mas, sim, o d e fazer u m a a b o r d a g e m de sua influên­

cia na sociedade e n a ciência d o Direito.

A globalização teve c o m o m a r c o inicial e elemento propulsor para seu crescimento: a evolução das tecnologias d e informação, n o m e a d a m e n t e a das telecomunicações, levando-nos ao redimensionamento dos conceitos d e espaço e tempo, a e c onomias nacionais interdependentes, competição internacional e m u d a n ç a s tecnológicas intensivas dentro de u m período de t e m p o c a d a v e z m a i s curto.

Para u m a melhor c o m p r e e n s ã o dessa radical conjugação de m u d a n ­ ças verificadas nos últimos tempos, é importante ressaltar q u e a globaliza­

ção n ão se trata de u m conceito exclusivamente ligado à informação e à e c o n o m i a ou à s extensões de sistemas e grandes instituições mundiais, pois atinge t a m b é m a vida social e individual.

E s s a nova sociedade d e inovação permanente, caracterizada pela informação, especialmente pela informação e m t e m p o real e avanços tec­

nológicos c a d a vez mais surpreendentes, impõe mutações nas mais diver­

sas esferas d a sociedade. A complexidade passa a ser u m a constante e m nossas vidas, exigindo atenção e espírito crítico para assimilarmos o u re­

futarmos as c h a m a d a s regras do jogo q u e nos são impostas perante situa­

ções elementares d o nosso quotidiano.

O impacto d o f e n ô m e n o globalizador na sociedade e m permanente m u t a ç ã o produz efeitos no m u n d o das ciências jurídicas, i m p o n d o aos le-

(') D o u t o r a n d a pela Fac u l d a d e d e Direito d a Universidade d e Coimbra. Trabalhos realizados s o b a orientação d o Prof. Doutor F e r n a n d o Alves Correia e eo-orientação d o Prof. D outor M a n u e l Henr i q u e Mesquita, pesquisa subsidiada peta F C T — F u n d a ç ã o para a Ciência e a Tecnologia (Ministérios d a Ciência e d a Tecnologia), Portugal.

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gisladores u m a tarefa hercúlea, a d e regular as inovações trazidas pelas novas tecnologias nas mais diversas áreas. Entretanto, c o m o a modifica­

ção e atualização das n o r m a s n ã o s e d ã o c o m a rapidez dos acontecimen­

tos, ao legislador ca b e a tarefa d e suprir e adaptar conceitos Indetermina- dos''1 2 3 4 e imprecisos n a tentativa d e u m a racionalização ideológica q u e ate­

n u e o ôn u s d a globalização e sirva de suporte de integração d o Direito e das novas tecnologias.

A adaptação a esta nova sociedade global, complexa, t a m b é m d e n o ­ mi n a d a d e sociedade pós-industrial, pós-moderna, d e informação, d e c o ­ nhecimento, d e risco'21, m a r c a d a pela "incerteza fabricada”*31, dentre outras qualificações q u e lhe são atribuídas, se faz necessária não só no sentido d e abertura para u m a integração entre a s nações, m a s t a m b é m n u m movi­

m e n t o de preservação e proteção dos Estados*41, o q u e se d á sob u m a nova vestimenta, pois se a supressão d e fronteiras traz os benefícios d a internacionalização das relações contratuais, d e produção, comerciais, d e difusão d e informação, e m contrapartida, acentua os riscos inerentes a essa abertura, n o m e a d a m e n t e a poluição e os desastres ecológicos, os perigos da perpetuação do crime organizado, q u e t a m b é m encontraram maior per­

meabilidade c o m a globalização.

II. R E F L E X O N O D I R E I T O I N T E R N O

A s m u d a n ç a s q u e se constatam n o plano internacional a p o n t a m para a substituição d e conceitos e m é t o d o s excessivamente nacionalistas e pro­

tecionistas por aqueles ditos “permeáveis” ao m u n d o globalizado. Assim, poderíamos dizer q u e e stamos a caminhar para u m f e n ô m e n o d e d e s n a ­ cionalização dos Estados e consequente internacionalização das relações, e xemplo cristalino é a formação d e blocos regionais c o m o a União Euro­

péia, N A F T A , Mercosul, etc., o n d e se busca u m a Integração e c onômica e legislativa q u e afeta diretamente o direito interno d e ca d a Estado.

