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CAPITÉIS DE IVORÁ/RS: RELIGIOSIDADE, PATRIMÔNIO HISTÓRICO E TURISMO 1 RESUMO

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CAPITÉIS DE IVORÁ/RS: RELIGIOSIDADE, PATRIMÔNIO HISTÓRICO E TURISMO1 COELHO, Eva Regina Barbosa Coelho2 BEZERRA, Thaís Viero3;

1 Trabalho de Pesquisa _UNIFRA

2 Curso de Turismo do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil 3 Curso de Turismo do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil E-mail: thiasvierobsm@hotmail.com; evaregina@unifra.br;

RESUMO

Neste artigo divulga-se os resultados parciais do projeto de pesquisa “Capitéis de Ivorâ/RS:Religiosidade, Patrimônio Histórico e Turismo” desenvolvido com o objetivo de recuperar os dados históricos dos capitéis ainda existentes neste municipo.Pretende-se relacioná-lo ao patrimônio cultural legado pelos descendentes italianos nesta região e evidenciar suas possibilidades de uso turístico. A metodologia usada refere-se principalmente aos recursos bibliográficos, entrevistas, observação e análise qualitativa dos dados recolhidos tendo como finalidade a produção de um texto informativo sobre este patrimônio a ser divulgado para a comunidade que o preserva. A conclusão parcial a que se chegou é a de que, por serem os capitéis uma marca da religiosidade de Ivorá, devem ser conservados e divulgados como atrativo turístico, mas, principalmente, como fator de manutenção de tal identidade, de orgulho e de autoestima do grupo que os criou.

Palavras-chave: Ivorá/RS; capitéis; Identidade; Turismo Cultural.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo apresenta o resultado parcial do levantamento que está sendo realizado em conformidade com o Projeto de Pesquisa “Capitéis de Ivorá/RS: religiosidade, patrimônio histórico e turismo”. Tal projeto tem como objetivo geral recuperar a história da construção e dos autores de cada um dos 24 capitéis existentes no município de Ivorá/RS, vinculando-os ao patrimônio histórico cultural legado pelos descendentes italianos nesta região e enfatizando suas possibilidades de uso turístico.

A intensão de resgatar a história e a memória dos capitéis de Ivorá justifica-se principalmente pela necessidade de conhecer a importância destas construções, entendida tanto pela comunidade em sua devoção, como pelo visitante - o turista.

A valorização pelo turismo de aspectos da cultura local pode servir como fator de autoconhecimento para os grupos envolvidos e da consciência de que a divulgação de seus costumes e de seu patrimônio ao visitante - turista - lhe trará benefícios, principalmente na forma de autoestima e valorização da identidade local.

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Imigração Italiana1 foram construídos pelos imigrantes italianos e seus descendentes numa demonstração de fé e religiosidade católica. São resultados de promessas diversas e na grande maioria das vezes foram doados à comunidade, servido ainda hoje como locais de encontro em momentos de expressão da devoção e piedade cristã.

2. IVORÁ

O município de Ivorá situa-se na região central do Rio Grande do Sul, a 360 quilômetros de Porto Alegre e a 50 quilômetros de Santa Maria. Está localizado na Serra de São Martinho a uma altitude média de 200 metros o que torna sua temperatura amena durante o ano todo numa média de 17°. A base da sua economia é voltada para a agricultura e pecuária2. Atualmente conta com uma população de 2.156 habitantes, destes 705 na zona urbana, e 1.451 na zona rural 3

Seu povoamento está, vinculado ao processo de imigração italiana ocorrida no Rio Grande do Sul durante o Segundo Império. Nesta ocasião, por necessidade de povoar terras desocupadas, formar um mercado interno com produção de gêneros de subsistência para a região sul a partir da produção em pequenas propriedades, decidiu o governo imperial vender suas terras devolutas4 a estrangeiros que pretendessem se instalar como pequeno agricultor na região sul do Brasil. A instalação dos imigrantes italianos no sul iniciou-se com a Colônia Conde d’Eu (criada em 1869) que deu origem à cidade de Garibaldi, a seguir surgiu a Colônia Princesa Isabel (também criada em 1869), hoje Bento Gonçalves. A terceira colônia a ser criada foi a Colônia de Fundos de Nova Palmira (1875), que deu origem à Caxias do Sul, todas na região nordeste do RS e por fim, o quarto núcleo de povoamento italiano, Silveira Martins, na região central.

