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38º. ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS GT-26 O PENSAMENTO SOCIAL LATINO-AMERICANO: LEGADO E DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS

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Academic year: 2021

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38º. ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS

GT-26 O PENSAMENTO SOCIAL

LATINO-AMERICANO:

LEGADO E DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS

LEGADO DOS CADERNOS DO POVO BRASILEIRO

PARA A INTERPRETAÇÃO DOS PROBLEMAS LATINO-AMERICANOS

(2)

LEGADO DOS CADERNOS DO POVO BRASILEIRO

PARA A INTERPRETAÇÃO DOS PROBLEMAS LATINO-AMERICANOS

Angélica Lovatto1

RESUMO:

O trabalho fará uma síntese da contribuição que os Cadernos do Povo Brasileiro (1962-64) deixaram para uma interpretação dos problemas latino-americanos, em especial do Brasil, no contexto da Guerra Fria e das consequências da Revolução Cubana de 1959 para o destino do continente. A recuperação aqui pretendida é a da leitura feita sobre a presença do imperialismo em meio ao chamado subdesenvolvimento latino-americano, bem como o dilema reforma versus revolução. Isto é, o conjunto de circunstâncias que viriam a definir, na sequência, a estratégia de aplicação de golpes de Estado, a partir do Brasil, e que se espalhariam pelo Cone Sul, cujas consequências nefastas deixaram raízes até hoje no continente

Palavras-chave: América Latina; pensamento latino-americano; Cadernos do Povo Brasileiro.

1. Introdução

Este trabalho fará uma síntese da contribuição que os Cadernos do Povo

Brasileiro (1962-64) deixaram para uma interpretação dos problemas latino-americanos,

em especial do Brasil, no contexto da Guerra Fria e das consequências da Revolução Cubana de 1959 para o destino do continente. Este legado ainda não havia sido estudado na totalidade de 28 volumes publicados em apenas dois anos, daí o ainda quase ineditismo de estudos sobre uma Coleção que vendeu, à época, a impressionante cifra de um milhão de exemplares e que foi destruída e encerrada em abril de 1964.

Portanto, a recuperação aqui pretendida é a da leitura feita sobre a presença do imperialismo em meio ao chamado subdesenvolvimento latino-americano, bem como o dilema reforma versus revolução, tão discutido naquele momento histórico. Desse quadro acabou se formando o conjunto de circunstâncias que viriam a definir, na sequência, a estratégia de aplicação de golpes de Estado, a partir do Brasil, e que se espalhariam pelo Cone Sul, cujas consequências nefastas deixaram raízes até hoje no continente. Entende-se, portanto, que este trabalho se insere no escopo da discussão contemporânea que pretende articular o aporte do pensamento latino-americano à análise dos grandes temas que permeiam a conjuntura de nossa região, discutindo sua longa duração e os desafios para o século XXI.

Um dos eixos que torna uma publicação que marcou época em uma referência para a discussão do tempo presente – e, ainda mais, suas perspectivas de futuro – é a

1

Professora do Depto de Ciências Políticas e Econômicas UNESP-Marília. Líder do Grupo de Pesquisa “Pensamento Político Brasileiro e Latino-Americano” (CNPq), no Programa de

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Pós-constatação de que “quem desconhece o passado, condena-se a repeti-lo”, lembrada por Goethe2. Resgatar nosso passado, a fim de compreender os eventuais erros e acertos cometidos não é tarefa fácil. Demanda – além dos esforços teóricos de praxe – uma disposição histórica de rever-se, seja individualmente, seja enquanto povo, seja enquanto classe ou fração de classe interessada e comprometida com as transformações sociais. Neste sentido, a incrível inserção social dos Cadernos do Povo Brasileiro naquele momento candente das estratégias geopolíticas, pensadas pelo mundo capitalista imperialista para o chamado Terceiro Mundo, tiveram uma função social efetiva, independentemente dos eventuais erros ou acertos contidos nas análises desta publicação. Por causa dessa inserção social – seja no meio estudantil, quanto no meio sindical – a Coleção sem dúvida precisava ser no mínimo estudada e referida, colaborando para o balanço de uma época que está historicamente ainda muito próxima, ou seja, decorridos apenas 50 anos de marchas e contra-marchas.