(1) Trai a m o s aqui d e conceito indeterminado, conceito v a g o o u conceito fluido c o m o aquele q u e n a esfera d o Oireito Administrativo reflete o exercício d o Poder Discricionário n a interpretação d e tais conceitos pela Administração. N o âmbito d o Direito Constitucional, a o tratar d o t e m a é assinalado que, e m s e tratando d e conceito jurídico indeterminado, caberá a o juiz concretizar o conceito c o m o é c a s o d o conceito d e b o n s costumes, d e o r d e m pública, estado d e necessidade e tantos outros.

Para u m maior aprofundamento sobre o tema, p o d e m o s citar Ntcklas L u h m a n n e RafaelleDe Giorgi;

j.j. G o m e s Canotilho; Sdoardo Garcia de Enterria; José Carlos Barbosa Moreira; Celso Antônio Bandeira de Mello, dentre tantos outros q u e a b o r d a m o t e m a n o s mais diversos r a m o s d o Direito.

(2) Beck, Ulrich. “La sociedad dei riesgo — Hacia u n a nuevamodernidad", trad. Jorge Navarro, Daniel J i m é n e s e M " R o s a Sorrás, 1 a edicion, Barcelona, 1998.

(3) Giddens, Anitmy. “M u n d o e m Descontrole: O q u e a globalização está fazendo d e nós", trad.

Maria Luiza d e Borges, Ed. Record, 1999.

(4) Importante ressaltar q u e o conceito d e E s tado nação, originado h á cinco séculos, está a ser enlraquecldo c o m o proc e s s o d e globalização. É certo q u e c a m i n h a m o s para o enfraquecimento d o s E s t ados nacionais, s e n d o estes matizados por n o v o s conceitos e funções e gradativamente c e d e n d o e s p a ç o a instituições supranacionais. C o m a forma ç ã o d o s m e r c a d o s regionais o u inter­

continentais e interdependência entre eles, assentam-se a s b a s e s para o s futuros gove r n o s trans- nacionais que, provavelmente, servirão c o m o unidades federativas d e u m a administração m u n ­ dial a ser constituída.

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E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 69

N ã o se trata aquí d e teorizar sobre as dramáticas m u d a n ç a s e m v á ­ rios s e g m e n t o s d a vida social acarretadas pelas novas tecnologias e o cres­

cente determinismo econômico, já q u e os primeiros efeitos d a globalização são percebidos na e c o n o m i a 15’, m a s sim de sintetizar essas m u d a n ç a s e dar enfoque às relações jurídicas, especialmente aquelas q u e envolvam direitos disponíveis e a predominância d a livre manifestação d e vontade, abordando formas alternativas d e solução de conflitos delas originadas.

N ã o só diante d a multipilcação das relações h u m a n a s e comerciais devido a o processo globalizador, m a s t a m b é m e m virtude d a s relações preexistentes a ele, os ordenamentos jurídicos nacionais e internacionais c l a m a v a m por meios mais eficazes e céleres d e resolução de conflitos.

O Estado, detentor d o monopólio jurisdicional, o Estado providência, encarregado d e assumir para si certas funções essenciais ligadas à vida e desenvolvimento d a n a ç ã o e dos Indivíduos q u e a c o m p õ e m , tornou-se Ine­

ficaz na tarefa d a prestação jurisdicional. O p e q u e n o n ú m e r o d e juízes para o crescente volume d e d e m a n d a s , a complexidade das causas sub judice, exigindo u m a especialização c a d a vez maior d o julgador sobre matérias n ã o jurídicas, o próprio sistema recursal vigente, são fatores Impeditivos d a satisfação quanto a o provimento jurisdicional, n ã o raro tardio, o que a c a b a por frustrar o jurisdicionado, revelando a insuficiência d o aparato estatal na solução célere de determinados conflitos ou ainda na cognição d o objeto e m questão.

Certamente não h á u m a fórmula simples para as curas dos males q u e sofre o Poder Judiciário Estatal. Por outro lado, a ausência d e controle estatai perante a jurisdição seria o caos total. Entretanto, existe u m a g a m a d e litígios q u e p o d e m e d e v e m estar fora das malhas d a jurisdição estatal, p o r é m c o m a possibilidade d e socorrer-se deia, qua n d o necessário. Tratam- s e d a s d e m a n d a s q u e envolvam p essoas maiores e capazes e q u e t e n h a m por objeto direitos disponíveis, n o m e a d a m e n t e direitos patrimoniais.