Silveira Martins foi sede da chamada Quarta Colônia Imperial de Imigração Italiana, fundada em 1876 pelo governo e ocupada a partir de 1877. Em 1883 devido à necessidade de novos loteamentos para as sucessivas levas de imigrantes, foi criado dois novos núcleos, o Núcleo Norte e o Núcleo Soturno ao norte de Silveira Martins, em direção à Serra de São Martinho. (RIGHI; BISOGNIN; TORRI, 2001).

Em 25 de setembro de 1883 chegou ao Núcleo Norte o primeiro colonizador italiano, oriundo da região de Údine e do Friuli-Venezia-Giulia, no norte da Itália, Valentino Zancan, que veio acompanhado de sua esposa e seus quatro filhos. Esta é a família

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A Quarta Colônia, situada na região central do RS, compõe-se hoje pelos municípios de Silveira Martins, Faxinal do Soturno, Ivorá, Dona Francisca, São João do Polêsine, Nova Palma, Pinhal Grande e Restinga Seca e Agudo..

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Disponível em http://www.ivora.rs.gov.br/index.php?site=ivora.php, acesso em 21 de ago. de 2012.

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Disponível em http://www.fee.tche.br/sitefee/pt/content/capa/index.php

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Situação das terras desocupadas do governo imperial no Brasil, cuja posse foi regulamentada através da Lei de Terras de 18 de setembro de 1850, “que dispõe sobre o aproveitamento das terras devolutas do Império [...]

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considerada fundadora do Núcleo Norte. Logo em seguida chegaram novas famílias, sempre da região de Údine (Friuli - Venezia Giulia). Por este motivo, o novo núcleo adotou, pouco mais tarde, o nome de Nova Údine em homenagem à região italiana de origem da maioria de seus primeiros povoadores.

Em meio à Segunda Guerra por determinação superior, todos os núcleos coloniais no Brasil que tivessem seu nome ligado à terra natal de seus moradores, principalmente dos descendentes de italianos e alemães, foram obrigados a trocar seu nome. Nova Ùdine passou a chamar-se Ivorá, palavra indígena que significa Rio da Pedra Formosa. (RIGHI; BISOGNIN; TORRI, 2001).

Os primeiros tempos de vida dos povoadores de Núcleo Norte não foram fáceis devido às grandes distâncias entre os vários núcleos nascentes e principalmente com relação à sede, Silveira Martins que dista a 20 quilômetros, mas isso não desencorajava os colonos. A mata fechada que separava as povoações, as condições precárias em que se encontravam, ao contrário de desanimá-los, mais os estimulava a continuar e não desistir de seus planos de cultivar e produzir em suas terras. Esta força vinha de sua expressiva religiosidade católica.

As dificuldades de assitirem a missa dominical em Silveira Martins, por exemplo, levou os colonos a erguerem com seus próprios meios uma modesta capela de madeira com uma mesa muito simples, sobre a qual ficavam duas garrafas no lugar dos castiçais, um quadro representando São José, outro de Nossa Senhora do Rosário e um pequeno crucifixo ornamentavam o pequeno templo (BELLINASO; MARCON,1993). Neste recinto faziam suas rezas, cantavam e louvavam a Virgem Maria e aos santos de sua devoção, sempre com auxilio de um padre leigo, que puxava as rezas, já que os sacerdotes raramente chegavam até a povoação, devido às distânicas e à falta de estradas.