Impossível entender o significado dos Cadernos sem esse contexto brasileiro e latino-americano, marcado por novas inflexões no debate sobre o desenvolvimento do continente na geopolítica do imperialismo, em uma conjuntura internacional em processo de mudança: avanço do processo de descolonização, crescimento do bloco dos “não alinhados”, início do “cisma” sino-soviético, emergência do terceiro-mundismo, intenso desenvolvimento capitalista industrial em alguns países periféricos, especialmente na América Latina.

Estimulados e patrocinados dentro dos projetos do ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros (1955-64), coordenados por Álvaro Vieira Pinto, os Cadernos foram publicados pela Civilização Brasileira, no Rio de Janeiro, e vendidos pela UNE Volante, projeto do movimento estudantil organizado que levava a várias cidades do interior do Brasil a discussão sobre as Reformas de Base – na qual se incluía a da Educação – através de projetos culturais germinados nos CPCs – Centros Populares de Cultura. Os volumes eram vendidos de mão-em-mão e publicados no formato de bolso, o que facilitava sua leitura e divulgação. Cada número tinha uma tiragem mínima de 20 mil exemplares, o que é muito difícil ainda hoje, imagine-se então à época. Esse fenômeno editorial chegou à venda de 100 mil exemplares de um único número, o volume 3, escrito por Álvaro Vieira Pinto, com o sugestivo título “Por que os ricos não fazem greve?”3. Aliás, a coleção é formada por títulos explosivos, tais como: “Que são as Ligas

2

Cf. GOETHE apud KONDER, Leandro. Os marxistas e a arte. R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1967.

3

VIEIRA PINTO, Álvaro. Por que os ricos não fazem greve? R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962, Cadernos do Povo Brasileiro, v.3.

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Camponesas?”4, escrito pelo próprio Francisco Julião; “Quem dará o golpe no Brasil?”,

de Wanderley Guilherme5; “Quem são os inimigos do povo?”, de Theotônio Junior6, entre outros.

No estudo que desenvolvi a este respeito7, fica patente em cada um dos volumes a preocupação dos autores em relacionar a realidade da formação social brasileira à formação do continente, já que o debate principal girava em torno da necessidade (ou não) de uma revolução de tipo democrático-burguesa nestes países periféricos que procuravam consolidar seu processo de industrialização, tendo como principais obstáculos a questão agrária mal resolvida – latifúndios, ausência de reforma agrária – e a presença incômoda do imperialismo batendo à porta dos países economicamente mais avançados da América Latina naquele contexto.

Vamos aqui apresentar algumas das reflexões realizadas nos Cadernos, onde é referida de forma mais direta a situação latino-americana que contextualizava o período, especialmente a influência nada desprezível da Revolução Cubana, que acabara de ocorrer – e que acendia os debates – e, consequentemente, as táticas e estratégias a serem pensadas para o continente. Posteriormente, se concretizada a seleção desta proposta, o trabalho final a ser inscrito trará o conjunto de referências à situação latino-americana como um todo, presentes nas páginas da Coleção.

A conjuntura latina e a influência da Revolução Cubana

Apesar de terem sido publicados apenas três anos após a Revolução Cubana – ou talvez por isso mesmo – os Cadernos do povo brasileiro fazem referências constantes ao acontecimento na ilha, independentemente de coincidirem com tal ou qual estratégia e tática da revolução ali defendida. A ameaça que a vitória daquela revolução provocava no conjunto de forças atuantes na Guerra Fria, pesou sobre as estratégicas geopolíticas do imperialismo norte-americano. Parecia se concretizar o temor – para as classes dominantes capitalistas – de que uma revolução de caráter socialista pudesse exercer uma maior sedução sobre os povos menos desenvolvidos, especialmente da América Latina, tanto por sua maior velocidade na superação de problemas econômicos, quanto pelo alcance de maior progresso social para as camadas marginalizadas, notadamente para países recém-saídos do processo de descolonização.

4

JULIÃO, Francisco. Que são as Ligas Camponesas? R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962,

Cadernos do Povo Brasileiro, v.1.

5

Wanderley Guilherme à época, hoje Wanderley Guilherme dos Santos. “Quem dará o golpe no Brasil? R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962, Cadernos do Povo Brasileiro, v.5.

6

Theotônio Junior à época, hoje Theotônio dos Santos. “Quem são os inimigos do povo?” R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962, Cadernos do Povo Brasileiro, v.6.