Tais questões p o d e m adotar a via das formas alternativas de solução d e conflitos — ADR's — Alternativa Dispute Resolution, utilizando-se da conciliação, m e d i a ç ã o e arbitragem para dirimir o s litígios. É importante ressaltar que, ao contrário d o que muitos autores afirmam, as A D R ’s não serão a solução para desafogar a jurisdição estatal do grande n ú m e r o de ca u s a s para julgamento, m a s certamente permitirão ao Estado u m maior e melhor d e s e m p e n h o quanto à função d e ater-se a questões basilares da sociedade, tratando c o m exclusividade dos direitos c h a m a d o s indisponí­

veis e permitindo que, e m se tratando d e direitos disponíveis, especialmen­

te n o q u e diz respeito aos direitos patrimoniais, seja possível a o p ç ã o do jurisdicionado recorrer à justiça estatal o u à justiça privada. ( S )

(S) O processo d e globalização, entendido c o m o integração e interdependência econômica, inte­

g ração e c o o p e r a ç ã o entre nações, r e m o n t a à era d o s descobrimentos, p a s s a n d o a o longo d a histdria por diversas fases d o Imperialismo colonialista, revolução industrial, a s g r a ndes guerras mundiais, a s divisões m a r c a d a s pela política. Hoje. o f e n ô m e n o d a globalização a s s u m i u a s p e c ­ tos ideológicos q u e a p o n t a m a s b e n e s s e s d e s s e proc e s s o c o m o a s inquietações d o i m p a d o globalizador, especialmente n a s sociedades m e n o s abastadas.

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Restringindo o enfoque d o t e m a para o c a m p o contratual e obrigacio- nal, a tendência mundial está s e n d o a de incentivar a a d o ç ã o d e meios alternativos extrajudiciais de solução de conflitos, q u a n d o a matéria versar sobre direitos patrimoniais disponíveis.

N ã o e s t a m o s diante de u m a inovação jurídica, pois a s formas alter­

nativas de solução d e conflitos d a t a m d e períodos anteriores à formação do Estado, tal c o m o conhecemos. A prestação da tutela jurídica pelo Estado q u e estabeleceu a Justiça Estatal oficialmente prestada, data do séc. II d.C.

c o m a introdução pelos r o m a n o s d a cognitio extra ordinem n o incipiente processo r o m a n o para solução d e litígios. Até então, tal atividade era exercida pelo árbitro livremente escolhido pelas partes, q u e a ele se apre­

s e n t a v a m para narrar os acontecimentos e aguardar o veridictum.

Verifica-se, então, q u e a solução de conflitos pela via arbitrai é mais antiga q u e a prestação da tutela pelo Estado.

C o m a formação dos primeiros Estados Nacionais (Áustria, séc. X e Portugal, séc. XII), surgiram dúvidas relativas à aplicação de regras locais e m relação aos estrangeiros, especialmente no c a m p o das disputas c o m e r ­ ciais e mercantis, a solução encontrada era a aplicação d a lex mercatoria, fundada e m usos e co s t u m e s locais e n ã o escritos de ca d a região que gradativamente foram incorporados às disciplinas jurídicas d e ca d a país, a lex forí.

Entretanto, a predominância d e u m garantismo legislativo constitui u m obstáculo a ser superado. O s ordenamentos jurídicos se viram diante de u m a proliferação d e normas, bu s c a n d o tutelar o s mais diversos be n s e garantir a o m á x i m o a estabilidade das relações jurídicas, porém, s e m tra­

zer a satisfação jurisdicional pretendida aos conflitos e m razão d a inter­

ve n ç ã o e protagonismo d e s m e s u r a d o d a tutela jurisdicional, especialmen­

te nas situações singulares inerentes às relações entre contratantes, que c o m o já foi dito, atualmente estão a tornar-se ca d a vez mais dinâmicas.

N a busca d e resultados mais céleres para os conflitos, t e m o s a valori­

zação d a arbitragem n o plano do direito interno c o m o alternativa a o pro­

cesso jurisdicional estatal. N ã o s e tratava d e u m instituto novo, c o m o já foi dito, pois já era utilizado anteriormente à instalação do poder jurisdicional estatal, pelos gregos e romanos, entretanto, durante a era m o d e r n a foi e m p r e g a d a q u a s e q u e c o m exclusividade pelo comércio internacional.