A prática do apostolado leigo, como era chamada a atividade dos padres leigos, comuns nas regiões de colonização italiana nos seus primeiros tempos, continuou, pelo menos, até a chegada dos sacerdotes palotinos que vinham regularmente de Vale Vêneto e a instalação de um capelão em 1906, o Padre João Iop. Em 1885, o Procurador Geral dos Palotinos, o padre Guilherme Witmee que se encontrava em Vale Vêneto, foi até a povoação a convite dos colonos para rezar a primeira missa na capelinha erguida pelos moradores no interior do Núcleo Norte. A partir de então a força e a persistência da comunidade levou-a a construir sua igreja matriz cuja pedra fundamental foi lançada em 1893, sendo sua sagração em 12 de setembro de 1899, com o título de Igreja Matriz de São José do Núcleo Norte. O Núcleo Norte foi levado à Capela Curada, isto é, passou a contar com a presença permanente de um Cura, em 1906, tendo sido nomeado o Padre João Iop. Em 1917 a Capelania de São José do Núcleo Norte foi erigida à categoria de Paróquia e foi nomeado como seu primeiro pároco, o Padre Humberto Busato. Em 09 de maio de 1988, a

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vila de Ivorá que havia sido instituida em 1939, foi elevada à categoria de municipio emancipando-se de Júlio de Castilhos. (BELLINASO; MARCON,1993).

3. OS CAPITÉIS, IDENTIDADE RELIGIOSA POSSIBILIDADES TURÍSTICAS

Com relação aos primeiros tempos e às dificuldades enfrentadas pelos colonos italianos no sul do Brasil, De Boni (1980) chama a atenção para a importância que teve a religião católica sob a forma de religiosidade popular para o imigrante italiano, o qual, afastado de toda a sociedade, sem recursos, [...], nas longínquas linhas, precisou se manter unido ao seu grupo para sobreviver e ajudar-se mutuamente. Foi Deus, a Virgem e os santos que sustentaram a religiosidade dos imigrantes italianos durante a viagem e nos primeiros tempos. Frente ao trabalho na floresta e nos campos, a religião foi o fator de integração social, que permitiu aos colonos manter a coesão e a identidade cultural na nova realidade. (MANFROI, 2001).

Além das capelas rústicas como aquela erguida pelas famílias do Núcleo Norte, os colonos de origem italiana costumavam erguer os capitéis. Nesta região no sul do Brasil, conforme observa Gutierrez e Gutierrez (2000) capitel não quer designar a parte superior de uma coluna, e sim, era o nome dado pelos imigrantes às pequenas capelas erguidas geralmente em homenagem a um santo de devoção, ou por conta de uma promessa ou graça alcançada. Na Quarta Colônia, como reforça Bisognin (2008), principalmente “no meio rural, os imigrantes deixaram uma marca profunda, sobretudo pela presença do grande número de capitéis”. Conforme lembra Belinazzo e Marcon (1993) os capitéis em Ivorá são geralmente construídos no jardim da casa, à beira da estrada e não implicavam em grandes gastos, pois eram simples e de pequeno tamanho. São demonstrações de fé popular, conforme pesquisa realizada por Belinazzo e Marcon (1993), envolvendo os capitéis construídos entre o final do século XIX e a década de 1980 e somam hoje 24 capitéis.

Caracterizando estas pequenas construções, Posenato (1983, p.331) as denomina de ermida, Undo afirma que “outro costume italiano trazido para o Brasil e que perdura até hoje nas áreas de colonização italiana é a construção de ermidas junto aos caminhos”. Na região, prossegue Posenato, "esta ermida denomina-se capitel, sem outra relação com a parte superior das colunas clássicas, a não ser a identidade do nome”.

Para o Posenato (1983), as ermidas originaram-se daqueles agrupamentos espontâneos para rezar, nas linhas, ou travessões e que se organizaram paulatinamente em capelas. Também podiam surgir de devoções, promessas e agradecimento, destaca o autor. Este projeto se propõe a resgatar a história da comunidade no que se relaciona à memória da construção e conservação dos seus capitéis, bem como recuperar com as famílias a importância destas pequenas construções para a manutenção dos laços de

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identidade e pertencimento que as ligam às origens italianas e ao local onde estão inseridas. A meta do projeto é oferecer um produto final sobre este aspecto da cultura da região, um espécie de catálogo, que venha ser útil não apenas para fonte de futuras pesquisas, como para divulgação das possibilidades do turismo cultural na região.