7

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Sem entrar aqui no mérito dos problemas de ordem econômica que a Revolução Cubana enfrentou, cabe ao menos salientar que tudo que envolvia a superação da miséria – mesmo numa revolução ocorrida nos chamados elos débeis do capitalismo –chamava a atenção de um conjunto de forças políticas naquele momento, fossem elas de direita ou de esquerda. No primeiro caso, para impedir que novas luzes esquentassem o termômetro das revoluções contra o capital e o capitalismo. E, no segundo, porque podia justamente trazer novas luzes sobre um debate muito difícil que vinha sendo travado desde o século XIX sobre a formação social do continente. Os Cadernos do povo brasileiro foram um componente importante neste último caso e fizeram parte do debate que se travou a esse propósito nos anos 1960. Por isso, vão aqui inicialmente alguns destaques.

Começo pela referência que Francisco Julião fez da influência da Revolução Cubana sobre as Ligas Camponesas, ao destacar a importância da questão agrária no processo revolucionário cubano:

A vitória da Revolução Cubana trouxe ao movimento camponês do Nordeste notável reforço. Desde o momento em que Fidel Castro com os seus barbudos entrou em Havana, ao lado de Cienfuegos, Guevara, Almeida e Raul, libertando o seu povo do regime cruel de Batista, nunca mais as Ligas perderam de vista a gloriosa Pátria de José Martí.

Tendo sido a reforma agrária a espinha dorsal daquela Revolução, seu eixo, sua alma, os camponeses nordestinos imediatamente passaram a defendê-la nas demonstrações de massas, passeatas e comícios.8

Outro cadernista que cita o exemplo da Revolução Cubana é Franklin de Oliveira9, quando está defendendo que as revoluções de caráter democrático-nacional no pós-Segunda Guerra deviam ser de novo tipo, que ele denomina de “revolução democrático-socialista”. Cita Cuba como exemplo dessa superação de uma situação colonial, ultrapassando os limites de caráter burguês de uma revolução democrático-nacional:

Como é do consenso geral (...) a Revolução Cubana começou sendo praticamente pouco mais do que uma revolução liberal. Visava fundamentalmente depor um ditador e erradicar a miséria do país. À medida, porém, que o governo revolucionário se empenhou na tarefa de erradicação da miséria, foi levado à anticolonial e antiimperialista, de onde a revolução automaticamente se ter

transformado em revolução socialista, a despeito de ter sido mínima, no seu curso, a

8

JULIÃO, Francisco, op.cit., p.42.

9

OLIVEIRA, Franklin de. Que é a revolução brasileira? R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962,

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participação de comunistas.10

Bolívar Costa, que escreveu Quem pode fazer a revolução no Brasil?11 refere-se

constantemente à Revolução Cubana. Até mesmo por motivos comparativos, o autor analisa o acontecimento na ilha, fazendo a relação das repercussões daquele processo sobre os outros países latino-americanos, em especial, o Brasil:

Principalmente depois da vitória da Revolução Cubana e devido à imensa repercussão que as medidas por ela adotadas alcançaram no seio das massas po-pulares da América Latina, o imperialismo cuidou de tornar mais efetivo seu esquema contra-revolucionário. A consequência imediata disso são os acordos resultantes das duas conferências de Punta del Este, convocadas com o objetivo de se preparar a repressão não diretamente contra o regime cubano, mas contra os povos dos países latino-americanos que vierem, no futuro, a levantar-se para acabar com a miséria e o atraso.12

Mas a expectativa com o papel de comando das forças latino-americanas que o Brasil podia representar era, nos cadernistas, uma esperança muito grande. Por isso, o mesmo autor ainda alerta que:

Isto não significa, porém, que a Revolução Cubana tenha sido a última a triunfar na América Latina. Na verdade, alguns países, como a Colômbia, a Argentina e, sobretudo, o Brasil, conservam plenas condições de viabilidade revolucionária.13

INSERIR AQUI O RESTANTE DO PAPER CUJA REDAÇÃO FINALIZEI ONTEM, E ESTÁ NO ARQUIVO “FINALIZAÇÃO PAPER COMPLETO”.

10

Ibid., p.84.

11

COSTA, Bolívar. Quem pode fazer a revolução no Brasil? R.Janeiro: Civilização Brasileira, 1962, Cadernos do Povo Brasileiro, v.7.

12

Ibid., p.59.

Referências

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