N a s últimas décadas foi outorgada u m a maior credibilidade e divul­

g a ç ã o para os sistemas d e auto-regulação d e conflitos e soluções n ã o ju­

risdicional d e controvérsias. Verifica-se u m a maior flexibilidade no siste­

m a 16’ e reconhecimento da ampliação dos poderes dos titulares da autono­

mia d a vontade. 6

(6) E s s a flexibilização importa n u m a desregulação por parte d o P o d e r Estatal. A s funções d e regulação d o E stado surgiram historicamente d a necessidade d e intervenção estatal para a cor­

reção d o s desequilíbrios g e r ados pelo desenvolvimento econômico. Politicamente, o exercício d a f u nção d e regulação assenta-se n a premissa d e q u e o E stado é o representante d o interesse d o tecido social, legitimado n u m contrato social e m q u e o E s t a d o a s s u m a a responsabilidade d e assegurar u m a organização sustentável e justa d a sociedade. A idéia d e contrato social teve

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E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 71

Verifica-se ainda q u e a intervenção judicial, restrita a o plano jurídico q u a n d o d a análise do caso concreto, n ã o raro demonstra u m a certa insen­

sibilidade às repercussões econômicas de suas decisões, o q u e no quadro atual passa a apresentar u m grande perigo no q u e tange aos efeitos jurídi­

cos q u e se p o s s a m gerar a terceiros e a o corpo social. Desta feita, a movi­

m e n t a ç ã o no sentido d e se recuperar valores c o m o eficiência e celeridade processual s e v ê concretizada no procedimento arbitrai.

A possibilidade d e julgamento, seja de direito o u de equidade, atuan­

d o o árbitro o u colégio arbitrai de forma a equilibrar as vitórias d e c a d a u m a das partes, d e m o d o a solucionar o conflito da forma m e n o s traumática e dispendiosa é certamente mais u m dos vários atrativos d a arbitragem; ao p a s s o q u e o juiz, prisioneiro d o direito e d a argumentação jurídica, por vezes n ã o possui argumentos suficientes para flexibilizar a decisão e vi­

sualizar seus efeitos.

Ili. A S P E C T O S R E L E V A N T E S S O B R E A A R B I T R A G E M

Dentre os aspectos positivos q u e se verificam n a utilização d a arbi­

tragem p o d e m o s destacar: a) u m a maior flexibilidade quanto a o procedi­

m e n t o e ao direito aplicado na resolução d o conflito, pois as partes t ê m a liberdade d e pactuar sobre o direito aplicável e o procedimento; b) inten­

sa dedicação do árbitro à causa, obtendo-se maior celeridade n a obten­

ção d o resultado final; c) maior liberdade do árbitro n a con d u ç ã o e decisão d o processo, possibilitando a valoração e o "equilíbrio" às questões não só do ponto d e vista jurídico, m a s igualmente ponderar distintos proble­

m a s litigiosos, c o m o a r e p e r c u s s ã o e c o n ô m i c a e sociai d a decisão;

d) maior tecnicidade n o julgamento, pois o árbitro possui conhecimentos técnicos específicos sobre o objeto da controvérsia, trata-se d e u m juiz c o m formação específica para o julgamento e m causa; e) confidencialidade (sigilo) n o procedimento, através da possibilidade de restrição d a discus­

são s o m e n t e entre as partes e o julgador, h á a segurança d e se discutir questões extr e m a m e n t e particulares dos litigantes, v.g. segredos indus­

triais, ma r c a s e patentes, além d e preservar a integridade e b o m n o m e das partes nos m e i o s comerciais; f) internacionalidade, ensejando u m n ú m e ­ ro maior d e casos, p o d e n d o ser resolvidos por esta modalidade de solu­

ç ã o pacífica d e conflitos; g) liberdade às partes na escolha d e pessoa c a p a z e d e s u a confiança para a arbitragem, por tratar-se de “justiça de técnicos"; h) e c o n o m i a processual e m razão d a a d o ç ã o d e u m procedi­

m e n t o m e n o s formalista, afastando-se das e n g r enagens burocráticas que

inicio n o séc. XVII, c o m b a s e n o p e n s a m e n t o d e John Locke e desenvolvida por Jean Jacques Rousseau n o séc. XVIII. Estas idéias loram a b a s e d o s princípios orientadores d a construção d a ideologia reformista e social n o decurso d o séc. XIX. Verilica-se, então, o início d a f unção regula­

dora d o Estado, n o m e a d a m e n t e n a s questões d e o r d e m social. A intervenção reguladora d o E s ­ tado toi desenvolvida pelos acontecimentos políticos e sociais, entretanto, s u a a t u ação n ã o p o d e restringir-se a u m a posição radical c o m o a d o "Estado Mínimo", m a s t a m b é m n ã o p o d e alastrar­

s e pelos m e a n d r o s d a s relações particulares q u e v e r s e m sobre direitos disponíveis.