O turismo cultural configura-se como um segmento importante a ser desenvolvido pela região de colonização italiana no centro do estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista, que aspectos do patrimônio material e da tradição oral destes locais precisam ser preservados em época de avanços de mundialização das comunicações.

Entre as definições de turismo cultural, a Carta de Turismo Cultural, do ICOMOS (Conselho Internacional para Monumentos e Sítios), de 1976, (apud DIAS, 2006, p. 39) apresenta esta atividade como

Aquela forma de turismo que tem por objeto, entre outros fins, o conhecimento de monumentos e sítios histórico-artísticos. Exerce um efeito realmente positivo sobre estes tanto quanto contribui – para satisfazer seus próprios fins – a sua manutenção e proteção. Esta forma de turismo justifica, de fato, os esforços que tal manutenção e proteção exigem da comunidade humana, devido aos benefícios sócio-culturais e econômicos que comporta para toda a população envolvida.

No Brasil, o Ministério do Turismo, preocupado em definir abrangências do segmento cultural do turismo, em virtude da necessidade de interação entre turismo e cultura e o direcionamento das políticas públicas nestes setores, definiu turismo cultural,

Como o segmento que compreende as atividades turísticas relacionadas à vivência do conjunto de elementos significativos do patrimônio histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens materiais e imateriais da cultura. ( BRASIL, 2006, p.11).

Importante destacar o aspecto da vivência dos elementos significativos do patrimônio cultural pelo turista, pois aqui se entende que vivenciar, isto é, conhecer, contemplar, discutir, entender o objeto de visitação, o que implicariam em experiência participativa, além de apenas contemplativa do objeto de visitação.

Portanto, a valorização pelo turismo de aspectos da cultural local pode servir também como fator de autoconhecimento para as comunidades envolvidas e a consciência de que a divulgação de seus costumes e patrimônio ao visitante - turista - lhe trará benefícios, principalmente na forma de auto-estima e valorização da identidade local.

4. METODOLOGIA

Metodologicamente este trabalho de pesquisa desenvolve-se com base na bibliografia conhecida sobre a história do povoamento e desenvolvimento da região de Ivorá, e em entrevistas com pessoas locais, indagando sobre a origem da devoção venerada no

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capitel, a construção e sobre sua utilização atual. As entrevistas são direcionadas para o tema principal, com perguntas que provoquem e oportunizem ao entrevistado falar o quanto achar necessário.

A cada visita quinzenal a Ivorá são buscados dados sobre os capitéis de uma determinada região do interior do município, contatando moradores que vivem nas imediações da pequena capela, preferencialmente os proprietários das terras onde ela está inserida. Os moradores, conhecedores da história do capitel, ou parte dela, ajudam com suas informações ao preenchimento da ficha catalográfica de cada capitel, onde são indagados sobre data da construção, localização, santo reverenciado, motivo da construção, características da construção (materiais, estilo, adornos externos) estado de conservação, ocupação atual (festas, novenas, terços), curiosidades, visitação, entre outros dados.

Ao mesmo tempo em que são levantados os dados físicos do capitel, são também feitas fotografias do capitel e seu entorno, que revirão posteriormente para melhor descrevê-lo.

Com a transcrição das narrativas e a recuperação de dados através da ficha de cada local, espera-se seja possível reescrever a história de cada capitel, das famílias responsáveis por eles, dos momentos em que eles foram reverenciados ou ainda o são através de cerimônias periódicas. Isto deverá recompor um momento da história do município de Ivorá, refazendo a memória coletiva e a identidade representada pela italianidade de sua cultura.

5. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Nas visitas quinzenais realizadas até o momento ao municípo de Ivorá foram levantados os dados de 19 capitéis que estão localizados geralmente dentro de uma propriedade rural, embora um pequeno número se encontre no meio urbano ou nas entradas da cidade. Também se percebeu que não significa que a família proprietária onde a construção está inserida seja descendente daquela que ergueu o capitel, mas geralmente, esta é a família responsável pela sua manutenção e cuidados. Conversando com tais pessoas é que se obtêm os dados principais de um determinado capitel. Neste caso, usa-se a entrevista oral e transcrita posteriormente, de maneira literal.

Como elemento de cunho religioso, o capitel constitui-se em apenas um dos legados culturais da comunidade de Ivorá, mas que sendo parte de sua história e de seu patrimônio cultural, é tarefa do historiador a obtenção de fatos fidedignos e relevantes que relacionados de forma coerente e significativa poderão ser utilizados para valorização da memória local. Este conjunto de fatos poderá ser aproveitado pelo profissional do turismo com responsabilidade e respeito ao local, para agregar valor ao produto turístico, pois se trata de

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aproveitar e expor o patrimônio cultural de uma comunidade. Pois, como adverte Moser (2004, p.81), é muito fácil que

a reinterpretação [das entrevistas] descaracterize a comunidade na sua oferta turística e gere um produto que não corresponda ao modelo, ou como a comunidade se vê e se acredita, “pasteurizando” e colocando à disposição do turista um produto inverossímil e inverídico e portanto [...] artificial ou irreal.

A fidedignidade aos relatos de histórias pessoais coletados neste trabalho de campo junto à população de Ivorá/RS leva em consideração a importância da memória individual e coletiva ao preservar certos símbolos locais e a capacidade da comunidade em preservá-los, o que garante a manutenção da sua identidade.

Para definir identidade e sua importância na manutenção da memória cultural da comunidade de Ivorá, leva-se em consideração o que afirma Calhoun (apud CASTELLS, 1999, p. 22), com respeito ao autoconhecimento: “não há povo que não tenha nomes, idioma ou cultura em que alguma forma de distinção entre o eu e o outro, nós e eles, não seja reconhecida. O autoconhecimento [...] nunca está totalmente dissociado da necessidade de ser reconhecido [...] pelos outros”. Complementando o pensamento, Castells (1999, p. 22) afirma que “identidade é o processo de construção de significado com base em atributo cultural ou ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o (s) qual (is) prevalece (m) sobre outras fontes de significado”.

Segundo Castells (1999) são as condições históricas, geográficas, biológicas, as instituições produtivas e reprodutivas da memória coletiva, as influências das instituições de poder e revelações de cunho religioso os fatores responsáveis pela formação da identidade de um grupo. Esta reflexão auxilia na compreensão de que o fato da comunidade de Ivorá ter permanecido praticamente isolada de outros grandes centros, teria preservado sua cultura original, mantendo sua identidade cultural de influência essencialmente italiana. Isto a faz diferente, pois seu passado lhe concedeu um sentido de identidade e de pertencimento que torna seus moradores conscientes da necessidade de manter esta continuidade através do tempo.

Pode-se notar tal entendimento do morador de Ivorá quando procurado para informar sobre o capitel de sua propriedade, por exemplo, ele abre sua residência sem cerimônia, são simpáticos, gentis, largam o serviço diário que estão fazendo para dar atenção ao grupo de estudantes entrevistadores. Estas atitudes e demonstrações de confiança levam a crer que a própria comunidade tem interesse em registrar essas informações para que a história dos capitéis no município não se perca, pois em sua maioria são trabalhadores rurais, gente simples e que vive em contato com a natureza, valorizando e cultivando sua religião.

Na região de Ivorá, o capitel tem o aspecto de uma pequena capela, de construção muito simples, quase sem adornos, muitas vezes solitário na curva de uma estrada ou quase inacessível no alto de uma encosta da estrada, raramente no interior de uma

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propriedade rural. O acesso é livre. Não se necessita solicitar permissão para visitá-lo nem para reverenciar o santo homenageado ali.

A grande maioria está em estado muito precário de conservação, o mato cresce ao seu redor, os raros ornamentos danificados, o acesso quase impossível. Ao passo que outros recebem cuidados periódicos, alguns até tem proteção ao seu redor para evitar o vandalismo, com pintura recente e imagens dos santos em muito bom estado.