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revestem o procedimento judicial; i) efetividade do m e i o e m p r e g a d o na c o m p o s i ç ã o d a lide, pois al é m d o c o m p r o m i s s o d a s partes d e s e s u b m e ­ terem a o resultado d a arbitragem, h á equiparação d a decisão arbitrai à sentença judicial {título executivo judiclal)(7).

O grande atrativo d o procedimento arbitrai s e m dúvida a l g u m a é a celeridade, por não imperar qualquer formalismo o u burocracia quanto aos atos d e comunicação, lançando-se m ã o dos meios de c o m u nicação tradi­

cionais c o m o a correspondência postada nos correios, c o m o dos meios mais modernos, c o m o fax e Internet, dispensando-se a utilização das cartas pre­

catórias e rogatórias.

Ainda q u e diante das várias vantagens q u e se p ossa enumerar, a arbitragem encontra grande resistência e m sua divulgação e aplicação exa­

tamente por esbarrar n u m dos pilares d o poder d o Estado, o poder de ditar a n o r m a aplicável ao caso concreto, preservando assim o monopólio d a sanção e pacificação social.

iV. A R B I T R A G E M E O M O N O P O L I O J U R J S D I C I O N A L E S T A T A L

N ã o é recente a discussão q u e envolve partidários da arbitragem e defensores d o monopólio jurisdicional do Estado. O debate transcende meras elucubrações teoréticas e acadêmicas, u m a vez q u e gera consequências nos limites de atuação d o Estado e n a utilização d a arbitragem.

A o passo q u e os opositores d a arbitragem b u s c a m afastar esse meio d e resolução extrajudicial d e conflitos sob os mais diversos argumentos, n o m e a d a m e n t e tratar-se d e u m a verdadeira privatização da justiça c o m a institucionaiização d a h e g e m o n i a do poder e c onômico e m detrimento da cidadania e das garantias d a magistratura, n u m a posição nitidamente pre­

conceituosa, avessa à modernidade, resistente às m u d a n ç a s inevitáveis q u e d e s p o n t a m d e u m a sociedade e m processo de globalização.

E m nosso singelo entendimento, o temor pelo procedimento arbitrai s e assenta e m du a s proposições essenciais a s e r e m abordadas: A) a ju- risdicionalidade o u n ã o d a arbitragem; B) o sigilo q u e reveste o procedi­

m e n t o arbitrai e m razão d a executoriedade da decisão e m a n a d a d o juízo arbitrai. * l o ,

(7) N o presente trabalho n ã o a b o r d a r e m o s d e t a l h adamente o procedimento d a arbitragem, seja ela regida por n o r m a s internas o u por tratados internacionais, entretanto é conveniente observar q u e a decisão arbitrai, e m b o r a revestida d e todos o s eleitos d e u m a sentença judicial, vinculando a s partes d o s e u c u m p r i m e n t o s o b p e n a d e execução, é passível d e ser a n u lada através d e a ç ã o d e anul a ç ã o pelo P o d e r Judiciário ou, ainda, n o m o m e n t o d e s u a execução, lhe s e r e m opostos e m b a r g o s à e x e c u ç ã o n a tentativa d e descaracterizá-la c o m o título executivo judicial. Para maior a p r o i u n d a m e n t o n a matéria: Carlos Alberto Carmona, " A Arbitragem n o Proc e s s o Civil', S ã o P a u ­ lo, Maiheiros, 1993; Paula Cosia e Silva, " O s M e i o s d e I m p u g n a ç ã o d e Deci s õ e s Proferidas e m Arbitragem Voluntária n o Direito Interno Portugués”, Revista d a O r d e m d o s A d v o g a d o s . Lisboa, janeiro/1996; Paula Cosia e Silva. "Anulação e R e c u r s o s d a D e c isão Arbitrai", Revista d a O r d e m d o s A d v o g a d o s . Lisboa, junho/1992.

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E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 73

A) A jurisdicionalidade o u n a o d a arbitragem

Provavelmente o ponto mais controvertido sobre a matéria é justa­

m e n t e a discussão de o procedimento arbitral se revestir d o caráter jurisdl- cionai ou não. Primeiramente é necessário delimitar a natureza jurídica da arbitragem e seu conceito, para ao final concluir pela jurisdicionalidade ou n ã o d o instituto, entretanto n ã o se trata d e u m a tarefa fácil, s e n d o q u e o debate sobre a natureza jurídica d a arbitragem se prolonga d e s d e fins do século passado, e m razão dos interesses políticos q u e circundam o tema.

Partindo d a premissa q u e o a u m e n t o d a complexidade d a sociedade exige q u e seus institutos sofram alguns ajustes, e m b o r a n ã o t e n h a m o s a pretensão d e formar u m conceito hermético d e jurisdição, é necessário que f açamos a l g u m a s reflexões sobre o instituto, pois, se a arbitragem é mati­

zada pela jurisdicionalidade, c o m o pretendemos demonstrar, esse é u m ponto determinante a ser abordado e m razão de se tratar d e u m ponto fundamental quanto aos efeitos produzidos pela decisão arbitrai.

D e u m lado encontramos a corrente contratualista, d e cunho privatista, s e g u n d o a qual o instituto d a arbitragem t e m por origem u m a obrigação criada por contrato, atribuindo-ihe a natureza aos efeitos d os pactos e m geral. O s adeptos desse entendimento afirmam q u e s e m c o n v e n ç ã o d e arbitragem (cláusula compromissória e compromisso) inexistirá o procedi­

m e n t o arbitrai, e m razão d a arbitragem originar-se n a ilvre manifestação de vontade, posto q u e a convenção de arbitragem t e m por ba s e o consenso entre as partes.

D o outro lado, os adeptos do jurisdicionalismo, seguidores d e u m a Idéia publicista d o processo, q u e atestam a natureza jurisdicional d a arbi­

tragem, sustentando sua equivalência c o m a função d o juiz estatal. Essa linha d e p e n s a m e n t o t e m seus estudos voltados aos elementos constituti­

vos do conceito de jurisdição, assinalando a atividade d o árbitro, não obs­

tante s e r e m n o m e a d o s por particulares, c o m o u m a atividade revestida de responsabilidades análogas às dos juízes d e Direito, sendo s ua decisão equivalente à sentença proferida no processo d e conhecimento, n ã o i m ­ portando o caráter m o m e n t â n e o e privado d a investidura d o árbitro, a sua atuação é d e u m munus publicum e a t u a m e m n o m e d o Estado, bu s c a n d o a pacificação através da realização justiça.

A atividade exercida pelo árbitro o u árbitros no procedimento arbitrai n ã o é m e r o ato de supressão d a via judicial, m a s sim o exercício de u m direito d e a ç ã o q u e se perfaz e m razão d e acordo prévio e expresso na c o n venção d e arbitragem (de natureza privada), enquanto seus efeitos, que se concretizam através dos atos executados pelo árbitro, e m razão do pac­

to arbitrai, s ã o de caráter público.

N o juízo arbitrai, os atos praticados pelo árbitro no exercício d e suas atividades s ã o revestidos d e notio, a vocatio e o iudicium, síntese d a juris­

dição, entretanto encontram limite a o passo q u e n ã o p o s s u e m a coercio,

assim, e m caso d e necessidade de m edidas coercitivas, v.g. c o n d u ç ã o de

testemunhas, decretação de medidas acautelatórias, haverá a necessidade

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de recorrer à justiça estatal para a exe c u ç ã o d o ato coercitivo. E s s a d e ­ pendencia d e m o n s t r a u m a atuação subsidiária'81 d a justiça pública peran­

te a justiça privada, n u m verdadeiro processo d e júris-integração'91 das jurisdições.

A l é m dos princípios constitucionais garantidores d o due process of law, aplica-se t a m b é m a o juízo arbitral o princípio d a kompetenz-kompetenz, no qual o árbitro tem competência sobre a sua própria competência, o u seja, é o juiz d e sua própria competência. U m a vez firmada a c o n venção d e arbi­

tragem, esta derroga a justiça estatal e m benefício d a jurisdição privada e, constituído o juízo arbitrai através do compromisso, passa o árbitro a deter o poder d o jus dicere a ser aplicado à controvérsia, e m consonância c o m as regras já estipuladas para a constituição d o juízo arbitrai e d e t é m ainda o poder para dirimir todas e quaisquer questões relacionadas c o m o caso e m exame, ressalvadas, obviamente, as matérias d e direito indisponível.

Recentemente, u m terceiro posicionamento v e m g a n h a n d o força, atri­

buindo u m a natureza mista à arbitragem, e m razão d e sua constituição dar-se por contrato (a partir d a cláusula compromissória ou do c o m p r o m i s ­ so, de caráter contratual e privado), enquanto q u e o processo arbitral está revestido d e natureza jurisdicional.