Quanto ao material empregado na sua construção identificam-se desde o basalto, pedra abundante na região e usada pelos imigrantes em suas moradias, por exemplo; o tijolo artesanal e o tijolo de fabricação mais recente; as telhas artesanais de barro ou de madeira, as telhas de barro industrializadas e até de amianto, para a cobertura; as grades de madeira ou de ferro para as aberturas e proteção. Raramente existem informações da localização ou mesmo uma de identificação do capitel.

No entanto, segundo narram os entrevistados, apesar do descuido, a devoção aos santos homenageados continua, pois vez ou outra uma capelinha, mesmo que parecendo abandonada, recebe flores, velas são ascendidas ali, demonstrando que a fé não esmorece, apesar de tudo.

A pesquisa ainda em andamento demonstrou que entre os 19 capitéis levantados até o momento as devoções mais recorrentes têm sido Santo Antônio de Pádua, São Francisco de Assis, São Paulo, Sant’Ana, Santa Escolástica (fig.2), Nossa Senhora nas suas diversas manifestações, como Nossa Senhora do Bom Parto (Fig.1), Nossa Senhora della Guardia, Nossa Senhora da Saúde, Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora Medianeira Nossa Senhora de Lourdes, Nossa Senhora da Salete, Nossa Senhora do Rosário de Pompéia.

Figura 2: Capitel Santa Escolástica, Linha Simonetti, IVORÁ/RS,construido no inicio do século XXI.

Acervo: E. Coelho, 2012 Figura 1: Capitel de Nossa Senhora do

Bom Parto, da Linha Londero Moro, Ivorá/RS, erguido no iníco do século XX; Acervo: E.Coelho , 2012

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Prova desta afirmação são as festas que continuam a ser realizadas nos capitéis de Ivorá, pelas respectivas comunidades. Dentre estas se podem destacar a Festa no capitel de Nossa Senhora do Rosário de Pompéia na Linha Sete, no capitel de Nossa Senhora Medianeira em Barreiro, festa de Nossa Senhora da Salete, na Comunidade de Chapadão, todas com apoio do pároco que reza as missas e da comunidade que organiza os almoços e festividades com bailes e jogos típicos da cultura imigrante italiana. Destaque ainda para aqueles capitéis onde ocorrem celebrações em dia santo e em festas de fim de ano, como no capitel do Sagrado Coração de Jesus, na Linha Zancan, de São Roque e de São Francisco na Linha Venturini e o de Nossa Senhora della Guardia, onde rezam novenas em épocas de seca.

6. CONCLUSÕES

Estas manifestações levam a crer que a identidade religiosa católica dos descendentes dos imigrantes italianos na região central, principalmente em Ivorá se manifesta diariamente na sua devoção a Nossa Senhora e aos santos e santas que na sua fé, lhes ajudaram enfrentar as dificuldades do dia-a-dia.

Alguns capitéis visitados apresentam sinais de abandono, outros já desapareceram ou foram retirados do lugar para dar passagem à estrada o que leva a pensar que se não houver uma conscientização geral sobre a importância e a representatividade cultural destas capelinhas, pouco restará delas. Outro fato que chama atenção é a falta de identificação ou sinalização. Entende-se este aspecto como decorrência do próprio objetivo com que foram construidos: são simplesmente sinais de reconhecimento por uma graça alcançada de algum dos santos de veneração da comunidade. Não foram erguidos pensando em servir de atração para a visitantes ou para facilitar seu acesso. Esta visão é decorrência da eminência que se tem hoje, em salvar o que resta da materialidade do passado de grupos expostos aos efeitos da globalização cultural.

Os capitéis como marca singela da religiosidade de Ivorá devem ser conservados e divulgados como atrativo turístico mas, principalmente, como fator de manutenção de tal identidade e de orgulho da italianidade do grupo que os criou.

REFERÊNCIAS

BELLINASO, Diácono Severino; MARCON, Frederico J. Paróquia de Ivorá: 1918-1993, 75 anos de fé. Santa Maria: Editora Pallotti, 1993.

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Referências

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