E m b o r a c o n c o r d e m o s integralmente c o m o s argumentos dos contra- tualistas (privatistas) e apesar d e irrefutáveis os argumentos dos jurisdicio- nalistas (publicistas), nos parece q u e a arbitragem possui u m a natureza sui generis, s e n d o mais equilibrada a tese defendida por aqueles q u e atri­

b u e m u m a natureza mista à arbitragem, ou ainda u m a natureza autôno­

ma'"51, especialmente e m razão das m u d a n ç a s sofridas nas legislações n a ­ cionais nos últimos tempos.

É acertado afirmar que o instituto jurídico d a arbitragem t e m por fun­

d a m e n t o o contrato e a livre vontade das partes, tendo s u a validade a p e ­ nas q u a n d o versar direitos patrimoniais disponíveis, razão pela qual p o ­ d e m optar pela resolução privada. Ainda é certo q u e o juízo arbitra! não exclui ou s e sobrepõe à jurisdição estatal, ap e n a s figura c o m o mais u m a alternativa à disposição das partes para a resolução d e suas lides civis ou comerciais (nacionais ou internacionais), d e s e m p e n h a n d o o árbitro u m a função privada análoga à função pública do magistrado, aplicando a regra ao caso concreto'"1. 8 9 * 1 1

(8) Revela-se u m a verdadeira h a r m o n i a entre a jurisdição estatal e a jurisdição arbitrai.

(9) Salles, Marcos Paulo de Almeida. " D a Coisa Julgada n a Arbitragem", in Revista d o A d v o g a d o n. 61 (OUI./97). Publicação d a A A S P — Ass o c i a ç ã o d o s A d v o g a d o s de S ã o Paulo.

{10) Jaqueline Rubellin-Devichiconclui q uanto à natureza jurídica d a arbilragem: “Pour permettre à l'arbitrage de connaître le d é v e l o p p e m e n t qu'il mérite, tout e n le maintenant d a n s les justes limites, il faut admettre, croyons-nous, q u e a s nature n ’est ni contractuelle, ni jurlsdictionelle, ni bibride, m a s autonome". {Rubellln-Devlchi, Jaquellne. “L'Arbitrage, Nature Juridique, Droit Interne et Droit International Privé", R. P ichon et R. D u r a n d Auzias, 1965, pág. 365).

(11) Carnelutti, Francesco. "Instituições d e Direito Processual Civil'', vol. L C a m p i n a s : Setvanda, 1999, pág. 157: “equivalentes jurisdicionais", m e i o s mediante o s quais s e p o d e atingir a justa c o m p o s i ç ã o d a lide, por obra d o s próprios litigantes (contendores) o u d e u m particular desprovido d e p o d e r jurisdicional estatal.

(9)

E S T U D O MULTIDISCIPLINAR 75

B) O sigilo q u e reveste o p r o c e d i m e n t o arbitral

C a b e n e s s a altura ressaltar q u e as p r o m e s s a s d a arbitragem c o m o celeridade, especialização da matéria, escolha d o direito aplicável, dentre outras, s ã o atrativos incontestáveis, especialmente s e voltarmos os olhos para a situação d e congestionamento e m q u e se encontram os tribunais.

Entretanto o sigilo q u e reveste o procedimento arbitral, c o m o garantia aos contendores d a preservação d e seus segredos industriais e reputação no me i o empresarial é posto pelos opositores à arbitragem c o m o fator de risco de subtração d a sociedade d e seu poder de vigilância d a s decisões, t e m e n d o ainda q u e as decisões privadas, e m razão d o c o m p r o m i s s o do árbitro c o m as partes, p o s s a m ocultar negociações q u e envolvam a o r d e m pública1121.

O r d e m pública é u m f e n ô m e n o q u e possui característica interna e internacional, além de envolver o conceito d e inafastabitidade d e disposi­

ção cogente, ou seja, envolve o interesse público por tratar de “um conjun­

to de princípios e normas essenciais para a convivência nacionar{'3) tornando-se indisponível. Consequentemente, n ã o p o d e m ser objeto de arbi­

tragem n e m s e p õ e m no âmbito da disponibilidade processual por sofrer limitação quanto ao próprio direito material aplicável, por prevalecer o inte­

resse público sobre o privado.

Infundado o temor pois, c o m o já foi dito, a solução privada d e litígios n ã o é m e r a m odernização dos meios de pacificação d e conflitos trazida pela globalização o u pelo liberalismo econômico, a o contrário, trata-se de u m dos pontos d e apoio d o direito processual.

V. C O N S I D E R A Ç Õ E S FI NAIS

B u s c a m o s c o m essa breve a b o r d a g e m focalizar a necessidade d e se observar a internacionalização das relações e a conseqüente necessidade d e valorização d e institutos q u e p o s s a m oferecer soluções aos conflitos decorrentes dessas relações, c o m foros isentos, céleres e especializados, a c o m p a n h a n d o as m u d a n ç a s exigidas pela globalização pelos e spaços de integração, n o m e a d a m e n t e os blocos econômicos, entretanto s e m estar voltado exclusivamente a o aspecto económico, m a s t a m b é m para a quali­

d a d e d e vida dos indivíduos e das sociedades. A convivência política, jurí­

dica e e c o n ô m i c a implica n a cidadania e d e seu exercício, e esta só é pos­

sível q u a n d o se t e m garantia de aplicação integral do direito c o m justiça, através d e meios e instrumentos imparciais.

E m face das m u d a n ç a s que naturalmente ocorrem n a sociedade, acele­

radas pelo processo da globalização e informação, é certo q u e seus refle- 1 2 1 3

(12) É preciso ter prudência q uanto à intervenção recíproca d a s esferas pública e privada, tratan- do-se d e u m desafio para o Direito c o n t e m p o r â n e o o equilíbrio entre a flexibilização e a preserva­

ç ã o d a o r d e m pública e s e u s princípios.

(13) Grecco Filho, Vicente. "Direito Processual Civil Brasileiro", Saraiva, 1 9 9 6 , 2 ' vol., pág. 415.

(10)

xos r e c a e m sobre a esfera jurídica, interferindo e m sua sistemática e in­

fluenciando na revisão de conceitos, dentre os quais d a m o s relevo a o c o n ­ ceito d e jurisdição para demonstrar a natureza jurisdiciona! d a arbitragem.

Tal revisão conceituai se dá n a esteira d a n o m e a d a “terceira onda"

renovatória d o Direito Processual, q u e visa criar formas alternativas d e s o ­ lução d e conflitos, utilizando procedimentos mais simples ou informais, o b ­ jetivando a garantia d o pleno acesso à justiça1'41. Importante saüentar que q u a n d o nos referimos a o acesso à justiça (conexo a o direito d e ação), não e s t a m o s tratando s o m e n t e d a prestação jurisdicional q u e e m a n a do Esta­

do, m a s sim d e u m conceito muito mais a m p l o d e jurisdição, visando a u ­ mentar o grau d e participação e o interesse popular n a administração d a justiça, valorizando-se a solução alternativa de conflitos.

A arbitragem certamente n ã o se identifica c o m o tradicional conceito d e jurisdição lançado por Chiovanda "de atuação da lei no caso concreto e função substitutiva da vontade das partes", m a s sim c o m u m conceito mais a m p l o d e seu exercício, q u e se concretiza n o instante e m q u e o particular realiza conciliação c o m a parte contrária o u s u b m e t e a solução d o seu conflito a u m árbitro previamente escolhido d e c o m u m acordo, conferindo- lhe o poder d e proferir a decisão mais justa e adequada.

B I B L I O G R A F I A C O N S U L T A D A E N A O C I T A D A

Barbosa Moreira, José Carlos. “M a n d a d o d e Injunção" in “Estudos Jurídi­

cos", Rio d e Janeiro, 1991.

Carmona, Carlos Alberto. “Arbitragem e Processo, U m Comentário à Lei n.

9.307/96”, Malheiros Editores, S ã o Paulo, 1998.

Casella, Paulo Borba (coord.). “Arbitragem, a N o v a Lei Brasileira (9.307/

96) e a Praxe Internacional’’, LTr Edit., S ã o Paulo, 1997.

Coimbra, 19 de m a r ç o d e 2001. 1 4

(14) S o b r e o assunto, Mauro Cappellettie Bryant Gartti. “A c e s s o à Justiça", Porto Alegre, 1988, Pabris Editor, pág. 82, n a qual o s autores l a z e m u m a rápida a b o r d a g e m sobre a s vant a g e n s d a a d o ç ã o d a arbitragem c o m o m e i o d e solução d e c a u s a s judiciais a o lado d a conciliação e incen­

tivos econômicos.

Referências

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